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Integração regional no Sul Global: Brasil, África do Sul e Índia

Regional Integration in the Global South: Brazil, South Africa and India

Resumo

Este artigo discute a integração regional no Sul Global, a partir de uma análise comparada entre Brasil, África do Sul e Índia. Em particular, destacam-se os governos do Partido dos Trabalhadores (PT) entre 2003 e 2016, as administrações do Congresso Nacional Africano sob Thabo Mbeki (1999-2009) e do Congresso Nacional Indiano (INC) entre 2004 e 2014. Examinamos como projetos de internacionalização de setores capitalistas destes países se articularam a iniciativas de integração regional no seu entorno geográfico imediato, para indagar em que medida este movimento foi concebido pelos governos analisados, como parte de uma estratégia de projeção política. Procura-se identificar quais os principais setores econômicos interessados na integração regional, em que medida o Estado nacional dos respectivos países avançou uma estratégica coerente respaldando estes interesses, e se havia uma intencionalidade política acompanhando o apoio a estes negócios. A hipótese do artigo é que, embora os três governos tivessem objetivos de política regional comparáveis, visando consolidar uma posição de liderança política assentada na projeção econômica, a comparação salienta a singularidade da estratégia brasileira sob as gestões petistas, que resulta de considerações de natureza histórica, política e econômica.

Palavras-chave:
Integração regional; Brasil; Índia; África do Sul; Globalização

Abstract

This article discusses regional integration in the Global South, based on a comparative analysis between Brazil, South Africa and India. In particular, we focus on the governments of the Workers’ Party (PT) between 2003 and 2016, the administrations of the African National Congress under Thabo Mbeki (1999-2009) and the Indian National Congress (INC) between 2004 and 2014. We analyze how the internationalization projects of the capitalist sectors of these countries have articulated themselves to regional integration initiatives in their immediate geographical surroundings, to examine to what extent this movement was conceived, by the analyzed governments, as part of a strategy of political projection. It aims to identify the main economic sectors interested in regional integration; the extent to which the national states of the respective countries have developed a coherent strategy to support these interests; and whether political intention accompanied support for these businesses. The article hypothesizes that, although the three governments had comparable regional policy goals, aiming at consolidating a political leadership position based on the economic projection, the Brazilian strategy under PT’s administrations was unique, as a result of historical, political and economic considerations.

Keywords:
Regional integration; Brazil; India; South Africa; Globalization

Introdução

O objetivo deste artigo é explorar, em perspectiva comparativa, uma das dimensões da resposta à globalização avançada por três países que integram os BRICS: Brasil, África do Sul e Índia. Especificamente, examinaremos como projetos de internacionalização de setores capitalistas destes países se articularam a iniciativas de integração regional no seu entorno geográfico imediato, indagando em que medida esta projeção de interesses mercantis foi concebida pelos governos analisados, como parte de um projeto político. Tendo em vista este enfoque, adquire particular importância a análise das iniciativas de integração que concernem à infraestrutura e à articulação entre setores produtivos destas regiões. Procura-se identificar quais os principais setores econômicos interessados na integração regional, em que medida o Estado nacional dos respectivos países avançou uma estratégica coerente respaldando estes interesses, e se havia uma intencionalidade política acompanhando o apoio a estes negócios.

A questão de fundo que norteia a análise é investigar se houve na Índia, sob o governo do Congresso Nacional Indiano entre 2004 e 2014, e na África do Sul, sob o Congresso Nacional Africano, em particular na presidência de Thabo Mbeki (1999-2008), projetos de integração regional comparáveis àquele avançado no Brasil sob as administrações do Partido dos Trabalhadores (2003-2016). Nossa hipótese é que, embora os três governos tivessem objetivos de política regional comparáveis, visando consolidar uma posição de liderança política assentada na projeção econômica de negócios nacionais, considerações de natureza histórica, política e econômica determinaram que a África do Sul e a Índia não implementassem uma estratégia similar à brasileira. Na medida em que a política de integração regional é uma dimensão da resposta avançada por estes países diante dos desafios colocados pela globalização, a comparação proposta contribui para uma reflexão sobre este fenômeno na perspectiva das singularidades históricas dos países referidos, em concordância com a análise de Robinson: “Não é possível entender algo sobre a sociedade global sem estudar uma região concreta e suas circunstâncias particulares - a parte de uma totalidade, em relação com aquela totalidade” (Robinson, 2017ROBINSON, William I. The transnational state and the BRICS: a global capitalism perspective. Third World Quarterly, v. 36, n. 1, p. 1-21, 2015., p. 17).

O ponto de partida da comparação são as políticas das gestões petistas no Brasil (2003-2016) para a América do Sul. Como este assunto já foi abordado em outro trabalho (Santos, 2018SANTOS, Fabio Luis Barbosa dos. Neodesenvolvimento do subdesenvolvimento: o Brasil e a economia política da integração sul-americana sob o PT. In: SILVA FLORES, Consuelo; NOYOLA, Ariel; KAN, Julián (Coord.). América Latina: una integración regional fragmentada y sin rumbo. Clacso; Iade: Buenos Aires, 2018.), apenas as linhas fundamentais desta política serão delineadas, para nas seções seguintes focalizar, respectivamente, os casos da África do Sul e da Índia. Em termos metodológicos, nossa análise remete às considerações de Marc Bloch em relação à comparação:

Antes do mais, no nosso domínio, o que é comparar? Incontestavelmente, é o seguinte: escolher em um ou vários meios sociais diferentes, dois ou vários fenômenos que parecem, à primeira vista, apresentar certas analogias entre si, descrever as curvas da sua evolução, encontrar as semelhanças e as diferenças e, na medida do possível, explicar umas e outras. São, portanto, necessárias duas condições para que haja, historicamente falando, uma comparação: uma certa semelhança entre os factos observados - o que é evidente - e uma certa dissemelhança entre os meios onde tiveram lugar (Bloch, 1998BLOCH, Marc. História e historiadores. Lisboa: Teorema, 1998., p. 21).

Entendemos que esta é, precisamente, a situação com que nos deparamos, ao enfocar países cuja trajetória apresenta evidentes analogias, mas também notáveis particularidades. Historicamente, África do Sul, Índia e Brasil são os três países caracterizados como subdesenvolvidos que mais avançaram na direção de uma indústria nacional, sem romper com o capitalismo, nas respectivas regiões em que estão situados: a América Latina, a África e o sudeste asiático. Nos três casos, a reprodução de desigualdades sociais pelas quais estes países são mundialmente conhecidos, associada à perpetuação da vulnerabilidade externa que foram incapazes de superar, limitou o alcance dos projetos associados ao desenvolvimento nacional no período da Guerra Fria.

Já no final do século XX, a aceleração da abertura à entrada de produtos, empresas, fluxos e operadores financeiros dos países centrais, em um movimento que se confunde com a própria globalização, esteve associado à difusão da agenda política identificada com o neoliberalismo. Entretanto, a forma como o neoliberalismo penetrou em cada país esteve condicionada por múltiplas particularidades, dentre as quais é possível destacar, no plano político, a emergência do Partido dos Trabalhadores no contexto de transição democrática no Brasil; o fim do apartheid e o novo papel do African National Congress (ANC) na África do Sul; a corrosão do prestígio do Indian National Congress (INC), que comandava o país desde a independência, e o ressurgimento da política comunal. De modo análogo, a institucionalização de um regime multilateral referido à Organização Mundial do Comércio (OMC) em 1994, reforçou a pressão para a formação de blocos econômicos. Neste contexto, os países adotaram estratégias de integração regional específicas, mas que admitem analogias, como se verá.

Nos três casos, constata-se uma inflexão relativamente simultânea em direção ao neoliberalismo: no Brasil, a referência é o Plano Real de 1994; na África do Sul, a adoção da política Growth, Employment and Redistribution (GEAR) em 1996, que marcou a guinada no CNA em direção neoliberal; e na Índia, a New Economic Policy implementada em 1991, marco de um movimento análogo neste país, então sob o comando do CNI. Nos três casos, a agenda de austeridade econômica teve efeitos sociais deletérios, o que por sua vez, gerou repercussões políticas. No caso brasileiro, o desgaste político do partido identificado com a implementação da agenda do ajuste estrutural, o PSDB de Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), favoreceu a eleição, pela primeira vez na história do país, de um presidente de origem operária e líder do Partido dos Trabalhadores, naquele momento um dos mais importantes partidos de esquerda no mundo.

Na Índia, a guinada neoliberal significou um afastamento do nacionalismo econômico que caracterizou as administrações do CNI desde a independência sob a liderança de Jawaharlal Nehru (1947-1964), fazendo da Índia o país do Terceiro Mundo que mais avançou na direção do planejamento econômico e da presença do Estado na economia, nos marcos do capitalismo. Esta inflexão incidiu sobre dois outros pilares da política nehruviana, o não-alinhamento internacional e a política secular. Neste contexto, a dominação do partido que comandou o país desde a independência foi gradualmente corroída em favor da política do nacionalismo hindu, comandada pelo Bharatiya Janata Party (Partido do Povo Indiano), que governou o país por um mandato completo pela primeira vez entre 1998 e 2004. Neste último ano, o partido do Congresso venceu as eleições, em uma campanha na qual fez uma espécie de mea culpa em relação à política de austeridade que anteriormente implementou, prometendo “reformas com um rosto humano” (Nielsen, 2019NIELSEN, Alf. India’s trajectory of change (2004-2019). 2019. To be published.). Eleito com apoio da esquerda, o partido não rompeu com os parâmetros da macroeconomia neoliberal, mas ao longo de dois mandatos avançou uma série de leis sociais, configurando o que foi descrito como uma modalidade de “neoliberalismo inclusivo” (Ruckert, 2010RUCKERT, A. The forgotten dimension of social reproduction: the World Bank and the poverty reduction strategy paradigm. Review of International Political Economy, v. 17, n. 5, p. 816-839, 2010.), o que justifica aproximá-lo aos governos do PT. Desde 2014, o BJP retomou o comando do país, liderado pelo atual primeiro-ministro Narendra Modi, reeleito em 2019. Uma nova hegemonia se consolidou desde então, sob a égide do nacionalismo hindu (Vanaik, 2017VANAIK, Achin. The rise of Hindu authoritarianism. London: Verso, 2017.).

