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Trabalho em equipe na Estratégia Saúde da Família: percepções dos profissionais

Resumo

Objetivo:

identificar as percepções dos profissionais de saúde a respeito de trabalho em equipe na Estratégia Saúde da Família.

Métodos:

estudo descritivo/abordagem qualitativa, realizado com uma equipe de Estratégia Saúde da Família. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com oito profissionais. Coleta de dados ocorreu em 2017. Para tratamento dos dados, utilizou-se análise de conteúdo/modalidade temática.

Resultados:

na análise dos dados emergiram três categorias temáticas: Elementos constitutivos do trabalho em equipe: contempla atributos importantes para construção do trabalho em equipe, como diálogo/colaboração/auxílio/consenso e união; Especificidade profissional: evidencia a realização do trabalho pautado na especificidade de cada profissão; Trabalho em equipe em momentos específicos: desvela que, para os entrevistados, o trabalho em equipe ocorre em momentos definidos, como nas circunstâncias de atendimento em grupo, em palestras e na educação continuada.

Conclusão e implicações para prática:

Os profissionais percebem o trabalho em equipe como aquele ancorado na ajuda mútua, colaboração e nos objetivos comuns. No entanto, na prática, o trabalho segue a tendência mais individualizada. É preciso cunhar mudanças possíveis de serem implementadas no cotidiano, de modo a promover a modalidade do trabalho em equipe, com vistas à assistência integral.

Keywords:
Comportamento Cooperativo; Atenção Primária à Saúde; Estratégia Saúde da Família

Abstract

Objective:

to identify the perceptions of health professionals about teamwork in the Family Health Strategy.

Methods:

descriptive study / qualitative approach, carried out with a Family Health Strategy team. Semi-structured interviews were conducted with eight professionals. Data collection took place in 2017. Thematic modality/ content analysis was used for data treatment.

Results:

in the analysis of the data emerged three thematic categories: Constituent elements of the teamwork: contemplates important attributes for construction of teamwork, such as dialogue / collaboration / help / consensus and union; Professional specificity: it shows the accomplishment of the work based on the specificity of each profession; Teamwork at specific times: it reveals that, for the interviewees, teamwork occurs in defined moments, as in the circumstances of group attendance, in lectures and in continuing education.

Conclusion and Implications for practice:

Professionals perceive teamwork as one that is anchored in mutual aid, collaboration and common goals. However, in practice, the work follows the trend more individualized. Evidence of possible changes to be implemented in daily life, in order to promote the modality of teamwork, with a view to integral assistance.

Keywords:
Cooperative Behavior; Primary Health Care; Family Health Strategy

Resumen

Objetivo:

identificar las percepciones de los profesionales de la salud respecto al trabajo en equipo en la Estrategia de Salud Familiar.

Métodos:

estudio descriptivo/abordaje cualitativo, realizado con un equipo de Estrategia de Salud Familiar. Se realizaron entrevistas semiestructuradas con ocho profesionales. La recolección de datos ocurrió en 2017. Para el tratamiento de los datos se utilizó el análisis de contenido/modalidad temática.

Resultados:

en el análisis de los datos surgieron tres categorías temáticas: Elementos constitutivos del trabajo en equipo: contempla atributos importantes para la construcción del trabajo en equipo, como diálogo/colaboración/ayuda/consenso y unión; Especificidad profesional: evidencia la realización del trabajo pautado en la especificidad de cada profesión; Trabajo en equipo en momentos específicos: desvela que, para los entrevistados, el trabajo en equipo ocurre en momentos definidos, como en las circunstancias de atención en grupo, en conferencias y en la educación continuada.

Conclusión e implicaciones para la práctica:

los resultados demuestran que los profesionales perciben el trabajo en equipo como anclado en la ayuda mutua, la colaboración y los objetivos comunes. Sin embargo, en la práctica, el trabajo sigue la tendencia más individualizada. Es necesario evidenciar posibles cambios de ser implementados en el cotidiano, de modo a promover la modalidad del trabajo en equipo, con miras a una asistencia integral.

Palabras clave:
Conducta Cooperativa; Atención Primaria de la Salud; Estrategia de Salud Familiar

INTRODUÇÃO

A partir da década de 1960, emergiram discussões sobre a importância da Atenção Primária à Saúde (APS) no mundo. A declaração de Alma Ata (1978) e a Carta de Ottawa (1986) apresentaram a temática e contemplaram ferramentas e propostas para sua efetivação. Nesta perspectiva, foram elaboradas estratégias para o desenvolvimento da saúde ancoradas nas estruturas das formações sociais, apoiada por profissionais de saúde, em unidades de saúde locais, responsáveis pela maior parte do cuidado.11 Giovanella L, Almeida PF. Comprehensive primary care and segmented health systems in South America. Cad Saúde Pública [Internet]. 2017; [cited 2018 Jul 10]; 33(Suppl 2):e00118816. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v33s2/1678-4464-csp-33-s2-e00118816.pdf. DOI: 10.1590/0102-311X00118816
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2 López-Fernández LA, Hormazábal OS. Repensar la carta de Ottawa 30 años después. Gac Sanit [Internet]. 2017; [cited 2018 Jul 10]; 31(6):443-5. Available from: http://scielo.isciii.es/pdf/gs/v31n6/0213-9111-gs-31-06-00443.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.gaceta.2016.12.013
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-33 Pires-Alves FA, Cueto M. The Alma-Ata Decade: the crisis of development and international health. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2017; [cited 2018 Jul 10]; 22(7):2135-44. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v22n7/en_1413-8123-csc-22-07-2135.pdf. DOI: 10.1590/1413-81232017227.02032017
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Isto representava uma tentativa para a superação do modelo predominante de assistência em saúde, marcado pelo paradigma da doença e da fragmentação, em detrimento à integralidade.

