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Uma avaliação acerca da falha empírica do teorema da paridade descoberta da taxa de juros entre o Real e o Dólar

An evaluation of the uncovered interest parity failure for the Brazilian economy

Resumo

Este artigo testa a validade do teorema da paridade descoberta de juros para os dados da economia brasileira no período de 2000 a 2014. Nossos resultados corroboram a não validade empírica, conhecida na literatura como de UIP Failure ou Forward Premium Puzzle. O coeficiente do diferencial de juros estimado por um modelo GARCH apresenta sinal negativo, contradizendo parte dos testes da UIP em economias periféricas. Já os modelos markovianos de mudança de regime apontaram para dois padrões bem delimitados: nos períodos de menor volatilidade o coeficiente assume valor negativo e, nos meses de alta volatilidade, valor positivo. Os resultados encontrados são coerentes com a abordagem da taxa de juros exógena em uma economia aberta.

Palavras-chave:
Paridade descoberta de juros; Abordagem da taxa de juros exógena; UIP failure; Teoremas de taxa de juros; Taxa de câmbio

Abstract

The present paper tests the validity of the uncovered interest parity (UIP) theorem using data from the Brazilian economy from 2000 to 2014. Our results endorse the empirical failure of this theorem, known in the literature as UIP Failure or Forward Premium Puzzle. The estimated coefficient of the interest rate differential in a GARCH model is negative, contradicting most of the UIP tests for emerging economies. However, using Markov switching models we found two well-defined patterns: during periods of lower exchange rate volatility the estimated coefficient becomes negative, while in high volatility periods the estimated coefficient is positive. These results are consistent with the exogenous interest rate approach in an open economy.

Keywords:
Uncovered Interest Parity; Exogenous interest rate approach; UIP failure; Interest rate theorems; Exchange rate

Introdução

O teorema da paridade descoberta da taxa de juros, do inglês Uncovered Interest Parity (UIP), estabelece que o diferencial de juros pago por ativos em dois países deve refletir a expectativa de valorização (ou desvalorização) entre a moeda desses dois países.

Este teorema aparece como uma relação comportamental chave em diversos modelos de determinação da taxa de câmbio (McCallum, 1994MCCALLUM, Bennett T. A reconsideration of the uncovered interest parity relationship. Journal of Monetary Economics, v. 33, n. 1, p. 105-132, 1994., p. 5), bem como em modelos macroeconômicos para economias abertas, como por exemplo o Global Economic Model do Fundo Monetário Internacional GEM-IMF (Laxton; Pesenti, 2003LAXTON, Douglas; PESENTI, Paolo. Monetary rules for small, open, emerging economies. Journal of Monetary Economics, v. 50, n. 5, p. 1109-1146, 2003., ver também Obstfeld; Rogoff, 1996OBSTFELD, Maurice; ROGOFF, Kenneth. Exchange rate dynamics redux. Cambridge, MA: National Bureau of Economic Research, 1996.). No Brasil também, o Banco Central utiliza a UIP como referência teórica em diversos modelos que consideram a determinação de variações cambiais (ver, por exemplo, Bogdanski; Tombini; Werlang, 2000BOGDANSKI, Joel; TOMBINI, Alexandre A.; WERLANG, Sergio R. da C. Implementing inflation targeting in Brazil. Brasília: Banco Central do Brasil, 200. (Working Paper, n. 1).).

Apesar da grande difusão e aceitação, a falha empírica da UIP é quase um fato estilizado. O teorema da paridade descoberta de juros foi seguidamente rejeitado empiricamente para diferentes países, períodos e técnicas de estimação. Esse resultado é bem conhecido e chamado de UIP Failure ou Forward Premium Puzzle.

Este artigo tem como objetivo avaliar a validade empírica do teorema da paridade descoberta de juros para os dados da economia brasileira no período de 2000 a 2014. Tendo em vista a natureza dos dados de câmbio e diferencial de juros para economias periféricas, em particular o Brasil, será necessário utilizar diferentes métodos econométricos para interpretar nossos resultados.

Para tanto, o artigo se desdobra, além dessa introdução, em mais cinco seções. A seção 1 discute os aspectos teóricos da paridade descoberta e as hipóteses por trás desse teorema. Na segunda seção são apresentados métodos para estimar a paridade descoberta e os resultados empíricos encontrados na literatura para diversos países desenvolvidos e periféricos, incluindo o Brasil. Na seção 3 se discute a natureza dos dados da economia brasileira e são apresentadas as estimativas do teorema da paridade descoberta. Na quarta seção será feita uma interpretação dos resultados encontrados à luz da abordagem da taxa de juros exógena. Considerações finais são tecidas na última seção.

1 O teorema da paridade descoberta e suas hipóteses

O teorema da paridade descoberta da taxa de juros estabelece que os retornos de dois ativos substitutos perfeitos, denominados em moedas diferentes, devem ser iguais. Dessa maneira, a taxa de juros doméstica (i) deve ser igual à taxa de juros internacional (i* ) somada da expectativa de desvalorização nominal da taxa de câmbio (se-s ):

i = i * + ( s e s ) (1)

No caso do câmbio flexível1 1 Que é o caso de maior interesse neste trabalho empírico, tendo em vista que no Brasil não houve câmbio fixo de 2000 a 2014, ainda que tenhamos tido uma flutuação suja com grande acumulação de reservas. , o modelo pode ser fechado da seguinte maneira: dadas as taxas de juros interna (i) e internacional (i*) exógenas e as expectativas de câmbio em t+1 (se ), a taxa de câmbio se ajusta para garantir a paridade:

s e s = i i * (2)

Empiricamente, a equação (3) é utilizada para testar a validade da paridade descoberta de juros. Diz-se que a hipótese da paridade descoberta é verificada se os parâmetros α e β estimados são estatisticamente iguais a zero e um, respectivamente.

s t + 1 e s t = α + β ( i i * ) + ε t + 1 (3)

Frequentemente se encontra a simplificação de que a expectativa acerca da taxa de câmbio em t+1(st+1e) é suposta igual (em média) à taxa de câmbio efetivamente ocorrida em t+1 (equação 4)2 2 Diversos artigos de referência sobre a validade empírica da paridade descoberta da taxa de juros adotam a variação efetiva da taxa de câmbio como aproximação da expectativa de desvalorização cambial, como por exemplo, Cumby e Obstfeld (1984) e Fama (1984). Em seu livro, McCallum (1996) esclarece que uma das possíveis causas da falha da UIP é a ausência de expectativas racionais, o que implica diretamente que a hipótese de expectativas racionais é assumida nos testes empíricos da UIP. O mesmo questionamento é feito por Marey (2004). , resultando na relação descrita por (5), onde as letras (t e ut são ruídos brancos. Seguiremos essa hipótese tradicional para a estimação da paridade descoberta e na última seção faremos considerações críticas a respeito.

s t + 1 e = s t + 1 + u t + 1 (4)

s t + 1 s t = α + β ( i t i t * ) + ε t + 1 (5)

Isso significa que se adota implicitamente a hipótese de que os agentes têm expectativas racionais sobre a taxa de câmbio nominal que é, portanto, exógena3 3 Muitas vezes é suposto que os agentes acreditam na validade da PPP (paridade do poder de compra da taxa de câmbio), para fechar modelos teóricos e chegar na equação de paridade real da taxa de juros (ver Lavoie, 2000) ou quando tal equação é utilizada para testes empíricos em geral é simplesmente assumido que os agentes acertam a taxa de câmbio nominal na média. . Como as expectativas cambiais não são observadas, o teste assume expectativas racionais e, portanto, que os agentes acertam na média (isto é, a não ser por uma variável aleatória normal padrão). Ou seja, as expectativas da taxa spot no período seguinte são iguais à taxa de câmbio spot observada no período seguinte (equação 4). Dessa maneira, este método avalia conjuntamente a paridade descoberta e a hipótese de expectativas racionais no mercado de câmbio.

Outra forma de testar a paridade descoberta consiste em testar se a taxa de câmbio a termo (ft,t + k ) é um previsor não viesado para a taxa spot esperada no futuro (set +k). Esse método é conhecido na literatura como unbiasedefficiency4 4 Neste artigo, optamos por não utilizar este método pois estamos interessados exclusivamente na paridade descoberta. Em outro trabalho, argumentamos que existe suporte empírico para a paridade coberta da taxa de juros Covered Interest Parity, justificada pela visão cambista, que afirma que a taxa de câmbio a termo é determinada diretamente pelo custo incorrido por instituições financeiras para entrega futura de divisas a seus clientes (ver Cieplinski; Braga; Summa, 2017forthcoming). . Ele parte da equação que relaciona o teorema da Paridade Coberta, junto com a hipótese de expectativas racionais, com a Paridade Descoberta da Taxa de Juros.

s t + k e s t = α + β ( f t , t + k s t ) + ε t + k (6)

s t + k e = s t + k + u t + k (7)

s t + k s t = α + β ( f t , t + k s t ) + η t + k (8)

Dessa maneira, o teste da validade da paridade descoberta consiste em estimar a equação (5) ou a equação (8), e esta é verificada empiricamente quando α =0 e β =1. É importante notar que este método avalia conjuntamente a paridade descoberta e a hipótese de expectativas racionais no mercado de câmbio, e no caso da equação (8) depende também da validade prévia da paridade coberta de juros.