Na África do Sul, o prestígio do CNA como organização que comandou a luta contra o apartheid sob a liderança de Nelson Mandela, é comparável ao que investiu o Partido do Congresso Indiano no contexto pós independência: à sua maneira, o apartheid foi uma emancipação da nação. No país africano, o padrão de dominação política do CNA desde o fim do apartheid, também é análogo ao que prevaleceu na Índia até o final do século passado, configurando uma modalidade de partido de Estado, que monopoliza a política nacional. Assim, as duas alternâncias registradas até o momento no século XXI, quando Jacob Zuma substituiu Thabo Mbeki em 2009 e, depois, foi sucedido por Cyril Ramaphosa em 2018, resultaram de disputas no seio desta organização, que culminaram, em ambos os casos, com renúncias do presidente para evitar processos de impeachment. Nesta realidade, a inflexão neoliberal nos anos 1990 foi vivida com decepção e, em alguns casos, provocou resistências na base popular do novo regime, mas, ao coincidir com o celebrado fim da segregação racial, não colocou em xeque a legitimidade do partido no poder (Marais, 2001MARAIS, Hein. South Africa: limits to change. The political economy of transition. Cape Town: University of Cape Town, 2001.).

Embora seja legítimo comparar o PT ao CNA, na medida em que ambos os partidos chegaram à presidência como portadores históricos de expectativas de mudança, e os governos que comandaram se defrontaram com dilemas similares, o contexto em que cada organização surgiu é significativamente distinto. O combate ao regime do apartheid e a transição que o sucede, são processos históricos de natureza e alcance diferentes em relação à redemocratização brasileira, por importante que esta tenha sido no contexto deste país. Entretanto, há notáveis paralelos entre o governo do sucessor de Mandela, Thabo Mbeki (1999 a 2008) e as gestões petistas. As administrações de Mbeki beneficiaram-se de altas taxas de crescimento puxadas pelo boom das commodities, que permitiram investimentos sociais e a injeção de recursos nas State Owned Enterprises (SOEs), entendidas como veículos do empoderamento negro, mas também como instrumentos importantes de um governo que viu a si mesmo como desenvolvimentista (Pons-Vignon e Segatti, 2013PONS-VIGNON, Nicolas; SEGATTI, Aurelia. The art of neoliberalism: accumulation, institutional change and social order since the end of apartheid, Review of African Political Economy, v. 40, n. 138, p. 507-518, 2013. DOI: 10.1080/03056244.2013.859449.
https://doi.org/10.1080/03056244.2013.85...
; Tleane, 2018TLEANE, Lekgantshi Console. South Africa’s “Radical Economic Transformation”. Sept. 2018.). No plano internacional, Mbeki liderou um esforço de recuperação do ideal de unidade africana sob a égide de uma “African Renaissance”, comparável à agenda petista para a América do Sul. De fato, ambos governos foram comparados na chave de uma “hegemonia às avessas”, em que partidos de extração popular afiançavam projetos neoliberais (Braga, Oliveira e Rizek, 2010BRAGA, Ruy; OLIVEIRA, Francisco; RIZEK, Cibele (Org.). Hegemonia às avessas. São Paulo: Boitempo, 2010.).

Por sua vez, o partido do Congresso indiano também já foi identificado com uma variante socialista, de modo que em 1976, o termo “socialismo” foi incluído no preâmbulo da constituição do país. Embora no século XXI as ligações com o socialismo fossem remotas, o partido foi eleito em 2004 com apoio da esquerda, em um pleito que mobilizou o conjunto das forças progressistas do país em oposição ao nacionalismo hindu. Em suma, ao aproximar Brasil, África do Sul e Índia sob os governos do PT, do CAN e do INC no século XXI, constata-se uma “certa semelhança”, mas também uma “certa dissemelhança”, que tornam pertinente a comparação, segundo Marc Bloch.

1 Brasil

No caso brasileiro, que serve como referência original para a comparação, o substrato econômico da política de integração regional petista foi a estratégia de apoiar a internacionalização de grandes empresas de capital nacional ou sediadas no país, entendidas como vetor do desenvolvimento capitalista nacional: é a política das “campeãs nacionais”. Este apoio se materializou principalmente por meio de uma diplomacia empresarial, praticada pelo Itamaraty, e pela política de crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Em 2003, o banco alterou seu estatuto para ofertar uma nova linha de crédito especial estimulando a inserção externa destas empresas, desde que promovessem as exportações brasileiras. Entre 2003 e 2009, o crédito concedido com esta finalidade por meio do programa BNDES Exim, saltou de U$ 42 milhões para U$ 1.26 bilhões, configurando um aumento de cerca de 3000% (Folha, 2009FOLHA DE SÃO PAULO. Brasil faz obras nos vizinhos temendo a China. Folha de São Paulo, São Paulo, Caderno Dinheiro, B6, 27 set. 2009.). Em 2010, o volume de crédito movimentado pelo BNDES atingia U$ 96,32 milhões, o que era 3,3 vezes superior aos US$ 28,6 milhões concedidos pelo Banco Mundial neste ano, e muito mais do que os US$ 11,4 milhões movimentados pelo BID. Esta expansão esteve diretamente relacionada ao crescimento da economia brasileira, cujo PIB naquele ano crescera 7,5% nos marcos do boom das commodities, colocando o país como a sétima economia mundial (Estado, 2011ESTADO DE SÃO PAULO. BNDES empresta 3915 mais em 5 anos e supera em 3,3 vezes o Banco Mundial. São Paulo, 10 mar. 2011. Disponível em: Disponível em: http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,bndes-empresta-391-mais-em-5-anos-e-supera-em-tres-vezes-o-banco-mundial-imp-,689817 . Acesso em: 16 maio 2016.
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).

Outra forma de apoiar esta internacionalização foi a atuação da BNDES Participações S.A. (BNDESPar), que capitaliza empresas por meio da aquisição de ações ou debêntures. Em 2009, o BNDESPar detinha participação em 22 multinacionais com sede no Brasil, e investimentos que totalizavam R$ 92,8 bilhões, correspondentes a 4% da capitalização total do mercado acionário brasileiro (Tautz et al., 2010TAUTZ, Carlos; SISTON, Felipe; LOPES PINTO, João Roberto; BADIN. O BNDES e a reorganização do capitalismo brasileiro: um debate necessário. In: OS ANOS Lula contribuições para um balanço crítico: 2003-2010. Rio de Janeiro: Garamond, 2010,, p. 261). Em 2012, 89% das ações do BNDESPar concentravam-se nos seguintes setores: petróleo, mineração, papel e celulose, energia e frigoríficos (Garzón, 2013GARZÓN. L. F. N. A esfinge, o BNDES e as “campeãs” que nos devoram. Correio Cidadania, 3 maio 2013. Disponível em: Disponível em: http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option= com_content&view=article&id=8329%3Amanchete030513&catid=34%3Amanchete& . Acesso em: 8 ago. 2016.
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). A ação do banco intensificou a concentração de capitais em setores da economia brasileira, movimento acelerado com a crise mundial em 2008, e que teve seu ponto alto em 2010, quando registraram-se mais de 700 operações de fusões e aquisições de empresas brasileiras. Para dar alguns exemplos: o banco proporcionou R$ 6 bilhões ao grupo JBS para aquisições no Brasil e no exterior, que a converteram na maior produtora de carne do mundo; R$2,4 bilhões para a Votorantim Celulose adquirir a Aracruz Celulose, resultando também em uma das maiores produtoras de celulose, a Fibria; mais de R$1,5 bilhão para a fusão da Sadia com a Perdigão, tornando o grupo Brasil Foods o maior exportador mundial de frango. No entanto, o protagonista da expansão internacional dos negócios brasileiros foi a construção civil, setor que se fortaleceu sob a ditadura e diversificou suas atividades ao se envolver com as privatizações nos anos 1990, também impulsionadas pelo BNDES (Campos, 2009CAMPOS, Pedro Henrique. As origens da internacionalização das empresas de engenharia brasileiras’. Em: FUNDAÇÃO ROSA LUXEMBURGO. Empresas transnacionais brasileiras na América Latina: um debate necessário. São Paulo: Expressão Popular, 2009.). De modo geral, estas empresas tornaram-se conglomerados diversificados, que têm na construção apenas mais um ramo de atividade. Deve-se lembrar que o setor também foi estimulado pela gestão petista por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de modo que há quem interprete este apoio do BNDES à expansão internacional das empreiteiras como uma extensão do PAC (Garzón, 2013GARZÓN. L. F. N. A esfinge, o BNDES e as “campeãs” que nos devoram. Correio Cidadania, 3 maio 2013. Disponível em: Disponível em: http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option= com_content&view=article&id=8329%3Amanchete030513&catid=34%3Amanchete& . Acesso em: 8 ago. 2016.
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).