Seguindo a tendência mundial, o Brasil, em 1994, instituiu o Programa de Saúde da Família (PSF) e em 2009 tomou como modelo a Estratégia Saúde da Família (ESF) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), para reorganizar a atenção básica, seguindo as diretrizes do SUS, integrando as Redes de Atenção à Saúde (RAS).44 Ministério da Saúde (BR). Gabinete do Ministro. Portaria Nº. 2.436 de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 2018 Jan 20]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html
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5 Bousquat A, Giovanella L, Campos EMS, Almeida PF, Martins CL, Mota PHS, et al. Primary health care and the coordination of care in health regions: managers’ and users’ perspective. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2017; [cited 2018 Jul 10]; 22(4):1141-54. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v22n4/en_1413-8123-csc-22-04-1141.pdf. DOI: 10.1590/1413-81232017224.28632016
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-66 Forte ECN, Pires DEP. Nurses in basic care: between job satisfaction and dissatisfaction. Trab Educ Saúde [Internet]. 2017 Sep/Dec; [cited 2018 July 10]; 15(3):709-24. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v15n3/1678-1007-tes-15-03-0709.pdf. DOI: https://dx.doi.org/10.1590/1981-7746-sol00083
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É pertinente destacar que as RAS objetivam proporcionar o cuidado integral, com articulação entre serviços, ações e profissionais. Pretende ainda ser coerente com as necessidades de saúde da população, superar a fragmentação da atenção, ampliar o acesso aos serviços de saúde, e garantir a equidade e a universalidade.44 Ministério da Saúde (BR). Gabinete do Ministro. Portaria Nº. 2.436 de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [cited 2018 Jan 20]. Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html
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-55 Bousquat A, Giovanella L, Campos EMS, Almeida PF, Martins CL, Mota PHS, et al. Primary health care and the coordination of care in health regions: managers’ and users’ perspective. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2017; [cited 2018 Jul 10]; 22(4):1141-54. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v22n4/en_1413-8123-csc-22-04-1141.pdf. DOI: 10.1590/1413-81232017224.28632016
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,77 Martins JS, Abreu SCC, Quevedo MP, Bourget MMM. Estudo comparativo entre Unidades de Saúde com e sem Estratégia Saúde da Família por meio do PCATool. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2016;11(38):1-13. DOI: http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc11(38)1252
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-88 Schimith MD, Brêtas ACP, Simon BS, Brum DJT, Alberti GF, Bidó MLD, et al. Precarization and fragmentation of work in the family health strategy: impacts in Santa Maria (RS). Trab Educ Saúde [Internet]. 2017 Jan/Apr; [cited 2018 Jul 10]; 15(1):163-82. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/1981-7746-sol00038
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Neste sentido, a Política Nacional de Atenção Básica preconiza que a ESF deve ser composta por uma equipe mínima de profissionais, dentre eles, médico, enfermeiro, auxiliar ou técnico de enfermagem, agentes comunitários de saúde e ainda podem ser acrescentados profissionais da saúde bucal. Como atribuições, a equipe deve prover atenção integral, contínua e organizada à população adscrita, por meio de trabalho interprofissional e em equipe, integrando áreas técnicas e profissionais de diferentes formações.99 Kahl C, Meirelles BHS, Lanzoni GMM, Koerich C, Cunha KS. Ações e interações na prática clínica do enfermeiro na atenção primária à saúde. Rev Esc Enferm USP [Internet] 2018; [cited 2018 Jul 10]; 52:e03327. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v52/0080-6234-reeusp-52-e03327.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1980-220X2017025503327
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-1010 Pinto LF, Giovanella L. The Family Health Strategy: expanding access and reducing hospitalizations due to ambulatory care sensitive conditions (ACSC). Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2018; [cited 2018 Jul 10]; 23(6):1903-13. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n6/en_1413-8123-csc-23-06-1903.pdf. DOI: 10.1590/1413-81232018236.05592018
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Oportuno salientar que a proposta da ESF vai ao encontro da modalidade de equipe integração, pois preconiza o trabalho coletivo, a articulação das ações e dos saberes, a interação comunicativa efetiva dos agentes, e a flexibilidade quanto à divisão do trabalho.1111 Peduzzi M. Multiprofessional healthcare team: concept and typology. Rev Saúde Pública [Internet]. 2001; [cited 2018 Jul 10]; 35(1):103-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v35n1/4144.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102001000100016
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No entanto, constata-se que o cotidiano ainda é marcado pelo predomínio de equipes nas quais os agentes realizam um trabalho fragmentado, pouco articulado e sustentado por processos de comunicação empobrecidos. Tal fato conduz ao trabalho segmentado e parcelar, o que pode comprometer a assistência integral ao paciente.1212 Goulart BF, Camelo SHH, Simões ALA, Chaves LDP. Teamwork in a coronary care unit: facilitating and hindering aspects. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2016; [cited 2018 Jul 10]; 50(3):479-86. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v50n3/0080-6234-reeusp-50-03-0482.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420160000400015
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-1313 Heidemann ITSB, Cypriano CC, Gastaldo D, Jackson S, Rocha CG, Fagundes E. A comparative study of primary care health promotion practices in Florianópolis, Santa Catarina State, Brazil, and Toronto, Ontario, Canada. Cad Saúde Pública [Internet]. 2018; [cited 2018 Jul 10]; 34(4):e00214516. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v34n4/1678-4464-csp-34-04-e00214516.pdf. DOI: 10.1590/0102-311X00214516
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Nesta perspectiva, o contexto dos serviços de saúde aproxima-se mais da modalidade de equipe agrupamento1111 Peduzzi M. Multiprofessional healthcare team: concept and typology. Rev Saúde Pública [Internet]. 2001; [cited 2018 Jul 10]; 35(1):103-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v35n1/4144.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102001000100016
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, uma vez que não promove trabalho articulado, integrado e dialógico.

