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Investigação metabólica em pacientes com nefrolitíase

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a prevalência dos distúrbios metabólicos associados à nefrolitíase em uma população feminina.

Métodos:

Foi realizado um estudo retrospectivo em 1.737 pacientes com evidência de formação recente de cálculos renais, sendo 54% do sexo feminino. A avaliação laboratorial constou de duas ou mais amostras de sangue e urina de 24 horas com dosagens de cálcio, ácido úrico, citrato e creatinina cistinúria qualitativa, pH urinário em jejum e restrição hídrica de 12 horas, urocultura, creatinina e paratormônio séricos.

Resultados:

As alterações mais encontradas foram hipercalciúria (40,9%), infecção do trato urinário (23,2%), hipocitratúria (22,4%), baixo volume urinário (20,5%) e hiperuricosúria (16%).

Conclusão:

As alterações metabólicas mais frequentes na população feminina foram hipocitratúria, infecção do trato urinário, baixo volume urinário e hiperuricosúria.

Descritores:
Nefrolitíase/metabolismo; Hipercalciúria; Ácido úrico

ABSTRACT:

Objective:

To evaluate the prevalence of metabolic disorders associated with nephrolithiasis in a female population.

Methods:

A retrospective study on 1,737 patients with evidence of recent formation of renal stones, being 54% females. The laboratory investigation consisted of at least two samples of blood and 24-hour urine to assess calcium, uric acid, citrate and creatinine levels, qualitative cystinuria, urinary pH following fasting and 12-hour water restriction, urine culture, serum creatinine and parathyroid hormone.

Results:

The most frequent alterations were hypercalciuria (40.9%), urinary tract infection (23.2%), hypocitraturia (22.4%), low urinary volume (20.5%) and hyperuricosuria (16%).

Conclusion:

The most frequent metabolic alterations in females were hypocitraturia, urinary tract infection, low urinary volume and hyperuricosuria.

Keywords:
Nephrolithiasis/metabolism; Hypercalciuria; Uric acid

INTRODUÇÃO

A nefrolitíase acomete entre 5 a 10% da população mundial,(11. Gee HY, Jun I, Braun DA, Lawson JA, Halbritter J, Shril S, et al. Mutations in SLC26A1 cause nephrolithiasis. Am J Hum Genet. 2016;98(6):1228-34.)com maior frequência nos homens do que nas mulheres, 13 e 7%, respectivamente.(22. Pachaly MA, Baena, CP, Carvalho MD. Therapy of nephrolithiasis: where is the evidence from clinical trials? J Bras Nefrol. 2016;38(1):99-106.)Até 15% da população mundial sofrerá com um episódio de cálculo renal durante a vida, e mais de 50% terão recorrência dentro de 10 anos.(22. Pachaly MA, Baena, CP, Carvalho MD. Therapy of nephrolithiasis: where is the evidence from clinical trials? J Bras Nefrol. 2016;38(1):99-106.,33. Mazzucchi E, Srougi M. [What's new in the diagnosis and management of urinary lithiasis?]. Rev Assoc Med Bras (1992). 2009;55(6):723-8. Review. Portuguese.)O pico de ocorrência, na população feminina, dá-se por volta dos 30 anos de idade e decai após os 50 anos, enquanto que, nos homens, o pico ocorre entre a quarta e a sexta década de vida.(33. Mazzucchi E, Srougi M. [What's new in the diagnosis and management of urinary lithiasis?]. Rev Assoc Med Bras (1992). 2009;55(6):723-8. Review. Portuguese.)

Os cálculos renais se desenvolvem, principalmente, nos cálices e pelve renal. Sua formação é influenciada pelo pH urinário, volume urinário diminuído e presença de bactérias, e tem como principal determinante a supersaturação urinária de cristais. Em torno de 70% dos mesmos são formadas por sais de oxalato de cálcio; outros 15% são compostos de fosfato amônio magnésio (cálculos de estruvita); 5 a 10% são de ácido úrico; e de 1 a 5%, cistina.(44. Kumar V, Abbas AK, Fausto N, Aster JC, editores. Robbins & Cotran patologia: bases patológicas das doenças. 8a ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2010.)Quando os cálculos aumentam de tamanho, cursam com lesão grave do rim, mesmo sem evidências clínicas, podendo complicar, com obstrução e infecção do trato urinário.(55. Porto CC, editor. Semiologia médica. 7a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2014.)

