Acessibilidade / Reportar erro

Instituições financeiras de desenvolvimento regional e os desafios do Sistema Nacional de Fomento

Regional development financial institutions and the challenges of the national development financial system

Resumo

Este artigo aborda os desafios enfrentados pelas Instituições Financeiras de Desenvolvimento Regional (IFDRs) no Brasil, sugerindo algumas condições para a melhora no financiamento de longo prazo. O artigo destaca a importância do Sistema Nacional de Fomento, traça um breve histórico das instituições financeiras de desenvolvimento brasileiras, aponta limitações a serem superadas e condições para que as IFDR assumam um papel mais efetivo no desenvolvimento nacional. As proposições de política pública voltadas ao fortalecimento das instituições regionais expressam o conteúdo dos debates mantidos no âmbito da Associação Brasileira de Desenvolvimento, o principal fórum de representação das instituições de fomento.

Palavras-chave:
ABDE; Sistema Nacional de Fomento; Sistema Financeiro Nacional; Instituições Financeiras de Desenvolvimento; Instituições Financeiras de Desenvolvimento Regional; Agência de Desenvolvimento; Banco de Desenvolvimento; Desenvolvimento

Abstract

This paper addresses the challenges faced by the Regional Development Financial Institutions (RDFI) in Brazil, assessing both the dilemmas and the conditions for the improvement of long-term financing in the country. Propositions for public policy aimed at strengthening the regional institutions, which is the main focus of the paper, express the contents of the debates held at the Brazilian Development Association, the development institutions’ forum. The paper highlights the importance of the National System of Development Financial Institutions, traces a brief history of the Brazilian RDFI to the present day, and points out both limitations to be overcome and conditions for the regional DFI to assume a more effective role in national development.

Keywords:
ABDE; National System of Development Finance; National Financial System; Development Financial Institutions; Regional Development Financial Institutions; Development Agency; Development Bank; State-owned banks; Development

Introdução

Este artigo trata dos desafios enfrentados pelas Instituições Financeiras de Desenvolvimento (IFDs) no Brasil. Insere-se na temática mais ampla dos problemas de financiamento ao desenvolvimento econômico, com ênfase no crédito de longo prazo para o investimento e a inovação. De modo específico, o artigo debruça-se sobre aquelas IFDs cujo escopo de atuação é marcadamente regional, abrangendo, no caso, as Agências de Fomento (AFs) e os Bancos de Desenvolvimento controlados por estados da federação (BDs).

Em larga medida, o texto reflete o conteúdo de debates travados na Associação Brasileira de Desenvolvimento (ABDE) nos últimos anos1 (1) A elaboração deste artigo não seria possível sem o apoio institucional da ABDE e os comentários esclarecedores de Marco Antonio Albuquerque de Araujo Lima, seu Secretário-Executivo, e de Cristiane Viturino, Gerente Técnico-Operacional, a quem manifestamos nosso profundo agradecimento, isentando-os dos erros e omissões praticados pelos autores. Assinalamos, ainda, que o texto não deve ser considerado um documento oficial da Associação. . Fundada em 1969, a ABDE é o fórum associativo das IFDs, atuando, sobretudo, como interlocutor dos associados junto ao Banco Central do Brasil (BCB) e a órgãos do governo federal e na formação de seus quadros técnicos e gerenciais. Em período recente, a ABDE intensificou a promoção de estudos e debates sobre os desafios colocados a uma inserção mais efetiva das IFDs no desenvolvimento econômico regional, disto resultando a proposição de uma agenda para o fortalecimento do Sistema Nacional de Fomento (SNF) (ABDE, 2013ABDE. Carta ABDE. Rio de Janeiro: ABDE, 2013.)2 (2) O SNF congrega as instituições que têm em seu escopo a missão de promover o desenvolvimento sustentável, especialmente por meio do crédito de longo prazo e apoio técnico. No Brasil, essas instituições compreendem os cinco Bancos Públicos Federais - Banco do Brasil, Caixa, BNDES, Banco do Nordeste e Banco da Amazônia; três Bancos de Desenvolvimento controlados por unidades da federação - Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes), Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais (BDMG) e Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE); cinco Bancos Públicos Comerciais Estaduais com carteira de desenvolvimento - Banco do Estado do Pará (Banpará), Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul), Banco de Brasília (BRB), Banco do Estado de Sergipe (Banese) e Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes); 16 Agências de Fomento - dos estados do Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Goiás, Mato Grosso, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Roraima, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins; os bancos cooperativos; a Finep-Inovação e Pesquisa; e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). .

A história da ABDE confunde-se com as idas e vindas das próprias IFDs. Criada durante o ciclo industrializante da economia brasileira, a ABDE vivenciou mudanças profundas em decorrência da crise fiscal dos anos 1980 e, principalmente, das políticas de redução da presença do setor público na atividade bancária levadas a cabo nos anos 1990. Não obstante, o espaço da Associação voltou a ser requisitado para o debate de questões sobre o financiamento de longo prazo, bem como sobre a atuação das IFDs, no início dos anos 2000, a partir do surgimento das AFs em diversas unidades da federação, e, de forma ainda mais pronunciada, em virtude do papel anticíclico dessas instituições no auge da crise financeira que se iniciou em 2007-2008.

O maior ativismo das IFDs nos anos 2000 deu vez a uma crescente literatura com foco nos Bancos Públicos Federais3 (3) Ver, dentre outros, Araújo e Cintra (2011); Araújo (2012); Prates e Freitas (2013); Paula e Marques (2006): Nogueira da Costa (2015); Jayme Jr. e Crocco (2010) e Hermann (2011) , a qual trata de revisar marcos teóricos que justificam a ação de instituições financeiras públicas, notadamente aquelas voltadas ao financiamento da formação de capital fixo, e de caracterizar sua atuação nos anos que se seguiram ao início da crise financeira. Não obstante, as Instituições Financeiras de Desenvolvimento Regionais (IFDRs) ainda carecem de um tratamento mais aprofundado acerca de sua atuação corrente, de seus desafios e de suas potencialidades. Tendo em vista esta lacuna na literatura, o presente artigo tem por objetivo analisar o desempenho das IFDRs brasileiras, identificando seu escopo de atuação, apresentando indicadores recentes de performance e sistematizando seus principais dilemas e as condições para a melhora de sua atividade como parte do fortalecimento do aparelho de financiamento de longo prazo no Brasil. Trata-se, neste sentido, de estudo empírico que avança sobre questões operacionais prementes de política pública, ancorado em ensaios teóricos que sustentam a relevância das IFDs públicas para o desenvolvimento nacional, os quais são referidos de modo breve em face da natureza do presente texto.

O artigo está dividido em seis partes, incluída esta introdução. A primeira seção aborda as razões para a existência de IFDs. A segunda trata da formação dos bancos públicos com função de fomento, englobando os períodos de apogeu, reestruturação, declínio e recuperação. Os novos integrantes do SNF, frutos da reestruturação dos anos 1990 - Agências de Fomento - e os Bancos de Desenvolvimento Estaduais remanescentes são objeto da terceira seção. A quarta seção ocupa-se dos entraves a superar com o intuito de fortalecer as IFDRs e ampliar a efetividade de sua atuação. Ao final, apresentamos uma síntese a guisa de conclusão.

1 Razões para a existência de instituições financeiras de desenvolvimento

Os Estados Nacionais respondem a desafios oriundos de oportunidades e restrições que surgem nas trajetórias de desenvolvimento dos países. Assim sendo, podemos considerar que a característica das IFDs como instrumento de política pública aproxima as discussões sobre seu papel à problemática geral do papel do próprio Estado (Hermann, 2009HERMANN, Jennifer. Bancos públicos em sistemas financeiros maduros: perspectivas teóriccas e desafios para os países em desenvolvimento. In: II ENCONTRO INTERNACIONAL da Associação Keynesiana Brasileira (AKB), set. 2009, p. 1-20.). O formato institucional dos diversos sistemas financeiros nacionais varia em função de um conjunto de fatores, tais como o grau de desenvolvimento econômico, a evolução desses sistemas financeiros nacionais, a configuração jurídica e a tradição de política macroeconômica do país. As experiências históricas na conformação de estruturas econômicas bem-sucedidas, diversificadas e competitivas guardam em comum a participação ativa do Estado na criação de condições favoráveis ao desenvolvimento. O grau de maturação dos sistemas financeiros e sua capacidade de financiar o longo prazo - quer seja por crédito, quer seja por mercados de capitais - são considerados importantes condicionantes para o desenvolvimento econômico. Poucos foram os países que lograram desenvolver os dois mecanismos concomitantemente e em mesmo grau de relevância. Via de regra, observa-se o apoio governamental na concessão de crédito ao setor privado de forma a induzir o crescimento (Cunha; Carvalho; Prates, 2014CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento. Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58.).

As instituições financeiras públicas seguem mantendo participação relevante no total dos ativos bancários no mundo, especialmente nas economias emergentes. O desenvolvimento econômico e o fortalecimento dos sistemas financeiros nacionais não foram acompanhados, necessariamente, do desaparecimento de instituições nacionais de fomento (Cunha; Carvalho; Prates, 2014CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento. Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58.). Assim, a existência de instituições financeiras públicas, notadamente de IFDs, pode ser defendida a partir das diversas funções que executa e das consequências benéficas à atividade econômica. Sem desconhecer as diferentes abordagens teóricas sobre a questão, cujo exame minucioso foge aos limites deste artigo, destacamos as seguintes funções referidas na literatura: (i) mitigar falhas de mercado; (ii) otimizar a oferta de crédito de longo prazo; (iii) financiar projetos de baixa lucratividade que, no entanto, apresentam importantes externalidades positivas; (iv) promover o desenvolvimento econômico e regional; (v) financiar áreas em que o setor privado, tipicamente, não se sente estimulado a financiar; e (vi) promover ações anticíclicas (Hermann, 2009HERMANN, Jennifer. Bancos públicos em sistemas financeiros maduros: perspectivas teóriccas e desafios para os países em desenvolvimento. In: II ENCONTRO INTERNACIONAL da Associação Keynesiana Brasileira (AKB), set. 2009, p. 1-20.; Cunha; Carvalho; Prates, 2014;CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento. Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58. Ferraz; Além; Madeira, 2013FERRAZ, João Carlos; ALÉM; Ana Claudia; MADEIRA, Rodrigo Ferreira. A contribuição dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo. Revista BNDES, 2013. 5-42.; Cavalcanti, 2007CAVALCANTI, Luiz Ricardo. Seis personagens à procura de um autor: a inserção das agências de fomento e dos bancos de desenvolvimento no Sistema Financeiro no Brasil. Desenbahia, p. 7-32, 2007.; Freitas, 2010FREITAS, Maria Cristina Penido de. Dinâmica concorrencial e bancos públicos: questões conceituais. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010.; Stiglitz, 1994STIGLITZ, J. The role of the State in financial markets. The World Bank, 1994.; Jayme Jr.; Crocco, 2010JAYME Jr., Frederico G., e Marco Crocco. “Bancos públicos, federalismo e políticas de desenvolvimento regional no Brasil.” In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 179-204.).