Isto pode ser reflexo da influência da fragmentação taylorista-fordista que estimula e reforça a rigidez nas divisões de tarefas, o que culmina com o distanciamento dos integrantes da equipe de saúde, comprometendo a assistência integral aos usuários.1212 Goulart BF, Camelo SHH, Simões ALA, Chaves LDP. Teamwork in a coronary care unit: facilitating and hindering aspects. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2016; [cited 2018 Jul 10]; 50(3):479-86. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v50n3/0080-6234-reeusp-50-03-0482.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420160000400015
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,1414 Selleck CS, Fifolt M, Burkart H, Frank JS, Curry WA, Hites LS. Providing primary care using an interprofissional collaborative practice model: what clinicians have learned. J Prof Nurs [Internet]. 2017 Nov/Dec; [cited 2018 Jul 10]; 33(6):410-6. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.profnurs.2016.11.004
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Além disso, constata-se que a estrutura curricular dos cursos de graduação em saúde não promove a prática interprofissional, pois a formação ainda segue a vertente fortemente especializada, técnica e com abordagem individualista, o que não favorece uma atuação compartilhada.1515 Arruda LS, Moreira COF. Interprofessional collaboration: a case study regarding the professionals of the Care Center for Elderly, Rio de Janeiro State University (NAI/UERJ), Brazil. Interface (Botucatu) [Internet]. 2018; [cited 2018 Jul 10]; 22(64):199-210. Available from: http://www.scielo.br/pdf/icse/v22n64/1807-5762-icse-1807-576220160613.pdf. DOI: 10.1590/1807-57622016.0613
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16 Littike D, Sodré F. The art of improvisation: the working process of administrators at a Federal University Hospital. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015; [cited 2018 Jul 10]; 20(10):3051-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n10/en_1413-8123-csc-20-10-3051.pdf. DOI: 10.1590/1413-812320152010.00042015
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17 Silva JAM, Peduzzi M, Orchad C, Leonello VM. Interprofessional education and collaborative practice in Primary Health Care. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2015; [cited 2018 Jul 10]; 49(no.spe 2):15-23. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v49nspe2/en_1980-220X-reeusp-49-spe2-0016.pdf. DOI: 10.1590/S0080-623420150000800003
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-1818 Tavares MFL, Rocha RM, Bittar CML, Petersen CB, Andrade M. Health promotion in professional education: challenges in Health and the need to achieve in other sectors. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2016; [cited 2018 Jul 10]; 21(6):1799-808. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v21n6/en_1413-8123-csc-21-06-1799.pdf. DOI: 10.1590/1413-81232015216.07622016
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Para consolidação do trabalho em equipe interprofissional, são necessários elementos substanciais que o qualifiquem como potente instrumento para enfrentamento da fragmentação do trabalho em saúde. Tais elementos incluem a cooperação/colaboração interprofissional, comunicação, respeito mútuo, troca de conhecimentos, articulação das ações e objetivos comuns.1515 Arruda LS, Moreira COF. Interprofessional collaboration: a case study regarding the professionals of the Care Center for Elderly, Rio de Janeiro State University (NAI/UERJ), Brazil. Interface (Botucatu) [Internet]. 2018; [cited 2018 Jul 10]; 22(64):199-210. Available from: http://www.scielo.br/pdf/icse/v22n64/1807-5762-icse-1807-576220160613.pdf. DOI: 10.1590/1807-57622016.0613
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,1919 Agreli HF, Peduzzi M, Silva MC. Patient centred care in interprofessional collaborative practice. Interface (Botucatu) [Internet]. 2016; [cited 2018 Jul 10]; 20(59):905-16. Available from: http://www.scielo.br/pdf/icse/v20n59/en_1807-5762-icse-1807-576220150511.pdf. DOI: 10.1590/1807-57622015.0511
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,2020 Souza GC, Peduzzi M, Silva JAM, Carvalho BG. Teamwork in nursing: restricted to nursing professionals or an interprofessional collaboration? Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2016; [cited 2018 Jul 10]; 50(4):640-7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v50n4/0080-6234-reeusp-50-04-0642.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420160000500015
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Diante disto, o trabalho em equipe, quando realizado seguindo princípios da articulação e integração entre agentes, saberes e fazeres, com ênfase na integralidade da assistência, pode representar importante dispositivo para viabilização da ESF enquanto política para reorganização da APS.

Embora a produção científica evidencie o trabalho em equipe como estratégia para superação da fragmentação em saúde, isso ainda não é suficiente para transformação da prática cotidiana e do modo de trabalhar em saúde. Nem mesmo a proposta política da ESF, que valoriza o trabalho realizado por meio de equipes integradas representa um caminho que esteja sendo seguido na prática. A lógica que norteia o cenário da saúde é recortada pela divisão em categorias profissionais e pela baixa articulação no processo de trabalho.

Entende-se por processo de trabalho o modo como os profissionais executam suas tarefas cotidianas. Sem pormenorizar, é o agrupamento de ações desenvolvidas pelos homens, através dos meios de produção, em relação a algum objeto, com a finalidade de promover modificações e torná-lo frutífero. Assim sendo, compõe o processo de trabalho os agentes, os meios de produção, os objetos e objetivos/finalidades. De forma que quanto menos organizado for o processo de trabalho mais árduo será para provocar reflexões e atuar sobre ele2121 Gonçalves RBM. Práticas de saúde: processos de trabalho e necessidades. São Paulo: CEFOR; 1992., situação essa presente na APS e ESF.

Considerando-se a ESF, destaca-se ainda que o fato de os profissionais atuarem no mesmo local e atenderem à mesma população não assegura a realização do trabalho em equipe.1111 Peduzzi M. Multiprofessional healthcare team: concept and typology. Rev Saúde Pública [Internet]. 2001; [cited 2018 Jul 10]; 35(1):103-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v35n1/4144.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102001000100016
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O trabalho em equipe vai muito além da mera proximidade física, representa uma modalidade de trabalho coletivo construído pela articulação técnica e interação entre os agentes do processo de trabalho, seus saberes e práticas.