Diversos fatores estão relacionados à predisposição à litíase renal, como: idade, sexo, sedentarismo, comorbidades (hipertensão e diabetes), medicamentos em uso, história prévia familiar ou pessoal de litíase, ocupação, questões dietéticas, aspectos geográficos e climáticos, alterações anatômicas e metabólicas.(55. Porto CC, editor. Semiologia médica. 7a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2014.)A literatura tem mostrado maior incidência de nefrolitíase no sexo masculino, no entanto, pesquisas recentes têm apontado para um aumento da incidência no sexo feminino.(66. Bar-Meir S. Gallstones: prevalence, diagnosis and treatment. Isr Med Assoc J. 2001;3(2):111-3. Review.)

Alterações anatômicas maiores ocorrem em até 40% de portadores de nefrolitíase, dentre elas obstrução da junção ureteropélvica, rim em ferradura, duplicação ureteral completa ou incompleta, rim espongiomedular e rim pélvico.(77. Peres LA, Ferreira JR, Beppu AP, de Araújo Junior ER, Vicenzi G, Yamamoto TY. Anatomical alterations in patients with nephrolithiasis. J Bras Nefrol. 2010; 32(1):33-6.)

OBJETIVO

Avaliar a prevalência dos distúrbios metabólicos associados à nefrolitíase em uma população feminina.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo retrospectivo, baseado na análise de prontuários de 1.737 pacientes adultos, litiásicos, na cidade de Cascavel (PR), que foram atendidos em uma clínica privada de nefrologia no período de 2005 a 2016. Os critérios de inclusão foram a eliminação espontânea, endoscópica e cirúrgica de cálculos renais e/ou confirmação radiológica de sua presença no trato urinário. Foram coletados os seguintes dados: identificação, sexo, idade, história familiar, apresentação clínica, exames laboratoriais e exames de imagem. O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da instituição, sob o número 1.604.236, CAAE: 57213316.4.0000.5219.

A investigação laboratorial incluiu duas ou mais amostras de urina de 24 horas para dosagem de cálcio, ácido úrico, citrato, creatinina e oxalato; cálcio, ácido úrico, creatinina e paratormônio séricos; urocultura e urina coletada após jejum e restrição de água por 12 horas com o objetivo de pesquisar cistinúria qualitativa, cristais no sedimento urinário e o pH urinário.

Os métodos laboratoriais empregados e os valores de referência adotados para amostras de urina de 24 horas foram, para cálcio, método de espectrometria de absorção atômica (<4,0mg/kg/dia); para ácido úrico, uricase método enzimático (<750mg para as mulheres e <800mg para os homens); para citrato, citrato liase enzimática (>320mg); para oxalato, método de cromatografia líquida de alta eficiência (>44mg); para creatinina, método de picrato alcalino (>1.000mg); e para volume de urina, medição volumétrica em um coletor de Becker para análise visual. Para a dosagem plasmática, os métodos empregados foram, para cálcio, método colorimétrico (8,5 a 10,5mg/dL); para ácido úrico, uricase método colorimétrico (2,0 a 7,0mg/dL); para creatinina, método do picrato alcalino (0,7 a 1,4mg/dL); e para paratormônio, teste intacto da molécula (10 a 70ng/L). Para os testes em amostras isoladas de urina, os métodos utilizados foram, para cistinúria qualitativa, teste de nitroprussiato de sódio; e para urina pH, medição por meio de tiras reativas com sistema de indicador de pH vermelho de metilo e azul-bromo-azul. A diminuição do volume de urina tem sido considerada quando pelo menos uma das amostras mostrou um volume de urina de 24 horas inferior a 15mL/kg.

A investigação de imagens incluiu ecografia do aparelho urinário e urografia excretora de rotina, bem como tomografia computadorizada em casos selecionados.

Para a análise dos dados, foram calculados média e desvio padrão, e percentagem. Foram utilizados os testes χ2e teste exato de Fisher, conforme adequado. Os principais distúrbios metabólicos foram comparados entre os sexos, bem como as alterações anatômicas. Para todas as análises foi adotado como nível de significância p<0,05. O tratamento estatístico de todas as informações foi efetuado utilizando o Statistical Package of the Social Science (SPSS) versão 15.0 e Excel .