Partindo da abordagem das falhas de mercado, tem-se que a criação de moeda mediante o crédito e a transferência eficiente de recursos dos agentes poupadores para os agentes gastadores encontram-se entre as principais funções do mercado financeiro. Adicionalmente, o sistema financeiro seleciona e monitora projetos de investimento, garante os contratos, administra os riscos do mercado e assegura o bom funcionamento da alocação de recursos. É, por definição, um mercado de elevado risco e altamente dependente de informações, sendo que as instituições financeiras são as mais aptas a obter as informações necessárias para aperfeiçoar suas ações.

Em virtude da assimetria de informações existente entre os agentes econômicos envolvidos em suas operações, o mercado de crédito se sujeita a falhas em seu funcionamento como intermediário financeiro e como criador do poder de compra, essencial ao processo de desenvolvimento e à dinâmica econômica. As informações disponíveis no mercado, apesar de serem melhores do que as dos agentes singulares, não são perfeitas; ao contrário, são assimetricamente distribuídas entre os agentes econômicos. O que leva a um problema:

O racionamento de crédito acontece em razão de uma falha de funcionamento dos mercados financeiros, causada pela existência de informação imperfeita ou assimetria de informações. Ou seja, a assimetria de informações impede que o mercado financeiro funcione de forma eficiente. Parte-se da ideia que os tomadores de recursos (empresários que buscam o crédito) têm mais informações sobre o retorno esperado de seus projetos do que os credores (bancos). Sendo assim, na hipótese de haver uma demanda de crédito maior do que a oferta, o ajuste não seria feito pelo aumento da taxa de juros (Ferraz; Além; Madeira, 2013FERRAZ, João Carlos; ALÉM; Ana Claudia; MADEIRA, Rodrigo Ferreira. A contribuição dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo. Revista BNDES, 2013. 5-42., p. 10-11).

No advento de elevadas taxas de juros, os agentes dispostos a pagar maior prêmio pelo financiamento são, de modo geral, os mais propensos ao risco, o que eleva as chances de default. Isto acarreta que, no mercado de crédito, a oferta (de recursos) não é diretamente proporcional ao aumento do preço (taxa de juros). O fenômeno da atração de tomadores mais propensos ao risco motiva o represamento dos recursos das instituições financeiras; vale dizer, maiores taxas de juros podem gerar maior aversão ao risco do lado da oferta. Assim, é bastante razoável entender que os retornos esperados pelas operações de crédito não são diretamente proporcionais às taxas de juros. Sua própria função, portanto, está associada a falhas estruturais de mercado em razão da assimetria de informações entre os agentes. Informações incompletas, custosas e de difícil obtenção, podem causar problemas de seleção adversa e moral hazard, ou risco moral, que ocorrem antes da transação se completar. A existência de falhas, portanto, impediria o bom funcionamento dos mercados (Cavalcanti, 2007CAVALCANTI, Luiz Ricardo. Seis personagens à procura de um autor: a inserção das agências de fomento e dos bancos de desenvolvimento no Sistema Financeiro no Brasil. Desenbahia, p. 7-32, 2007.; Freitas, 2010FREITAS, Maria Cristina Penido de. Dinâmica concorrencial e bancos públicos: questões conceituais. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010.).

Se, ademais, associarmos o mercado de crédito a incertezas e a agentes que decidem com base em suas expectativas de ganho futuro, podemos admitir que as decisões sobre a oferta de crédito de longo prazo, essenciais ao processo de desenvolvimento econômico, são mais arriscadas do que as da oferta de crédito de curto prazo (Ferraz; Além; Madeira, 2013FERRAZ, João Carlos; ALÉM; Ana Claudia; MADEIRA, Rodrigo Ferreira. A contribuição dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo. Revista BNDES, 2013. 5-42.). Disto decorre que as incompletudes dos mercados se caracterizam, também, por falhas que assolam especialmente os sistemas financeiros de economias em desenvolvimento uma vez que, via de regra, os mercados de capitais e acionários são fracos e os bancos priorizam os empréstimos de curto prazo, especialmente nesses sistemas que ainda não estão completamente desenvolvidos.

Também a experiência histórica atesta a importância das IFDs, particularmente para as estratégias de industrialização adotadas por países da Europa e pelo Japão. Quando os riscos são considerados grandes ou os prazos longos, o mercado privado de crédito deixa de atuar de forma ótima, sendo necessário, portanto, o apoio creditício de instituições públicas (Hermann, 2009HERMANN, Jennifer. Bancos públicos em sistemas financeiros maduros: perspectivas teóriccas e desafios para os países em desenvolvimento. In: II ENCONTRO INTERNACIONAL da Associação Keynesiana Brasileira (AKB), set. 2009, p. 1-20.; Cunha; Carvalho; Prates, 2014CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento. Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58.; Ferraz; Além; Madeira, 2013FERRAZ, João Carlos; ALÉM; Ana Claudia; MADEIRA, Rodrigo Ferreira. A contribuição dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo. Revista BNDES, 2013. 5-42.; Jayme Jr.; Crocco, 2010JAYME Jr., Frederico G., e Marco Crocco. “Bancos públicos, federalismo e políticas de desenvolvimento regional no Brasil.” In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 179-204.).

Nota-se ainda que o setor privado não tem interesse naqueles projetos que combinam baixo retorno privado e alto risco, independentemente das externalidades ou do retorno social dos projetos. Ou seja, a própria realidade do sistema financeiro contribui para sua “incompletude”. Em consequência, o financiamento do desenvolvimento, que requer prazos maiores e outras condições normalmente associadas a maior risco e/ou menor retorno, tende a ser o mais atingido. Assim,

(...) existência de setores/projetos de investimento que requerem financiamento, mas que inspiram alta incerteza quanto a seu sucesso futuro e, por isso, são preteridos pelo sistema financeiro privado em detrimento de setores/projetos de investimento cujos resultados esperados sejam menos incertos. São setores/projetos altamente complexos e comumente dispendiosos, que exigem expertise sofisticada para avaliação, podem gerar impactos positivos em toda a economia (externalidades positivas) e/ou nos quais prevalecem os retornos sociais sobre os retornos privados. [...]. Esse tipo de situação é observável tanto em países desenvolvidos quanto naqueles em desenvolvimento e pode ocorrer em momentos de estabilidade econômica (Ferraz; Além; Madeira, 2013FERRAZ, João Carlos; ALÉM; Ana Claudia; MADEIRA, Rodrigo Ferreira. A contribuição dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo. Revista BNDES, 2013. 5-42., 14, grifos nossos).

As incompletudes no mercado de crédito geram, da mesma forma, lacunas ao financiamento de determinados segmentos, especialmente aqueles que demandam crédito de longo prazo, e criam impedimentos à redução de desigualdades regionais, setoriais e sociais. Mesmo que o retorno social do financiamento ao setor produtivo tenha impacto apreciável, este pode não ocorrer se não for justificado pelo retorno privado que as instituições financeiras tendem naturalmente a priorizar (Stiglitz, 1994STIGLITZ, Joseph. The role of the state in financial markets. World Bank, 1994.).

As economias regionais ou subnacionais diferenciam-se entre si segundo inúmeros aspectos, dentre os quais o acesso ao crédito. As instituições financeiras privadas tendem a disponibilizar maior oferta de crédito a regiões que apresentam maior grau de desenvolvimento econômico, normalmente associadas a menores incerteza e preferência pela liquidez, o que reforça o processo cumulativo das desigualdades regionais. Esta tendência natural do sistema financeiro gera um efeito concentrador no que se refere ao crédito, tornando-se um instrumento estimulador dos desequilíbrios regionais, justamente por uma característica própria do desenvolvimento, segundo a qual a conglomeração urbana determina uma maior concentração de instituições financeiras e de oferta de crédito e um maior grau de sofisticação dos serviços oferecidos (Jayme Jr.; Crocco, 2010JAYME Jr., Frederico G., e Marco Crocco. “Bancos públicos, federalismo e políticas de desenvolvimento regional no Brasil.” In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 179-204.). As IFDs, especialmente as de caráter regional, podem ajudar a romper este círculo vicioso em vista de sua integração com a economia local e do seu mandato na promoção do desenvolvimento sustentável regional, incentivando a oferta de crédito local e aumentando a capilaridade do sistema financeiro de modo a contrastar os efeitos deletérios da concentração bancária. Especificamente, as Instituições Financeiras de Desenvolvimento Regional servem aos estados controladores como instrumentos de suas políticas de desenvolvimento.

O desenvolvimento econômico está intimamente ligado ao desenvolvimento de sistemas financeiros articulados e complexos, pois a canalização dos recursos em financiamentos ao investimento produtivo é condição sine qua non ao sucesso deste processo. As falhas inerentes ao funcionamento dos sistemas financeiros e a importância capital deste mercado para o processo de desenvolvimento econômico são fortes motivos que justificam a existência de instituições financeiras públicas voltadas para o desenvolvimento sustentável.

Há formas de o Estado intervir que podem tornar o mercado financeiro mais eficiente e, por conseguinte, melhorar o desempenho da economia (Stiglitz, 1994STIGLITZ, J. The role of the State in financial markets. The World Bank, 1994., Hermann, 2010HERMANN, Jenifer. Desenvolvimento financeiro e concorrência privada: desafios para a funcionalidade macroeconômica dos bancos públicos. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 233-257.). A atuação direta do Estado por meio de Instituições Financeiras de Desenvolvimento e de sua possível articulação sistêmica, por sua vez, pode aumentar a disponibilidade de crédito para a economia em geral e, especificamente, para aqueles setores que, não obstante o poder multiplicador e seu alcance na promoção da mudança estrutural requerida pelo desenvolvimento econômico, sujeitam-se à escassez de crédito quando deixados exclusivamente às considerações de risco e retorno privados. Considerando a presença de IFDs, os investimentos planejados pelos Estados, no âmbito de políticas de desenvolvimento, não se restringem àqueles realizados diretamente pelas Administrações Públicas, cujo financiamento depende de recursos fiscais e/ou emissão de dívida pública, ou por corporações não-financeiras por elas controladas.