2 Avaliação da Literatura Empírica sobre a paridade descoberta

Uma característica marcante da literatura empírica que investiga a paridade descoberta de juros é que o teorema não é verificado à luz dos dados, para diferentes países, períodos e técnicas de estimação. Esse resultado é bem conhecido e chamado de UIP Failure ou Forward Premium Puzzle. Froot e Thaler (1990FROOT, Kenneth A.; THALER, Richard H. Anomalies: foreign exchange. The Journal of Economic Perspectives, v. 4, n. 3, p. 179-192, 1990., p. 182) mostram que o resultado mais usual na literatura para este tipo de teste é um parâmetro β menor que um e em geral negativo. O coeficiente médio levando em conta 75 estimativas publicadas foi de -0.88 sem que nenhum estudo corroborasse a hipótese nula de β=1.

A constatação deste coeficiente β <0 é denominada forwardpremium puzzle. Diversos estudos tentaram atribuir esta “anomalia” à presença de um prêmio de risco variável. Entretanto, como apontam MacDonald e Taylor (1992MACDONALD, Ronald; TAYLOR, Mark P. Exchange rate economics: a survey. Staff Papers (International Monetary Fund), v. 39, n. 1, p. 1-57, Mar. 1992., p. 39), diversos autores falharam ao tentar modelar estes desvios da UIP pelo acréscimo de uma variável de risco nos testes.

Dois dos estudos mais antigos e influentes a testar a equação (8) são Cumby e Obstfeld (1984CUMBY, Robert E.; OBSTFELD, Maurice. International interest-rate and price-level linkages under flexible exchange rates: a review of recent evidence. In: BILSON, John F. O.; MARSTON, Richard C. (Ed.). Exchange rate theory and practice. Chicago: Chicago University Press, 1984, p. 121-152.) e Fama (1984FAMA, Eugene F. Forward and spot exchange rates. Journal of Monetary Economics, v. 14, n. 3, p. 319-338, 1984.). No primeiro, os autores explicitam a invalidade do mesmo teste com as variáveis em níveis t+k =α+β. f t,1 + &epsiv; tdevido a sua não estacionariedade, que antes havia sido utilizada para confirmar a UIP por Frenkel (1981FRENKEL, J. Flexible exchange rates, prices, and the role of “news”: lessons from the 1970s. Journal of Political Economy, v. 89, n. 4, p. 665-705, Aug. 1981.), por exemplo. Os testes de Cumby e Obstfeld rejeitam a UIP para cinco moedas contra o dólar americano5 5 Libras esterlinas, marcos alemães, francos suíços, dólares canadenses e ienes japoneses. : encontrando parâmetros β negativos e significativamente diferentes de zero para quatro das cinco taxas de câmbio. As estimações por 2SLS utilizam dados semanais entre 1976 e 1981. Fama, por sua vez, testa a mesma relação para nove moedas contra o dólar utilizando duas metodologias: mínimos quadrados ordinários e seeminglyunrelatedregression (SUR). Mais uma vez os coeficientes β apresentam o sinal inverso do esperado.

Em outro estudo semelhante, Taylor (1987TAYLOR, Mark P. Risk premia and foreign exchange: a multiple time series approach to testing uncovered interest-rate parity. Weltwirtschaftlichesarchiv, v. 123, n. 4, p. 579-591, 1987.) utiliza dados mensais entre 1979 e 1986 para estimar um VAR. São utilizadas taxas de juros de ativos equivalentes - Eurocurrencyinterest rates - com maturidades de seis e doze meses. Taylor utiliza taxas de câmbio de diversas moedas contra o dólar americano e também a libra esterlina, totalizando onze taxas de câmbio diferentes6 6 São elas: dólares americanos, marcos alemães, ienes japoneses, francos franceses, lira italiana e guilder holandês contra libras esterlinas e dólares americanos. . A UIP é rejeitada para todas as taxas de câmbio exceto Liras/GBP e DM/USD, para seis e doze meses de maturidade.

Froot e Frankel (1989FROOT, Kenneth A.; FRANKEL, Jeffrey A. Forward discount bias: is it an exchange risk premium? The Quarterly Journal of Economics, v. 104, n. 1, p. 139-161, 1989.), utilizando dados diários para quatro períodos compreendidos entre 1981 e 1985 avaliam se a falha da UIP decorre do prêmio de risco e concluem que o “erro nas expectativas cambiais” (St+k - ft,k ) não pode ser explicado por um prêmio de risco, pois este varia menos do que a taxa de câmbio. Portanto, mesmo uma variação do risco no sentido inverso do forwardpremium (ft,t+k - St ) , como postulou Fama (1984FAMA, Eugene F. Forward and spot exchange rates. Journal of Monetary Economics, v. 14, n. 3, p. 319-338, 1984.), não seria capaz de explicar o parâmetro β negativo.

Outra tentativa de explicar os desvios da UIP é apresentada por Baillie e Osterberg (2000BAILLIE, Richard T.; OSTERBERG, William P. Deviations from daily uncovered interest rate parity and the role of intervention. Journal of International Financial Markets, Institutions and Money, v. 10, n. 3, p. 363-379, 2000.). Em vez do prêmio de risco eles investigam a influência de atuações diretas dos Bancos Centrais sobre a taxa de câmbio. Os desvios da paridade descoberta são calculados pela diferença entre a variação cambial e o diferencial de juros calculado com as taxas overnight de Eurobondsentre dólares americanos e marcos alemães, entre 1987 e 1993. Aplica-se a metodologia FIGARCH a 1436 observações diárias, utilizando como variáveis explicativas as intervenções diárias, à vista e por swaps, do Federal Reserve e do Bundesbank. Os autores indicam que as intervenções dos BCs parecem ter o objetivo de estabilizar a taxa de câmbio spot. Entretanto, não são capazes de explicar os desvios da UIP.

Parte da literatura questiona o uso da forma funcional expressa por (8) para testar a UIP e aplica métodos econométricos alternativos às variáveis em nível. Segundo Goodhartet al. (1997GOODHART, Charles A.E.; MCMAHON, Patrick C.; NGAMA, Yerima L. Why does the spot-forward discount fail to predict changes in future spot rates? International Journal of Finance & Economics, v. 2, n. 2, p. 121-129, 1997.) as equações (6) e (8) são equivalentes apenas sob a hipótese nula, normalmente rejeitada. Estes autores realizam uma regressão cointegrada aplicando o estimador FMOLS7 7 Fully Modified Ordinary Least Squares (Phillips; Hansen, 1990). a dados mensais de seis taxas de câmbio. Desta vez, o parâmetro β estimado é positivo e muito próximo da unidade em todos os casos. Delcoureet al. (2003DELCOURE, Natalya et al. The forward rate unbiasedness hypothesis reexamined: evidence from a new test. Global Finance Journal, v. 14, n. 1, p. 83-93, 2003.) seguem a mesma linha, mas notam que, enquanto alguns estudos encontram um vetor de cointegração próximo da unidade entreSt+k e ft,t+k , outros sequer são capazes de identificar uma relação estável (cointegrada) entre as variáveis (Delcoure et al., 2003DELCOURE, Natalya et al. The forward rate unbiasedness hypothesis reexamined: evidence from a new test. Global Finance Journal, v. 14, n. 1, p. 83-93, 2003., p. 85). Assim como Goodhart et al. (1997GOODHART, Charles A.E.; MCMAHON, Patrick C.; NGAMA, Yerima L. Why does the spot-forward discount fail to predict changes in future spot rates? International Journal of Finance & Economics, v. 2, n. 2, p. 121-129, 1997.) este estudo encontra evidências de um vetor de cointegração próximo de um ao aplicar o teste de Johansen a dados trimestrais entre 1970 e 1996. Porém, não confirma que ft,t+k é um previsor não enviesado paraSt+k , pois para três das taxas de câmbio investigadas não é cumprida a condição de ortogonalidade. Resultados semelhantes são apresentados por Ho (2003HO, Tsung-Wu. A re-examination of the unbiasedness forward rate hypothesis using dynamic SUR model. The Quarterly Review of Economics and Finance, v. 43, n. 3, p. 542-559, 2003.) a partir um modelo SUR dinâmico, construindo um painel com dados diários do ano de 1998 para dezessete moedas.

Este ramo da literatura apresenta, em contraste com os testes mais tradicionais da unbiasedefficiency, uma saída ao confirmar a validade da paridade descoberta de juros, tão importante para diversos modelos macroeconômicos de economia aberta. Contudo, nenhum destes trabalhos considera a possibilidade de quebras estruturais nas séries e/ou na relação de cointegração entre elas. Se, por exemplo, há evidencia de quebras estruturais nas séries analisadas é possível que as relações de cointegração relatadas nos estudos acima sejam espúrias, como sugerem Leybourne e Newbold (2003LEYBOURNE, Stephen J.; NEWBOLD, Paul. Spurious rejections by cointegration tests induced by structural breaks. Applied Economics, v. 35, n. 9, p. 1117-1121, 2003.) e Cook (2004COOK, Steven. Spurious rejection by cointegration tests incorporating structural change in the cointegrating relationship. Applied Economics Letters, v. 11, n. 14, p. 879-884, 2004.).

Portanto, se aceitamos que há uma relação contemporânea entre ft,t+k e St , e que taxas de câmbio parecem ser particularmente sujeitas a quebras estruturas, inclusive devido a mudanças de regimes cambiais, é bastante provável que as relações de cointegração encontradas se devam a quebras estruturais contemporâneas ou próximas nas variáveis e não à uma relação estável entre elas.