RESULTADOS

Foram levantados os prontuários de 1.737 pacientes, sendo 952 mulheres (54,8%) e 785 homens (45,1%). A relação homem/mulher observada foi de 1:1,2. O histórico sintomatológico mais encontrado no momento do diagnóstico foi de cólica nefrética, perfazendo um total de 53,3% e 57,4% entre mulheres e homens, respectivamente. O antecedente familiar de litíase foi positivo para 39,8% das mulheres e 40,5% para os homens.

Dos 902 pacientes que completaram o estudo metabólico, 482 eram mulheres (53,4%) e 420 homens (46,6%). Destes, observou-se que as alterações metabólicas mais encontradas, por ordem de frequência, foram: hipercalciúria (45,4%), hiperuricosúria (25,1%), hipocitratúria (21,4%), baixo volume urinário (18%), infecção do trato urinário (11,6%), hiperoxalúria (5,3%), hiperparatireoidismo (4,3%), cistinúria (0,5%) e acidose tubular (0,4%). Quando observado por sexo, os achados mais encontrados nas mulheres foram: hipercalciúria (40,9%), infecção do trato urinário (23,2%), hipocitratúria (22,4%), baixo volume urinário (20,5%) e hiperuricosúria (16%). Nos homens, as alterações metabólicas mais encontradas, por ordem de frequência, foram: hipercalciúria (50%), hiperuricosúria (34,3%), hipocitratúria (20,5%) e baixo volume urinário (15,5%). A tabela 1 apresenta todas as alterações metabólicas encontradas.

Tabela 1
Alterações encontradas em 902 pacientes com nefrolitíase de acordo com o sexo

As principais alterações anatômicas observadas foram cisto renal, duplicação pielocalicial, obstrução da junção ureteropélvica, rim em ferradura, rim espongiomedular, rim pélvico e ptose renal. A tabela 2 mostra todas as alterações anatômicas encontradas.

Tabela 2
Alterações anatômicas encontradas em 148 pacientes com nefrolitíase de acordo com o sexo

DISCUSSÃO

O pico de incidência da nefrolitíase ocorre entre os 40 a 60 anos de idade.(33. Mazzucchi E, Srougi M. [What's new in the diagnosis and management of urinary lithiasis?]. Rev Assoc Med Bras (1992). 2009;55(6):723-8. Review. Portuguese.)Neste estudo, observamos que a média de idade dos pacientes no momento da investigação metabólica foi de 49 anos, com leve predomínio de mulheres, o que pode sugerir maior adesão delas à investigação metabólica.

Compatível com a literatura, a história familiar positiva para nefrolitíase, que varia entre 25% e 55%, neste estudo foi de cerca de 40%. O histórico familiar não implica somente na herança genética, visto que indivíduos da mesma família podem compartilhar hábitos de vida, como os dietéticos. Por exemplo, a elevada ingestão de sódio tem alta implicação no desenvolvimento de hipercalciúria.(88. Anatol T, Pinto Pereira L, Simeon D, Sawh L. Risk factors for urinary tract calculi in Trinidad. Trop Med Int Health. 2003;8(4):348-53.1010. Damasio PC, Amaro CR, Berto SJ, Cunha NB, Pichutte AC, Padovani CR, et al. Urinary lithiasis and idiopathic hypercalciuria: the importance of dietary intake evaluation. Int Braz J Urol. 2010;36(5):557-62.)

Foram encontradas alterações metabólicas distintas em ambos os sexos, enquanto que no sexo feminino ocorreu mais infecção urinária, no masculino observamos mais hipercalciúria e hiperuricosúria.

O citrato urinário promove uma redução na formação e recorrência dos cálculos renais por se ligar ao cálcio, inibindo a nucleação espontânea e a agregação de cristais de oxalato, além de interagir com a proteína de Tamm-Horsfall para inibir a cristalização do oxalato de cálcio.(22. Pachaly MA, Baena, CP, Carvalho MD. Therapy of nephrolithiasis: where is the evidence from clinical trials? J Bras Nefrol. 2016;38(1):99-106.)Nos dados da literatura, as mulheres apresentam maior excreção de citrato na urina do que os homens, o que diminui a formação de cálculos urinários na população feminina em geral.(1111. Parmar MS. Kidney stones. BMJ. 2004;328(7453):1420-4. Review.)Hipóteses explicativas para tal fato são de mudança do hábito alimentar, elevados níveis de estrogênios, gravidez, desequilíbrios acidobásicos, vitamina D e paratormônio.(1212. Da Silva JD. Nefrolitíase induzida por fármacos [teste]. Portugal: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto; 2015. 31f.)Em nosso estudo, houve maior incidência de hipocitratúria em mulheres com nefrolitíase submetidas à investigação metabólica.