Finalmente, as Instituições Financeiras de Desenvolvimento evidenciam atuação anticíclica, ou seja, podem agir no sentido de minimizar os efeitos prejudiciais da retração do crédito privado em momentos de desaceleração da economia, evitando rupturas drásticas no financiamento ao investimento. O setor financeiro privado atua de modo pró-cíclico, expandindo o crédito em momentos de aceleração da economia, quando a confiança dos agentes está alta e a própria natureza concorrencial desses mercados faz com que as instituições adotem comportamentos menos conservadores a fim de evitar perdas de market share. Em contrapartida, em momentos de crise ou instabilidade econômica que antecipam possível recessão, as instituições financeiras aumentam a preferência pela liquidez e restringem a oferta de crédito, aprofundando o período de baixa e criando um círculo vicioso onde a retração do crédito gera inadimplência e depreciação dos ativos, o que agrava o cenário pessimista e gera ainda maior retração do crédito, como se fosse uma profecia autorrealizável.

A insuficiência de fundos para as empresas consolidarem suas posições financeiras emerge nos momentos de baixa dos ciclos econômicos. Quando a economia está em expansão, as expectativas são favoráveis e os agentes tendem a investir em face de suas projeções de ganhos futuros. Neste contexto, as instituições financeiras emprestam de forma mais ousada, com menor aversão ao risco, mantendo sua oferta de crédito elevada. Já nos períodos recessivos, ocorre o movimento contrário, ou seja, as instituições financeiras retraem a oferta de crédito, provocando a contração dos investimentos e aprofundando a crise econômica, num círculo vicioso. Ou seja, o comportamento dos bancos tende a agravar as crises ao reduzir a liquidez do sistema exatamente quando ela é mais necessária4 (4) Teoria conhecida como “hipótese da fragilidade financeira” de Minsky. (Minsky, 1986MINSKY, H. Stabilizing an unstable economy. McGraw-Hill, 1986.). Isso significa que a preferência pela liquidez das instituições financeiras está relacionada diretamente ao estado de expectativa dos agentes ao longo do ciclo econômico. A expansão do crédito nos períodos de crescimento, bem como sua contração em períodos de crise, são características inerentes da atividade bancária, especialmente do setor privado que segue uma lógica de lucratividade (Cunha; Carvalho; Prates, 2014CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento. Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58.).

A configuração do Estado brasileiro amplifica a importância das IFDs enquanto instrumentos de políticas anticíclicas. Isto porque, com o advento da Lei Complementar n. 101, de 04/05/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal, LRF), limitou-se o poder do Estado de atuar diretamente por meio de políticas fiscais anticíclicas, uma vez que os gastos discricionários do poder público são bastante reduzidos. Em geral, dispositivos da LRF restringem os gastos em investimentos e as próprias políticas de desenvolvimento regional que dependem do gasto público. Jayme Jr. e Crocco assinalam as consequências da LRF sobre a capacidade de a Administração Pública sustentar uma ação fiscal anticíclica:

A LRF promove [...] um engessamento das possibilidades de gastos dos diversos entes federativos e, de alguma forma, a própria capacidade de aumento do crédito por parte dos BPs [Bancos Públicos]. Não obstante sua importância em garantir um maior controle de gastos, principalmente levando-se em conta que há no Brasil uma larga experiência de má gestão administrativa de estados e municípios, a LRF impossibilita a utilização de uma política fiscal anticíclica, baseada no princípio de que, em períodos de desaceleração econômica, é conveniente ao estado aumentar gastos para sustentar o nível da demanda agregada (Jayme Jr.; Crocco, 2010JAYME Jr., Frederico G., e Marco Crocco. “Bancos públicos, federalismo e políticas de desenvolvimento regional no Brasil.” In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 179-204., p. 187).

Percebe-se, assim, que embora se afigure importante para garantir o equilíbrio fiscal necessário à solvência do setor público, a LRF restringe a ação direta do Estado nas ações anticíclicas. Essa realidade confere às IFDs maior protagonismo durante ciclos contracionistas e de aumento da aversão ao risco das instituições financeiras privadas, no sentido de serem importantes agentes da política de mitigação do desaquecimento da atividade econômica. Não obstante também sofrerem os efeitos de contenção da LRF, as IFDs com margem operacional (disponibilidade de recursos e espaço para maior alavancagem) podem realizar ações anticíclicas por meio do crédito, garantindo o financiamento da produção e do consumo. Dada a natureza pró-cíclica do crédito privado e as restrições das Administrações Públicas no Brasil de expandirem investimentos financiados por maior endividamento, o papel das Instituições Financeiras de Desenvolvimento pode ser vital para a manutenção da atividade produtiva, do emprego e da renda, e, por consequência, da retomada mais rápida de uma trajetória de crescimento sustentável.

Destaca-se, todavia, que para que as IFDs atuem de forma eficiente em seu papel de agentes de políticas anticíclicas, elas precisam ser instituições consolidadas dentro do sistema financeiro. A reação tempestiva que momentos de crise requerem dos agentes públicos justifica a existência prévia dessas instituições quando tais ações são exigidas. Não há eficácia em se criar IFDs sob demanda, ou seja, de criá-las apenas quando se supõe que elas sejam necessárias, para simplesmente descartá-las no momento em que parecem não ter mais uso5 (5) Em painel promovido pela ABDE no início dos anos 2000, Joseph Stiglitz lembrou ser muito fácil fechar instituições financeiras de desenvolvimento, mas bem mais difícil criá-las e torná-las eficientes partindo do zero. A construção exige tempo e experiência; a destruição, apenas uma decisão política. .

2 IFDs no Brasil: do boom à redução da presença estatal no setor financeiro

No Brasil, pode-se considerar que a experiência de bancos públicos com função de fomento tem origens remotas na fundação do Banco do Brasil, em 1808, o qual, apesar de ser originalmente uma empresa de capital privado, atuava como banco do governo e tinha como principal objetivo financiar a abertura de empresas manufatureiras no Brasil. Desde sua criação, a instituição passou por uma série de modificações jurídicas e institucionais. Entretanto, sua prioridade foi, normalmente, o financiamento da atividade econômica. Atuou também como emissor de moeda doméstica, o que lhe dava condição híbrida de banco comercial com atributos de banco central, fato que perdurou até 1986. No século XXI, o Banco vem atuando tanto como instrumento de políticas públicas voltadas para o fomento de setores prioritários, quanto como banco comercial múltiplo (Banco do Brasil, 2010BANCO DO BRASIL. Banco do Brasil 200 anos. Belo Horizonte: Banco do Brasil, 2010.).

Na sequência, em 1861, foi criada a Caixa Econômica Federal, com a finalidade de incentivar a poupança das famílias, sendo sua motivação mais social e política do que propriamente econômica. Desde sua fundação, a Caixa desempenhou um papel essencial, permitindo às populações de mais baixa renda acessarem serviços financeiros, além de ser um importante financiador de imóveis. Na primeira década do século XXI, a instituição responsabilizou-se pela execução de grande parte dos programas de desenvolvimento econômico e social do governo, como o pagamento do auxílio Bolsa Família, o financiamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a execução do Programa de Integração Social (PIS), a gestão do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e a gestão operacional do programa Minha Casa Minha Vida, dentre outros.

Foi a partir de meados do século XX, não obstante, que o governo federal criou instituições financeiras orientadas precipuamente para o fomento. O marco principal de fundação de um SNF está na criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) em 1952, instituído como autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda, conforme a Lei n. 1.628 e, mais tarde, transformado em Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Sua criação foi precedida, desde a segunda metade da década de 1930, pela elaboração de estudos sobre os problemas da economia brasileira e os elementos de indução ao desenvolvimento (FGV 2001FGV. FGV CPDOC. 2001. Disponível em: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Aera Vargas2/artigos/EleVoltou/BNDE. Acesso em: 20 fev. 2015.
http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Aer...
). Diante das disparidades da economia nacional, o BNDE tinha os objetivos de gerir os recursos financeiros mobilizados interna e externamente e organizar as providências necessárias à execução de projetos relacionados ao desenvolvimento sustentável (Costa Neto, 2004COSTA NETO, Yttrio Corrêa da. Bancos oficiais no Brasil: origem e aspectos de seu desenvolvimento. Brasília: Banco Central do Brasil, 2004.).

Ainda em meados do século XX, a importância do planejamento regional demandou ações específicas voltadas para regiões de menor renda relativa. Para encarar essas questões foi idealizado o Banco do Nordeste do Brasil (BNB) e, mais tarde, o Banco da Amazônia. A Lei n. 1.649, de 19/07/1952BANCO DA AMAZÔNIA. Banco da Amazônia, História. 2014. Disponível em: http://www.bancoamazonia.com.br/index.php/institucional-obanco-historia. Acesso em: 5 mar. 2015.
http://www.bancoamazonia.com.br/index.ph...
, criou o BNB, que, no entanto, foi inaugurado apenas em 1954. Inseria-se numa visão de promoção do desenvolvimento por meio da mobilização de recursos garantidos na Constituição para o combate à seca e o incentivo a atividades dinâmicas de forma alinhada à economia nacional (Valias Neto; Cosentino, 2014VALIAS NETO, MONTICELI, F.; VAL COSENTINO, D. Rômulo Almeida: Banco do Nordeste do Brasil e a Comissão de Planejamento Econômico da Bahia. Desenbahia, v. 11, n. 20, p. 177-197, 2014.). Por sua vez, o Banco da Amazônia foi originalmente idealizado como Banco de Crédito da Borracha, criado pelo Decreto-Lei n. 4.451, de 09/07/1942, com o objetivo de financiar a produção daquele bem e tendo participação acionária compartilhada pelos EUA e o Brasil. Em 1950, o governo criou o Banco de Crédito da Amazônia S.A., ampliando os meios de financiamento para outras atividades produtivas e assumindo contornos de banco regional misto. Apesar de sua criação precoce, o banco assumiu seu formato atual apenas a partir de 1966, com a promulgação da Lei n. 5.122, de 28/09/1966 (Banco da Amazônia, 2014BANCO DA AMAZÔNIA. Banco da Amazônia, História. 2014. Disponível em: http://www.bancoamazonia.com.br/index.php/institucional-obanco-historia. Acesso em: 5 mar. 2015.
http://www.bancoamazonia.com.br/index.ph...
).

