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O que torna o governo representativo democrático?

Democracia e representação são conceitos com origens e significados distintos. Cunhada pela primeira vez na Grécia antiga, democracia (dēmokratía) significa, literalmente, poder (kratos) do povo (demos). A representação (representatione), por sua vez, é de origem latina. Costuma-se remontar seu primeiro uso a 1188, ano no qual o rei Afonso IX reuniu, na Península Ibérica, diferentes membros da nobreza, a fim de angariar apoio político e econômico. Podemos dizer que estes nobres, reunidos nas Cortes do rei, agiam como representantes, no sentido de que as decisões que ali tomavam eram consideradas como se tivessem sido feitas por todos os cidadãos da localidade de onde provinham. À medida que se difundiu para outros lugares da Europa, essa prática consolidou o governo representativo, termo usado até hoje para designar todo regime político que adota a representação como instrumento de governo.

Dados os diferentes significados e origens da representação e da democracia, compreende-se por que alguns defensores desta julguem-na incompatível com aquela. Afinal, a democracia designava o regime dos antigos no qual o povo inteiro se governava. A representação, em contrapartida, era um mecanismo que permitia aos monarcas e nobres governar uma população servil. Sendo assim - insistem alguns críticos -, tentar conjugar representação e democracia seria uma empreitada tão promissora quanto tentar encontrar um círculo quadrado. Para alcançarmos a democracia, afirmam esses críticos, precisamos destruir as instituições representativas e, por assim dizer, começar do zero. Engajar com as instituições vigentes, em resumo, é inútil.

Visto essa posição simplista não ser incomum entre nós, é em boa hora que vem a lume a versão ampliada de Teatro legislativo, cuja primeira edição foi publicada por Augusto Boal em 1996. Trata-se de uma versão ampliada porque, além do texto original, o livro contém dez discursos políticos do autor, traduções de trechos acrescidos à edição inglesa do Teatro legislativo, um texto inédito sobre cultura e uma carta de Boal a Richard Schechner que serve de post-scriptum ao texto original. O livro também apresenta depoimentos de quatro praticantes do teatro legislativo, dois dos quais trabalharam com Boal, entre 1993 e 1996, durante seu mandato como vereador do Rio de Janeiro.

Além de sistematizar as práticas que Boal implementou quando foi vereador, o Teatro legislativo tem como objetivo elaborar uma teoria acerca da representação democrática. Não se trata de uma tarefa nova, é claro, haja vista a procura por formas de representação democrática ter animado Boal desde meados de 1950. A diferença específica do Teatro legislativo é que ele não só propõe dispositivos participativos capazes de dar vazão à representação democrática, como também explica o que torna o governo representativo democrático. Não menos do que Condorcet e Stuart Mill - filósofos que também foram eleitos representantes políticos em seus respectivos países -, Boal buscou pensar a democracia em conjunção com a representação. Assim como eles, Boal nos faz ver a ingenuidade daqueles que, recusando a representação tout court, creem ser possível, no contexto moderno, o retorno à democracia direta dos antigos.

Logo no início do livro, Boal argumenta que a democracia grega não constitui um modelo que os modernos devem imitar. O tipo de democracia que os gregos praticavam era imperfeito, quando mais não seja porque restringia o sufrágio a uma parcela ínfima da população. Na medida em que contava com um número extremamente reduzido de cidadãos, a democracia grega dispensava a representação e promulgava as decisões governamentais por meio de “plebiscitos orais” que ocorriam na praça pública (Boal, 2020, p.60). Em regimes cujo corpo citadino ultrapassa a casa dos milhões, a representação se torna uma condição necessária para a democracia, pois permite criar decisões coletivas a partir da interação de pessoas que agem em diferentes tempos e espaços.

Necessária, porém não suficiente. Com efeito, imediatamente após afirmar a inviabilidade de recriar a pólis ateniense na modernidade, Boal critica o caráter oligárquico dos governos representativos existentes. Embora se autodenominem “democracias representativas”, nossos governos não são democráticos, sobretudo porque o tipo de representação que praticam confina a participação popular ao instante solitário do voto. Toda democracia representativa é um governo representativo, mas nem todo governo representativo se qualifica de democracia representativa. Nos governos representativos atuais, o exercício do sufrágio é “paradoxal: no momento mesmo de exercê-lo, no ato de votar, esse poder desaparece” (p.162). Isso acontece porque os meios que temos para influenciar nossos representantes no período entre eleições são escassos. Para que o governo representativo se democratize, é necessário que o povo participe da política, ativamente, no intervalo entre uma eleição e outra.