Diante do exposto, questiona-se qual o entendimento dos profissionais a respeito de trabalho em equipe na ESF. Acredita-se que analisar as percepções possa favorecer a produção de ações que viabilizem a sinalização de mudanças a serem implementadas, tanto no cotidiano de trabalho quanto na formação acadêmica e em serviço, de modo a sensibilizar, promover e viabilizar o trabalho em equipe, entendido como potente tecnologia em saúde. Este estudo objetivou identificar as percepções dos profissionais de saúde a respeito de trabalho em equipe na Estratégia Saúde da Família.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo descritivo, com abordagem qualitativa, realizado com uma equipe de ESF de um município no interior de Minas Gerais. O referido município, conta com população estimada de 300.000 pessoas2222 Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (BR). Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Brazil. Minas Gerais, Cidades. Uberaba [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [cited 2019 May 21]. Available from: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/uberaba
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e tem seu sistema de saúde dividido em três Distritos Sanitários, sendo 20 equipes de ESF urbanas e uma rural no Distrito Sanitário I; 12 equipes de ESF urbanas e duas rurais no Distrito Sanitário II e, 15 equipes de ESF urbanas e uma rural no Distrito Sanitário III.

Para participar da investigação foi selecionada a equipe de Saúde da Família do Distrito Sanitário II, que englobava maior população adscrita, a qual contava com 3714 pessoas atendidas, à época da coleta de dados. A equipe era composta por cinco agentes comunitários de saúde (ACS), um auxiliar em saúde bucal, um dentista, um enfermeiro, um médico e um técnico de enfermagem.

Do total de 10 profissionais da equipe, participaram oito profissionais que atenderam aos critérios de inclusão, que consistiam em atuar na referida ESF há, no mínimo, seis meses. Foram excluídos aqueles que estavam afastados do trabalho à época da coleta dos dados e os não localizados após três tentativas para agendamento da entrevista.

O método utilizado para coleta de dados foi a entrevista semiestruturada. O roteiro da entrevista foi elaborado pelos próprios autores, submetido à validação aparente e de conteúdo por três peritos na temática e/ou em metodologia de pesquisa. Realizado teste-piloto para testar em condições reais os procedimentos de coleta de dados, contando com participantes que não fariam parte da coleta definitiva dos dados, os quais eram de outra equipe de ESF. O roteiro constituiu-se de duas partes: a primeira direcionada aos dados sociodemográficos e profissionais dos participantes; a segunda composta pelas seguintes questões norteadoras: A partir de sua vivência profissional aqui: Conte-me como os profissionais realizam o trabalho aqui na ESF. Trabalho em equipe: o que você entende por isso? Com base em seu entendimento, você considera que o trabalho realizado aqui se configura como um trabalho em equipe? Justifique sua resposta.

Para coleta de dados definitiva, a entrevista foi desenvolvida pelo próprio pesquisador, face a face, gravada em meio digital, em dia e local previamente agendados, em comum acordo entre os participantes, responsáveis pelo serviço e pesquisador, em ambiente que assegurasse privacidade. Não houve ônus para os participantes. Os dados foram coletados em 2017. Para preservar sigilo e anonimato, os participantes foram denominados como E1, E2, E3 e assim por diante, até E8, sendo a letra E usada para representar a entrevista do participante, e o numeral, a ordem sequencial de realização da entrevista. Pertinente ressaltar que não houve a preocupação com a identificação e distinção de categoria profissional dos entrevistados, pois o interesse do estudo era pela equipe em sua totalidade.

Para análise dos dados, as entrevistas foram transcritas na íntegra, pelo próprio pesquisador e utilizou-se análise de conteúdo, na modalidade temática, seguindo-se as três etapas. Na primeira etapa, denominada pré-análise, realizou-se leitura exaustiva do material, para apreender o todo dos dados e das particularidades do conjunto. Na segunda fase, procedeu-se à exploração do material, para identificação das categorias que emergiram e agrupamento, por afinidade, das unidades de contexto. Na última etapa, síntese interpretativa, realizou-se o agrupamento dos trechos de acordo com os temas que emergiram das entrevistas, e a organização em unidades temáticas.2323 Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2011. Utilizou-se como referencial teórico conceitos do processo de trabalho em saúde.2121 Gonçalves RBM. Práticas de saúde: processos de trabalho e necessidades. São Paulo: CEFOR; 1992. Os elementos do processo de trabalho (objeto, finalidade, instrumentos e agentes) nortearam a análise dos resultados na perspectiva do cotidiano e dinâmica do trabalho em equipe de saúde.

Em atendimento a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde2424 Ministério da Saúde (BR). Conselho Nacional de Saúde. Resolução Nº. 466 de 12 de dezembro de 2012 [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [cited 2018 Jul 10]. Available from: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/2012/Reso466.pdf
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, o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal do Triângulo Mineiro no dia 29 de Agosto de 2016, com CAAE 56426916.4.0000.5154 e parecer de número 1.700.853. Os participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

Assim, a população do estudo constituiu-se de oito profissionais da equipe de ESF, dos quais, cinco eram agentes comunitários de saúde (62,5%), um dentista (12,5%), um enfermeiro (12,5%) e um médico (12,5%).

Não participaram dois profissionais, sendo o auxiliar de saúde bucal que se recusou a participar da entrevista, e a técnica de enfermagem que foi exonerada com o término do contrato com a prefeitura, durante o período de coleta de dados.