Montilla et al., em um estudo transversal com 154 mulheres, observaram que as mulheres apresentaram consumo proteico superior às suas necessidades nutricionais.(1313. Montilla Rd, Aldrighi JM, Marucci Mde F. [Calcium/protein relation of women on the climacteric]. Rev Assoc Med Bras (1992). 2004;50(1):52-4. Portuguese.)Considerando que a alta ingesta de proteínas de origem animal tem uma elevada carga ácida, o citrato urinário diminui por aumento da sua reabsorção tubular proximal e por redução de sua excreção pelas células tubulares.(1212. Da Silva JD. Nefrolitíase induzida por fármacos [teste]. Portugal: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto; 2015. 31f.,1414. Mattix Kramer HJ, Grodstein F, Stampfer MJ, Curhan GC. Menopause and postmenopausal hormone use and risk of incident kidney stones. J Am Soc Nephrol. 2003;14(5):1272-7.)

Em uma pesquisa norte-americana, que avaliou o risco de incidência de litíase renal em 91.731 mulheres saudáveis na menopausa e pós-menopausa, foi observado que, após a administração diária de estrogênio oral conjugado (1,25mg) durante 4 dias, mantendo-se uma dieta restrita a purinas, a excreção de ácido úrico urinário aumentou 23% (p<0,05) em comparação com o valor basal em sete mulheres pós-menopáusicas. Resultados semelhantes foram observados em um estudo de 22 homens transexuais adultos tratados com estrogênio, onde a excreção média de ácido úrico aumentou 28%, sendo a diferença estatisticamente significativa.(1111. Parmar MS. Kidney stones. BMJ. 2004;328(7453):1420-4. Review.,1515. Jama and Archives Journals. Estrogen therapy may be associated with kidney stones in postmenopausal women [Internet]. ScienceDaily; 2010 [cited 2017 July 26]. Available from: https://www.sciencedaily.com/releases/2010/10/101011173257.htm
https://www.sciencedaily.com/releases/20...
,1616. Korkes F, Rauen EC, Heilberg IP. Urolithiasis and pregnancy. J Bras Nefrol. 2014;36(3):389-95. Review.)

Durante o período gravídico, constatamos inúmeras transformações pró-litogênicas. Uma delas é a hidronefrose fisiológica, que propicia estase urinária, atuando como um grande fator de risco para a ocorrência de calculose renal, bem como de infecções urinárias. Além disso, há também um aumento na taxa de filtração glomerular, superior a 40%. Por conseguinte, alguns fatores litogênicos, como a hipercalciúria, elevação do pH urinário e a hiperabsorção intestinal de cálcio sofrem um incremento na gestante, favorecendo a supersaturação de sais na urina. Por outro lado, já fora observada a ocorrência, na gravidez, de alguns fatores inibitórios que reduzem a agregação de cristais e, consequentemente, a formação de cálculos urinários. Dentre eles podemos citar as uromodulinas, a nefrocalcina, as glicoproteínas, o aumento do pH urinário, e o aumento da excreção renal de cálcio e de magnésio.(1717. Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, Bandeira F, Griz L, Chaves N, Carvalho NC, Borges LM, et al. Diagnosis and management of primary hyperparathyroidism—a scientific statement from the Department of Bone Metabolism, the Brazilian Society for Endocrinology and Metabolism. Arq Bras Endocrinol Metab. 2013;57:406-24.)