Há ainda outra classe de estudos, ora representada por Mehl e Cappiello (2009MEHL, Arnaud; CAPPIELLO, Lorenzo. Uncovered interest parity at long horizons: evidence on emerging Economies. Review of International Economics, v. 17, n. 5, p. 1019-1037, 2009.), que defende a validade da UIP apenas para títulos de maturidade mais longa. A hipótese central é que o carry trade se concentra em ativos de menor maturidade, de até um ano, e é responsável pela correlação negativa entre juros e câmbio. Mehl e Capiello utilizam métodos não lineares aplicados a ativos com maturidade de dois, cinco e dez anos de maturidade8 8 Uma das hipóteses implícitas é que os agentes retêm estes títulos até sua maturidade. Os testes são realizados para países desenvolvidos, entre 1970 e 2006, e também periféricos9 9 Entre os periféricos constam Malásia, Hong Kong, Índia, Coréia do Sul, Filipinas, Arábia Saudita e Singapura. entre 1980 e 2006, com dados mensais. Os resultados confirmam parcialmente a hipótese do trabalho. São encontrados, para títulos com dez anos de prazo, coeficientes β significativamente positivos, mas inferiores à unidade. Os resultados agrupados (pooledregression) encontram um β de 0.50, 0.52 e 0.24 para todos os países, apenas para economias desenvolvidas e apenas para periféricos, respectivamente. De maneira análoga, para títulos de cinco anos, são estimados βs de 0.30, 0.60 e 0.04. Os autores concluem que utilizando horizontes mais longos há evidencias em favor da UIP, para taxas de câmbio de economias desenvolvidas contra o dólar americano, mas não para países emergentes.

A Tabela 1 resume os trabalhos discutidos nesta seção. De modo genérico pode-se concluir que a maioria da literatura empírica rejeita a paridade descoberta de juros.

Tabela 1
Estudos Empíricos da UIP

Destacamos também que a mera persistência do carry trade é suficiente para invalidar a UIP10 10 Para mais informações sobre as estratégias de carry trade e sobre o uso extensivo deste tipo de operação em diversos mercados ver Rossi (2010), Carneiro e Rossi (2012) e Galatti (2007). . A lucratividade destas operações indica que taxas de câmbio e/ou taxas de juros não se ajustam de modo a evitar oportunidade de lucro em operações especulativas11 11 Taylor (1995) atesta que tais estratégias frequentemente geram resultados rentáveis, invalidando mais uma vez a paridade descoberta de juros. .

Uma vez apresentados os resultados da literatura empírica sobre o teorema da paridade descoberta para as economias desenvolvidas, nos concentramos a seguir estudos aplicados a diversas economias periféricas, bem como exclusivamente ao Brasil.

Em economias periféricas, a UIP parece não demonstrar desvios tão flagrantes quanto para países desenvolvidos. Muitas vezes não se verifica uma relação negativa entre o diferencial de juros e a variação cambial, mas tampouco este se aproxima da unidade como seria necessário para validar empiricamente tal teorema. Assim, parece haver uma clara diferença na relação entre juros e câmbio para economias periféricas e desenvolvidas.

Este resultado é corroborado para a economia brasileira por Garcia e Olivares (2001GARCIA, Márcio; OLIVARES, Gino. O prêmio de risco da taxa de câmbio no Brasil durante o Plano Real. Revista Brasileira de Economia, v. 55, n. 2, p. 151-182, 2001.). Com dados mensais entre 1995 e 1998, os autores encontram um β de aproximadamente 0.3. E utilizando dados diários do final de 1997 até 2000, verifica-se um aumento deste parâmetro, principalmente após a adoção do regime de câmbio flutuante em 199912 12 Neste caso foi estimada uma rolling regression para obter parâmetros que variam ao longo da amostra. .

Bansal e Dahlquist (2000BANSAL, Ravi; DAHLQUIST, Magnus. The forward premium puzzle: different tales from developed and emerging economies. Journal of International Economics, v. 51, n.1, p. 115-144, 2000.) estimam um painel não balanceado para 28 economias entre 1976 e 199813 13 As observações para as economias periféricas só têm início no começo da década de 1990. , concluindo que o forwardpremium puzzle, ou seja, a relação negativa entre juros e câmbio, ocorre apenas em países desenvolvidos cujas taxas de juros são menores do que a norte americana. Já Frankel e Poonawala (2010FRANKEL, Jeffrey; POONAWALA, Jumana. The forward market in emerging currencies: less biased than in major currencies. Journal of International Money and Finance, v. 29, n. 3, p. 585-598, 2010.) se concentram exclusivamente em economias emergentes entre 1996 e 2004 e também concluem que os desvios da UIP nestes são menores do que nos países desenvolvidos14 14 Em um survey, Alper et al. (2009) buscam algumas explicações para estes resultados. Segundo os autores é possível que devido aos maiores níveis de inflação países emergentes tenham menor rigidez de preços. Ainda, maiores níveis de inflação causariam uma tendência comum nas taxas de juros e de câmbio. Esta hipótese, no entanto, assume que tanto as taxas de juros quanto o câmbio são de alguma forma determinados pela inflação interna, como na exposição de Frenkel (1976). Esta teoria é bastante controversa, pois nega a exogeneidade da determinação dos juros e também depende do funcionamento da PPP. Frenkel e Poonawala (2010) propõe uma explicação mais razoável. Primeiro eles notam que o resultado mais favorável à UIP nos emergentes é um indício de que a explicação do forwardpremium puzzle por um prêmio de risco variável, proposta por Fama (1984), é incorreta uma vez que mercados emergente são evidentemente mais arriscados do que os desenvolvidos. Em seguida eles atribuem o resultado da UIP em países emergentes a uma maior previsibilidade de tendências de desvalorização de suas moedas. .

Clarida, Davis e Pedersen (2009CLARIDA, Richard; DAVIS, Josh; PEDERSEN, Niels. Currency carry trade regimes: beyond the Fama regression. Journal of International Money and Finance, v. 28, n. 8, p. 1375-1389, 2009.) apontam para uma relação direta entre a falha da UIP e operações de carry trade. Ao estimar modelos que relacionam o retorno de operações de carry trade com a volatilidade cambial entre 1993 e 2009 os autores relacionam os coeficientes negativos que representam a falha da paridade descoberta de juros com períodos de baixa volatilidade das taxas de câmbio. Estes períodos de baixa volatilidade, por sua vez, são relacionados a maiores retornos em operações de carry trade. Períodos de alta volatilidade cambial, por outro lado, diminuem os ganhos de carry trade e são relacionados a parâmetros positivos na equação da paridade descoberta de juros. Nas próximas seções identificamos uma relação similar entre a volatilidade cambial e o sinal dos coeficientes estimados da UIP para a economia brasileira.

Yoshino e Micheloto (2004YOSHINO, Joe Akira; MICHELOTO, Silvio Ricardo. The uncovered interest parity in the foreign exchange (FX) markets. Brazilian Review of Finance, v. 2, n. 2, p. 137-157, 2004.) investigam a UIP para os vinte países incluídos no EMBI+ por meio de um painel cointegrado. A paridade descoberta é rejeitada para o período entre 1993 e 2001 nestes países. Carvalho e Divino (2009CARVALHO, Jaimilton; DIVINO, José Angelo. Paridade descoberta da taxa de juros em países latino-americanos. Pesquisa e Planejamento Econômico, v. 39, n. 2, 2009.) também utilizam um painel para avaliar a UIP em quatro países entre 1995 e 2007: Brasil, Chile, Argentina e México. Em um resultado incomum, os autores encontram evidências em favor da paridade descoberta de juros.

Por fim, destacamos o artigo de Santos Souza e Curado (2013SANTOS SOUZA, G. R.; CURADO, M. Comportamento da taxa de câmbio no Brasil: uma análise a partir da paridade descoberta da taxa de juros. Análise Econômica, v. 31, n. 59, 2013.) que trata exclusivamente da economia brasileira. O período escolhido entre 2003 e 2008 se destaca pela ausência de grandes turbulências na taxa de câmbio brasileira. São utilizados dados mensais para a estimação de um VAR com taxas de câmbio, diferencial de juros entre Brasil e EUA e o prêmio de risco soberano representado pelo EMBI+. Os resultados não confirmam a UIP, mas identificam um efeito pequeno dos juros sobre o câmbio. Entretanto, as variáveis utilizadas são a primeira diferença do câmbio (variação cambial), do EMBI+ e do diferencial de juros. Logo, a relação testada não é exatamente a UIP que relaciona a variação cambial com o nível do diferencial de juros15 15 Adicionalmente, o VAR estimado não rejeita a auto correlação serial dos resíduos ao nível de 10% no teste LM. .

Tabela 2
Estudos Empíricos da UIP no Brasil

Os estudos apresentados nesta seção constatam um comportamento diferente da relação entre juros e câmbio em países periféricos, inclusive no Brasil. Mesmo que rejeitando a validade da UIP, o coeficiente normalmente estimado parece ser positivo ou próximo de zero nos países periféricos, contrastando com a relação negativa entre juros e câmbio usual nas economias desenvolvidas.