Dentre os oito participantes da pesquisa, todos eram do sexo feminino; com idades entre 29 e 56 anos, sendo a média de 44 anos; quatro (50%) profissionais possuíam o ensino superior completo, quatro (50%) o ensino médio completo. O tempo médio de formação foi de 22 anos, com tempo de atuação na ESF variando de 1 a 11 anos, sendo a média de 6 anos de atuação.

Os resultados que emergiram das entrevistas foram agrupados, por afinidade de conteúdo, em três categorias temáticas: Elementos constitutivos do trabalho em equipe, que concentra o maior número de unidades de registros; Especificidade profissional; e Trabalho em equipe em momentos específicos.

A categoria temática Elementos constitutivos do trabalho em equipe revela que os entrevistados identificam a colaboração, o diálogo, o auxílio mútuo, o consenso e a união como atributos para construção e realização do trabalho em equipe. Pode-se dizer que estes elementos correspondem aos meios de produção utilizados pelos agentes para modificar a condição do paciente, com a finalidade de promover saúde e prevenir doenças.2121 Gonçalves RBM. Práticas de saúde: processos de trabalho e necessidades. São Paulo: CEFOR; 1992. Isto é ilustrado nas falas que seguem:

[...] trabalho em equipe é quando um profissional solo não consegue resolver aquele problema [...] precisa de outros profissionais juntos para somar conhecimento [...] experiência (E1).

[...] não tenho que resolver sozinha, aí tem que conversar [...] ver o que é melhor [...] vejo que preciso de ajuda de outra amiga agente comunitária, porque [...] uma experiência que ela tem e que eu não tenho [...] converso com ela e ela me ajuda [...] (E3).

[...] A gente trabalha em grupo, todos tem seu papel na equipe, e nós trocamos ideias, informações, conhecimento, experiência, fazemos planejamento, fazemos educação continuada, então temos sim um trabalho em equipe [...] (E8).

Fica evidente a colaboração como instrumento indispensável para concretização do trabalho em equipe frente à complexidade demandada para atuação da equipe na ESF. A fala a seguir exemplifica essa questão:

[...] acho essencial, primordial [...] a gente tem que ter mesmo a colaboração de cada um para que o trabalho possa acontecer [...] a gente atua em várias frentes, é um trabalho de grande complexidade [...] (E8).

Para os participantes, outro aspecto importante refere-se aos objetivos comuns para alcance do trabalho em equipe. Revelam que para prestação de assistência integral e de qualidade à população, é fundamental que todos os profissionais da equipe estejam alinhados com objetivos pactuados, conforme ilustram as falas a seguir:

[...] trabalho em equipe [...] é quando todo mundo trabalha por um ideal, não apenas em números de pessoas, mas com os mesmos objetivos (E2).

Nós realizamos em conjunto [...] e geralmente funciona muito bem porque é um auxiliando o outro [...] trabalho em equipe tem que ser todo mundo junto pelo mesmo objetivo [...] (E5).

A segunda categoria temática, Especificidade profissional, evidencia a realização do trabalho pautado na especificidade de cada profissão. Indica uma divisão do trabalho dos profissionais em etapas, inclusive “dentro” e “fora” da Unidade, o que pode ser constatado nas falas que seguem:

[...] a enfermeira tem o trabalho dela aqui [na unidade] [...] e externo [...] a dentista também. Ela tem o trabalho dela aqui [...] e nos dias que tem que ir para creche e [...] escola [...] a agente comunitária tem que estar sempre junto (E4).

Tipo assim, a agente comunitária atua na área (...) a gente tem a enfermeira que faz visita com agente [comunitária], a médica também com os acadêmicos também faz visita com agente [comunitária] na área, o técnico de enfermagem fica mais aqui dentro da unidade [...] (E6).

[...] cada um tem suas funções [...] as agentes comunitárias estão mais em contato direto com as famílias, normalmente elas trazem para gente os problemas que encontram [...] (E7).

Algumas falas indicam a especificidade de ações conforme formação profissional, mas revelam, também, uma tímida tentativa de articulação entre os profissionais. Conforme cenário analisado, os agentes que desenvolvem o processo de trabalho podem ser vistos sob a ótica individual, grupal e em equipe, permanentemente empenhados em alcançar a finalidade do processo de trabalho que é a saúde e qualidade de vida dos pacientes.2121 Gonçalves RBM. Práticas de saúde: processos de trabalho e necessidades. São Paulo: CEFOR; 1992.

[...] a agente comunitária vai nas casas, se ver alguma coisa passa para a enfermeira, e aí a enfermeira vai lá com a gente, a médica tem o dia dela [...] (E3).

[...] Trabalho em equipe é todos tentando trabalhar juntos por um melhor resultado, e a gente faz o que é da [nossa] parte [competência profissional] [...] vamos supor, qualquer conversa minha que tenho com o usuário na casa, na visita, se for para dentista eu chego e vou tentar passar para secretária dela [...] para enfermeira mesma coisa [...] neste sentido [...] e cada um no seu quadrado [...] (E4).

A terceira categoria temática, Trabalho em equipe em momentos específicos, desvela que, para os entrevistados, a estratégia de trabalho em equipe ocorre em situações específicas, como nas circunstâncias de atendimento em grupo, nas ações junto a escolares, em palestras e na educação continuada. Isto pode ser constatado nas falas que seguem:

[...] nos grupos [com usuários] a gente trabalha em equipe, na educação continuada [...] e aí nestes momentos a gente trabalha em equipe [...] (E1).

[...] nos grupos [com usuários] a gente trabalha em equipe, quando a gente desenvolve nossos trabalhos na escola, e aí a gente vai lá enquanto equipe para fazer avaliação [...] palestras na escola [...] (E1).

[...] Geralmente na segunda-feira temos visita com a médica na residência, e são duas [agentes comunitárias] que vai com a médica e as outras [agentes comunitárias] vão com dentista na escola, tem dia da creche, tem o dia do grupo de hipertenso e diabético [...] (E5).