A estratégia regional subjacente a esta expansão mercantil é ilustrada pelo caso peruano. Em 2010, os presidentes Alan García e Lula da Silva assinaram um acordo prevendo a construção de cinco hidrelétricas na Amazônia peruana, que exportariam 80% da sua produção para o Brasil. A primeira e principal delas se situaria em Inambari, obra adjudicada a um consórcio de três empresas brasileiras, liderada pela construtora OAS. Mais além do projeto em si, pretendia-se desencadear um movimento orientado a acoplar a economia peruana ao Brasil, como aconteceu com a construção do gasoduto boliviano no final dos anos 1990, marco a partir do qual o Brasil se tornou o principal parceiro comercial deste país. Na visão dos formuladores brasileiros, o resultado é que se estreitariam os laços econômicos regionais, fortalecendo a base material para a autonomia política da região, sob a liderança brasileira (Araujo, 2015ARAUJO, Joaquim. Chefe do Setor de Defesa e Cooperação da Embaixada do Brasil no Peru. Lima, jul. 2015.; Paloschi, 2015PALOSCHI, Jonas. Chefe do Setor Cultural e de Cooperação Educacional da Embaixada brasileira no Peru. Lima, jul. 2016). Em linhas gerais, a racionalidade petista previa que a internacionalização de corporações brasileiras serviria de alicerce material para projetar regionalmente a influência do país, modificando seu padrão de inserção internacional, fazendo do Brasil um global player.

Foi nesta perspectiva que se criou, em 2008, a União das Nações Sul-Americanas (UNASUL). Em contraste com a lógica pleiteada pela Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América (ALBA), que apontava para uma integração contrahegemônica de escopo latino-americano, a UNASUL esteve pautada desde a origem pelo mínimo denominador comum capaz de aglutinar políticas díspares na América do Sul, como as praticadas então pelos governos de Venezuela e Colômbia. Mais além de realizações bem-vindas porém de escasso impacto estrutural, como acordos para a convalidação de diplomas e compras conjuntas de vacina, esperava-se que a criação do Cosiplan como organismo da Unasul invertesse a racionalidade original da carteira de projetos associada à Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), originalmente concebida pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) como a dimensão de infraestrutura de um projeto de integração referenciada no regionalismo aberto, segundo uma racionalidade orientada por corredores de exportação de matérias-primas.

Do ponto de vista brasileiro, o movimento integracionista ampliava as frentes de negócio e fortalecia seu protagonismo político. Os demais países da região tinham duas motivações fundamentais para se somarem. Por um lado, houve aqueles que enxergaram uma oportunidade de consolidar um campo político alternativo à influência estadunidense. Esta foi a motivação subjacente aos países sul-americanos que integram a ALBA, uma iniciativa de integração potencialmente mais radical que foi neutralizada, na prática, pela conduta brasileira. Por outro lado, houve países que fizeram negócios com o Brasil como fazem com qualquer país, como é o caso do Peru. Sintomaticamente, Venezuela e Peru são os dois países em que a Odebrecht, corporação que simbolizou a expansão apoiada pelas gestões petistas, movimentou maior volume de negócios (Chan, 2015CHAN, Alan. Diretor da operação da Odebrecht no Peru. Lima, jul. 2015.).

Embora a Unasul não possa ser reduzida a uma iniciativa brasileira, pois resultou da confluência de interesses de diversos governos da região, a racionalidade que se impôs obedecia aos desígnios da política petista, pretendendo ampliar a margem de manobra política da região, sem questionar os fundamentos da hegemonia dos Estados Unidos. Neste sentido, a Unasul emergiu com um segundo papel importante a cumprir: mediar conflitos e tensões na região, papel que ensaiou exercer na Venezuela enquanto esteve ativa. Embora convivesse com outras iniciativas integracionistas com que o Brasil está envolvido, notadamente o Mercosul, a Unasul merece destaque porque foi uma organização criada no período que analisamos e que pode ser vista como a principal tradução política do projeto que se pretendeu avançar. Em síntese, o neodesenvolvimentismo brasileiro sob a égide do PT correspondeu a um desígnio de integração desenvolvimentista ou pós-neoliberal, que vislumbrou a internacionalização de negócios brasileiros como alicerce de um projeto de liderança regional, expresso na criação da Unasul, ambicionando fortalecer o papel do país no cenário internacional (Garcia, 2018GARCIA, Marco Aurelio. A opção sul-americana. Reflexões sobre a política externa (2003-2016). Org. Bruno Gaspar e Rose Spina. São Paulo: Perseu Abramo, 2018.). Sintomaticamente, a eleição de Bolsonaro modificou a orientação da política externa brasileira, e no plano regional, colocou em xeque a própria existência da Unasul, mas não o Mercosul.

2 África do Sul

Quando a África do Sul se juntou aos países BRIC em 2011, muitos apontaram que este recrutamento não correspondia a critérios estritamente econômicos, mas envolvia considerações de outra natureza, principalmente geopolítica. Afinal, o PIB do país era, em 2018, cerca de 1/3 do mexicano, turco ou sul-coreano, ou 1/5 do brasileiro (Bond e Garcia, 2015BOND; Patrick; GARCIA, Ana. BRICS: an anti-capitalistic critique. Johannesburg: Jacana, 2015.). No entanto, o país é a segunda maior economia da África, depois da Nigéria rica em petróleo. Visto em perspectiva regional, o país responde por 1/3 do PIB da África subsaariana, ou – do PIB da South African Development Comunity (SADC), que congrega os países mais próximos. Conforma-se uma situação paradoxal, uma vez que a economia da África do Sul tem uma dimensão modesta no plano global, ao mesmo em que tem um peso desproporcional na relação com os demais Estados da região.

Neste contexto, o país é visto, desde o fim do apartheid, como um candidato natural à liderança regional. Formuladores de políticas no país entendem que este papel é uma condição necessária para a projeção mundial do país. Nas palavras de uma diretora do South African Institute of International Affairs (SAIIA), se a África do Sul quiser ser um hegemon, precisa de tamanho, ou seja: precisa de uma região (Bertelsmann-Scott, 2018BERTELSMANN-SCOTT, Talitha. Diretora do Regional Observatory do SAIIA. Joanesburgo, jun. 2018.).

Como consequência, impõem-se relações ambivalentes com os países vizinhos, uma vez que a expectativa de que a África do Sul assuma uma liderança regional é contraposta ao receio de que este papel seja exercido de modo a reforçar interesses particulares no contexto regional: o temor de um “subimperialismo sul-africano” (Bond, 2006BOND, Patrick. O império norte-americano e o subimperialismo sul africano. In: PANITCH, Leo; LEYS, Colin. O império reloaded. Socialist Register 2005. Buenos Aires: CLACSO, 2006.). Nesta perspectiva, a ideia de Mandela de que a África do Sul não pode ser uma ilha de prosperidade em um mar de pobreza (ainda que esta prosperidade seja relativa), é problematizada pela natureza dos nexos econômicos do país com seu entorno imediato.

O país tem uma relação comercial superavitária com o continente africano, concentrada nos países vizinhos, para os quais exporta cinco vezes mais do que importa. Historicamente, o eixo da acumulação de capital no país é o que Fine e Rustomjee descreveram como o complexo mineral-energético (Mineral-Energy Complex), salientando a centralidade das atividades mineiras para o desenvolvimento econômico e para a própria industrialização sul-africana (Fine; Rustomjee, 1996FINE, Ben; RUSTOMJEE, Zavareh. The political economy of South Africa: from minerals-energy complex to industrialization. Boulder: Westview Press, 1996.). No entanto, enquanto – das exportações sul-africanas para o resto do mundo envolvem minerais, no comércio com o continente o país exporta manufaturas: 86% das exportações industriais da África do Sul tem como destino a África, e dentre estas, 70% são absorvidas pelos países mais próximos - o chamado BNLS: Botswana, Lesotho, Namíbia e Swazilândia. Nas relações comerciais entre estes países se institucionalizou o uso do rand, moeda sul-africana (Gwynne-Evans, 2018GWYNNE-EVANS, Nigel & Industrial Development. Department of Trade and Industry. Governo da África do Sul. Joanesburgo, jun. 2018.). Em 2013, a África do Sul exportou mais manufaturas para Botswana do que para a China, mais para o Lesotho do que para Rússia e Brasil somados.

Neste mesmo ano, o superávit com vizinhos regionais (BNLS mais Moçambique e Zimbabwe) foi suficiente para compensar 2/3 do seu déficit comercial com o resto do mundo. As exportações para o entorno responderam por cerca de 18% do total, uma importância superior à da China (14%), seu principal destino mundial. A África subsaariana foi o destino de 28% das exportações do país e 43% das exportações de manufaturados, dos quais ¼ se dirigiu aos países vizinhos (Alence, 2015, 285). As manufaturas sul-africanas não competem globalmente com as indústrias low-cost asiáticas, mas a proximidade geográfica compensa os custos de produção no contexto regional. Como decorrência, o comércio intraregional é uma fonte de divisas crucial para a estabilidade macroeconômica do país, e para a vitalidade da sua combalida indústria (Dube, 2018DUBE, Cornelius. Zimbabwe Economic Policy Analysis and Research Unit. Harare, jun. 2018.; Tembo, 2018TEMBO, Bernard. Zambia Institute for Policy Analysis and Research (ZIPAR). Lusaka, jun. 2018.).