Contudo, a grande maioria dos artigos desta seção inclui em suas amostras períodos de câmbio fixo nas economias periféricas. E o único estudo que considera exclusivamente a economia brasileira, Santos Souza e Curado (2013SANTOS SOUZA, G. R.; CURADO, M. Comportamento da taxa de câmbio no Brasil: uma análise a partir da paridade descoberta da taxa de juros. Análise Econômica, v. 31, n. 59, 2013.), testa uma relação diferente da UIP ao utilizar a variação do diferencial de juros e não o nível como variável explicativa. Assim, na próxima seção vamos analisar dados mais recentes da economia brasileira a fim de testar a validade da UIP entre o Real e o Dólar

3 Descrição e comentários sobre os dados

3.1 Um primeiro olhar sobre os dados e a relação da paridade descoberta

Para testar a validade empírica do teorema da paridade descoberta utilizamos dados mensais em uma amostra que se estende de janeiro de 2000 até março de 2014, totalizando 171 observações. Essa amostra compreende o período logo após a implementação do sistema de metas de inflação, no qual a taxa de câmbio é menos controlada (“flutuação suja”) do que no período anterior, e abarca tanto períodos em que a taxa de câmbio nominal se mostrou mais estável quanto períodos de turbulência.

Como apontado na seção 1, seguiremos o procedimento usual encontrado na literatura empírica de estimar diretamente a relação entre a variação cambial e o diferencial de juros, utilizando a hipótese de que as expectativas são corretas em média, como descrito na equação (5):

s t + 1 s t = α + β ( i t i t * ) + ε t (5)

Todas as três variáveis utilizadas nesta seção foram construídas a partir de dados diários. O câmbio spot (s) mensal é dado pela média das taxas diárias de compra e venda de um determinado mês16 16 Séries de código 1 e 10813do SGS/BCB. . Já a variação cambial mensal (ds) é igual à diferença entre as taxas spot no início de cada mês. Em outras palavras, a variação cambial em determinado mês t(dst ) é igual à mudança da taxa de câmbio ao longo deste mês.

O diferencial de juros (ii), por sua vez, é calculado pela razão entre a taxa CDI diária em % ao dia17 17 Série 12 SGS/BCB. e a taxa libor de um mês diária18 18 Como os dados em sua fonte original (FRED/ St. Louis FED) estão anualizados, foi necessária dividir por 360. , ambas acumuladas no mês. Por fim, o EMBI+ brasileiro é igual ao valor observado no início do mês da série diária19 19 O EMBI+ é elaborado pelo J.P. Morgan, mas a séries com os valores diários, em basis points, pode ser obtida em www.ipeadata.gov.br. Na revisão da literatura já mencionamos o papel que o carry trade pode ter na relação negativa entre variação cambial e diferencial de juros comumente encontrada na literatura empírica. Assim como antes, o embi+ aqui representa o custo enfrentado por um agente nacional que pretende tomar emprestado a taxas externas e investir no Brasil. Entretanto, é mais provável que grande parte do fluxo de capitais para investimento em portfolio seja de instituições estrangeiras que são capazes de tomar emprestado a um valor mais próximo da taxa externa e investir em títulos nacionais. Mas mesmo nesse caso o uso do embi+ na equação se justifica não apenas como uma medida da percepção de risco destes investidores estrangeiros, mas porque ao refletir variações no rendimento dos títulos da dívida externa brasileira pode levar a maiores aplicações nestes do que em títulos denominados em reais. OEMBI+ aqui representa o custo enfrentado por um agente nacional que pretende tomar emprestado a taxas de juros externas e investir no Brasil. Entretanto, é mais provável que grande parte do fluxo de capitais para investimento em portfolio seja de instituições estrangeiras que são capazes de tomar emprestado a um valor mais próximo da taxa externa e investir em títulos nacionais. Mas mesmo nesse caso o uso do EMBI+ se justifica não apenas como uma medida da percepção de risco destes investidores estrangeiros, mas porque ao refletir variações no rendimento dos títulos da dívida externa brasileira. Um EMBI+ maior está relacionado a maiores aplicações em títulos da dívida externa do que em títulos denominados em reais.

Portanto, nossa equação de teste pode ser apresentada por (9), na qual os subscritos t e i representam o mês e os dias do mês, respectivamente. É importante notar que estamos relacionando a variação cambial ao longo de um mês com o diferencial de juros calculado com as taxas acumuladas durante o mesmo mês20 20 Destacamos ainda que é especialmente difícil especificar de uma forma homogênea, utilizando apenas uma taxa doméstica e outra externa, os retornos reais obtidos pelos participantes de um mercado. Aplicações em taxas de juros externas podem ocorrer por períodos diferentes e em ativos diferentes, geralmente concentradas em prazos mais curtos. Galatti, Heath e McGuire (2007), por exemplo, ilustram a complexidade de se identificar precisamente os impactos do carry trade devido à dificuldade de isolar os fluxos específicos para este tipo de operação. . No anexo 2 que contém todos os resultados dos testes realizados nesta seção também reportamos a regressão por MQO e o GARCH realizado com as variáveis explicativas defasadas em um período. Estes indicam a mesma relação entre juros e câmbio encontrada com a formulação na equação eq:1.15-1. Na verdade estes resultados são ainda mais de acordo com as proposições teóricas apresentadas até o capítulo 2 deste trabalho. Contudo, nos atemos aos resultados que acreditamos estarem mais próximos da realidade. Destacamos ainda que é especialmente difícil especificar de uma forma homogênea, utilizando apenas uma taxa doméstica e outra externa, os retornos reais obtidos pelos participantes do mercado. Aplicações em taxas de juros externas podem ocorrer por períodos diferentes e em ativos diferentes, geralmente concentradas em prazos mais curtos. Galatti, Heath e McGuire (2007GALATTI, Gabriele; HEATH, Alexandra; MCGUIRE, Patrick. Evidence of carry trade activity. BIS Quarterly Review, v. 3, p. 27-41, 2007.), por exemplo, ilustram a complexidade de se identificar precisamente os impactos do carry trade devido à dificuldade de isolar os fluxos específicos para este tipo de operação.

s t + 1 s t s t = α + β ( Π i ( 1 + C D I t ) Π i ( 1 + l i b o r t ) 1 ) + γ e m b i t + ε t (9)

d s t = α + β i i t + γ e m b i t + ε t (10)

Os dois gráficos abaixo demonstram a evolução das variáveis ao longo da amostra.

Gráfico 1
Evolução das Variáveis ds, ii e EMBI+

A princípio, a inspeção gráfica das variáveis não sugere nenhuma observação decisiva sobre a relação entre juros e câmbio. Exceto, talvez, por alguns momentos onde grandes variações positivas do câmbio parecem estar relacionadas a aumentos do diferencial de juros como no final de 2002 e início de 2003 ( período compreendido entre a moratória argentina no final de 2001 e a eleição do primeiro governo Lula( durante o início da crise financeira internacional no final de 2008 e também no segundo semestre de 2011. É possível ainda associar taxas de câmbio menos voláteis a diferenciais de juros positivos, porém decrescentes, em períodos de valorização cambial como 2003-2008 e 2009-2011.

O primeiro passo de nossa inspeção das séries consistiu na avaliação da estacionariedade das três variáveis em questão21 21 Apresentamos os testes realizados apenas com o intercepto na regressão de teste, pois não há motivo para supor que alguma das variáveis tenha uma clara tendência ao longo do tempo. . s testes demonstram que a variação cambial (ds) é estacionária. O diferencial de juros e o EMBI+ apresentam resultados ambíguos, com os testes ADF, PP e KPSS indicando a presença de raiz unitária, enquanto os testes ADF-GLS e Ng-Perron, com um poder um pouco maior, rejeitam a hipótese nula de raiz unitária a 10% e 5%, respectivamente. A Tabela 3 apresenta os testes de raiz unitária para ds, iie EMBI.

Tabela 3
Testes de Raiz Unitária

Para contornar esta dificuldade, foram realizados testes de raiz unitária com quebra estrutural. Os resultados do teste de Lee Strazicich (LS) com duas quebras aponta para a rejeição da hipótese de raiz unitária tanto do diferencial de juros quanto do EMBI+. Deste modo, prosseguimos aplicando métodos econométricos mais tradicionais às regressões, sempre testando a hipótese de raiz unitária nos resíduos.

A primeira etapa da estratégia de modelagem foi analisar os resíduos de mínimos quadrados de uma regressão múltipla da variação cambial explicada pelo EMBI+ e pelo diferencial de juros. Esse modelo naive, além de gerar resíduos auto correlacionados, detectado pelo teste LM de Breusch-Godfrey, também indicou a presença de heterocedasticidade e efeito ARCH, de acordo com os testes de White e ARCH-LM, respectivamente. Tampouco são os resíduos normalmente distribuídos.

Para contornar essa questão, estimamos um modelo GARCH para obter resíduos adequados. A equação (10) apresenta o resultado dessa estimação utilizando um modelo GARCH (1,1) (com resíduos GED). Os testes indicam que a equação da variância é capaz de modelar de maneira satisfatória a volatilidade e o teste de Ljung-Box no correlograma também indica a ausência de auto correlação.

d s t = 0.0088 ( 0.2926 ) 2.9382 ( 0.0096 ) i i t + 0.00003 ( 0.0054 ) e m b i t + ε t σ t 2 = 0.0011 ( 0.0050 ) + 0.6010 ( 0.0039 ) ε t 1 2 0.0405 ( 0.8159 ) σ t 1 2 (11)

Tabela 4
Testes nos Resíduos da equação (10)

Gráfico 1
Variância Condicional da equação (10)

O modelo acima rejeita a validade da UIP já que o coeficiente do diferencial de juros é diferente da unidade e estatisticamente significante ao nível de 1%. De fato, a relação estimada entre ds e ii é negativa, com elasticidade de -2.9422 22 O intervalo de confiança de 95% do coeficiente está entre -5.18 e -0.70. Apenas um intervalo de confiança de 99% entre -5.89 e 0.02 apresenta a possibilidade de um parâmetro positivo muito próximo de zero. , próxima aos valores indicados por McCallum (1994MCCALLUM, Bennett T. A reconsideration of the uncovered interest parity relationship. Journal of Monetary Economics, v. 33, n. 1, p. 105-132, 1994.). Este resultado está em linha com a grande maioria da literatura internacional, mas parece contradizer parte dos testes da UIP em economias periféricas. Estes, apesar de rejeitar a UIP, encontram parâmetros positivos ou próximos de zero, em estudos que consideram diversos países em conjunto.