A expansão das atividades do BNDES e a criação da Finame, em 1966, estimularam a constituição de instituições públicas de fomento também por unidades federativas, sobretudo a partir dos anos 1960, as quais passaram a atuar de forma complementar aos entes federais como agentes repassadores de seus recursos. Assim, foram criadas 48 instituições financeiras públicas ao longo do século XX, sendo que 67% do total surgiram após a constituição do BNDE (ver Quadro 1), entre 1952 e 1992. Muitas dessas instituições foram privatizadas ou simplesmente extintas nos anos 1990, ao passo que outras deram origem a um novo tipo de instituição financeira não-bancária, as Agências de Fomento (AFs), em processo que será descrito adiante neste trabalho.

Quadro 1
Instituições financeiras controladas por unidades da federação

Vale ainda destacar que mesmo no contexto da Reforma Bancária de 1964-1965, que visava estimular o aumento do mercado de capitais e criar um sistema financeiro privado capaz de financiar o desenvolvimento, a disseminação das instituições financeiras públicas subnacionais seguiu ocorrendo. Acontece que as respostas do setor privado aos vários incentivos foram insuficientes, de modo que, na prática, observou-se a continuidade do processo de consolidação das instituições de fomento públicas, tanto federais quanto estaduais. Não somente prosseguiu o ciclo de criação de instituições públicas (nada menos do que 18 foram inauguradas após as reformas), quanto a atuação desse grupo se fortaleceu, com crescimento considerável dos desembolsos do BNDES destinados ao setor produtivo privado e o fortalecimento dos Bancos de Desenvolvimento controlados por unidades da federação. No caso específico dos Bancos de Desenvolvimento subnacionais, salvo por BRDE e BDMG, ambos criados em 1962, todos os demais foram instituídos após a Reforma Bancária. Assim, observou-se a consolidação das instituições públicas (Studart; Hermann, 2001STUDART, Rogério; HERMANN, Jennifer. Estrutura e operação dos sistemas financeiros no Mercosul: perspectivas a partir das reformas institucionais dos anos 1990. Brasília: Cepal, 2001. (Texto para Discussão, n. 799).) e se reafirmaram os mecanismos básicos de financiamento da industrialização brasileira, combinando-se autofinanciamento, capital externo (crédito e investimento estrangeiro direto) e crédito público distribuído através das instituições oficiais (Hermann, 2010HERMANN, Jenifer. Desenvolvimento financeiro e concorrência privada: desafios para a funcionalidade macroeconômica dos bancos públicos. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 233-257.).

O BNDES manteve papel relevante, preenchendo a lacuna que o mercado privado de crédito e o mercado de capitais não conseguiram completar. O banco, que iniciara suas atividades com ênfase no financiamento do setor público, voltou-se para o financiamento do setor privado a partir de meados dos anos 1960, o que exigiu maior capilaridade, consolidada por meio da atuação conjunta com instituições estaduais. Neste sentido, a criação dos BDs conduziu à desconcentração do sistema financeiro de desenvolvimento em mais um capítulo da consolidação dos alicerces institucionais da industrialização (Cavalcanti, 2007CAVALCANTI, Luiz Ricardo. Seis personagens à procura de um autor: a inserção das agências de fomento e dos bancos de desenvolvimento no Sistema Financeiro no Brasil. Desenbahia, p. 7-32, 2007.).

Na década de 1980, em meio à forte restrição fiscal que se seguira à crise da dívida externa aberta em 1979, os agentes públicos regionais se tornaram também importantes financiadores dos governos que detinham seu controle. Como resultado, o fomento ao desenvolvimento deixou de ser seu mais importante propósito. Em um período de inflação alta e crescente, as instituições oficiais funcionaram como meio de retenção do imposto inflacionário e gestores das receitas tributárias dos estados. Em última instância, financiaram gastos públicos através de empréstimos nem sempre realizados com base nas melhores práticas de gestão de risco. Essa função de cobertura de déficits terminaria contribuindo para a gradativa deterioração da situação patrimonial das instituições, que acabaram por sofrer uma longa reestruturação na década seguinte (Salviano Jr. 2004SALVIANO JUNIOR, Cleofas. Bancos Estaduais: dos problemas crônicos ao Proes. Brasília: Banco Central do Brasil, 2004.; Cavalcanti, 2007CAVALCANTI, Luiz Ricardo. Seis personagens à procura de um autor: a inserção das agências de fomento e dos bancos de desenvolvimento no Sistema Financeiro no Brasil. Desenbahia, p. 7-32, 2007.).

Reforçada pela onda liberalizante que se consolidou em esfera mundial, o processo de estabilização monetária dos anos 1990 conformou um novo espaço regulatório, no qual as orientações de política apontaram para a redução da participação do Estado no setor bancário, impactando as IFDRs. Adicionalmente, a estabilização monetária alcançada com o Plano Real trouxe um problema de rentabilidade ao Sistema Financeiro Nacional, que tinha no imposto inflacionário uma fonte importante de suas receitas. As instituições financeiras enfrentaram dificuldades em promover os ajustes necessários à sua sobrevivência nesse novo ambiente e vários bancos quebraram, gerando enormes custos financeiros e sociais (FEIL, 2014FEIL, Fernanda de Freitas. Comparação das políticas macroeconômicas e de transferência de renda e do papel do Estado dos governos Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva. Dissertação (Mestrado)-Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014.). Para evitar uma crise bancária com potencial para gerar crise sistêmica, o governo federal implantou o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer), por meio da Medida Provisória n. 1.179, de 31/11/1995.

Em relação às instituições públicas estaduais, o governo federal buscou equacionar seus desequilíbrios patrimoniais por meio do Programa de Incentivo à Redução do Setor Público Estadual na Atividade Bancária (Proes), criado pela Medida Provisória n. 1.514, de 07/08/1996. O Proes permitiu que os estados controladores optassem por privatização, aquisição pelo governo federal para posterior privatização, extinção ou saneamento dos seus bancos. No caso de saneamento, o estado manteria o controle da instituição, desde que aportasse no mínimo 50% dos recursos necessários e garantisse a solidez da instituição no longo prazo (Cunha; Carvalho; Prates, 2014CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento. Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58.). Permitiu, também, que os estados decidissem por transformar suas instituições em Agências de Fomento, um tipo de instituição financeira não bancária submetida ao controle do BCB.

No Quadro 1 consta uma lista das instituições que foram extintas, privatizadas ou transformadas em AFs. Nele, observa-se que, entre meados dos anos 1990 e o começo dos anos 2000, quase todos os bancos públicos passaram por processos de reestruturação no âmbito do Proes. Reestruturados e privatizados, tais agentes foram virtualmente eliminados do sistema financeiro. Os poucos sobreviventes e as novas estruturas passaram a conviver em um ambiente regulatório novo (Cunha; Carvalho; Prates, 2014CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento. Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58.).

As instituições financeiras federais também passaram por um processo de reestruturação no âmbito do Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais (Proef). O programa previa a adoção de medidas de saneamento, enfatizando a transferência para o Tesouro Nacional de créditos problemáticos da carteira de ativos e a cessão de créditos para a Empresa Gestora de Ativos (Emgea), empresa não financeira vinculada ao Ministério da Fazenda e criada especificamente para gerir esses créditos. Finalmente, o governo federal capitalizou a Caixa, o BNB e o Banco da Amazônia. Além disso, o BCB recomendou uma série de aprimoramentos na governança das instituições, que deveriam ser adotados de forma a garantir sua eficiência e eficácia ( Cunha; Carvalho; Prates, 2014CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento. Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58.).

Os processos de reestruturação e a maior abertura externa do sistema financeiro ocorridos durante a década de 1990 e início dos anos 2000 resultaram em desnacionalização e concentração patrimonial do setor. No entanto, isso não representou uma alteração no padrão do financiamento do investimento produtivo, que permaneceu a cargo das instituições públicas. Ou seja, as mudanças estruturais do Sistema Financeiro Nacional novamente não foram acompanhadas do desenvolvimento de um sistema privado de crédito de longo prazo.

O ano de 2003 representou um novo marco na estrutura e funcionamento do mercado de crédito brasileiro, com a introdução de novas diretrizes operacionais e regulatórias6 (6) Manutenção da inflação em patamares baixos, fruto do plano de estabilização implantado na década anterior, aliada à diminuição da taxa de juros, ao crescimento da economia e a melhorias na regulamentação do Sistema Financeiro Nacional - crédito consignado, lei de falências, Sistema de Informações de Crédito, entre outras (Feil, 2014). . O governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que iniciava, tinha na alavanca do crédito um importante instrumento capaz de estimular o consumo da população a fim de apoiar um círculo virtuoso na economia. O período registrou expansão concomitante das operações de crédito das instituições financeiras públicas e privadas, ainda que, num primeiro momento, teve como vetor dinâmico os bancos privados. Essa diferenciação entre os dois grupos (públicos e privados) foi revertido a partir da crise financeira internacional, que se iniciou no biênio 2007/2008, quando as IFDs voltaram a assumir protagonismo no processo de expansão das operações de crédito, iniciando um movimento de política contracíclica.

Conquanto o processo de recuperação institucional do SNF tenha começado já em 2003, foi apenas durante a referida crise financeira internacional que se viu renovada sua função de agente do desenvolvimento no sentido mais amplo. O governo brasileiro atuou especialmente por meio dos bancos públicos, evitando o empoçamento do crédito e uma decorrente maior queda do nível de atividade. Assim, enquanto em pouco menos de uma década e meia após a introdução do Real, as operações de crédito das instituições do SNF reduziram-se de um patamar acima de 60% para oscilar entre 35% e 40% do total do sistema financeiro, esse processo reverteu-se já nos primórdios da crise a tal ponto que a participação do SNF se elevou a mais de metade das operações de crédito a partir de 2012 (ver Gráfico 1).