Considerando-se os relatos dos participantes, evidencia-se que, de acordo com as percepções dos profissionais da equipe da ESF, o trabalho em equipe acontece em momentos de agrupamento dos profissionais, relacionados a alguma ocasião específica e local definido, podendo ou não haver articulação das ações dos agentes da equipe.

DISCUSSÃO

Constata-se, por meio dos relatos, que os profissionais da ESF partilham em suas perspectivas que o trabalho em equipe é construído por meio de elementos da prática interprofissional em saúde. Isso foi nitidamente evidenciado na categoria Elementos constitutivos do trabalho em equipe. Identificou-se, nas falas dos entrevistados, a presença dos instrumentos não materiais do processo de trabalho como viabilizadores para o trabalho em equipe. Evidenciam a colaboração e a ajuda mútua como atributos cruciais para a realização do trabalho em equipe.1919 Agreli HF, Peduzzi M, Silva MC. Patient centred care in interprofessional collaborative practice. Interface (Botucatu) [Internet]. 2016; [cited 2018 Jul 10]; 20(59):905-16. Available from: http://www.scielo.br/pdf/icse/v20n59/en_1807-5762-icse-1807-576220150511.pdf. DOI: 10.1590/1807-57622015.0511
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-2020 Souza GC, Peduzzi M, Silva JAM, Carvalho BG. Teamwork in nursing: restricted to nursing professionals or an interprofessional collaboration? Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2016; [cited 2018 Jul 10]; 50(4):640-7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v50n4/0080-6234-reeusp-50-04-0642.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420160000500015
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Esses achados revelam que os profissionais da ESF reconhecem que, para um trabalho em equipe integral e coletivo, são indispensáveis a comunicação em equipe, a colaboração, e o auxílio mútuo, de modo que cada profissional com sua formação específica contribua no processo de trabalho da equipe de saúde.1111 Peduzzi M. Multiprofessional healthcare team: concept and typology. Rev Saúde Pública [Internet]. 2001; [cited 2018 Jul 10]; 35(1):103-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v35n1/4144.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102001000100016
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,2020 Souza GC, Peduzzi M, Silva JAM, Carvalho BG. Teamwork in nursing: restricted to nursing professionals or an interprofessional collaboration? Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2016; [cited 2018 Jul 10]; 50(4):640-7. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v50n4/0080-6234-reeusp-50-04-0642.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0080-623420160000500015
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Na perspectiva da equipe da ESF, a colaboração é desenvolvida com o propósito de articular as ações das várias especialidades, com vistas à atenção integral em saúde. Neste sentido, equipes que desenvolvem a prática colaborativa utilizam como mecanismo para efetivação do trabalho em equipe a troca de informações, a interdependência, a comunicação horizontalizada, a confiança, o auxílio, o respeito mútuo e a responsabilidade entre os profissionais da equipe.2525 Farias DN, Ribeiro KSQS, Anjos UU, Brito GEG. Interdiciplinario e interprofesionalidad en la estrategia salud de la família. Trab Educ Saúde [Internet]. 2018 Jan/Apr; [cited 2018 Jul 10]; 16(1):141-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v16n1/1678-1007-tes-1981-7746-sol00098.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1981-7746-sol00098
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-2626 McInnes S, Peters K, Bonney A, Halcomb E. An integrative review of facilitators and barriers influencing collaboration and teamwork between general practitioners and nurses working in general practice. J Adv Nurs [Internet]. 2015 Sep; [cited 2018 Jul 10]; 71(9):1973-85. Available from: https://doi.org/10.1111/jan.12647
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Tais elementos emergiram nos resultados do presente estudo, o que indica aproximação entre os achados com a produção científica.

A confiança e o respeito são dois termos relacionados como condições prévias subjacentes para uma colaboração bem-sucedida. Uma relação de confiança e respeito pode criar um ambiente aberto e seguro em que os profissionais se atrevam a pensar e agir mais amplamente do que sua própria disciplina.2727 van Dongen JJ, Lenzen SA, van Bokhoven MA, Daniëls R, van der Weijden T, Beurskens A. Interprofessional collaboration regarding patients’ care plans in primary care: a focus group study into influential factors. BMC Fam Pract [Internet]. 2016 May 28; [cited 2018 Jul 10]; 17:58. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27233362. DOI: 10.1186/s12875-016-0456-5
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Isso possibilita uma atuação criativa e ampliada sobre o objeto de trabalho, à medida que possibilita aos profissionais se enxergarem e agirem como parceiros na busca pelo alcance da finalidade do processo de trabalho, ou seja, um cuidado integrado e coletivo.

Tais aspectos têm estreita ligação com os instrumentos não materiais do processo de trabalho. Isso significa que, no contexto estudado, os participantes identificam esses elementos como impulsores para a concretização da proposta de trabalho em equipe. A maneira como os profissionais se relacionam e interagem influencia diretamente na dinâmica do trabalho.

Assim, ressalta-se que o trabalho em equipe deve ser construído por meio da interação e articulação dos profissionais em uma equipe, na tentativa de superar a fragmentação do trabalho e, consequentemente, o parcelamento da assistência. Os agentes do processo de trabalho precisam ter um relacionamento interprofissional ancorado na colaboração, no auxílio mútuo e na união, na tentativa de alcance da finalidade do processo de trabalho, ou seja, assistência integral e de qualidade à comunidade adscrita da ESF.