2.1 Nepad

O fim do apartheid em 1994 abriu a possibilidade da África do Sul afirmar sua liderança regional. O país se integrou à SADC, constituída nos anos 1980 pelos chamados Frontline States com o objetivo original de, justamente, contornar a dependência econômica da região em relação à África do Sul. Entretanto, no início do século XXI, a política externa sul-africana adotou um escopo mais abrangente, orientando-se para o continente como um todo. O sucessor de Nelson Mandela (1994-1999), Thabo Mbeki (1999-2008), ancorou-se no prestígio mundial do CNA naquele momento para capitanear uma tentativa de recuperar o ideário de unidade continental, nos marcos de um “renascimento africano”. A principal expressão desta política foi a New Partnership for Africa’s Development (NEPAD), surgida em 2001.

Apesar do esforço em conceder à Nepad uma legitimidade continental, Mbeki foi desde o início, seu principal propulsor: como indício de seu compromisso, o governo sul-africano fretou um avião que levou 80 funcionários para o lançamento da iniciativa em Abuja na Nigéria, oferecendo carona aos participantes angolanos no caminho (Muller, 2018MULLER, Mike. Engenheiro, consultor de empresas do setor hidroelétrico. Pesquisador da Wits School of Governance. Joanesburgo, jun. 2018.). Embora vinculada à União Africana, o secretariado da Nepad incluiu desde o início pessoal do Development Bank of South Africa (DBSA) sediado em Midrand, e opera até os dias de hoje em um prédio próximo ao banco (Tschandu, 2018).

Angulada na perspectiva de uma integração africana e não de um regionalismo sul-africano, Nepad foi concebida a partir de uma abordagem fundamentalmente política (Gwynne-Evans, 2018GWYNNE-EVANS, Nigel & Industrial Development. Department of Trade and Industry. Governo da África do Sul. Joanesburgo, jun. 2018.). No plano do desenvolvimento, vislumbrou-se um conjunto de projetos de integração de infraestrutura, cuja realização estava referida a um novo padrão de relacionamento com as potências mundiais que se propunha - daí a ideia de uma “nova parceria”. Concretamente, os projetos dependiam de recursos obtidos fora do continente para saírem do papel, conforme reconhecia o parágrafo 147 do seu documento fundador (Bond, 2005BOND, Patrick (Ed.). Fanon’s warning. A civil society reader on the New Partnership for Africa’s Development. 2. ed. Asmara: Africa World Press. 2005., p. 207). Como a maioria dos países envolvidos é pobre, a iniciativa dependeu da mobilização de doadores internacionais, que não decolou. Com o tempo, Nepad acabou se transformando em uma longa lista de desejos não realizados e, em 2018, era vista como um projeto que perdeu relevância, processo acelerado durante a gestão de Jacob Zuma (2009-2018), que concedeu escassa importância à política externa e à integração regional (Pere, 2015PERE, Gareth le. The evolution of South Africa’s foreign policy. In: KHADIAGALA, Gilbert M.; NAIDOO, Prishani; PILLAY, Devan; SOUTHALL, Roger. New South African Review 5. Beyond Marikana. Johannesburg: Wits University Press, 2015, p. 249-267.).

Entretanto, a dimensão infraestrutural da integração continental subjacente aos projetos que convergiram em Nepad foi, em certa medida, recolhida e cultivada sob a égide do African Development Bank (AfDB). O banco gerencia o fundo NEPAD-Infrastructure Project Preparation Facility (IPPF), constituído em 2005, e que em 2018, mobilizava U$ 102 milhões amealhados a partir de uma diversidade de contribuidores. O foco desta instituição é tornar financiáveis (bankable) projetos de infraestrutura na região (NEPAD-IPPF, 2018). Muitos destes projetos confluíram para a carteira do Programme for Infrastructure Development in Africa (PIDA), concebido em 2012 como o sucessor da Medium to Long Term Strategic Framework (MLTSF) da Nepad. PIDA tem como propósito articular uma visão estratégica de conjunto para o desenvolvimento da infraestrutura regional e continental no longo prazo (2012-2040), pensada a partir de quatro dimensões: energia, transporte, informação e tecnologias da comunicação, e recursos hídricos transfronteiriços.

Formalmente, African Union Commission (AUC) e Nepad compartilham com o AfDB a responsabilidade sobre o PIDA, mas concretamente, o banco é a agência executora do programa, uma posição similar à do BID em relação à IIRSA na América do Sul. Também à maneira da IIRSA, o PIDA arrolava em 2017 uma lista de 51 “Priority Action Plan” (PAP) - projetos e programas prioritários distribuídos pelo continente, que se desdobravam em 433 projetos nas quatro dimensões citadas. O custo estimado das obras entre 2012 e 2020 era de U$ 68 bilhões anuais, dos quais 95% se concentravam em projetos de energia e transporte. Os financiadores incluem o próprio AfDB, bem como instituições vinculadas ao governo do Japão, da Alemanha e a União Europeia, entre outras (PIDA, 2017PIDA. 2017. Disponível em: Disponível em: https://www.afdb.org/en/topics-and-sectors/initiatives-partnerships/programme-for-infrastructure-development-in-africa-pida/ . Acesso em: 27 dez. 2018.
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). Entretanto, de acordo com a agência Nepad, havia uma lacuna de recursos da ordem de U$ 31 bilhões anuais, que incluem 75% dos investimentos de capital e 25% das despesas de manutenção (OSSA, 2015OSSA. Office of the Special Advisor in Africa. Financing Africa’s infrastructure development. Policy Brief, 2015. Disponível em: Disponível em: http://www.un.org/en/africa/osaa/pdf/policybriefs/2015_financing_infrastructure.pdf . Acesso em: 27 dez. 2018.
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).

Endereçando este problema, o AfDB estabeleceu Africa50 como um instrumento para mobilizar o financiamento privado em infraestrutura, enquanto Nepad iniciou em 2017 a campanha “Agenda 5%”, estimulando os investidores a aplicar 5% dos seus fundos em infraestrutura no continente, em lugar dos atuais 1,5% (NEPAD, 2017). Nos marcos deste esforço, a campanha defende que se reformem os marcos regulatórios nacionais e regionais que orientam o investimento institucional na África. Ao mesmo tempo, estimula o desenvolvimento de novos produtos no mercado de capitais para diminuir o risco do crédito, favorecendo que os proprietários de ativos africanos identifiquem no investimento em infraestrutura um ativo atrativo para o seu portfólio. A campanha foi lançada em setembro de 2017 na bolsa de Nova Iorque (SIF, 2017).

Toda esta movimentação amparada pelo AfDB sugere que a Nepad proposta por Mbeki teve desdobramentos e rendeu frutos. Entretanto, a África do Sul perdeu o papel de liderança a que se propôs. Com sede no Senegal, o AfDB é visto como um banco em que predominam funcionários francófonos, que tem como foco os países de baixa renda, e que, portanto, não é muito envolvido com a África do Sul, país mais visto antes como fonte de capital no continente do que como um recebedor (Bertelsmann-Scott, 2018BERTELSMANN-SCOTT, Talitha. Diretora do Regional Observatory do SAIIA. Joanesburgo, jun. 2018.). Analisando a carteira de projetos PIDA em 2018, observa-se apenas 5 projetos envolvendo a África do Sul, incluindo a modernização de dois postos de fronteira. Em contraste, um país pequeno como Ruanda recebe 9 projetos, enquanto Uganda tem quase vinte dos 411 projetos listados (PIDA, 2018PIDA. 2017. Disponível em: Disponível em: https://www.afdb.org/en/topics-and-sectors/initiatives-partnerships/programme-for-infrastructure-development-in-africa-pida/ . Acesso em: 27 dez. 2018.
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).

2.2 Uma estratégia regional?

Para além da Nepad, cabe indagar se os governos do CNA desenharam alguma estratégia para a projeção regional de negócios sul-africanos ou sediados no país, comparável à política das campeãs nacionais das administrações petistas. Em primeiro lugar, é pertinente investigar se há instituições financeiras que cumprem um papel análogo ao BNDES brasileiro.

Em tese, a Industrial Development Corporation (IDC) tem o papel de fomentar projetos associados ao desenvolvimento nacional. Entretanto, embora a IDC financie projetos de infraestrutura na região vinculados à exportação de serviços sul-africanos e ofereça algum financiamento industrial, sua participação é pequena e dirigida principalmente a projetos intensivos de capital no setor de mineração (Mohamed, 2010MOHAMED, Seeraj. The state of South African economy. In: DANIEL; NAIDOO; PILAY; NEPAD-IPPF. Nepad infrastructure project preparation facility. Disponível em: Disponível em: https://www.afdb.org/en/topics-and-sectors/initiatives-partnerships/nepad-infrastructure-project-preparation-facility-nepad-ippf/ . Acesso em: 27 dez. 2018.
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, 49). Um estudo que a compara ao BNDES aponta que o banco sul-africano não tem uma participação equivalente no planejamento e na concepção de políticas estatais, nem tem representação nos mais altos níveis do governo (Maia; Mondi; Roberts, 2005MAIA, J., MONDI, L.; ROBERTS, S. Industrial Development and Industrial Finance in South Africa and Brazil: a comparative assessment. Trade and Uneven Development: Opportunities and Challenges. TIPS Annual Forum, 2005.).