Gráfico 1
Participação do Sistema Nacional de Fomento no Sistema Financeiro Nacional

Num primeiro momento, o impacto da crise financeira foi a contração do crédito por parte dos bancos privados, o que poderia prejudicar a trajetória de crescimento da economia. No entanto, os níveis reduzidos de alavancagem do Sistema Financeiro Nacional, comparativamente ao sistema internacional, a aplicação de procedimentos de supervisão consolidada do sistema e a solidez das instituições possibilitaram a adoção de medidas de estímulo à atividade econômica com provimento de liquidez do próprio sistema. O BCB diminuiu os depósitos compulsórios e injetou liquidez no mercado. O clima geral de incerteza fez com que aumentasse, todavia, o grau de aversão ao risco nos bancos privados, os quais direcionaram os recursos liberados para operações compromissadas com a própria autoridade monetária. Assim, coube aos bancos públicos a tarefa de garantir a oferta de crédito, resultando no aumento relativo de suas operações de crédito. A atuação anticíclica das IFDs frente ao empoçamento do crédito privado foi essencial para evitar tanto a paralisia do mercado de crédito, quanto impactos ainda mais negativos sobre a atividade.

Os efeitos da crise financeira sobre a economia real fizeram com que se dirigisse a atenção ao maior ativismo do Estado no setor financeiro. Um olhar mais favorável às IFDs ressurgiu em nível mundial, portanto, da constatação renovada de que os capitais privados têm comportamento pró-cíclico.

O mercado creditício atua não somente na alocação ótima de recursos entre os agentes que poupam e os agentes que querem investir - seu desempenho afeta a eficiência total da economia, bem como sua taxa de crescimento (Stiglitz, 1994STIGLITZ, J. The role of the State in financial markets. The World Bank, 1994.). Ou seja, como discutimos anteriormente, a atuação do sistema financeiro é essencial para o financiamento do processo de crescimento da economia e a sustentação de níveis de investimento compatíveis com trajetórias de alta do produto interno. Sob tal circunstância, uma das principais funções do Sistema Nacional de Fomento, que atua como braço de política pública, se relacionaria à sua ação anticíclica, considerada vital para a manutenção da atividade produtiva. Ou seja, as IFDs podem atuar a fim de contrabalançarem os efeitos prejudiciais da retração do crédito privado. Assim, em face da realidade que se apresentava, os Bancos Públicos Federais expandiram sua presença relativa em termos de operações de crédito, ativos e patrimônio líquido a partir da crise.

Vale ainda destacar quanto aos demais segmentos que compõem o SNF, notadamente as IFDRs, que sua presença relativa está em patamar bastante inferior ao dos Bancos Públicos Federais, tanto em termos de ativos, quanto de operações de crédito e de patrimônio líquido. No entanto, são instituições de importância estratégica, pois servem aos estados controladores como braços operacionais de suas políticas de desenvolvimento. O crédito das instituições privadas, além da característica pró-cíclica já mencionada, é também concentrador regionalmente. Assim, políticas de desenvolvimento regional podem sofrer limitações em virtude de eventual falta de apetite das instituições financeiras privadas para atuar em segmentos vistos como essenciais ao processo de desenvolvimento.

Em um país como o Brasil, de elevada disparidade regional, a intervenção do Estado por meio da intermediação financeira acaba por ser essencial, uma vez que as instituições públicas têm o poder de financiar as atividades que maximizem as potencialidades econômicas locais, inclusive ampliando o efeito multiplicador gerado pelo investimento na região. As instituições subnacionais, adicionalmente, em função de suas próprias missões, têm maior comprometimento com o desenvolvimento local. A estrutura do Sistema Financeiro no Brasil mostra alta concentração bancária nas regiões mais ricas (Sudeste e Sul). Isso porque, de forma geral, as regiões menos desenvolvidas estão relacionadas a um maior grau de incertezas, levando os agentes a optarem por posições mais líquidas. O sistema financeiro tende a emprestar menos, mantendo seus ativos concentrados em rubricas que não as operações de crédito (Crocco; Figueiredo, 2009CROCCO, M.; FIGUEIREDO, A. T. Differentiated bank strategies across the territory: an exploratory analysis. Belo Horizonte: UFMG/Cedeplar, 2009. (Texto para discussão, n. 343).).

Essa menor participação dos agentes financeiros públicos com escopo de atuação subnacional e o que isso significa para o desenvolvimento das regiões brasileiras é a questão de fundo que orienta o presente artigo, o que nos remete às condições requeridas para seu fortalecimento que examinamos a seguir.

3 Instituições financeiras de desenvolvimento regional

As instituições que compõem o SNF diferenciam-se sob vários aspectos, notadamente quanto ao tamanho. Nesta seção, detalhamos algumas características principais das Agências de Fomento e dos Bancos de Desenvolvimento7 (7) Uma definição mais ampla de IFDRs poderia incluir os Bancos Comerciais Estaduais com carteira de desenvolvimento, conforme a abordagem usualmente adotada pela ABDE. Neste artigo, contudo, optou-se por concentrar a atenção nas instituições de fomento puras, ou seja, os Bancos de Desenvolvimento Estaduais e as Agências de Fomento, resultando, portanto, numa definição mais restrita de IFDR controladas por estados, a qual é motivada pelo problema de política pública que orienta nossa argumentação. De outro lado, lembramos que essa definição pode ser ainda mais ampla se nela incluirmos os Bancos Federais com escopo de atuação regional no Norte e Nordeste, mas novamente isto nos afastaria da preocupação central do artigo. .

A criação das AFs ocorreu como uma resposta ao fechamento dos bancos estaduais ocorrido nos anos 1990. Tratava-se de um incentivo aos governos estaduais para que estes aderissem ao Proes. Por conseguinte, os estados contariam com instituições de fomento que não causariam risco sistêmico em razão de suas restrições financeiras. As AFs foram criadas pela Medida Provisória n. 1.514, de 07/08/1996, e regulamentadas pela Resolução n. 2.347, de 20/12/1996, do BCB. Cerca de cinco anos mais tarde, a regulamentação foi alterada e consolidada por meio da Medida Provisória n. 2.192, de 24/08/2001, e da Resolução n. 2.828, de 30/03/2001, do BCB (Salviano Jr., 2004SALVIANO JUNIOR, Cleofas. Bancos Estaduais: dos problemas crônicos ao Proes. Brasília: Banco Central do Brasil, 2004.).

As AFs são instituições financeiras não bancárias cujo principal escopo de atuação é o financiamento ao investimento nos estados onde tenham sede. Devem ser constituídas sob a forma de sociedade anônima de capital fechado e estar sob o controle de unidade da federação, sendo que cada estado só pode constituir uma agência. Diferenciam-se das instituições bancárias por não poderem captar recursos junto ao público, recorrer ao redesconto, ter conta de reserva no BCB e contratar depósitos interfinanceiros na qualidade de depositantes ou de depositárias, sendo-lhes vedada a transformação em qualquer outro tipo de instituição integrante do sistema. As AFs operam por meio de capital próprio e de repasses de recursos orçamentários, de fundos fiscais ou parafiscais e de organizações de desenvolvimento nacionais e internacionais, obrigando-se a constituir e manter, permanentemente, fundo de liquidez equivalente, no mínimo, a 10% do valor de suas obrigações, o qual deve ser integralmente aplicado em títulos públicos federais.

Passados oito anos de sua edição, a Resolução n. 2.828 sofreu modificação significativa por meio da Resolução n. 3.757, de 01/07/2009, e, posteriormente, pelas Resoluções n.s 3.834, de 28/01/2010, e 4.023, de 27/11/2011, do BCB. A nova regulamentação permitiu: (i) a ampliação dos limites de atuação das AFs, principalmente no que tange à participação acionária, direta ou indireta, em empresas não financeiras; (ii) a realização de operações de capital de giro puro para a manutenção da atividade produtiva; (iii) um modelo de captação externa de recursos provindos de organismos de desenvolvimento, desde que obtenha classificação de risco igual ou superior ao risco da União; (iv) a atuação, em condição de excepcionalidade, em programas e projetos desenvolvidos em estado limítrofe à sua área de atuação; e (v) a permissão para captar depósitos interfinanceiros vinculados a operações de microfinanças (ABDE, 2014ABDE. Sistema Nacional de Fomento e o desenvolvimento regional. Rio de Janeiro: ABDE, 2014.).

Atualmente, existem 16 AFs no Brasil. A primeira a ser criada foi a de Santa Catarina a partir da transformação do antigo BD (Badesc), tendo sido homologada pelo BCB em setembro de 1998. Desde então, foram homologadas outras 15 Agências, das quais apenas a Desenbahia e o Badesc8 (8) A AF de Santa Catarina manteve a sigla do antigo Banco de Desenvolvimento. preservaram o capital integral dos antigos bancos comerciais de seus estados. As demais, ou foram estabelecidas a partir de estruturas parciais (ativos, funcionários, carteira, etc.) dos bancos públicos que passaram pelo Proes, ou foram capitalizadas diretamente pelo estado controlador. O Quadro 2 apresenta as AFs na posição de dezembro de 2016, ordenadas conforme a data de sua homologação pelo BCB.

Quadro 2
Agências de Fomento

Além das 16 Agências de Fomento, as instituições estaduais de fomento incluem três Bancos de Desenvolvimento: o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes), o Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais (BDMG) e o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). O BRDE é a única instituição controlada por mais de um estado: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Ao final de 2016, as 19 Instituições Financeiras de Desenvolvimento Regional contavam com cerca de R$ 36,4 bilhões em ativos (equivalente 0,44% do SFN), saldo de operações de crédito no total de R$ 28,0 bilhões (0,87% do SFN) e patrimônio líquido agregado de R$ 9,9 bilhões (1,5% do SFN). Estes indicadores de tamanho evidenciam que, embora a criação e a manutenção dessas instituições sejam consideradas importantes para a operacionalização de políticas públicas e o financiamento de projetos singulares de desenvolvimento regional, que busquem alavancar as potencialidades locais, elas ainda são pequenas em relação ao conjunto do sistema financeiro, verificando-se o mesmo quando comparadas à dimensão das economias estaduais onde atuam. Além disso, cabe destacar que as IFDRs apresentam grande heterogeneidade quanto ao porte e outros atributos, em geral associada à diferença de tamanho das economias de sua região de atuação. Classificando-as de acordo com seus ativos, percebe-se maior concentração das instituições de pequeno porte nas regiões menos desenvolvidas do Norte e Nordeste brasileiro, enquanto as de maior porte estão concentradas nas regiões mais desenvolvidas do Sudeste e Sul, conforme se observa na Tabela 1. Vale notar que os dados de patrimônio das IFDRs mostram uma distribuição desigual semelhante à registrada com outras variáveis de tamanho.