3.2 Avaliando a paridade descoberta com a existência de regimes diferentes

É possível que os resultados descritos na seção anterior sejam afetados por quebras estruturais no câmbio, comportamento tipicamente encontrado na literatura (Alper et al., 2009ALPER, C. Emre; ARDIC, Oya Pinar; FENDOGLU, Salih. The economics of the uncovered interest parity condition for emerging markets. Journal of Economic Surveys, v. 23, n. 1, p. 115-138, 2009.). Como a presença de quebras e mudanças nos processos geradores dos dados pode afetar os testes tradicionais de raiz unitária e de cointegração (assim como os coeficientes de modelos que assumem constância paramétrica), uma segunda inspeção da relação da paridade descoberta para o Brasil consistiu em utilizar modelos markovianos de alternância de regime (MS). Estes modelos nos permitem avaliar se as variáveis se relacionam de maneira diferente em cada um dos regimes estimados23 23 Os modelos econométricos com alternância de regime remontam à Hamilton (1989, 1994). A partir da ideia de permitir que o modelo dependa do estado da economia é possível estimar uma equação na qual as mesmas variáveis macroeconômicas tenham impactos diferentes sobre o nível de atividade da economia em dois regimes de recessão e expansão, por exemplo. A especificação de cada um dos regimes é linear, mas a probabilidade de transição entre eles se dá por meio de uma cadeia de Markov, resultando em um modelo não linear estimado por métodos numéricos de máxima verossimilhança. As equações dinâmicas com alternância de regimes markovianos nesta seção foram estimadas no pacote PcGive 13 para OxMetrics. O Método de estimação utilizado é o de Programação Quadrática Sequencial Factível (SQPF) padrão do Software. A mudança de regimes é estimada por uma variável aleatória discreta não observada (μt ), descrita por uma cadeia de Markov para a qual são computadas as probabilidades de transição. No caso de dois regimes (0 e 1), temos probabilidades de transição que dependem do estado da economia no período anterior. .

Foram estimadas especificações que permitem alternância do intercepto (MSI), dos coeficientes das variáveis (MSM), do coeficiente da variância (MSH), e suas combinações MSIH, MSIM, MSMH e MSIHM24 24 As siglas são para MarkovSwitching (MS) em I (intercepto), M (médias) e H (heterocedasticidade). Ver Krolzig (1998). com dois regimes, totalizando 15 possíveis especificações para a estimação da equação de paridade descoberta. Como podemos permitir a variação de quatro coeficientes (constante, ii, embi e variância) teríamos 16 combinações possíveis. Uma delas, no entanto, é o modelo simples estimado por MQO onde nenhum dos parâmetros varia e não há mudança de regime. Optamos por apenas dois regimes para separar períodos de alta volatilidade cambial, geralmente ligados a crises ou momentos de grande percepção de risco nos mercados internacionais, de outros com relativa estabilidade cambial. Destacamos ainda que de acordo com Hamilton (2008) a estimação de modelos de alternância de regimes torna-se difícil com mais de três regimes. Dos 15 modelos estimados, apenas em um caso não houve convergência do estimador. Dentre os 14 modelos estimados com sucesso, 5 cumpriram os critérios de não auto correlação, homocedasticidade e normalidade dos resíduos.25 25 Em geral a alternância de regimes no parâmetro do EMBI+ parece afetar negativamente as propriedades dos resíduos e também a transição entre os regimes que se torna muito frequente pouco passível de uma interpretação econômica. A alternância na variância tem o efeito oposto, resultando em resíduos bem comportados.

Em todos os modelos estimados o parâmetro do diferencial de juros apresenta sinal negativo. Entre os cinco modelos com resíduos esféricos, sempre que é permitida a alternância do coeficiente do diferencial de juros (ii), observaram-se dois padrões bem delimitados: um valor negativo, no regime de menor volatilidade cambial, e um valor positivo e maior do que um, durante os meses de alta volatilidade.

Os dois modelos apresentados na Tabela 5, além das boas propriedades dos resíduos, são aqueles cujos parâmetros variáveis se mostram estatisticamente significantes. A especificação 9 abaixo foi estimada com alternância de regimes no diferencial de juros (ii) e na variância (MSMH); já a especificação 12 contém alternância na constante, no diferencial de juros (ii) e na variância (MSIMH). Os coeficientes ii (0) e ii (1) correspondem aos coeficientes estimados para o diferencial de juros nos dois regimes, de menor e maior volatilidade cambial, respectivamente26 26 Nos dois modelos expostos na Tabela 5, a alternância de coeficientes da variância parece dar conta da heterocedasticidade condicional dos dados, antes modelada via GARCH. Por outro lado, os coeficientes estimados do diferencial de juros são menos significantes no regime de menor volatilidade cambial em ambos os modelos. .

Tabela 5
Modelos de Alternância de Regimes Markovianos para a UIP

Gráfico 3
Modelos 9 e 12 de Alternância de Regimes Markovianos para a UIP

Podemos comparar assim nossos resultados obtidos a partir da estimação de modelos de MS com os resultados típicos das estimações do teorema da paridade descoberta em mercados emergentes (Bansal; Dahlquist, 2000BANSAL, Ravi; DAHLQUIST, Magnus. The forward premium puzzle: different tales from developed and emerging economies. Journal of International Economics, v. 51, n.1, p. 115-144, 2000.; Frankel; Poonawala, 2010FRANKEL, Jeffrey; POONAWALA, Jumana. The forward market in emerging currencies: less biased than in major currencies. Journal of International Money and Finance, v. 29, n. 3, p. 585-598, 2010.). Paradoxalmente, os resultados teoricamente mais favoráveis à validade da UIP (sinal positivo do coeficiente do diferencial de juros) estão relacionados a períodos de alta volatilidade do câmbio, enquanto os resultados “enigmáticos” estão associados a períodos mais calmos.

É interessante notar ainda que o coeficiente do EMBI+ é não significativo em ambas versões do modelo de MS. Isso significa que ao adotarmos a possibilidade de alternância de regime, inclusive para a volatilidade cambial, o EMBI+ passa a não ser relevante como variável explicativa. A própria alteração nos coeficientes da variação cambial, entre dois tipos de regimes, é capaz de modelar bem a dinâmica da série. Isso sugere que os dois regimes são suficientes para modelar a variação cambial e aponta para a robustez dos modelos.

Resultados parecidos foram encontrados por Clarida, Davis e Pedersen (2009CLARIDA, Richard; DAVIS, Josh; PEDERSEN, Niels. Currency carry trade regimes: beyond the Fama regression. Journal of International Money and Finance, v. 28, n. 8, p. 1375-1389, 2009.). Ao reestimar as equações de Fama (1984FAMA, Eugene F. Forward and spot exchange rates. Journal of Monetary Economics, v. 14, n. 3, p. 319-338, 1984.) eles encontram mais uma vez coeficientes negativos para a amostra completa, mas ao separar períodos de alta volatilidade cambial se deparam com coeficientes maiores do que um27 27 Apesar deste resultado restrito à alta volatilidade, combinado com βs geralmente negativos para a amostra inteira e também para os períodos de baixa volatilidade os autores dão a entender que esta seria uma evidência em favor da UIP. . O mesmo estudo aponta que retornos de operações de carry trade estão inversamente relacionados à volatilidade do câmbio, ou seja, quanto menos este varia maiores os ganhos.

Para se certificar que as estimativas não são viesadas por possíveis problemas de endogeneidade nos modelos apresentados até aqui recorremos a um teste de exogeneidade. Abaixo apresentamos os resultados dos testes com três alternativas de especificação: uma apenas com as variáveis de variação cambial e diferencial de juros, a segunda com o EMBI+ como variável exógena e a terceira com a medida de volatilidade (variância condicionada) estimada pelo modelo GARCH da equação 10. Os testes foram rodados para três opções de número de defasagens diferentes, de acordo com critérios de informação ou teste de restrição de parâmetros das defasagens.

Tabela 6
Teste de Exogeneidade (Bloco Exogeneidade de Wald)

Os resultados das três especificações para o teste apontam para a exogeneidade do diferencial de juros, no sentido de ausência de precedência temporal, independentemente do número de defasagens escolhidas.