O trabalho em equipe é efetivo quando há construção da interprofissionalidade dentro da equipe, de maneira que todos os profissionais utilizem e se apropriem de elementos que viabilizem uma equipe integrada, que os objetivos e metas de cada profissional estejam alinhados na perspectiva de um trabalho coletivo, contribuindo diretamente para uma visão mais ampliada a respeito do objeto de trabalho.1414 Selleck CS, Fifolt M, Burkart H, Frank JS, Curry WA, Hites LS. Providing primary care using an interprofissional collaborative practice model: what clinicians have learned. J Prof Nurs [Internet]. 2017 Nov/Dec; [cited 2018 Jul 10]; 33(6):410-6. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.profnurs.2016.11.004
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,2727 van Dongen JJ, Lenzen SA, van Bokhoven MA, Daniëls R, van der Weijden T, Beurskens A. Interprofessional collaboration regarding patients’ care plans in primary care: a focus group study into influential factors. BMC Fam Pract [Internet]. 2016 May 28; [cited 2018 Jul 10]; 17:58. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27233362. DOI: 10.1186/s12875-016-0456-5
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28 Fiscella K, Mauksch L, Bodenheimer T, Salas E. Improving Care Teams’ Functioning: Recommendations from Team Science. Jt Comm J Qual Patient Saf [Internet]. 2017 Jul; [cited 2018 Jul 10]; 43(7):361-8. Available from: http://dx.doi.org/10.1016/j.jcjq.2017.03.009
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-2929 Gordo F, Abella A. Intensive care unit without walls: Seeking patient safety by improving the efficiency of the system. Med Intensiva [Internet]. 2014; [cited 2018 Jul 10]; 38(7):438-43. Available from: http://www.elsevier.es/en/linksolver/ft/pii/S0210-5691(14)00041-2. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.medin.2014.02.001
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A categoria temática Especificidade profissional indica, na perspectiva dos participantes da pesquisa, que o trabalho segue uma lógica dividida por categorias profissionais, ou seja, cada agente do processo de trabalho desenvolve suas atribuições específicas, e eles tentam fazer uma articulação com os demais profissionais.

Oportuno destacar que o trabalho em equipe não tem o intuito de abolir a especificidade profissional, mas sim aprimorar e articular as habilidades específicas de cada profissão, em prol de trabalho coletivo, integrando os saberes de distintos campos de atuação em saúde.1111 Peduzzi M. Multiprofessional healthcare team: concept and typology. Rev Saúde Pública [Internet]. 2001; [cited 2018 Jul 10]; 35(1):103-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v35n1/4144.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102001000100016
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No entanto, questiona-se se estas articulações das diversas formações profissionais, no contexto em foco, são frágeis, pois ocorrem em momentos de legítima necessidade. Não fica muito claro, por meio dos relatos, se os agentes realizam o trabalho de maneira articulada e integrada como uma premissa para o fazer em saúde cotidiano e coletivo.

Nesse sentido, a divisão técnica do trabalho depende do grau de interação em que os membros da equipe de saúde estão envolvidos, podendo moldar-se em equipe integração ou agrupamento.1111 Peduzzi M. Multiprofessional healthcare team: concept and typology. Rev Saúde Pública [Internet]. 2001; [cited 2018 Jul 10]; 35(1):103-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v35n1/4144.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102001000100016
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A divisão de tarefas entre profissionais de saúde pode auxiliar na organização do processo de trabalho, mas também pode levar a um processo de fragmentação, segmentação do trabalho, comprometendo a efetivação do trabalho em equipe.

Contudo, a institucionalização dos saberes e sua organização na atuação prática em saúde se dariam por meio do núcleo e campo de competência e responsabilidade, sendo que o núcleo contempla as ações específicas voltadas para a formação profissional, o que confere a identidade profissional. Já o campo de competência e responsabilidade configura-se como espaços e limites imprecisos, nos quais cada disciplina e profissão se complementam com as demais, com vistas a cumprir suas atribuições no processo de trabalho em saúde.3030 Campos GWS. Public health and collective health: field and core area for knowledge and practice. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2000; [cited 2018 Jul 10]; 5(2):219-30. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v5n2/7093.pdf
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Destaca-se que, de acordo com as entrevistas, a atuação prática dos profissionais da ESF e a composição dos saberes se fundamentam mais nos núcleos do que nos campos de competência e responsabilidade. Isto significa que a atuação do profissional fica restrita a seu núcleo de atuação específica. Evidencia-se incipiente e tímido processo de articulação entre os profissionais apenas em determinadas situações na ESF.

Deste modo, os profissionais precisam olhar para além de sua própria profissão para compartilhar os objetivos com profissionais de outras formações.2727 van Dongen JJ, Lenzen SA, van Bokhoven MA, Daniëls R, van der Weijden T, Beurskens A. Interprofessional collaboration regarding patients’ care plans in primary care: a focus group study into influential factors. BMC Fam Pract [Internet]. 2016 May 28; [cited 2018 Jul 10]; 17:58. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27233362. DOI: 10.1186/s12875-016-0456-5
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Isto pode contribuir para reconstrução de um caminho compartilhado com vistas à assistência adequada ao usuário, com participação de todos os profissionais no plano de cuidado, assinalando como potente ferramenta na promoção em saúde, conduzindo à integralidade da assistência.

A terceira categoria temática, Trabalho em equipe em momentos específicos, revela que para os participantes o trabalho em equipe acontece em momentos específicos no cotidiano de trabalho da ESF, como por exemplo, nas ações realizadas com escolares, em grupos com pacientes. Isso pode revelar as percepções de que o trabalho em equipe ocorre em momentos pontuais e pré-determinados, nos quais todos estão reunidos no mesmo local envolvidos com a mesma atividade. Contudo, não fica evidente se essas percepções dos entrevistados, de trabalho integrado, refletem uma efetiva articulação ou meramente um “agrupamento” dos agentes em momentos específicos. Questiona-se ainda se os sujeitos não percebem que o trabalho em equipe deve permear todo o processo de trabalho em saúde, e não se configurar como ferramenta para ações isoladas e pontuais.