Boal chamará de democracia transitiva o governo que conjuga representação e participação popular. Ele explica que o termo transitividade era usado por Paulo Freire para expressar um movimento interativo entre educadores e educandos, pautado pelo diálogo democrático, que os permitia construir conhecimento e autonomia. Na pedagogia freireana, o conceito de transitividade está intimamente ligado ao construtivismo epistemológico, isto é, à ideia de que o conhecimento não é algo que precede a interação entre educando e educador. Em vez disso, o conhecimento é construído à medida que educandos e educadores interagem entre si. A relação pedagógica defendida por Freire não consiste na transmissão monológica de conteúdos, despejados por um ator que detém o monopólio da ação (o professor), sobre um espectador passivo (o aluno).

Boal estende o princípio da transitividade ao plano da representação política e, ao fazê-lo, endossa o construtivismo representativo. No modelo de democracia que elabora, o objeto a ser representado não antecede a representação. Pelo contrário, o objeto representado é construído ao longo do processo representativo. Na democracia transitiva, o representado auxilia o representante na formação da proposta legislativa que ele pleiteará na assembleia. Quando opera de maneira democrática, a representação constrói pautas coletivas que promovem a autonomia do povo.

Um pressuposto central da estética boalina, reiterado no livro, é o de que as pessoas não são livres porque estão atrofiadas: “as pessoas se encontram isoladas e individualizadas em frente à TV, tendo, no entanto, sua individualidade extraída delas: o mercado não tem como satisfazer os desejos de todos, então aqueles que manipulam o mercado procuram nos extirpar de todos os nossos desejos [...], implantando o desejo do mercado em nós” (p.74). Boal emprega o termo individualidade para descrever o sujeito que, mediante desenvolvimento de suas capacidades epistêmicas e estéticas, consegue cultivar uma relação crítica com seu entorno. Ora, o individualismo fomentado pelo capitalismo é o oposto disto. No mundo opressivo em que vivemos, a ideologia manipula os desejos das pessoas e, por conseguinte, sua identidade. Quando meu desejo é deformado com o propósito de me fazer apoiar práticas que me oprimem, sou roubado de minha individualidade. Na sociedade atual, a abertura de canais participativos é sem dúvida importante. Igualmente necessário, porém, é estruturar estes canais de modo a resistir à injustiça epistêmica e à injustiça estética (Dalaqua, 2020DALAQUA, G. H. Aesthetic Injustice. Journal of Aesthetics & Culture, v. 12, n. 1, p.1-12, 2020.). Seria equivocado acreditar que a democracia - vale dizer, a autonomia do povo - surgiria tão logo abolíssemos as instituições representativas e criássemos, por meio da internet, um regime no qual todos decidiriam, instantaneamente, as decisões governamentais. Para averiguar se uma decisão foi autônoma, não basta constatar a presença de consenso; é preciso também verificar o processo por meio do qual o consenso se formou. Os juízos que determinam o voto das pessoas nem sempre se formam autonomamente. Dada a presença da ideologia, muitas vezes eles apenas refletem os interesses dos opressores.

Em comparação com as formas imediatas de exercício do poder político, a vantagem do modelo de democracia que Boal defende é que ele se vale das instituições representativas como meio de reversão da ideologia e de promoção da autonomia dos sujeitos. Boal potencializou o aspecto crítico dos juízos populares ao criar uma série de espaços onde os representados deliberavam, em pé de igualdade, sobre os temas que os representantes deveriam legislar. Se o Teatro legislativo, por um lado, deve ser lido por aqueles que recusam a representação porque a consideram incompatível com a democracia, por outro, ele também precisa ser estudado por quem subscreve à oligarquização do governo representativo. A teoria da representação de Boal apresenta um caráter democrático robusto que a distancia de algumas defesas do governo representativo, predominantes no mainstream do discurso político e acadêmico, cujo aspecto democrático é bastante tênue. Portanto, não causa surpresa que o autor tenha sido alvo de uma série de fake news, veiculada durante semanas na primeira página de um jornal da grande mídia, segundo a qual ele teria desviado dinheiro da prefeitura. À medida que as práticas boalinas se alastravam pelo Rio de Janeiro, as elites que lucram com a oligarquização do governo representativo perceberam que precisavam reagir. Ainda que, nos anos seguintes, as ações judiciais, decorrentes destas notícias falsas, tenham provado a inocência de Boal, o efeito que elas almejavam produzir foi alcançado. Boal não foi reeleito e o teatro legislativo deixou de ser utilizado pela Câmara Municipal carioca.