Tabela 1
Instituições financeiras de desenvolvimento regional, segundo variáveis de tamanho, Dez. 2016 (R$ milhões)

Ainda que uma explicação para os fatores de desigualdade dentre as AFs e BDs dependa de investigação adicional, é possível aventar que ela decorre, em primeiro lugar, da própria desigualdade nas participações dos respectivos estados controladores na economia nacional, à qual se somariam variáveis institucionais que capturem a medida do esforço e da capacidade financeira dos governos estaduais em fortalecerem suas instituições. Neste sentido, nota-se a tendência dos estados de menor participação no PIB brasileiro possuírem as IFDs de menor porte, em termos de ativos. Por exemplo, ao final de 2016, o BRDE - a maior instituição regional e que atua em uma das mais ricas áreas do país, responsável por 16,4% do PIB do Brasil - somava R$ 16.518 milhões em ativos (ou 1,74% do PIB da região) e R$ 13.459 milhões em operações de crédito (ou 1,42% do PIB). No outro extremo, a menor instituição financeira regional, a Piauí Fomento, cuja economia da região de atuação equivale a 0,7% do PIB nacional, possuía R$ 13,4 milhões em ativos (ou 0,04% do PIB do estado) e R$ 11,9 milhões em operações de crédito (ou 0,03% do PIB). A Tabela 1 mostra a relação entre as variáveis de tamanho das instituições nas economias onde atuam.

O conjunto das AFs e BDs possui dimensões modestas em termos agregados, ao mesmo tempo em que apresenta potencial considerável para aprofundar sua importância para as economias dos estados. Esta afirmação decorre do fato de que várias IFDRs praticam modalidades variadas de apoio à atividade privada e aos municípios, conquanto ainda não adequadamente medidas quanto à importância relativa do financiamento a segmentos específicos. Vale dizer: quando observadas no agregado, a conclusão inescapável é que as IFDRs têm diminuta expressão; porém, se considerado seu potencial, evidenciado na variedade de modalidades operacionais encontrada nas instituições singulares (aspecto qualitativo) e no provável maior tamanho relativo quanto ao financiamento de setores específicos (aspecto quantitativo), reafirma-se a importância de se considerar o enfrentamento aos desafios postos ao seu crescimento.

Modalidades de atuação e outros aspectos das IFDs Regionais

As modalidades operacionais das IFDRs variam bastante de acordo com seu tamanho e região, como se observa no Quadro 3. As principais modalidades são: (i) crédito de longo prazo para projetos de investimento, incluindo-se o giro associado, sobretudo de pequenas e médias empresas (PME), de produtores rurais e de cooperativas de produção; (ii) crédito para capital de giro puro; (iii) operações de microcrédito produtivo orientado e de microfinanças; (iv) crédito de longo prazo para projetos de inovação com base em repasses da Finep; e (v) gestão de fundos fiscais, normalmente utilizados em operações com o setor público municipal para financiamento de projetos de infraestrutura urbana. Em menor proporção, verificam-se operações de crédito com grandes empresas e o aporte de recursos em fundos de participação em empresas. À par das modalidades de financiamento, vale assinalar que a atuação das IFDRs se estende às atividades de mobilização de agentes econômicos em apoio a programas setoriais e regionais de desenvolvimento e às ações de capacitação empresarial, como na difusão de informações sobre linhas de crédito e incentivos fiscais ao investimento (ABDE, 2014ABDE. Sistema Nacional de Fomento e o desenvolvimento regional. Rio de Janeiro: ABDE, 2014.).

Quadro 3
Modalidades principais de atuação e outros aspectos das IFDs Regionais

No âmbito da governança, merece destaque que a estrutura organizacional das IFDRs contempla o funcionamento de comitês técnicos, cujo principal objetivo é garantir idoneidade e eficiência na tomada de decisões e a coordenação das atividades internas. Dentre outros aspectos, os comitês são responsáveis por definirem critérios para a concessão de crédito, acompanharem as práticas contábeis, proporem o planejamento de atividades anuais e analisarem as contribuições da instituição para o desenvolvimento regional. A preocupação crescente com a excelência em gestão, o que resulta diretamente da atuação do BCB, dentre outros fatores, assegura um elemento de prevenção contra os problemas que levaram ao encerramento das atividades de suas antecessoras na década de 1990. A gestão de riscos segue as normas estabelecidas pelo BCB e incluem políticas de gestão de riscos corporativos e de gestão de capital (ABDE, 2014ABDE. Sistema Nacional de Fomento e o desenvolvimento regional. Rio de Janeiro: ABDE, 2014.).

As fontes de recursos das IFDRs variam de acordo com seu tamanho. Não obstante, compreendem três tipos principais: (i) recursos de repasses do Sistema BNDES, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Finep e organismos e instituições financeiras internacionais de desenvolvimento; (ii) recursos próprios; e (iii) recursos de fundos públicos e de programas oficiais com fundos estaduais. A maioria das IFDRs opera, primordialmente, com base em repasses do BNDES. No caso das Agências de menor porte, entretanto, o acesso tem sido autorizado para pequenos montantes ou simplesmente vedado em face das exigências do próprio BNDES quanto à estrutura operacional e de capital requerida dos agentes repassadores, incluindo-se a capacidade técnica para avaliação e acompanhamento das operações de crédito, o desempenho econômico-financeiro, o grau de alavancagem definido pelo Patrimônio de Referência e sua dependência em relação ao acionista majoritário. Limitação semelhante ocorre quanto aos repasses dos fundos constitucionais administrados por instituições financeiras federais nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Ainda que tenham obtido acesso formal a esses recursos a partir de 2003, as IFDRs vêm recebendo efetivamente parcela muito pequena do total disponível.

4 Uma agenda para o fortalecimento do Sistema Nacional de Fomento

Transcorridos quase 20 anos da criação da primeira AF, é possível afirmar que a maioria dessas instituições já se distanciou da etapa inicial de sua constituição. Por dez anos, aproximadamente entre 2005 e 2015, as AFs e os BDs vivenciaram uma expansão significativa nos volumes financiados, com implantação de novas modalidades operacionais e foco na atividade-fim do fomento à atividade econômica. Num quadro de retomada do desenvolvimento nacional, a continuidade dessa trajetória dependerá, todavia, da superação de entraves que impedem o crescimento operacional sustentado das IFDRs.

Para cumprir suas funções com efetividade, é necessário que as IFDRs disponham de condições de contexto e capacidade técnica e de gestão que permitam a elas ofertar regularmente produtos financeiros com prazos e custos adequados, sob condições de risco sustentáveis. Idealmente, devem combinar a função de agente de desenvolvimento, autonomia financeira e baixos riscos de liquidez e juros (Hermann, 2010HERMANN, Jenifer. Desenvolvimento financeiro e concorrência privada: desafios para a funcionalidade macroeconômica dos bancos públicos. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 233-257.). O fortalecimento dessas instituições defronta-se com alguns obstáculos que precisam ser superados a fim de tornar viável seu crescimento operacional e institucional. Os principais obstáculos compreendem o acesso a fontes de recursos em volume e condições adequadas, a reduzida base de capital de várias instituições, o ônus tributário que reduz o ritmo de crescimento do patrimônio e o crescente custo de observância associado a controles por vezes excessivos e meramente burocráticos dos órgãos reguladores.

Um efetivo Sistema Nacional de Fomento deve reunir instituições com capacidade de apoiar políticas de desenvolvimento em todos os níveis, particularmente nos níveis regional e local no que tange às IFDRs. A perseguição deste objetivo, por seu turno, requer não apenas o enfrentamento aos desafios postos ao funcionamento dos entes singulares, mas também a busca de maior articulação entre as instituições federais especializadas no financiamento ao investimento e à inovação, mas sem capilaridade, e as instituições regionais, preferencialmente à luz de uma política nacional de desenvolvimento regional. Um esforço de fortalecimento do SNF e de ampliação da atuação das IFDRs vem sendo empreendido pela ABDE de modo que os tópicos que discutimos a seguir refletem a agenda de trabalho da associação. São os desafios a serem enfrentados na construção do SNF.

Fontes de recursos e capitalização

A questão do acesso a fontes de recursos em volume e condições compatíveis às demandas do desenvolvimento econômico atinge todas as IFDs no Brasil, ainda que os graus de relevância e outros aspectos variem conforme o tipo e porte da instituição. No caso das IFDRs, essa questão desdobra-se em duas outras: (i) acesso às fontes de recursos para financiamento de longo prazo já existentes - fundos constitucionais, orçamentários e parafiscais e repasses das instituições que operam no segundo piso do sistema; e (ii) ampliação da base de capital, sobretudo nas instituições de menor porte.

No que tange à primeira questão, trata-se de permitir que as IFDRs, em especial aquelas que já preenchem condições para tanto, acessem um volume maior de recursos das fontes tradicionais, as quais são administradas por IFDs federais. Não obstante os avanços que vinham ocorrendo, observa-se, ainda, certa contenção das instituições federais em aprofundarem uma articulação com as IFDRs e acederem em ampliar o funding das instituições regionais.

A segunda questão é mais complexa. A base de capital de uma IFDR pode ser ampliada em decorrência de aporte de recursos dos controladores ou de melhores resultados financeiros retidos na forma de aumento patrimonial. Conquanto tenham sido observados casos de aporte de recursos dos controladores, em geral originados de linhas de financiamento do BNDES e do Banco do Brasil aos estados, este caminho sofre as injunções da reduzida capacidade fiscal dos estados, que se agravou durante a recessão econômica pós-2015. Já em relação à melhora dos resultados financeiros, esta solução é limitada pelas baixas margens remuneratórias dos empréstimos de longo prazo.

Uma alternativa factível e ancorada na experiência internacional das instituições de fomento envolve a utilização de créditos tributários para capitalização das IFDRs. Paradoxalmente, embora tenham características muito particulares derivadas de sua condição de agentes de fomento com pequena diversificação no portfólio dos produtos, as IFDRs estão sujeitas ao mesmo regime tributário das instituições financeiras privadas. São, no entanto, situações diferentes por natureza - enquanto o primeiro grupo compõe-se de entes públicos voltados à promoção do desenvolvimento econômico, sendo que seu lucro é fonte de crescimento do patrimônio que permitirá reforçar o fomento, o segundo realiza a intermediação financeira com o objetivo precípuo do lucro como renda de controladores privados. Estender às IFDRs o ônus tributário do sistema privado resulta em limitar sua capacidade de crescimento patrimonial e de exercício de sua função.