Já o DBSA, constituído originalmente para financiar o desenvolvimento dos bantustões, ampliou o seu escopo de atuação e, a partir de 1997, tem como mandato específico o desenvolvimento infraestrutural no sul do continente. Recentemente, a abrangência geográfica dos investimentos se ampliou, e o banco tem a pretensão de ir além da região SADC (Notshulwana, 2018NOTSHULWANA, Mxolisi. Senior Specialist. Infrastructure projects. International Financing Division. Development Bank of Southern Africa (DBSA). Joanesburgo, jun. 2018.). Porém, sua abordagem é essencialmente mercantil, financiando projetos comercialmente viáveis em áreas como energia e transporte. Em suma, considerados os limites políticos e financeiros do IDC e do DBSA, um ex-assessor do ministro da fazenda conclui que o país não tem instrumentos adequados para o investimento de longo prazo na região, só tem negócios (Kassim, 2018KASSIM, Fuad. Assessor do Minister of Finance at Treasury, 2010 a 2018. Joanesburgo, jun. 2018.).

Deste ponto de vista, a questão fundamental é saber se o DBSA poderá competir com as instituições estadunidenses e europeias. Em 2014, estes países abocanhavam 40% dos projetos no continente, cujo valor total alcançava U$325 bilhões, seguidos pelos chineses, que realizavam 12% das obras, enquanto empresas de países como Índia, Emirados Árabes e Austrália respondiam pelas demais (Deloitte, 2015DELOITTE. South African construction trends. Report, 2015. Disponível em: Disponível em: https://www2.deloitte.com/za/en/pages/energy-and-resources/articles/africa-construction-trends-report.html . Acesso em: 27 out. 2018.
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). Embora construtoras sul-africanas atuem no continente, especialmente no seu entorno regional, elas têm padecido diante da concorrência chinesa e a escala da sua presença não é comparável à expansão das construtoras brasileiras na América do Sul sob as gestões petistas.

Se a expansão da construção civil é inibida pela competição internacional, particularmente chinesa, e não tem como ponto de apoio fundamental instituições de crédito nacional, como se dá a internacionalização em outras áreas de negócios sul-africanos? Um setor que tem se expandido é o agronegócio, impulsionado pela escassez de água e terras em território sul-africano (Goga; Nair, 2018GOGA, Sumayya. Centre for Competition, Regulation and Economic Development (CCRED). University of Johannesburg. Joanesburgo, jun. 2018.). No entanto, em muitos casos este movimento se dá em associação com capitais globalizados que, em parte, atuam por meio da África do Sul. Empresas sul-africanas de sementes, agrotóxicos e fertilizantes participam de processos de fusões e aquisições, nos marcos da sua expansão internacional. Portanto, a expansão do agronegócio sul-africano tem acontecido em competição, mas também em associação com corporações dos países centrais, movimento que se observa em outros setores, como telecomunicações e mineração.

No plano da integração comercial, SADC, East African Community (EAC) e Common Market for Eastern and Southern Africa (Comesa) se engajaram em 2015 em uma área de livre-comércio abrangendo a metade dos países do continente. Em março de 2018, 44 dentre os 55 membros da União Africana assinaram em Ruanda um acordo para estabelecer uma área de livre comércio continental (CFTA). Embora fosse um dos principais incentivadores do acordo, a África do Sul não o assinou naquele momento por questões de sensibilidade política, mas certamente participará (Parshotam, 2018PARSHOTAM, Asmita. Pesquisadora do South African Institute of International Affairs (SAIIA). Joanesburgo, jun. 2018.). As corporações do país devem se beneficiar do fim de barreiras tarifárias em escala continental, como aconteceu na região austral. Entretanto, há uma leitura consensual de que a proposta de uma área de livre comércio continental esbarra em múltiplas dificuldades concretas. Neste contexto, a ideia de aprofundar a integração a partir das comunidades econômicas regionais, soa razoável (Cheelo, 2018CHEELO, Caesar. Macro-economic and monetary policy. Zambia Institute for Policy Analysis and Research. Lusaka, jun. 2018.; Mahaja, 2018).

Porém, obstáculos de outra natureza se colocam. SADC tem poucos funcionários que não são bem remunerados e a organização depende de doações, principalmente da União Europeia. Muitos países enfrentam problemas domésticos e rivalidades cuja solução está fora do alcance da diplomacia sul-africana. Ainda, prevalecem estradas ruins, alfândegas lentas, cortes de energia, entre outros gargalos estruturais (Bertelsmann-Scott, 2018BERTELSMANN-SCOTT, Talitha. Diretora do Regional Observatory do SAIIA. Joanesburgo, jun. 2018.). Como resultado, frequentemente a integração se concentra no setor mineral. E neste caso, muitas vezes se confunde com a mera expansão dos negócios sul-africanos na região (Cheelo, 2018CHEELO, Caesar. Macro-economic and monetary policy. Zambia Institute for Policy Analysis and Research. Lusaka, jun. 2018.).

Quando o Zimbabwe presidiu SADC em 2015, o país promoveu uma agenda de industrialização, visando a formação de cadeias regionais de valor. Entretanto, analistas consideram que a África do Sul não tem interesse nesta agenda. O foco da sua política é facilitar as trocas regionais. Mais especificamente, o foco sul-africano é promover a colaboração entre o setor privado, estimulando a expansão e penetração de seus negócios na região (Dube, 2018DUBE, Cornelius. Zimbabwe Economic Policy Analysis and Research Unit. Harare, jun. 2018.; Mahaja, 2018; Tembo, 2018TEMBO, Bernard. Zambia Institute for Policy Analysis and Research (ZIPAR). Lusaka, jun. 2018.).

Esta percepção remonta aos anos 1990. Naquele momento, o desmanche do apartheid encerrou o isolamento político do país, mas também o bloqueio econômico. Neste contexto, reformas reduziram as barreiras ao comércio intrarregional, o que favoreceu a expansão de negócios sul-africanos. Companhias nos ramos de supermercados, bancos, transporte, logística, mineração, construção, manufatura, serviços financeiros, telecomunicações, turismo e lazer, se expandiram pela região. As indústrias de pequena escala de Zâmbia e Zimbabwe foram particularmente afetadas pela concorrência do vizinho austral (Bond, 2005BOND, Patrick (Ed.). Fanon’s warning. A civil society reader on the New Partnership for Africa’s Development. 2. ed. Asmara: Africa World Press. 2005., p. 197). Em 2008, entrou em vigor a SADC Free Trade Area, aprofundando a tendência à integração comercial regional.

Em decorrência deste processo, o Zimbabwe, país que já teve 30% do PIB na indústria, agora é um escoadouro de manufaturas sul-africanas. Como em outros países da região, há bancos, grifes e supermercados sul-africanos que importam a quase totalidade dos seus produtos do seu país de origem. Capitais sul-africanos também têm uma importante participação no setor minerador, e controlam a produção de platina, que é refinada na África do Sul. Em Zâmbia observa-se uma trajetória similar. Em Lusaka, como em outras grandes cidades da África austral, há centros comerciais parecidos entre si e recheados de marcas sul-africanas, de modo que se alguém caísse do céu, pensaria que está em Johannesburgo (Mulobela, 2018MULOBELA, Whitney. Jornalista e ativista social, Non-Governamental Gender’s Organization Cordinating Council. Lusaka, jun. 2018.). De modo geral, analistas no Zimbabwe e em Zâmbia opinam que a projeção de negócios sul-africanos não é casual, e obedece a uma estratégia do governo deste país (Cheelo, 2018CHEELO, Caesar. Macro-economic and monetary policy. Zambia Institute for Policy Analysis and Research. Lusaka, jun. 2018.; Chirimambowa, 2018CHIRIMAMBOWA, Tamuka. Secretário executivo do Institute of Public Affairs in Zimbabwe. Harare, jun. 2018.; Mulobela, 2018MULOBELA, Whitney. Jornalista e ativista social, Non-Governamental Gender’s Organization Cordinating Council. Lusaka, jun. 2018.).

Entretanto, esta visão não é partilhada por observadores sul-africanos, que salientam debilidades do Estado para concretizar qualquer projeto neste sentido. Ao longo desta pesquisa, não foi possível mapear políticas específicas do Estado sul-africano em apoio da expansão regional, para além de uma atuação em prol da liberalização comercial. Na realidade, os testemunhos de analistas, servidores públicos de alto nível e homens de negócios sugere que esta expansão tem sido um assunto privado, que acontece em grande medida à revelia do Estado.

Um executivo da MTN, empresa de telefonia sul-africana que se expandiu globalmente, relata um episódio quando trabalhava na sua principal concorrente, Vodacom - atualmente controlada pela britânica Vodafone. Esta empresa teria entrado no mercado moçambicano em resposta a um pedido pessoal do então presidente Nelson Mandela. Do ponto de vista corporativo, trata-se de um país em que os potenciais clientes se concentram em poucas cidades esparsas em um vasto território, o que torna a cobertura telefônica dispendiosa e pouco rentável. Entretanto, como disse o executivo, “ninguém dizia não a Madiba” - modo como é conhecido Mandela. Questionado sobre a forma de penetração destas empresas na região, relatou que, frequentemente, governos convidam empresas sul-africanas a fazerem negócios em seu país, porque elas aportam investimento em economias pouco diversificadas (Nyoka, 2018NYOKA, Nkateko. Chief Officer of Legal and Regulatory at Vodacom. Anteriormente, trabalhou na MTN, a outra grande empresa de telecomunicações de origem sul-africana.).