Quais são essas práticas, de potencial emancipatório, que o teatro legislativo propõe? A primeira delas se dá com a criação dos núcleos, espaços deliberativos onde os representados constroem, coletiva e frequentemente, as pautas que desejam comunicar aos representantes. No período em que foi vereador, Boal e seus assessores estimularam a criação de mais de trinta núcleos. Em sua maioria, os participantes eram “da classe média baixa, proletários ou desempregados” - i.e., pessoas oprimidas economicamente -, mas também havia núcleos que se juntavam porque eram oprimidos por conta de raça, gênero, sexualidade, religião ou deficiência física (Boal, 2020, p.82). Valendo-se do arsenal do Teatro do Oprimido (TO), os participantes dos núcleos discutem os problemas que os afligem e ensaiam soluções para eles. Partindo da tese hegeliana de que a essência do teatro é o conflito, Boal estabelece que os núcleos devem empregar técnicas teatrais, a fim de explicitar os vários eixos de opressão que tendem a ser camuflados no dia a dia. Visto que os núcleos geralmente são formados por pessoas similares, é importante que eles criem “diálogos intergrupos [...]: é preciso que cada oprimido conheça a opressão dos demais e com eles se solidarize. Cada cidadão vai compreender melhor os seus próprios problemas se compreender os dos demais” (p.88).

Mais uma vez, salta aos olhos a influência de Freire. De acordo com a teoria freireana, a ausência de solidariedade entre os oprimidos é um dos maiores obstáculos à luta contra a opressão e em prol da democracia. Para que possam fortalecer esta luta, os oprimidos precisam perceber que, em que pese suas diferenças de raça, classe, gênero etc., todos eles têm algo em comum: são oprimidos. Freire entendia que semelhante percepção somente poderia se desenvolver a contento mediante um processo de politização, quer dizer, de enfrentamento entre duas identidades antagônicas (“nós” vs. “eles”). “Somente quando os oprimidos descobrem, nitidamente, o opressor, e se engajam na luta organizada” é que a prática da liberdade lhes é possível (Freire, 2017, p.72). Na esteira de Freire, Boal considera o conflito salutar e o identifica como sustentáculo da liberdade. A democracia é o regime que, longe de escamotear os diversos conflitos que permeiam as relações humanas, explicita-os a fim de minorar a opressão.

Outra prática do teatro legislativo é a Câmara na Praça (CP). Como o nome já deixa antever, a CP prolonga para a praça pública os procedimentos deliberativos adotados na assembleia representativa. Trata-se de uma reunião aberta ao público que visa produzir rascunhos de projetos de lei - no vocabulário de Boal, súmulas - sobre um determinado tema. Findada a reunião, as súmulas são enviadas para um representante, que ficará encarregado de vertê-la em um projeto de lei e defendê-la perante a assembleia. A CP pode ocorrer não só numa praça, como também em qualquer outro lugar de fácil acesso, como “numa igreja ou quadra de basquete: o importante é que se reúnam muitas pessoas interessadas pelo tema e que a sessão se desenrole como uma sessão da Câmara, com tempo cronometrado, ordem do dia, encaminhamentos etc.” (Boal, 2020, p.127). No período em que foi vereador, Boal recebeu dezenas de súmulas enviadas por núcleos de cidadãos. Destas, mais de trinta resultaram em projetos de lei que ele defendeu na Câmara, treze dos quais foram aprovados.