Em vários países, há exemplos bem-sucedidos de IFDs que recebem incentivos tributários para melhor desempenhar suas funções. O mais simbólico é o caso do KfW Bankengruppe na Alemanha, que goza de isenção tributária (KfW 2011KFW. KfW - A two minute guide. 2011. Disponível em: https://www.kfw.de/KfW-Konzern/Investor-Relations/KfW-Anleihen/Capital-market/PDFs/20120828_2minuteguideQ2en.pdf. Acesso em: 19 ago. 2014.
https://www.kfw.de/KfW-Konzern/Investor-...
). Contava, em 2013, com ativos da ordem de € 512 bilhões (18% do PIB) e financiamentos de mais de € 400 bilhões (15% do PIB), sendo que 80% do seu capital pertence ao governo federal e 20% aos governos dos estados (Tavares, 2014TAVARES, D. Existe alternativa ao mercado de capitais. Rumos, n. 274, p. 42-43, 2014.).

Governança e gestão

Em que pese o aprimoramento da governança corporativa nas IFDRs - provocado pela evolução do mercado, regulamentação do Conselho Monetário Nacional e atuação da autoridade monetária -, persistem lacunas a serem preenchidas na melhoria dos mecanismos de gestão. Não basta que as IFDRs inovem em seus processos operacionais por meio de programas e produtos financeiros, sendo também necessário inovar nos processos internos, promovendo os avanços necessários nos sistemas de liderança, de trabalho e de informação de que resulte o aumento de sua eficiência operacional. Esse aprimoramento deve ser um processo dinâmico e contínuo, ancorado em comitês técnicos, e não apenas um comportamento adaptativo às regras estabelecidas pelo BCB (ABDE, 2014ABDE. Sistema Nacional de Fomento e o desenvolvimento regional. Rio de Janeiro: ABDE, 2014.).

A governança das IFDRs deve assegurar uma convergência de interesses múltiplos, dando ênfase à aplicação eficiente dos seus recursos em termos de risco-retorno e, igualmente, ao cumprimento de seus mandatos como agentes de fomento. Para tanto, é crucial reforçar o comprometimento dos governos dos estados controladores com a governança das IFDRs e a gestão baseada em critérios de qualidade e em resultados econômico-financeiros efetivos. Esses resultados, cabe insistir, não se circunscrevem aos indicadores de solvência das instituições, mas incluem a relevância de suas operações para o fomento do investimento e da inovação e para a execução de políticas públicas (Freitas, 2010FREITAS, Maria Cristina Penido de. Dinâmica concorrencial e bancos públicos: questões conceituais. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Ipea, 2010.).

Capacitação técnica

O constante aperfeiçoamento do seu pessoal é uma condição necessária à excelência técnica exigida pelo fortalecimento das IFDRs. De um lado, as transformações do mercado financeiro e da economia mundial exigem adaptações dessas instituições a fim de redirecionar o rumo dos negócios, suprir demandas do mercado e inovar na oferta de produtos. As mudanças estruturais requerem controles diferenciados e equipes especializadas. De outro lado, as IFDRs mais eficientes serão aquelas cujo corpo técnico souber não apenas estruturar soluções de financiamento adequadas, mas também incorporar outros conhecimentos relevantes às decisões de investimento, tais como incentivos fiscais alternativos, regras de licenciamento ambiental e oportunidades de localização de empreendimento industriais, dentre outros, atuando como um grupo de agentes de desenvolvimento em amplo sentido.

Apesar do compromisso organizacional e do esforço revelado para aprimorar as estratégias e as práticas de governança, as IFDRs precisam evoluir no que tange à sua própria capacitação técnica, especialmente nas instituições de menor porte. Os recursos destinados à formação e desenvolvimento do corpo funcional são insuficientes e observa-se carência de suporte técnico para a implantação de uma estrutura moderna de gestão. Há casos em que é necessário, inclusive, realizar seleção de pessoas para formar um quadro técnico permanente e identificado com o mandato da instituição (ABDE, 2014ABDE. Sistema Nacional de Fomento e o desenvolvimento regional. Rio de Janeiro: ABDE, 2014.).

Um arranjo institucional mais forte e o BNDES

A construção de um efetivo SNF deve ser vista como um capítulo do processo de fortalecimento institucional do Estado Nacional, cujo norte é a recuperação da capacidade de planejamento e de execução de políticas de desenvolvimento. Este processo requer necessariamente uma combinação mais efetiva entre IFDs federais que costumam atuar no segundo piso do sistema e as IFDRs. Muitos agentes regionais já são credenciados como repassadores do BNDES e se constata algum grau de articulação das IFDRs com a Finep, o Banco do Nordeste e a Caixa. No entanto, essas relações normalmente se estabelecem sob as mesmas regras aplicadas às relações entre as IFDs federais, com ênfase no BNDES, e os bancos privados.

Um efetivo SNF que opere com o objetivo de apoiar uma política nacional de desenvolvimento regional necessita criar um arranjo institucional mais forte na combinação entre as IFDRs e as IFDs federais. Um arranjo que amplie a capilaridade do sistema de financiamento de longo prazo, com base na expertise técnica das IFDRs, a fim de atingir, sobretudo, as unidades de produção de menor porte e os projetos de infraestrutura, em especial ao encargo de municípios. O ponto de partida mais promissor para a evolução desde o estágio presente, em que as IFDRs atuam como agentes repassadores, para um estágio em que os agentes regionais componham um efetivo Sistema, deve ser encontrado em iniciativa que faça do BNDES a instituição-líder deste processo.

Conclusão

Neste artigo, discutimos o papel e, sobretudo, os desafios enfrentados pelas IFDs brasileiras cujo escopo de atuação é regional. Trata-se de questão sempre renovada em face das exigências colocadas ao financiamento do investimento no processo de desenvolvimento econômico. No Brasil, o financiamento produtivo é caracterizado por uma forte participação das IFDs. Ademais, a evidência mostra que diversos países utilizaram IFDs para apoiar a industrialização e que tais instituições ainda mantêm participação relevante no total dos seus ativos bancários.

Nos anos 1990, o Sistema Financeiro Nacional passou por reestruturação que modificou o ambiente em que atuam as IFDs. Um contexto diferente emergiu nos anos 2000. Inicialmente, no que se refere ao conjunto dos entes regionais, o sistema foi acrescido das AFs a partir de fins da década de 1990, que se agregaram aos BDs remanescentes, constituindo um conjunto de IFDRs. Mais adiante, a crise financeira de 2007-2008 deu origem a uma expansão da participação das instituições públicas diante da reafirmação do comportamento pró-cíclico dos intermediários privados.

A retomada da relevância das IFDs e o nascimento de um novo conjunto de instituições regionais colocaram o fortalecimento de um SNF na pauta da política de desenvolvimento. Em especial, cabe enfrentar as restrições postas a uma atuação mais efetiva das IFDRs com base nos objetivos de desenvolvimento e de capilarização dos meios de financiamento de longo prazo. Assim, uma agenda para a superação destes entraves e, mais importante, para o fortalecimento de um arranjo institucional denominado SNF constituiu o objeto principal deste artigo. Nesta agenda, destacamos as questões das fontes de recursos, da base de capital, da governança das instituições e da formação de quadros técnicos que assumam um papel mais abrangente como agentes de desenvolvimento. Como antes e agora, tais questões somente encontrarão resposta efetiva no plano da intencionalidade. Em suma, dependem de uma Política que determine a ação coordenada entre as instituições federais, especialmente o BNDES, com o apoio da ABDE, e as IFDRs sob a égide de uma política efetiva de desenvolvimento regional.

  • (1)
    A elaboração deste artigo não seria possível sem o apoio institucional da ABDE e os comentários esclarecedores de Marco Antonio Albuquerque de Araujo Lima, seu Secretário-Executivo, e de Cristiane Viturino, Gerente Técnico-Operacional, a quem manifestamos nosso profundo agradecimento, isentando-os dos erros e omissões praticados pelos autores. Assinalamos, ainda, que o texto não deve ser considerado um documento oficial da Associação.
  • (2)
    O SNF congrega as instituições que têm em seu escopo a missão de promover o desenvolvimento sustentável, especialmente por meio do crédito de longo prazo e apoio técnico. No Brasil, essas instituições compreendem os cinco Bancos Públicos Federais - Banco do Brasil, Caixa, BNDES, Banco do Nordeste e Banco da Amazônia; três Bancos de Desenvolvimento controlados por unidades da federação - Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes), Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas Gerais (BDMG) e Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE); cinco Bancos Públicos Comerciais Estaduais com carteira de desenvolvimento - Banco do Estado do Pará (Banpará), Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul), Banco de Brasília (BRB), Banco do Estado de Sergipe (Banese) e Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes); 16 Agências de Fomento - dos estados do Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Goiás, Mato Grosso, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Roraima, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins; os bancos cooperativos; a Finep-Inovação e Pesquisa; e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).
  • (3)
    Ver, dentre outros, Araújo e Cintra (2011)ARAUJO, V. L.; CINTRA, M. A. O papel dos bancos públicos federais na economia brasileira. Brasília: Ipea, 2011. (Texto para Discussão, n. 1604).; Araújo (2012)ARAUJO, V. Preferência pela liquidez dos bancos no ciclo de expansão do crédito no Brasil 2003-2010. Brasilia: Ipea, 2012. (Texto para Discussão, n. 1717).; Prates e Freitas (2013)PRATES, D e M; FREITAS C. Crédito bancário no Brasil: evolução recente e perspectivas. Revista de Economia Política, p. 322-340, 2013.; Paula e Marques (2006)PAULA, L. F.; MARQUES, M. B. Tendências recentes da consolidação bancária no Brasil. Revista de Análise Econômica, p. 235-263, 2006.: Nogueira da Costa (2015); Jayme Jr. e Crocco (2010)JAYME JR., F.; CROCCO, M. Bancos públicos e desenvolvimento. Brasília: Ipea, 2010. e Hermann (2011)HERMANN, J. Bancos públicos em sistemas financeiros maduros: perspectivas teóricas e desafios para os países em desenvolvimento. Revista de Economia Política, p. 397-414, 2011.
  • (4)
    Teoria conhecida como “hipótese da fragilidade financeira” de Minsky.
  • (5)
    Em painel promovido pela ABDE no início dos anos 2000, Joseph Stiglitz lembrou ser muito fácil fechar instituições financeiras de desenvolvimento, mas bem mais difícil criá-las e torná-las eficientes partindo do zero. A construção exige tempo e experiência; a destruição, apenas uma decisão política.
  • (6)
    Manutenção da inflação em patamares baixos, fruto do plano de estabilização implantado na década anterior, aliada à diminuição da taxa de juros, ao crescimento da economia e a melhorias na regulamentação do Sistema Financeiro Nacional - crédito consignado, lei de falências, Sistema de Informações de Crédito, entre outras (Feil, 2014FEIL, Fernanda de Freitas. Comparação das políticas macroeconômicas e de transferência de renda e do papel do Estado dos governos Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva. Dissertação (Mestrado)-Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014.).
  • (7)
    Uma definição mais ampla de IFDRs poderia incluir os Bancos Comerciais Estaduais com carteira de desenvolvimento, conforme a abordagem usualmente adotada pela ABDE. Neste artigo, contudo, optou-se por concentrar a atenção nas instituições de fomento puras, ou seja, os Bancos de Desenvolvimento Estaduais e as Agências de Fomento, resultando, portanto, numa definição mais restrita de IFDR controladas por estados, a qual é motivada pelo problema de política pública que orienta nossa argumentação. De outro lado, lembramos que essa definição pode ser ainda mais ampla se nela incluirmos os Bancos Federais com escopo de atuação regional no Norte e Nordeste, mas novamente isto nos afastaria da preocupação central do artigo.
  • (8)
    A AF de Santa Catarina manteve a sigla do antigo Banco de Desenvolvimento.