4 Interpretação dos resultados encontrados à luz da abordagem da taxa de juros exógena

Nesta seção sugerimos que os resultados encontrados são coerentes com uma visão heterodoxa da taxa de juros exógena (Summa; Serrano, 2013SERRANO, F.; SUMMA, R. Uma sugestão para simplificar a teoria da taxa de juros exógena. Ensaios FEE, v. 34, n. 2, 2013.) aplicada a economias abertas (Lavoie 2000LAVOIE, Marc. A post Keynesian view of interest parity theorems. Journal of Post Keynesian Economics, p. 163-179, 2000., 2001LAVOIE, Marc. The reflux mechanism and the open economy. In: Louis-Philippe ROCHON and Matias VERNENGO (Ed.). Credit, interest rates and the open economy: essays in the horizontalist tradition. p. 215, 2001. Disponível em: http://aix1.uottawa.ca/~robinson/Lavoie/Courses/2007_ECO6183/reflux-open.pdf.
http://aix1.uottawa.ca/~robinson/Lavoie/...
, 2003LAVOIE, Marc. Interest parity, risk premia, and Post Keynesian analysis. Journal of Post Keynesian Economics, v. 25, n. 2, p. 237-250, 2003., 2014LAVOIE, Marc. Post-Keynesian economics: new foundations. United Kingdon: Edward Elgar Publishing, 2014.). A UIP pode ser criticada teoricamente a partir de três pilares no caso da taxa de câmbio flutuante. Essa discussão teórica ultrapassa o escopo deste artigo, porém, exporemos brevemente estes argumentos apenas para fundamentar a interpretação dos resultados encontrados.

O primeiro pilar diz respeito ao fato da taxa de juros ser exógena em uma economia aberta, no sentido de ser fixada autonomamente pela autoridade monetária (AM) sem que mecanismos automáticos de mercado alterem essa taxa. Mesmo no caso da taxa de câmbio fixa, não existe mecanismo de ajuste via oferta de moeda, pois com o princípio do refluxo a esterilização ocorre automaticamente pela ação dos agentes privados dada a taxa de juros fixada pelo Banco Central (Lavoie, 2001LAVOIE, Marc. The reflux mechanism and the open economy. In: Louis-Philippe ROCHON and Matias VERNENGO (Ed.). Credit, interest rates and the open economy: essays in the horizontalist tradition. p. 215, 2001. Disponível em: http://aix1.uottawa.ca/~robinson/Lavoie/Courses/2007_ECO6183/reflux-open.pdf.
http://aix1.uottawa.ca/~robinson/Lavoie/...
).

O segundo ponto de crítica é o da substituição imperfeita entre os ativos no mercado internacional de capital, uma vez que o teorema da paridade descoberta de juros tem como hipótese a substituição perfeita entre os ativos de diferentes países. É devido a este pressuposto que uma elevação na taxa doméstica de juros em relação à externa (já incluído o prêmio de risco) geraria um fluxo infinito de capitais. Estes cessariam apenas com o retorno à condição de equilíbrio da paridade descoberta. Este é um pressuposto pouco realista mesmo no âmbito dos modelos neoclássicos de escolha entre ativos, como apontou Lavoie (2003LAVOIE, Marc. Interest parity, risk premia, and Post Keynesian analysis. Journal of Post Keynesian Economics, v. 25, n. 2, p. 237-250, 2003., p. 238).

O terceiro pilar é relativo às expectativas cambiais endógenas, conforme argumentado na subseção 5.1 a seguir. Com base nestes três pilares pode-se argumentar que a AM tem a capacidade de determinar suas taxas de juros e que um aumento do diferencial de juros exerce um efeito apreciativo na taxa de câmbio. Desta forma, existe um canal pelo qual a AM é capaz de influenciar a taxa de câmbio ou pelo menos indicar para os agentes uma possível tendência para o câmbio ao elevar o rendimento dos títulos denominados em moeda doméstica.

4.1 A interpretação do coeficiente beta e o papel das expectativas

Vimos que os testes UIP segundo a equação (5) verificam duas hipóteses ao mesmo tempo: a paridade descoberta e também a hipótese de que as expectativas cambiais são forward looking (e racionais) e aparecem da seguinte forma:

s t + 1 s i = α + β ( i t i t * ) + ε t (5)

Em que a condição para a validade da paridade descoberta é dada por ( = 0 e β = 1. Assim, um parâmetro ( negativo indica que um diferencial de juros positivo leva a uma apreciação da taxa de câmbio nominal:

s t + 1 s t < 0 (11)

Para Marey (2004MAREY, Philip S. Uncovered interest parity tests and exchange rate expectations. The Netherlands: Maastricht Research School of Economics of Technology and Organizations (METEOR), 2004.) os parâmetros positivos ou negativos da paridade descoberta estão relacionados com o tipo de expectativa cambial assumida. Desta forma, é importante perceber que a hipótese de expectativas racionais é fundamental para o funcionamento da relação acima.

De uma maneira estilizada, a especificação da UIP com expectativas endógenas simples (ou bandwagon) é a seguinte:

s t + 1 e = s t 1 (12)

s t 1 s t = ( i t i t * ) (13)

s t s t 1 = ( i t i t * ) (14)

Vários estudos empíricos questionaram a validade desta hipótese. Frenkel e Froot (1987FRANKEL, Jeffrey A.; FROOT, Kenneth A. Using survey data to test some standard propositions regarding exchange rate expectations. The American Economic Review, v. 77, n. 1, 1987.) avaliam diversas regras de formação de expectativas cambiais, a partir de três pesquisas realizadas junto a agentes dos mercados de câmbio. Os autores realizam testes para determinar a forma específica das expectativas, com o intuito de saber se estas são estabilizadoras ou desestabilizadoras.

Os autores notam que em trabalhos mais antigos como Branson, Halttunen e Masson (1977BRANSON, William H.; HALTTUNEN, Hannu; MASSON, Paul. Exchange rates in the short run: The dollar-dentschemark rate. European Economic Review, v. 10, n. 3, p. 303-324, 1977.) muitas vezes eram adotadas expectativas estáticas, ou seja, a taxa de câmbio esperada para o próximo período é igual ao último valor observado e afirmam que esta é uma simplificação radical e incorreta. Entretanto, ela parece bastante razoável uma vez que estudos empíricos identificam um comportamento semelhante a um passeio aleatório nas taxas nominais de câmbio (Mussa, 1984MUSSA, Michael L. The theory of exchange rate determination. In: BILSON, John F. O.; MARSTON, Richard C. (Ed.). Exchange rate theory and practice. Chicago: Chicago University Press, 1984. p. 13-78., p. 15).

Frenkel e Froot concluem que as expectativas não são estáticas e tampouco que são do tipo bandwagon (isto é, dado uma valorização passada os agentes esperam uma posterior valorização cambial no futuro). Sua evidência, para moedas de países desenvolvidos entre 1976 e 1985, favorece expectativas que revertem à tendência observada anteriormente, concluindo, portanto, que as expectativas cambiais são estabilizadoras. Moosa (2004MOOSA, Imad A. An empirical examination of the Post Keynesian view of forward exchange rates. Journal of Post Keynesian Economics, v. 26, n. 3, p. 395-418, 2004.), por outro lado, encontra evidências de que as expectativas cambiais são ‘extrapolativas’ no curto prazo e estabilizadoras no médio prazo:

This means that if a currency is appreciating then it should continue to appreciate in the near future (in the short-term) and to depreciate after (in the medium term) (Moosa, 2004MOOSA, Imad A. An empirical examination of the Post Keynesian view of forward exchange rates. Journal of Post Keynesian Economics, v. 26, n. 3, p. 395-418, 2004., p. 449).

Engel e Hamilton (1989ENGEL, Charles; HAMILTON, James D. Long swings in the exchange rate: are they in the data and do markets know it? Cambridge, MA: National Bureau of Economic Research, 1989.), por sua vez, verificam que taxas de câmbio contra o dólar americano, nas décadas de 1970 e 1980, estavam sujeitas a flutuação em ciclos longos (long swings). São identificados três períodos onde a taxa do dólar contra francos, libras e marcos seguiram uma tendência por um longo período de tempo. Há uma tendência de depreciação do dólar americano na segunda metade da década de 1970 que é seguida de um longo período de apreciação após a elevação das taxas de juros no período Reagan/Volcker que se reverte em uma nova tendência de depreciação que se estende de meados de 1984 até o final da amostra em 1987. Estes resultados não só contradizem o consenso prévio de que as taxas nominais de câmbio seguiam um passeio aleatório como demonstra que estratégias de carry trade seguidoras da tendência, ou seja, expectativas cambiais endógenas, são lucrativas, exceto nos períodos de reversão das tendências.

Spronk et al. (2013SPRONK, Richard; VERSCHOOR, Willem F. C.; ZWINKELS, Remco C. J. Carry trade and foreign exchange rate puzzles. European Economic Review, v. 60, p. 17-31, 2013.) introduzem três tipos de agentes formadores de expectativas: os fundamentalistas, os grafistas e os carrytraders. Os fundamentalistas têm expectativas exógenas, enquanto os grafistas olham para a variável no passado. Já os carrytraders especulam contra o UIP, ou seja, esperam que altas taxas de juros levam à apreciação da moeda doméstica. Suas simulações permitem explicar o parâmetro negativo da UIP devido a interação entre grafistas e carry traders: “Given that interest rate differentials are persistent, carry traders introduce momentum effects in a currency that is picked up and extrapolated by chartists. Hence, it is only due to the existence of chartists that carry traders can have such a profound effect on foreign exchange markets.”

Dessa forma, parece razoável, do ponto de vista empírico, assumir que as expectativas do câmbio no futuro são efetivamente endógenas e dependem, até certo ponto, dos valores passados desta variável.