Tendo explicado, em linhas gerais, os principais argumentos do livro, passemos em revista duas críticas levantadas contra ele. A primeira delas acusa o teatro legislativo de postular uma concepção legalista da democracia. De acordo com alguns críticos, o teatro legislativo sinalizaria um recuo de Boal diante da democracia radical e uma capitulação perante o parlamentarismo burguês (Kershaw, 2001KERSHAW, B. Legislative Theatre. Theatre Research International, v. 26, n. 2, p.209-221, 2001.). Talvez o que tenha impulsionado semelhante crítica são algumas passagens do livro que caracterizam o teatro legislativo como uma prática na qual “o cidadão se transforma em legislador”, e a democracia, como “o sistema de governo em que todos elegem livremente os seus representantes” (Boal, 2020, p.47, 203). A impressão que fica é a de que Boal reduziria a cidadania ao ato legislativo, e a democracia, às instituições representativas.

Uma leitura completa do livro, contudo, desfaz tal impressão. Boal decerto ressalta a importância da lei e das instituições representativas para a democracia, porém não reduz esta àquelas. Como vimos, um dos objetivos do teatro legislativo é politizar os diferentes grupos oprimidos e gerar solidariedade entre eles. No capítulo seis, Boal relata o encontro entre dois núcleos de jovens negros: um composto por estudantes universitários; o outro, por moradores do Morro do Chapéu Mangueira. O propósito do encontro era permitir que cada um expusesse seus problemas, de sorte a mostrar que, não obstante suas diferenças, os dois grupos sofriam de uma mesma opressão: o racismo. Este exemplo evidencia que nem todas as atividades do teatro legislativo se restringem à feitura de leis e às instituições representativas. Conforme atesta um praticante do teatro legislativo, o objetivo deste “não é só fazer leis, mas construir um processo político de debate e questionamento de injustiças” (p.227). Seria incorreto reduzir o valor do teatro legislativo às leis promulgadas por sua causa. Muito mais importante é a “extraordinária aprendizagem militante” que ele transmite às pessoas (p.249). Mesmo quando os projetos de lei que produz são rejeitados, o teatro legislativo é benéfico porque politiza os representados.

A acusação de que Boal teria deixado de ser um democrata radical porque se envolveu com as instituições representativas só se sustenta se pressupormos que estas são incompatíveis com a democracia radical, o que está longe de ser o caso. Do fato de que as instituições representativas tenham sido, por boa parte da história, mobilizadas em prol da oligarquia, não se segue que não possamos ocupá-las a fim de promover a democracia radical. “A política parlamentar tem um papel a cumprir em uma estratégia democrática radical” (Mouffe apud Martin, 2013MARTIN, J. (Org.) Chantal Mouffe: Hegemony, Radical Democracy, and the Political. Abingdon: Routledge, 2013., p.232). Uma assembleia legislativa ocupada por representantes progressistas é “um dos exemplos onde uma instituição da cultura burguesa pode ser utilizada para preparar uma transformação radical” da sociedade (Marcuse, 2008MARCUSE, H. Num mundo feio não pode existir liberdade. In: COHN, S.; PIMENTA, H. (Org.) Maio de 68. Rio de Janeiro: Beco do Azogue, 2008. p.90-123., p.118). Assim como outros intelectuais de esquerda, Boal considera que o objetivo final da política não deve ser apenas congregar multidões insurgentes nas ruas, mas sim extrair de sua insatisfação medidas práticas que atenuem ou eliminem as injustiças responsáveis pela insurreição popular. No começo do livro, Boal esclarece que o teatro legislativo surgiu da vontade de dar continuidade às propostas que os participantes do TO elaboravam para resistir à opressão. O autor pensou, com acerto, que poderia implementar algumas destas propostas caso ocupasse um cargo legislativo.


Augusto Boal (1931-2009).

O aspecto não legalista da democracia que Boal defende sobressai no manuscrito sobre cultura, incluído nesta nova edição do Teatro legislativo. Nele, fica claro que a democratização do governo representativo requer não só transformar os cidadãos em legisladores, mas também desenvolver uma política cultural democrática. Por isso mesmo, Boal (2020, p.213) propõe “a criação de estruturas simples, flexíveis e dinâmicas, chamadas Centros de Arte e Cultura, que facilitem o acesso e promovam o desenvolvimento cultural do maior número possível de cidadãos”. Sem uma cultura autônoma, os representados não formam suas faculdades críticas e, portanto, não se habilitam para o autogoverno.