Neste sentido, outros estudos revelam que o trabalho na ESF permeia a lógica multidisciplinar, mas a depender do nível de interação entre os profissionais, pode ou não garantir a interprofissionalidade e o trabalho coletivo e integrado. Somente o fato de agrupar profissionais não necessariamente se traduz em prática colaborativa.3131 Jacowski M, Budal AMB, Lemos DS, Ditterich RG, Buffon MCM, Mazza VA. Teamwork: the professionals’ perception of family health strategy. Rev Baiana Enferm [Internet]. 2016 Apr/Jun; [cited 2018 Jul 10]; 30(2):1-9. Available from: https://portalseer.ufba.br/index.php/enfermagem/article/view/15145/pdf_41. DOI: 10.18471/rbe.v30i2.15145
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-3232 Matuda CG, Pinto NRS, Martins CL, Frazão P. Interprofessional collaboration in the Family Health Strategy: implications for the provision of care and work management. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2015; [cited 2018 Jul 10]; 20(8):2511-21. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v20n8/1413-8123-csc-20-08-2511.pdf. DOI: 10.1590/1413-81232015208.11652014
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Atividades coletivas com a participação de diversos profissionais que compõem a ESF nem sempre impulsionam uma lógica integrativa. Evidenciou-se que mesmo essas ações coletivas eram fundamentadas pela perspectiva individualizada, havendo apenas a exposição de conhecimentos relativos ao núcleo de conhecimento, e a não interação dos saberes, o que não favorece a implementação do trabalho em equipe na ESF.2525 Farias DN, Ribeiro KSQS, Anjos UU, Brito GEG. Interdiciplinario e interprofesionalidad en la estrategia salud de la família. Trab Educ Saúde [Internet]. 2018 Jan/Apr; [cited 2018 Jul 10]; 16(1):141-62. Available from: http://www.scielo.br/pdf/tes/v16n1/1678-1007-tes-1981-7746-sol00098.pdf. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1981-7746-sol00098
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Isto também foi evidenciado na presente pesquisa, constatando-se que os participantes identificam o trabalho em equipe como aquele que ocorre em momentos nos quais os profissionais estão juntos fisicamente, independentemente de haver interação e troca de conhecimento ou não entre eles.

Deste modo, para que o trabalho se configure minimamente como coletivo, com vistas ao trabalho em equipe, é fundamental a maneira como os profissionais interagem e se relacionam diante do objeto de trabalho. Se este espaço for utilizado com o propósito de um trabalho compartilhado, apropriando-se da comunicação horizontalizada, com compartilhamento e articulação das ações, isto pode impulsionar o trabalho em equipe.2121 Gonçalves RBM. Práticas de saúde: processos de trabalho e necessidades. São Paulo: CEFOR; 1992.,2626 McInnes S, Peters K, Bonney A, Halcomb E. An integrative review of facilitators and barriers influencing collaboration and teamwork between general practitioners and nurses working in general practice. J Adv Nurs [Internet]. 2015 Sep; [cited 2018 Jul 10]; 71(9):1973-85. Available from: https://doi.org/10.1111/jan.12647
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-2727 van Dongen JJ, Lenzen SA, van Bokhoven MA, Daniëls R, van der Weijden T, Beurskens A. Interprofessional collaboration regarding patients’ care plans in primary care: a focus group study into influential factors. BMC Fam Pract [Internet]. 2016 May 28; [cited 2018 Jul 10]; 17:58. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27233362. DOI: 10.1186/s12875-016-0456-5
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O presente estudo apresenta como limitação a coleta ter sido realizada em uma única equipe de ESF. Porém, a intenção era desvelar o cotidiano e a dinâmica do trabalho de uma equipe de profissionais, pois não se pretendia generalizar os resultados, mas conhecer a realidade com mais profundidade. Acredita-se que a realidade encontrada apresenta muitas semelhanças com outras equipes da APS.

Como recomendação, sugere-se realização de pesquisa utilizando-se a Técnica do Incidente Crítico para evidenciar situações reais a respeito de trabalho em equipe, na ESF, e identificar comportamentos que favoreçam e dificultem tal modalidade de trabalho para se pensar em estratégias em serviço com vistas ao fortalecimento dos aspectos positivos e à superação das fragilidades.

CONCLUSÕES

Os resultados evidenciam que os profissionais percebem o trabalho em equipe como aquele ancorado na ajuda mútua, colaboração e nos objetivos comuns. Revelam que o trabalho na ESF realiza-se com base nas atribuições específicas de cada profissional, e que isso se configura como trabalho em equipe. Entretanto, os relatos não indicam articulação e integração efetiva entre agentes, saberes e fazeres.

Pelos discursos, observa-se que na prática o trabalho segue a tendência mais individualizada. Isto fica claro nas entrevistas nas quais os participantes discorrem que quando estão juntos em determinadas ações, em momentos específicos na ESF, caracteriza-se como trabalho em equipe. Entretanto, não mencionam se há troca de saberes e integração.

Desta forma, esses resultados sinalizam que os profissionais da ESF desconhecem que os elementos constitutivos do trabalho em equipe devem perpassar todo o processo de trabalho na ESF, que sem a utilização desses elementos o trabalho em equipe não é efetivo, podendo reforçar a assistência fragmentada em saúde.

Os resultados foram apresentados para os gerentes das unidades de Saúde da Família dos três Distritos Sanitários, em uma reunião na Secretaria Municipal de Saúde, do município em foco. Espera-se contribuir por meio da reflexão e reflexão dos achados como sinalizadores para promover atuações coletivas, mais integradas e solidárias. Acredita-se que estudos desta natureza podem inclusive, favorecer futuras mudanças curriculares dos cursos da saúde, para que incorporem aspectos não materiais como fundamentais também na atuação profissional. A presente pesquisa evidencia, inclusive, a necessidade de investimento na colaboração interprofissional nos cursos de graduação, pós-graduação e na formação/capacitação em serviço.

REFERENCES

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Set 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    02 Abr 2019
  • Aceito
    10 Jul 2019
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