Incorporando uma expectativa cambial que olha para a taxa de câmbio ocorrida no passado, os resultados do coeficiente negativo passam a mostrar tão somente que, se um país fixar um diferencial de juros positivo em relação à taxa de juros internacional, ele deve em geral experimentar uma valorização de sua taxa de câmbio nominal (justamente o contrário do obtido com expectativas forward looking).

4.2 A interpretação do coeficiente beta nos diferentes regimes

Se a presença de um coeficiente negativo parece ser mais condizente com o funcionamento normal da relação entre taxa de câmbio e diferencial de juros em um país, como justificar a presença de coeficientes positivos, encontrados nesse trabalho para períodos de maior volatilidade?

Segundo Serrano e Summa (2015SERRANO, F.; SUMMA, R. Mundell-Fleming without the LM curve: the exogenous interest rate in an open economy. Review of Keynesian Economics, v. 3, n. 2, 2015.) é possível que, em uma situação de fuga de capitais, se observe um movimento simultâneo de perda de reservas internacionais e elevação de juros. Isso ocorre por conta de expectativas backward looking, que projetam a situação ocorrida no passado para o presente. Esse resultado pode ser bastante instável e processos de depreciação cambial contínua (e não apenas uma mudança once and for all) podem ocorrer. Essas possibilidades de especulação com a moeda doméstica fazem com que a reação do BC, para evitar esse tipo de instabilidade, seja a de aumentar o diferencial de juros. Este seria um exemplo de uma restrição imposta à atuação da AM pela posição de sua moeda no sistema financeiro internacional. É comum que, frente a um grande aumento da percepção mundial de risco- como, por exemplo, durante a crise financeira mundial iniciada em 2008 -- ou em situações de crise cambial em um país próximo (contagion), investidores optem por retirar seus investimentos de países periféricos de maneira abrupta, investindo em títulos de menor risco, como os americanos. Deve-se notar, contudo, que este não é um mecanismo automático. A elevação da taxa básica de juros em um evento deste tipo é uma decisão da AM.

Assim, ainda que a AM determine autonomamente sua taxa de juros, enfrenta restrições de acordo com o papel de sua moeda no sistema financeiro mundial e as condições gerais de liquidez internacional e das contas externas domesticas. Dessa forma, há uma assimetria neste nexo entre juros e câmbio. Países que não tem a possibilidade de saldar sua dívida externa na própria moeda estão sujeitos à restrição externa. Esta situação é especialmente comum em economias periféricas e é geralmente antecipada por fugas de capitais.

Consequentemente, não só é possível como é comum um BC que não emite a moeda mundial estabelecer sua taxa básica acima da taxa internacional, a fim de atrair capitais e valorizar sua moeda. Seria extremamente imprudente, ao menos no caso de países periféricas, estabelecer um diferencial de juros negativo ou mesmo um diferencial suficientemente pequeno para que os títulos se tornem pouco atrativos para investidores estrangeiros, considerando o risco soberano percebido. A consequência natural de tal ação seria uma acelerada fuga de capitais e brusca desvalorização cambial.

Também é relevante notar que a percepção de risco global, como a causada no início da crise financeira mundial, por exemplo, afeta significativamente os fluxos internacionais de capitais. Fugas de capitais ou a parada brusca dos influxos de capitais estrangeiros (suddenstops) estão diretamente ligadas a episódios de desvalorização cambial (Forbes; Warnock, 2012FORBES, Kristin J.; WARNOCK, Francis E. Capital flow waves: surges, stops, flight, and retrenchment. Journal of International Economics, v. 88, n. 2, p. 235-251, 2012., p. 4).

Assim, a alternância de elasticidades negativas e positivas em tempos de estabilidade e instabilidade, respectivamente, também pode ser interpretada à luz da abordagem da taxa de juros exógena da seguinte forma: a associação positiva entre juros e câmbio decorre de uma opção deliberada da autoridade monetária com objetivo de evitar ou mitigar a saída de capitais durante crises cambiais. A elevação dos juros seria assim uma resposta defasada à desvalorização do câmbio. Já a relação negativa é decorrente da operação do mecanismo juros - câmbio em ambiente estável, em que um diferencial de juros (já incluído o spread) levaria a uma valorização na moeda pela entrada de fluxos de capitais.

Considerações finais

Este artigo teve o intuito de avaliar a paridade descoberta de juros no Brasil entre 2000 e o início de 2014. Tendo em vista a natureza dos dados de câmbio e diferencial de juros para economias periféricas, em particular o Brasil, foi necessário utilizar diferentes métodos econométricos para alcançar nossos diferentes objetivos.

Uma primeira conclusão dessa investigação é que os resultados encontrados estão de acordo com uma vasta quantidade de trabalhos empíricos para o teorema da paridade descoberta em vários países do mundo, ao encontrar a falha empírica desta relação, expressa nos coeficientes significativamente diferentes da unidade estimados para o diferencial de juros. Mais especificamente, os modelos indicaram uma relação negativa entre a variação da taxa de câmbio e o diferencial de juros para os dados da economia brasileira.

O resultado de UIP Failure encontrado para o período de 2000 a 2014 coloca em dúvida a relevância prática de modelos para determinação das variações cambiais que tem a UIP como referência teórica. Como estes modelos dependem de uma série de hipóteses sobre o funcionamento perfeito dos mercados internacionais de capitais, nos parece mais plausível que haja uma relação entre diferencial de juros e variação cambial que pode ser explorada em períodos de maior estabilidade externa. A percepção de que os mercados internacionais de capitais não são perfeitos junto com expectativas cambiais backward looking e sua possível instabilidade fazem com que intervenções do Banco Central sejam a regra e não exceção (Steiner, 2015STEINER, Andreas. Central banks and macroeconomic policy choices: Relaxing the trilemma. Journal of Banking & Finance, 2015.) e que estas sejam importantes tanto para a definição do diferencial de juros (Serrano e Summa, 2015SERRANO, F.; SUMMA, R. Mundell-Fleming without the LM curve: the exogenous interest rate in an open economy. Review of Keynesian Economics, v. 3, n. 2, 2015.) quanto para a própria definição da variação cambial.

O segundo ponto deste artigo é entender porque, ainda que estes resultados estejam em linha com a evidência empírica internacional, eles contradizem estudos que encontram uma elasticidade ‘variação do câmbio’ - ‘diferencial de juros’ levemente positiva para a UIP em países periféricos. Uma possível explicação para esta contradição foi apresentada pelas nossas estimações de modelos de alternância de regimes. Em momentos que um país emergente como o Brasil apresenta grande volatilidade de taxa de câmbio, em geral associado a problemas externos, os coeficientes estimados são positivos, e geralmente acima de um, e quando passa por momentos de estabilidade, o coeficiente se torna negativo e os resultados mais condizentes com os testes de paridade descoberta para países desenvolvidos. É importante notar que evidências semelhantes foram encontradas por Clarida, Davis e Pedersen (2009CLARIDA, Richard; DAVIS, Josh; PEDERSEN, Niels. Currency carry trade regimes: beyond the Fama regression. Journal of International Money and Finance, v. 28, n. 8, p. 1375-1389, 2009.).

Interpretamos esses resultados de alteração do sinal do coeficiente do diferencial de juros em períodos de volatilidade distintos da seguinte maneira: quando há relativa estabilidade nas contas externas do país e na economia mundial, um aumento do diferencial de juros implica em entrada de capitais e valorização cambial, portanto o resultado negativo do coeficiente faz sentido; por outro lado, em períodos de instabilidade nas contas externas do país, fuga de divisas e rápida desvalorização cambial, a autoridade monetária tenta evitar ou mitigar a saída de capitais manipulando o diferencial de juros, levando a um coeficiente positivo entre variação cambial e diferencial de juros.