Referências bibliográficas

  • ABDE. Estatuto Social Rio de Janeiro: ABDE, 1986.
  • ABDE. Carta ABDE Rio de Janeiro: ABDE, 2013.
  • ABDE. Sistema Nacional de Fomento e o desenvolvimento regional Rio de Janeiro: ABDE, 2014.
  • ALCÂNTARA JR. Otávio de Castro. Mudança organizacional em um sistema complexo: as lições do caso da incorporação do BNH pela CEF. Disertação (Mestrado)- Universidade de Salvador, Salvador, 2006.
  • AMADO, A. Bancos privados e públicos regionais em uma perspectiva de desenvolvimento regional. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 205-230.
  • ARAUJO, V. L.; CINTRA, M. A. O papel dos bancos públicos federais na economia brasileira Brasília: Ipea, 2011. (Texto para Discussão, n. 1604).
  • ARAUJO, V. L.; PIRES, M.; SILVA, M. F.; CASTRO, D. O sistema brasileiro de instituições financeiras subnacionais para o desenvolvimento: um panorama. Brasília: Ipea, 2011. (Texto para Discussão, n. 1626).
  • ARAUJO, V. Preferência pela liquidez dos bancos no ciclo de expansão do crédito no Brasil 2003-2010 Brasilia: Ipea, 2012. (Texto para Discussão, n. 1717).
  • BANCO DA AMAZÔNIA. Banco da Amazônia, História 2014. Disponível em: http://www.bancoamazonia.com.br/index.php/institucional-obanco-historia Acesso em: 5 mar. 2015.
    » http://www.bancoamazonia.com.br/index.php/institucional-obanco-historia
  • BANCO DO BRASIL. Banco do Brasil 200 anos Belo Horizonte: Banco do Brasil, 2010.
  • BARBOSA, Nelson; SOUZA, José Antonio Pereira de. A inflexão do governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. In: SADER, Emir; GARCIA, Marco Aurelio (Org.). Brasil, entre o passado e o futuro São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010.
  • BRASIL. Banco Central do Brasil. Boletim do Banco Central do Brasil, Relatório 1998 Brasília: Banco Central, 1999.
  • BRASIL. Banco Central do Brasil. Banco Central do Brasil, PROER - Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional 1999. Disponível em: http://www.bcb.gov.br/?RED1-PROER Acesso em: 27 fev. 2015.
    » http://www.bcb.gov.br/?RED1-PROER
  • CARVALHO, E. G1 Economia 2014. Disponível em: http://g1.globo.com/economia/noticia/2014/03/falta-de-saneamento-afeta-educacao-e-produtividade-do-pais-diz-estudo.html Acesso em: 21 jul. 2014.).
    » http://g1.globo.com/economia/noticia/2014/03/falta-de-saneamento-afeta-educacao-e-produtividade-do-pais-diz-estudo.html
  • CAVALCANTI, Luiz Ricardo. Seis personagens à procura de um autor: a inserção das agências de fomento e dos bancos de desenvolvimento no Sistema Financeiro no Brasil. Desenbahia, p. 7-32, 2007.
  • CENTRO INTERNACIONAL CELSO FURTADO DE POLÍTICAS PARA O DESENVOLVIMENTO. Memórias do desenvolvimento Rio de Janeiro: Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, 2007.
  • COSTA NETO, Yttrio Corrêa da. Bancos oficiais no Brasil: origem e aspectos de seu desenvolvimento. Brasília: Banco Central do Brasil, 2004.
  • CROCCO, M.; FIGUEIREDO, A. T. Differentiated bank strategies across the territory: an exploratory analysis. Belo Horizonte: UFMG/Cedeplar, 2009. (Texto para discussão, n. 343).
  • CUNHA, André Moreira; CARVALHO, Carlos Eduardo; PRATES, Daniela Magalhães. Estado atual do Sistema Nacional de Fomento e indicadores de desempenho. In: ABDE. Sistema Nacional de Fomento - Financiando o Desenvolvimento Rio de Janeiro: ABDE, 2014. p. 11-58.
  • FEIL, Fernanda de Freitas. Comparação das políticas macroeconômicas e de transferência de renda e do papel do Estado dos governos Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva Dissertação (Mestrado)-Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014.
  • FERRAZ, João Carlos; ALÉM; Ana Claudia; MADEIRA, Rodrigo Ferreira. A contribuição dos bancos de desenvolvimento para o financiamento de longo prazo. Revista BNDES, 2013. 5-42.
  • FGV. FGV CPDOC 2001. Disponível em: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Aera Vargas2/artigos/EleVoltou/BNDE Acesso em: 20 fev. 2015.
    » http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Aera Vargas2/artigos/EleVoltou/BNDE
  • FREITAS, Maria Cristina Penido de. Dinâmica concorrencial e bancos públicos: questões conceituais. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento Rio de Janeiro: Ipea, 2010.
  • GRANDA, A. Exame.com 2014. Disponível em: http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/custo-de-congestionamentos-no-rj-e-em-sp-atinge-r-98-bi Acesso em: 25 jul. 2014.
    » http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/custo-de-congestionamentos-no-rj-e-em-sp-atinge-r-98-bi
  • HERMANN, J. Bancos públicos em sistemas financeiros maduros: perspectivas teóricas e desafios para os países em desenvolvimento. Revista de Economia Política, p. 397-414, 2011.
  • HERMANN, Jenifer. Desenvolvimento financeiro e concorrência privada: desafios para a funcionalidade macroeconômica dos bancos públicos. In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 233-257.
  • HERMANN, Jennifer. Bancos públicos em sistemas financeiros maduros: perspectivas teóriccas e desafios para os países em desenvolvimento. In: II ENCONTRO INTERNACIONAL da Associação Keynesiana Brasileira (AKB), set. 2009, p. 1-20.
  • JAYME JR., F.; CROCCO, M. Bancos públicos e desenvolvimento Brasília: Ipea, 2010.
  • JAYME Jr., Frederico G., e Marco Crocco. “Bancos públicos, federalismo e políticas de desenvolvimento regional no Brasil.” In: JAYME JR., Frederico G.; CROCCO, Marco (Org.). Bancos públicos e desenvolvimento Rio de Janeiro: Ipea, 2010. p. 179-204.
  • KFW. KfW - A two minute guide. 2011. Disponível em: https://www.kfw.de/KfW-Konzern/Investor-Relations/KfW-Anleihen/Capital-market/PDFs/20120828_2minuteguideQ2en.pdf Acesso em: 19 ago. 2014.
    » https://www.kfw.de/KfW-Konzern/Investor-Relations/KfW-Anleihen/Capital-market/PDFs/20120828_2minuteguideQ2en.pdf
  • MINSKY, H. Stabilizing an unstable economy McGraw-Hill, 1986.
  • PAULA, L. F.; MARQUES, M. B. Tendências recentes da consolidação bancária no Brasil. Revista de Análise Econômica, p. 235-263, 2006.
  • PRATES, D e M; FREITAS C. Crédito bancário no Brasil: evolução recente e perspectivas. Revista de Economia Política, p. 322-340, 2013.
  • SALVIANO JUNIOR, Cleofas. Bancos Estaduais: dos problemas crônicos ao Proes. Brasília: Banco Central do Brasil, 2004.
  • SANTOS, Jailson Moreira dos. A história da Caixa Econômica Federal do Brasil e o desenvolvimento econômico, social e político brasileiro. In: O DESENVOLVIMENTO Econômico E A Caixa, por Caixa. Rio de Janeiro: Centro Celso Furtado, 2011. p. 167-181.
  • SCHELLER, F. Estadão Economia 2014. Disponível em: http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,produtividade-baixa-impede-que-brasil-cresca-mais-imp-,1139095 Acesso em: 25 jul. 2014.
    » http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,produtividade-baixa-impede-que-brasil-cresca-mais-imp-,1139095
  • STIGLITZ, J. The role of the State in financial markets The World Bank, 1994.
  • STIGLITZ, Joseph. The role of the state in financial markets World Bank, 1994.
  • STUDART, Rogério; HERMANN, Jennifer. Estrutura e operação dos sistemas financeiros no Mercosul: perspectivas a partir das reformas institucionais dos anos 1990 Brasília: Cepal, 2001. (Texto para Discussão, n. 799).
  • TAVARES, D. Existe alternativa ao mercado de capitais. Rumos, n. 274, p. 42-43, 2014.
  • VALIAS NETO, MONTICELI, F.; VAL COSENTINO, D. Rômulo Almeida: Banco do Nordeste do Brasil e a Comissão de Planejamento Econômico da Bahia. Desenbahia, v. 11, n. 20, p. 177-197, 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    19 Abr 2017
  • Aceito
    19 Ago 2018
Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, Publicações Rua Pitágoras, 353 - CEP 13083-857, Tel.: +55 19 3521-5708 - Campinas - SP - Brazil
E-mail: publicie@unicamp.br