Neste mesmo diapasão, mas de um ângulo distinto, um servidor que ocupava em 2018 um alto cargo vinculado ao Ministério de Indústria e Comércio, opina que há pouca estratégia governamental e que a expansão corporativa tem sido, em larga medida, um movimento na esfera privada (Gwynne-Evans, 2018GWYNNE-EVANS, Nigel & Industrial Development. Department of Trade and Industry. Governo da África do Sul. Joanesburgo, jun. 2018.). Prevalece entre os analistas a percepção de que a internacionalização evolui caso a caso, sem constituir uma política totalizadora que articule este movimento econômico a um projeto político de liderança regional, ou de projeção global (Goga e Nair, 2018GOGA, Sumayya. Centre for Competition, Regulation and Economic Development (CCRED). University of Johannesburg. Joanesburgo, jun. 2018.). Outro economista que serviu no governo lembra que as corporações sul-africanas se beneficiam do seu conhecimento da realidade africana para fazer negócios, escoradas na superioridade relativa das instituições e da infraestrutura do país no contexto da região (Kassim, 2018KASSIM, Fuad. Assessor do Minister of Finance at Treasury, 2010 a 2018. Joanesburgo, jun. 2018.). Nesta perspectiva, a África do Sul opera também como porta de entrada para negócios globais no continente (Scholvin; Draper, 2012SCHOLVIN, Soren; DRAPER, Peter. The gateway to Africa? Geography and South Africa’s role as an economic hinge joint between Africa and the world. South African Journal of International Affairs, v. 19, n. 3, p. 381-400, 2012.).

Entretanto, se a África do Sul se destaca no contexto regional, o país encara obstáculos para que estas vantagens comparativas se desdobrem em um projeto nacional. Constatam-se dificuldades de natureza diversa, desde o tamanho relativamente pequeno da economia até entraves políticos. Um analista que esteve presente no lançamento da Nepad, entende que a dificuldade de formular uma estratégia coerente é acentuada pelo descolamento entre os negócios, majoritariamente nas mãos dos brancos, e a política, comandada pelos negros - parte do arranjo que afiançou a transição pós-apartheid (Muller, 2018MULLER, Mike. Engenheiro, consultor de empresas do setor hidroelétrico. Pesquisador da Wits School of Governance. Joanesburgo, jun. 2018.). Sugere-se que a formulação de uma política consistente de integração regional esbarra também na escassa coordenação entre os governos da região, agravada pela falta de coesão entre os diferentes ministérios e órgãos governamentais no seio do governo sul-africano (Bertelsmann-Scott, 2018BERTELSMANN-SCOTT, Talitha. Diretora do Regional Observatory do SAIIA. Joanesburgo, jun. 2018.; Kassim, 2018KASSIM, Fuad. Assessor do Minister of Finance at Treasury, 2010 a 2018. Joanesburgo, jun. 2018.; Mondi, 2008MONDI, Lumkile P. Foi Chief Economist e Executive Vice President of Professional Services at The Industrial Development Corporation of South Africa Limited. Também foi Vice President at the Industrial Development Corporation. Trabalhou por sete anos como Deputy Treasurer at Transnet. Joanesburgo, jun. 2018.). Neste contexto, embora constatem-se relações assimétricas em benefício de negócios sul-africanos na região, o Estado parece simplesmente impotente para consolidar um projeto político coerente de liderança regional. Em suma, talvez a África do Sul pretendesse ser “subimperialista” como alegam vozes críticas no país e na região, mas parece não reunir a capacidade para isso sob a ANC.

3 Índia

A despeito de paradoxos e contradições, o horizonte da política externa indiana esteve referido ao não-alinhamento até o final da Guerra Fria, quando a inflexão neoliberal correspondeu a um progressivo alinhamento aos Estados Unidos. Esta reorientação incidiu no modo como o país enquadra as relações com o entorno asiático. O paradigma do não-alinhamento angulava a solidariedade asiática em escala ampla, tanto do ponto de vista geográfico como civilizatório, concebendo a aproximação entre os países do sul nos marcos de uma estratégia de superação do legado colonial, referido aos valores do Pancha Sila. A partir dos anos 1990, a abordagem prevalente distanciou-se desta orientação contra-hegemônica, pautando-se por um enfoque resignado, ditado de modo crescente pelas exigências mercantis inerentes à globalização. A ambição de um horizonte civilizatório alternativo diante da Guerra Fria cedeu lugar a uma racionalidade pragmática que, aceitando a liderança dos Estados Unidos e a globalização, projeta estratégias que favoreçam um lugar menos periférico para o país na ordem mundial (Santos, 2019SANTOS, Fabio Luis Barbosa dos. Economia política da integração regional: uma comparação entre Brasil e Índia. Estudos Internacionais, v. 7, n. 1, p. 41-62, 2019.).

Esta perspectiva modificou a dinâmica com os países vizinhos, e com a Ásia de maneira geral. A relação com os países fronteiriços ganhou maior importância, segundo uma racionalidade que concebe a liderança regional como um ativo político na ordem mundial, derivando recentemente na política de neighbors first (vizinhos em primeiro lugar). Entretanto, esta liderança é dificultada pelo histórico de dissenso legado pela partilha do subcontinente em 1947, e as clivagens religiosas que a acompanharam. No tocante ao sudeste asiático, a chamada Look East policy (olhar para o oriente) que circula no país desde os anos 1990, expressa o interesse indiano em vincular-se ao dinamismo econômico que emana do oriente. Em ambos os casos, seja no entorno imediato, seja no sudeste asiático, a Índia envolveu-se em diversas iniciativas políticas e econômicas de integração regional. Em ambos os casos, a projeção do poder chinês influencia cálculos e decisões, enquanto na relação com a África, o espírito de Bandung cedeu lugar à expansão mercantil.

3.1 Integração no subcontinente indiano

Em 1985, mesmo ano em que foi assinada a Declaração de Foz do Iguaçu por Brasil e Argentina, que está na origem do Mercosul, foi criada a South Asian Association for Regional Cooperation (SAARC), à qual aderiram todos os países do subcontinente indiano e adjacências: Afeganistão, Bangladesh, Butão, Índia, Nepal, Maldivas, Paquistão e Sri Lanka. Embora na sua origem a organização acenasse com propósitos políticos, visando superar o trauma da partilha, também evoluiu na direção da integração comercial, consumada em 2006 como South-Asian Free-Trade Area (SAFTA). Entretanto, enquanto no caso sul-americano a evolução política nos anos subsequentes aproximou Brasil e Argentina, sobretudo sob as presidências de Lula e Kirchner a partir de 2003, as tensões entre Paquistão e Índia persistiram, desaguando em mais um conflito militar entre os países em 1999: a Guerra de Kargil na região de Caxemira. O quadro foi agravado pelo ascenso do nacionalismo hindu, que comandava o país naquele momento, difundindo uma atitude hostil à religião muçulmana prevalente no Paquistão.

A desavença entre Índia e Paquistão sempre entravou avanços concretos da SAARC, o que levou o primeiro país a se engajar em iniciativas alternativas. Em 1997, constituiu-se o embrião da organização que, a partir de 2004, ano em que o INC voltou ao poder, foi conhecida como Bay of Bengal Initiative for Multi-Sectoral Technical and Economic Cooperation (BIMSTEC). Originalmente um arranjo relativamente frouxo, a composição da organização é reveladora da orientação da política externa indiana. Integrada por países do sul e do sudeste asiático (Bangladesh, Índia, Myanmar, Sri Lanka, Tailândia, Butão e Nepal), BIMSTEC foi concebida como uma espécie de ponte entre SAARC e Association of South East Asean Nations (ASEAN) (ADB, 2016ADB. Asian Economic Integration Report. Manila: ADB, 2016.).

Neste quadro, BIMSTEC resulta da convergência entre a orientação indiana de “olhar para o oriente” com a política de “olhar para o ocidente” que emanava da Tailândia, por motivações similares (Datta, 2017DATTA, Sreesadha. India: the Bridge Linking South and Southeast Asia. In: YHOME, K.; CHATURVEDY, Rajeev. Disponível em: Disponível em: https://www2.deloitte.com/za/en/pages/energy-and-resources/articles/africa-construction-trends-report.html . Acesso em: 27 out. 2018.
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). A iniciativa ofereceu à Índia uma porta de entrada à ASEAN, da qual participam Myanmar e Tailândia. Por outro lado, a organização reúne países da SAARC, mas sem a presença do Paquistão, considerada incômoda para os interesses indianos. Em suma, BIMSTEC expressa duas tendências fundamentais da política externa indiana: a intenção de consolidar a liderança entre os países do entorno imediato, mesmo que isso implique em excluir o Paquistão; por outro lado, o empenho econômico em intensificar a integração regional na direção oriental, com vistas a potenciar nexos econômicos nos marcos da globalização (Yahya, 2003YAHYA, F. India and Southeast Asia: Revisited. Contemporary Southeast Asia. Journal of International and Strategic Affairs, v. 25, n. 1, p. 79-103, 2003. Project MUSE. Disponível em: http://muse.jhu.edu/article/387706.
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).