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  • 28
    JEL F41, E44, F31, F62.
  • 1
    Que é o caso de maior interesse neste trabalho empírico, tendo em vista que no Brasil não houve câmbio fixo de 2000 a 2014, ainda que tenhamos tido uma flutuação suja com grande acumulação de reservas.
  • 2
    Diversos artigos de referência sobre a validade empírica da paridade descoberta da taxa de juros adotam a variação efetiva da taxa de câmbio como aproximação da expectativa de desvalorização cambial, como por exemplo, Cumby e Obstfeld (1984CUMBY, Robert E.; OBSTFELD, Maurice. International interest-rate and price-level linkages under flexible exchange rates: a review of recent evidence. In: BILSON, John F. O.; MARSTON, Richard C. (Ed.). Exchange rate theory and practice. Chicago: Chicago University Press, 1984, p. 121-152.) e Fama (1984FAMA, Eugene F. Forward and spot exchange rates. Journal of Monetary Economics, v. 14, n. 3, p. 319-338, 1984.). Em seu livro, McCallum (1996MCCALLUM, Bennett T. A reconsideration of the uncovered interest parity relationship. Journal of Monetary Economics, v. 33, n. 1, p. 105-132, 1994.) esclarece que uma das possíveis causas da falha da UIP é a ausência de expectativas racionais, o que implica diretamente que a hipótese de expectativas racionais é assumida nos testes empíricos da UIP. O mesmo questionamento é feito por Marey (2004MAREY, Philip S. Uncovered interest parity tests and exchange rate expectations. The Netherlands: Maastricht Research School of Economics of Technology and Organizations (METEOR), 2004.).
  • 3
    Muitas vezes é suposto que os agentes acreditam na validade da PPP (paridade do poder de compra da taxa de câmbio), para fechar modelos teóricos e chegar na equação de paridade real da taxa de juros (ver Lavoie, 2000LAVOIE, Marc. A post Keynesian view of interest parity theorems. Journal of Post Keynesian Economics, p. 163-179, 2000.) ou quando tal equação é utilizada para testes empíricos em geral é simplesmente assumido que os agentes acertam a taxa de câmbio nominal na média.
  • 4
    Neste artigo, optamos por não utilizar este método pois estamos interessados exclusivamente na paridade descoberta. Em outro trabalho, argumentamos que existe suporte empírico para a paridade coberta da taxa de juros Covered Interest Parity, justificada pela visão cambista, que afirma que a taxa de câmbio a termo é determinada diretamente pelo custo incorrido por instituições financeiras para entrega futura de divisas a seus clientes (ver Cieplinski; Braga; Summa, 2017CIEPLINSKI, A.; BRAGA, J; SUMMA; R. Avaliação empírica do teorema da paridade coberta de juros para a economia brasileira (2008-2013). Nova Economia, Belo Horizonte, 2017.forthcoming).
  • 5
    Libras esterlinas, marcos alemães, francos suíços, dólares canadenses e ienes japoneses.
  • 6
    São elas: dólares americanos, marcos alemães, ienes japoneses, francos franceses, lira italiana e guilder holandês contra libras esterlinas e dólares americanos.
  • 7
    Fully Modified Ordinary Least Squares (Phillips; Hansen, 1990PHILLIPS, P.; HANSEN, B. Statistical inference in instrumental variables regression with I (1) processes. Review of Economic Studies, v. 57, p. 99-125, 1990.).
  • 8
    Uma das hipóteses implícitas é que os agentes retêm estes títulos até sua maturidade.
  • 9
    Entre os periféricos constam Malásia, Hong Kong, Índia, Coréia do Sul, Filipinas, Arábia Saudita e Singapura.
  • 10
    Para mais informações sobre as estratégias de carry trade e sobre o uso extensivo deste tipo de operação em diversos mercados ver Rossi (2010ROSSI, Pedro. O mercado internacional de moedas, o carry trade e as taxas de câmbio. Observatório da Economia Global, [s.e: s.l] 2010.), Carneiro e Rossi (2012CARNEIRO, Ricardo; ROSSI, Pedro. The Brazilian experience in managing the interest-exchange rate nexus. In: BRESSER-PEREIRA; KREGEL; BURLAMAQUI (Ed.). Financial stability and growth: perspectives on financial regulation and new developmentalism. Abingdon, UK: Routledge, 2014. p. 194.) e Galatti (2007GALATTI, Gabriele; HEATH, Alexandra; MCGUIRE, Patrick. Evidence of carry trade activity. BIS Quarterly Review, v. 3, p. 27-41, 2007.).
  • 11
    Taylor (1995TAYLOR, Mark P. The economics of exchange rates. Journal of Economic Literature, v. 33, n. 1, p. 13-47, 1995.) atesta que tais estratégias frequentemente geram resultados rentáveis, invalidando mais uma vez a paridade descoberta de juros.
  • 12
    Neste caso foi estimada uma rolling regression para obter parâmetros que variam ao longo da amostra.
  • 13
    As observações para as economias periféricas só têm início no começo da década de 1990.
  • 14
    Em um survey, Alper et al. (2009ALPER, C. Emre; ARDIC, Oya Pinar; FENDOGLU, Salih. The economics of the uncovered interest parity condition for emerging markets. Journal of Economic Surveys, v. 23, n. 1, p. 115-138, 2009.) buscam algumas explicações para estes resultados. Segundo os autores é possível que devido aos maiores níveis de inflação países emergentes tenham menor rigidez de preços. Ainda, maiores níveis de inflação causariam uma tendência comum nas taxas de juros e de câmbio. Esta hipótese, no entanto, assume que tanto as taxas de juros quanto o câmbio são de alguma forma determinados pela inflação interna, como na exposição de Frenkel (1976FRENKEL, Jacob A. A monetary approach to the exchange rate: doctrinal aspects and empirical evidence. The Scandinavian Journal of Economics, p. 200-224, 1976.). Esta teoria é bastante controversa, pois nega a exogeneidade da determinação dos juros e também depende do funcionamento da PPP. Frenkel e Poonawala (2010FRANKEL, Jeffrey; POONAWALA, Jumana. The forward market in emerging currencies: less biased than in major currencies. Journal of International Money and Finance, v. 29, n. 3, p. 585-598, 2010.) propõe uma explicação mais razoável. Primeiro eles notam que o resultado mais favorável à UIP nos emergentes é um indício de que a explicação do forwardpremium puzzle por um prêmio de risco variável, proposta por Fama (1984FAMA, Eugene F. Forward and spot exchange rates. Journal of Monetary Economics, v. 14, n. 3, p. 319-338, 1984.), é incorreta uma vez que mercados emergente são evidentemente mais arriscados do que os desenvolvidos. Em seguida eles atribuem o resultado da UIP em países emergentes a uma maior previsibilidade de tendências de desvalorização de suas moedas.
  • 15
    Adicionalmente, o VAR estimado não rejeita a auto correlação serial dos resíduos ao nível de 10% no teste LM.
  • 16
    Séries de código 1 e 10813do SGS/BCB.
  • 17
    Série 12 SGS/BCB.
  • 18
    Como os dados em sua fonte original (FRED/ St. Louis FED) estão anualizados, foi necessária dividir por 360.
  • 19
    O EMBI+ é elaborado pelo J.P. Morgan, mas a séries com os valores diários, em basis points, pode ser obtida em www.ipeadata.gov.br.
  • 20
    Destacamos ainda que é especialmente difícil especificar de uma forma homogênea, utilizando apenas uma taxa doméstica e outra externa, os retornos reais obtidos pelos participantes de um mercado. Aplicações em taxas de juros externas podem ocorrer por períodos diferentes e em ativos diferentes, geralmente concentradas em prazos mais curtos. Galatti, Heath e McGuire (2007GALATTI, Gabriele; HEATH, Alexandra; MCGUIRE, Patrick. Evidence of carry trade activity. BIS Quarterly Review, v. 3, p. 27-41, 2007.), por exemplo, ilustram a complexidade de se identificar precisamente os impactos do carry trade devido à dificuldade de isolar os fluxos específicos para este tipo de operação.
  • 21
    Apresentamos os testes realizados apenas com o intercepto na regressão de teste, pois não há motivo para supor que alguma das variáveis tenha uma clara tendência ao longo do tempo.
  • 22
    O intervalo de confiança de 95% do coeficiente está entre -5.18 e -0.70. Apenas um intervalo de confiança de 99% entre -5.89 e 0.02 apresenta a possibilidade de um parâmetro positivo muito próximo de zero.
  • 23
    Os modelos econométricos com alternância de regime remontam à Hamilton (1989HAMILTON, James D. A new approach to the economic analysis of nonstationary time series and the business cycle. Econometrica: Journal of the Econometric Society, p. 357-384, 1989., 1994HAMILTON, James Douglas. Time series analysis. Princeton: Princeton University Press, 1994.). A partir da ideia de permitir que o modelo dependa do estado da economia é possível estimar uma equação na qual as mesmas variáveis macroeconômicas tenham impactos diferentes sobre o nível de atividade da economia em dois regimes de recessão e expansão, por exemplo. A especificação de cada um dos regimes é linear, mas a probabilidade de transição entre eles se dá por meio de uma cadeia de Markov, resultando em um modelo não linear estimado por métodos numéricos de máxima verossimilhança. As equações dinâmicas com alternância de regimes markovianos nesta seção foram estimadas no pacote PcGive 13 para OxMetrics. O Método de estimação utilizado é o de Programação Quadrática Sequencial Factível (SQPF) padrão do Software. A mudança de regimes é estimada por uma variável aleatória discreta não observada (μt ), descrita por uma cadeia de Markov para a qual são computadas as probabilidades de transição. No caso de dois regimes (0 e 1), temos probabilidades de transição que dependem do estado da economia no período anterior.
  • 24
    As siglas são para MarkovSwitching (MS) em I (intercepto), M (médias) e H (heterocedasticidade). Ver Krolzig (1998KROLZIG, Hans-Martin. Econometric modelling of Markov-switching vector autoregressions using MSVAR for Ox. 1998. Disponível em: http://fmwww.bc.edu/ec-p/software/ox/Msvardoc.pdf.
    http://fmwww.bc.edu/ec-p/software/ox/Msv...
    ).
  • 25
    Em geral a alternância de regimes no parâmetro do EMBI+ parece afetar negativamente as propriedades dos resíduos e também a transição entre os regimes que se torna muito frequente pouco passível de uma interpretação econômica. A alternância na variância tem o efeito oposto, resultando em resíduos bem comportados.
  • 26
    Nos dois modelos expostos na Tabela 5, a alternância de coeficientes da variância parece dar conta da heterocedasticidade condicional dos dados, antes modelada via GARCH. Por outro lado, os coeficientes estimados do diferencial de juros são menos significantes no regime de menor volatilidade cambial em ambos os modelos.
  • 27
    Apesar deste resultado restrito à alta volatilidade, combinado com βs geralmente negativos para a amostra inteira e também para os períodos de baixa volatilidade os autores dão a entender que esta seria uma evidência em favor da UIP.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2017

Histórico

  • Recebido
    18 Mar 2015
  • Aceito
    22 Fev 2017
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