A segunda crítica é a de que o teatro legislativo seria paternalista. Por paternalismo, entenda-se o controle da liberdade de um sujeito que se exerce com a justificativa de que este carece de conhecimento ou preparo suficientes para agir sem supervisão. Há quem diga que, ao incitar os representados a construir pautas próprias, Boal acabaria os induzindo a pensar e agir de uma maneira preestabelecida por ele, o que, no limite, desrespeitaria a autonomia popular (Nicholson, 2013NICHOLSON, H. On Visiting Forgotten Tombs. In: NOORANI, T.; BLENCOWE, C.; BRIGSTOCKE, J. (Org.) Problems of Participation: Reflections on Authority, Democracy, and the Struggle for Common Life. Lewes: ARN Press, 2013. p.83-90.). Antes de a CP ocorrer, o representante precisa redigir um texto que esclareça aos participantes da CP o tema que avaliarão. Ciente de que o texto pode direcionar os participantes, Boal (2020, p.128) determina que este “não deverá ser distribuído logo no início da sessão, a fim de permitir um tempo em que os participantes falem livremente sobre o tema, sem serem induzidos a uma tomada de posição”. Poder-se-ia rebater, entretanto, que o fato de o representante ter planejado previamente o texto usado como base da deliberação pública basta para induzir os representados a uma determinada posição.

A segunda crítica ganha plausibilidade, quando lemos que o representante precisa “traduzir em termos legais as possíveis sugestões” elaboradas pelos representados (p.128). Para que possa ser defendida na assembleia legislativa, a súmula produzida pela CP precisa ser traduzida pelo representante. É necessário que o representante saiba separar “o joio do trigo”, pois nem todas as sugestões apresentadas na CP de fato promovem a luta contra a opressão (p.131). Em um livro de autoria própria, a chefe de gabinete de Boal no período em que ele foi vereador, Bárbara Santos (2019SANTOS, B. Teatro das oprimidas. 2.ed. Rio de Janeiro: Casa Philos, 2019., p.353), admite que o poder de tradução, conferido ao representante e seus assessores, impunha uma “verticalidade” no teatro legislativo. Em seu trabalho atual, Santos tem procurado introduzir mudanças no teatro legislativo para diminuir esta verticalidade. Seja como for, deve-se reconhecer que, ao menos em sua versão inicial, o teatro legislativo é suscetível à acusação de paternalismo. Assim como outros críticos da ideologia que defendem a autonomia, Boal parte do diagnóstico de que, inicialmente, nem todos os oprimidos estão aptos para discernir as propostas que os rumarão à liberdade. É necessário, portanto, submetê-los a uma série de exercícios que os encaminhe, como diria Freire (2001FREIRE, P. Educação e atualidade brasileira. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2001., p.56), à “maioridade”. O teatro legislativo é construtivista na acepção forte do termo, pois visa construir um povo autônomo mediante a democratização do governo representativo.

Referências

  • BOAL, A. Teatro legislativo. Org. Fabiana Comparato e Julián Boal. São Paulo: Editora 34, 2020.
  • DALAQUA, G. H. Aesthetic Injustice. Journal of Aesthetics & Culture, v. 12, n. 1, p.1-12, 2020.
  • FREIRE, P. Educação e atualidade brasileira. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2001.
  • _______. Pedagogia do oprimido. 64.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2017.
  • KERSHAW, B. Legislative Theatre. Theatre Research International, v. 26, n. 2, p.209-221, 2001.
  • MARCUSE, H. Num mundo feio não pode existir liberdade. In: COHN, S.; PIMENTA, H. (Org.) Maio de 68. Rio de Janeiro: Beco do Azogue, 2008. p.90-123.
  • MARTIN, J. (Org.) Chantal Mouffe: Hegemony, Radical Democracy, and the Political. Abingdon: Routledge, 2013.
  • NICHOLSON, H. On Visiting Forgotten Tombs. In: NOORANI, T.; BLENCOWE, C.; BRIGSTOCKE, J. (Org.) Problems of Participation: Reflections on Authority, Democracy, and the Struggle for Common Life. Lewes: ARN Press, 2013. p.83-90.
  • SANTOS, B. Teatro das oprimidas. 2.ed. Rio de Janeiro: Casa Philos, 2019.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    11 Jan 2021
  • Aceito
    28 Abr 2021
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