Neste mesmo diapasão, foi lançada em 2000 a Mekong-Ganga Cooperation (MGC), iniciativa reunindo a Índia e cinco países da ASEAN (Camboja, Laos, Myanmar, Tailândia e Vietnã), em torno de uma agenda de transporte, turismo, cultura e educação. Além do ensejo de maior conectividade, sugerido pela evocação de dois grandes rios que singram o continente, a iniciativa apoia-se em nexos históricos que vinculam a Índia com esta região - o sítio arqueológico de Angkor Wat por exemplo, principal atração turística do Camboja, foi originalmente um templo hindu. Em outras palavras, há similaridades culturais que favorecem a aproximação com a Índia, em termos do que analistas denominam como soft power (Yhome; Chaturdevi, 2017YHOME, K.; CHATURVEDY, Rajeev Ranjan. Emerging trans-regional corridors: South and Southeast Asia. New Delhi: ORF, 2017.).

É possível traçar um paralelo com a situação brasileira na América do Sul, onde apesar da diferença de idioma, similaridades históricas e culturais favorecem a aproximação. Porém, se no caso sul-americano o cálculo geopolítico é motivado pela influência histórica dos Estados Unidos, na Ásia contemporânea o móvel fundamental é o receio da projeção chinesa, em um contexto em que todos os países da região têm algum nível de apreensão em relação a este país, em função de conflitos passados ou tensões presentes. Porém, diferentemente dos tempos do não-alinhamento, esta aproximação pode convergir com interesses dos Estados Unidos: em um momento em que a presença chinesa no Paquistão se multiplica, a Índia foi vista pela gestão Obama como um potencial pivô para conter a China na Ásia (Kuruvilla, 2017KURUVILLA, Benny. Transnational Institute. Bangalore, ago. 2017.).

A proposta de integrar sul e sudeste asiático nos marcos da globalização não era nova. Desde 1992 o Asian Development Bank (ADB) secretariava a Greater Mekong Sub-region (GMS), que não tem a participação da Índia, mas inclui regiões da China relacionadas ao rio Mekong (Verghese, 2001VERGHESE, B. G. Reorienting India. The new geo-politics of Asia. New Delhi: Konark, 2001., 195). No início dos anos 2000, também o ADB respondeu às novas tendências que emanavam da Índia, e esteve à frente do programa South Asia Subregional Economic Cooperation (SASEC) em 2001. Trata-se de uma iniciativa reunindo países do sul e sudeste asiático em torno de uma agenda de projetos de integração infraestrutural regional comparável à Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), avançada neste mesmo momento pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Também SASEC propunha uma estratégia conjunta de integração regional, embora no caso sul-americano, a escala da proposta seja maior. Segundo Prabir De, não se trata de coincidência, mas há muito intercâmbio entre o ADB e o BID, que se reflete na estratégia de atuação dos bancos. Chaturdevi é ainda mais enfático, sugerindo que os bancos iniciaram os processos de integração em ambos os continentes (De, 2017DE, Prabir. Research and Information System for Developing Countries (RIS). Nova Delhi, ago. 2017.; Chaturdevi, 2017CHATURDEVI, Sachin. Diretor Geral do Research and Information System for Developing Countries (RIS). Nova Delhi, ago. 2017.).

No caso indiano, o imperativo de conectar o país com o sudeste asiático subjacente a BIMSTEC e a SASEC responde ao desígnio de integrar o país a cadeias globais de valor, potencializando o acesso a mercados como o Japão e os Estados Unidos (Taneja, 2017TANEJA, Nisha. Indian Council for Research on International Economic Relations. Nova Delhi, ago. 2017.). Portanto, em ambas as situações, a integração regional não emerge como um fim em si, mas como uma via para potencializar a conexão de Brasil e Índia aos circuitos mais dinâmicos da economia global - no caso brasileiro, a IIRSA visa conectar o país na direção do Pacífico superando obstáculos naturais nesta direção, como a floresta Amazônica e a cordilheira dos Andes. Neste processo, potencializaram-se nexos mercantis com os respectivos entornos regionais, mas referidos a racionalidades diferentes.

No país asiático, o retorno do partido do Congresso à presidência em 2004 não se traduziu em uma estratégia diferenciada para o entorno regional. Se o ideário petista de uma política econômica “neodesenvolvimentista” tem paralelo na proposta mais modesta de “reforma com rosto humano” do partido indiano, a proposição de um “regionalismo desenvolvimentista” não tem equivalência na política do INC. Na realidade, assim como ocorre no terreno da economia, as tendências prevalentes na política externa desde a inflexão liberal nos anos 1990 não foram contestadas, sequer no plano ideológico. A principal novidade no início do século XXI é que a projeção internacional chinesa se evidenciou, o que aguçou a necessidade de respostas políticas e econômicas por parte do governo indiano (Yhome, 2017YHOME, K. Observer Research Foundation (ORF). Nova Delhi, ago. 2017.). O sentido da resposta intensificou movimentos na direção do livre-comércio, da conexão oriental e da liderança política regional.

3.2 Neighbors first?

Em correspondência com os esforços de integração infraestrutural, os fluxos comerciais entre a Índia e os países CMLV (Cambodja, Myanmar, Laos e Vietnã) decuplicou entre 2004 e 2013, saltando de U$ 1.1 bilhões para U$ 11.2 bilhões. Neste último ano, o investimento indiano nestes países era estimado em U$ 40.9 milhões. Estas cifras, embora expressivas, empalidecem em comparação com os investimentos da ASEAN nos países CMLV neste ano, que alcançaram U$ 3.5 bilhões, enquanto a China sozinha investia cerca de U$ 2 bilhões (Dixit, 2015DIXIT, Nishant. CLMV in India’s ‘Act East’ Policy. In: Asean Briefing. 13 mar. 2015. Disponível em: Disponível em: https://www.aseanbriefing.com/news/2015/03/13/cmlv-in-indias-act-east-policy.html . Acesso em: 2 mar. 2018.
https://www.aseanbriefing.com/news/2015/...
).

Na realidade, conforme já observado, o interesse fundamental da Índia não é estes mercados em si, mas as possibilidades de conexão com cadeias globais de valor, uma vez que o setor mais competitivo das exportações do país é serviços, destinados principalmente a corporações transacionais que operam a partir dos países industrializados. De modo análogo, a relação da Índia com os países limítrofes não é pautada centralmente por interesses econômicos, pois trata-se de mercados pequenos (Pande, 2017PANDE, Aparna. From Chanakya to Modi. The evolution of India’s foreign policy. Harper Collins: Noida, 2017.). Ainda que negócios aconteçam, são questões geopolíticas que ditam a dinâmica das relações da Índia com o entorno regional.

Não se constata no contexto indiano uma articulação comparável às gestões petistas no Brasil entre expansão mercantil e projeção política. Diversos fatores explicam esta diferença. No plano econômico, não houve uma política de apoio à expansão de negócios indianos na região, o que pode ser atribuído a fatores comerciais, como os diminutos mercados vizinhos, a natureza das exportações indianas, ou recursos insuficientes à disposição do Exim Bank indiano. Porém, considerações de natureza política também têm um papel relevante.

De modo análogo ao que ocorre no sudeste asiático com a China, os pequenos países do subcontinente indiano enxergam com apreensão a projeção indiana. Este receio remete não apenas ao trauma da partilha e às diversas guerras com o Paquistão, mas também às intervenções em Bangladesh (1971, então Paquistão Oriental), Sri Lanka (1987) e ilhas Maldivas (1988). De fato, no começo de 2018 aventava-se novamente a possibilidade de intervenção da Índia em meio à crise política nas Maldivas (Kazmin, 2018KAZMIN, Amy. Maldives lashes out at calls for India military intervention. Financial Times, New Delhi, 14 fev. 2018. Disponível em: Disponível em: https://www.ft.com/content/332a5b1a-1155-11e8-8cb6-b9ccc4c4dbbb . Acesso em: 24 mar. 2018.
https://www.ft.com/content/332a5b1a-1155...
). Este legado histórico não tem paralelo na América do Sul.

Por outro lado, os investimentos chineses no subcontinente indiano escalaram desde o lançamento da One Belt, One Road Initiative (BRI) em 2013. Neste contexto, a China tem se apresentado como um parceiro disponível, em circunstâncias em que a Índia não deseja, ou é incapaz de comparecer. No Sri Lanka, os chineses financiaram a construção do porto de Hambantota no sul da ilha, que os indianos anteriormente recusaram, considerando-o caro. No final de 2017, menos de sete anos após a inauguração, o porto foi arrendado pelo governo cingalês aos chineses por 99 anos, diante da impossibilidade de pagar a dívida, integrando-se concretamente à BRI (Purushothaman, 2017PURUSHOTHAMAN, Chithra. Pesquisadora do Institute for Defense Studies and Analyses. Nova Delhi, ago. 2017.). No Nepal, o impacto dos investimentos chineses é notável em estradas, hidroelétricas e ferrovias, além do auxílio para a reconstrução do país após o terremoto de 2015. Enquanto o investimento chinês era estimado em U$ 8.3 bilhões em 2017, o compromisso indiano estava em U$ 317 milhões. Neste ano, os comunistas venceram as eleições, prenunciando uma maior aproximação entre o reino e a China. Em Bangladesh, onde a relação com a Índia tem evoluído favoravelmente, o embaixador chinês anunciou investimentos da ordem de U$ 10 bilhões em 2018, nos marcos da BRI. Mesmo a fidelidade do pequeno Butão, com quem a Índia cultiva “laços sagrados” afiançados pela dependência econômica (95% das exportações e 75% das importações), tem sido cortejado por investimentos chineses. Enquanto isso, Maldivas assinou o seu primeiro tratado de livre-comércio no final de 2017, justamente com a China.

Vista por este prisma, a política Neighbors First adotada pelo Primeiro-Ministro Narendra Modi desde 2014, emerge antes como uma reação à ameaça à hegemonia indiana no seu entorno imediato, do que como uma estratégia para afirmar o protagonismo do país na ordem mundial. A intenção de cultivar a fidelidade política dos vizinhos é movida, sobretudo, por preocupações de segurança. Por outro lado, estes países encontram na China oportunidades de negócios, mas também um trunfo político a ser utilizado nas negociações com a Índia: a chamada China card, ou seja, a possibilidade de manipular a aproximação com Beijing, como forma de obter concessões de Delhi.

Reflexões finais

As gestões petistas no Brasil conceberam uma estratégia para a América do Sul, que articulou expansão mercantil e protagonismo político. Esta estratégia foi possível porque havia negócios brasileiros interessados em mercados sul-americanos e vice-versa, enquanto a liderança política do país foi, de modo geral, bem-vinda, e as preocupações concernentes a um ‘subimperialismo’ brasileiro permaneceram relativamente marginais.

O caso sul-africano assemelha-se ao brasileiro, o que também lhe valeu a acusação de ‘subimperialista’. No entanto, múltiplas contradições atravessam os governos do CNA, e em última análise, o próprio capitalismo sul-africano, dentre as quais: os negócios principalmente nas mãos de brancos, enquanto o Estado é comandado por negros; relações superavitárias com os vizinhos, que por sua vez, sustentam relações deficitárias com o mercado mundial; a expansão de negócios sul-africanos que, ao se internacionalizarem, frequentemente deixam de ser africanos; contradições entre as exigências mercantis imediatas (por exemplo, do DBSA) e a necessidade de consolidar as estruturas para uma articulação econômica e política regional. Estas determinações, consolidadas e aprofundadas sob Mbeki, permaneceram sob Zuma, embora o segundo tenha concedido menor importância à política externa e à integração regional. Diante desta realidade, os governos do CNA aparecem como incapazes de desenhar e implementar uma estratégia comparável àquela avançada pelas gestões petistas na América do Sul.

No caso indiano, o investimento em integração regional sob governos no Congresso no início do século XXI, correspondeu a uma reação à projeção chinesa, que em lugar de resultar em uma estratégia específica, acentuou tendências já prevalentes na direção da abertura comercial, da integração com o oriente e da busca de liderança subcontinental. Negócios indianos estavam menos interessados nos diminutos mercados vizinhos do que na conexão com o sudeste asiático, em direção a Japão, Estados Unidos e China, enquanto o histórico de tensões regionais dificulta a liderança política do país: premidos entre o poder indiano e o avanço chinês, os pequenos vizinhos se inclinam a manipular interesses contraditórios em seu favor, em lugar de aderir à liderança indiana.

Estas especificidades incidiram na forma como se concretizou a integração política e a conectividade infraestrutural. Nos três casos, iniciativas originárias dos anos 1980 (Mercosul, SADC e SAARC), somaram-se a outras, de diferente escopo e natureza. Na África do Sul, o fim do apartheid abriu novos horizontes para a atuação regional do país, que capitaneou um projeto de renascimento africano, consumado com a criação da NEPAD. Ao mesmo tempo, o país pressionou pela liberalização econômica no plano regional, política que favoreceu a expansão de negócios sul-africanos, proporcionando uma relação superavitária que compensa déficits com outras partes do mundo. Na Índia, a difícil relação com o Paquistão, somada ao imperativo da conexão oriental resultou em BIMSTEC, concebida como uma ponte entre SAARC (sem Paquistão e Afeganistão) e ASEAN. A articulação regional avançou uma agenda explicitamente mercantil, em que a conectividade estrutural é central, como demonstra a superposição entre BIMSTEC e SASEC, secretariada pela ADB. Ao mesmo tempo, tratados de livre-comércio foram assinados. Nos três casos, instituições financeiras multilaterais atuam como indutores da conexão infraestrutural regional, concebida como uma alavanca do desenvolvimento econômico. No entanto, não houve equivalentes à criação da Unasul na África austral ou no subcontinente indiano, o que tem a ver com a natureza singular da relação do Brasil com seus vizinhos, em contraste com as tensões históricas características das outras regiões, entre a partilha e o apartheid. Mas também está relacionada a uma singular convergência de governos progressistas na América do Sul no início do século XXI, que favoreceu o projeto petista.

Em síntese, constatamos que no início do século XXI, avançou a internacionalização de setores capitalistas no Brasil, África do Sul e Índia, corroborando iniciativas de integração regional relativamente simultâneas no seu entorno geográfico, dentre as quais privilegiamos na análise aquelas relacionadas à infraestrutura e à articulação entre setores produtivos. Identificamos os principais setores econômicos interessados na integração regional, ao mesmo tempo em que analisamos a resposta governamental, particularmente sob as gestões do PT, do CNA sob Mbeki e do CNI, em respaldo a estes interesses. A análise comparativa ressalta a singularidade do projeto brasileiro sob o PT, em que interesses econômicos convergiram em uma estratégia política que, a partir da liderança regional, pretendia fortalecer o protagonismo do país no cenário global. Constatamos que, embora África do Sul e Índia também projetassem interesses mercantis no seu entorno imediato, sobre o qual buscam exercer uma liderança política que as fortaleça internacionalmente, considerações de natureza histórica, política e econômica determinaram que esta atuação não derivasse em uma estratégia abrangente, como no caso brasileiro.

Na medida em que a política de integração regional é uma dimensão da resposta destes países à globalização, a comparação proposta sugere uma reflexão sobre este fenômeno na perspectiva do Sul Global. Para além das particularidades aludidas, observa-se um movimento comparável: desde os anos 1980, Brasil, África do Sul e Índia abdicaram do horizonte nacional-desenvolvimentista, aderindo em ritmo diferente à agenda do ajuste estrutural que caracteriza o neoliberalismo. Neste processo, a constituição de burguesias nacionais, cujos negócios estariam umbilicalmente vinculados ao espaço econômico nacional, cedeu passo ao protagonismo de setores internacionalizados das burguesias locais, apontando para horizontes de acumulação transnacionais. Nesta perspectiva, a economia política petista apoiou-se no entorno regional como espaço privilegiado de acumulação de capital, visando projetar negócios de escopo global em um movimento comparável à expansão mercantil sul-africana, embora neste segundo caso, seja menos evidente a indução estatal. No caso indiano, o entorno regional tem um peso antes político do que econômico, e a ambição mercantil prevalente é conectar negócios nacionais a cadeias globais de valor, via sudeste asiático. Nos três casos, as vantagens competitivas internacionais residem primordialmente na exploração do trabalho barato e de recursos naturais. Enquanto as campeãs nacionais brasileiras dedicam-se à produção de matérias-primas e à construção civil, a economia sul-africana segue assentada no complexo energético-mineral, embora financeirizado, e a exportação de serviços indiana beneficia-se do movimento de terceirização no mundo corporativo em escala mundial, reduzindo custos por meio da precarização do trabalho.

É possível aventar que, enfocados em perspectiva totalizante, Brasil, África do Sul e Índia inscrevem-se em uma divisão internacional do trabalho que se apoia na degradação do trabalho e na exploração ambiental, para intensificar a acumulação de capital em escala global. Subordinados a este movimento de valorização do valor, a conectividade infraestrutural, a liberalização comercial e a formação de blocos regionais, entendidas como dimensões da globalização, autonomizam-se em relação às finalidades elementares do desenvolvimento econômico, que remetem ao bem-estar da população e ao equilíbrio ambiental. Os governos petistas e os do CNA pretenderam negociar de modo mais favorável os termos desta participação, modulando a liberalização comercial e a integração regional, mas sem questionar os marcos globais da inserção subordinada, assim como o CNI pretendeu dosar o alcance da abertura, mas sem problematizar o seu sentido. Porém, ao aceitar como inexoráveis os termos da globalização, a articulação estrutural entre dependência e desigualdade social não foi desafiada.

Na atualidade, a reeleição do nacionalista hindu Narendra Modi ameaça o que resta do horizonte nehruviano, enquanto a presidência de Bolsonaro condena o neodesenvolvimentismo petista ao passado. Na África do Sul, o novo presidente Cyril Ramaphosa se apresenta como o restaurador da normalidade capitalista, depois que seu antecessor foi forçado a renunciar em função da “captura do Estado” para fins privados que comandou. Em qualquer dos casos, a tendência prevalente é reforçar uma lógica segundo a qual a conectividade infraestrutural, a formação de blocos regionais e os tratados de livre-comércio são perseguidos como fins em si. Distanciando-se das expectativas de integração virtuosa, desenvolvimento sustentável e modernização nacional associadas aos governos precedentes, a globalização se recoloca como um fetiche, oferecendo como horizonte civilizatório nada além da racionalidade autoreferida do capital.

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Entrevistas citadas

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  • MULLER, Mike. Engenheiro, consultor de empresas do setor hidroelétrico. Pesquisador da Wits School of Governance. Joanesburgo, jun. 2018.
  • MULOBELA, Whitney. Jornalista e ativista social, Non-Governamental Gender’s Organization Cordinating Council. Lusaka, jun. 2018.
  • NOTSHULWANA, Mxolisi. Senior Specialist. Infrastructure projects. International Financing Division. Development Bank of Southern Africa (DBSA). Joanesburgo, jun. 2018.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    May-Jul 2021

Histórico

  • Recebido
    10 Set 2019
  • Aceito
    27 Out 2020
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