O hiperparatireoismo primário é mais comum em mulheres.(1818. Silverberg SJ, Clarke BL, Peacock M, Bandeira F, Boutroy S, Cusano NE, et al. Current issues in the presentation of asymptomatic primary hyperparathyroidism: proceedings of the Fourth International Workshop. J Clin Endocrinol Metab. 2014;99(10):3580-94.,1919. Daudon M, Doré JC, Jungers P, Lacour B. Changes in stone composition according to age and gender of patients: a multivariate epidemiological approach. Urol Res. 2004;32(3):241-7.)Nesta entidade temos uma secreção aumentada do hormônio da paratireoide, que estimula a síntese de calcitriol e o consequente aumento da absorção intestinal de cálcio e da reabsorção óssea, culminando com hipercalciúria. Este desequilíbrio hormonal, juntamente do aumento nos níveis da vitamina D, englobam uma das causas de nefrolitíase por aumento dos níveis séricos e urinários de cálcio.(1212. Da Silva JD. Nefrolitíase induzida por fármacos [teste]. Portugal: Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto; 2015. 31f.)

Em estudo anterior, realizado em nosso meio, as alterações metabólicas mais encontradas foram: hipercalciúria em 51,8% dos pacientes; hiperexcreção de ácido úrico em 27,6%; hipocitratúria em 23,5%; baixo volume urinário em 19,8%; infecção do trato urinário em 13,5%; hiperoxalúria em 8,0%; hiperparatireoidismo em 5,6%; acidose tubular renal em 0,7%; e cistinúria em 0,7%. Comparando os distúrbios metabólicos mais prevalentes entre os sexos, a hiperexcreção de ácido úrico foi mais frequente no masculino e a infecção do trato urinário, no feminino. Estes dados são concordantes com o observado nesse estudo.(2020. Amaro CR, Goldberg J, Amaro JL, Padovani CR. Metabolic assessment in patients with urinary lithiasis. Int Braz J Urol. 2005;31(1):29-33.)

Em pesquisa realizada com 182 pacientes maiores que 12 anos, as alterações encontradas, por ordem de apresentação, foram hipercalciúria (74%), hipocitratúria (37,3%), hiperoxalúria (24,1%), hipomagnesemia (21%), hiperuricosúria (20,2%), hiperparatireoidismo primário (1,8%), hiperparatireoidismo secundário (0,6%) e acidose tubular renal (0,6).(2121. Amaro CR; Amaro JL, Goldberg J. Comportamento do magnésio urinário em pacientes com litíase renal. J Bras Nefrol. 2005;27(3):146-9.)Observamos, em nosso estudo, incidência menor de hipercalciúria, hipocitratúria e hiperoxalúria, sendo que a hiperexcreção de ácido úrico foi maior e que diagnosticamos alguns casos de cistinúria.

Em conformidade com dados da literatura, as alterações anatômicas mais encontradas foram o cisto renal, a duplicação pieloureteral e a estenose de junção ureteropélvica, em ambos os sexos.(77. Peres LA, Ferreira JR, Beppu AP, de Araújo Junior ER, Vicenzi G, Yamamoto TY. Anatomical alterations in patients with nephrolithiasis. J Bras Nefrol. 2010; 32(1):33-6.)

Estratégias de tratamento de recorrência dos cálculos renais poderão reduzir outras comorbidades, bem como o risco cardiovascular nessa população, uma vez que demonstrou-se a associação entre litíase renal e síndrome metabólica, sendo esta uma situação complexa, que engloba obesidade, dislipidemia, hipertensão, diabetes mellitus e resistência insulínica.(2222. Domingos F, Serra A. Nephrolithiasis is associated with an increased prevalence of cardiovascular disease. Nephrol Dial Transplant. 2011;26(3):864-8.)No IV Inquérito Nacional de Saúde de Portugal, 23.349 questionários foram aplicados em indivíduos com mais de 15 anos de idade e contatou-se que houve um aumento significativo da prevalência de algumas doenças crônicas associadas a maior risco de eventos cardiovasculares nos doentes com nefrolitíase em relação à população geral, incluindo hipertensão (50,4% versus 28,6%), obesidade (22,7% versus 16,9%), diabetes mellitus (16,6% versus 9,4%), infarto do miocárdio (3,3% versus 1,8%) e acidentes cerebrovasculares (3,8% versus 2,1%).(2323. Domingos F. Estudo da actividade eferente do sistema nervoso autónomo na nefrolitíase recorrente [tese]. Lisboa: Universidade de Lisboa; 2012. 173f.)

Para além de diminuição de comorbidades e recorrências, a prevenção e o tratamento de litíase urinária implica redução do impacto gerado na saúde pública, uma vez que a nefrolitíase acomete principalmente adultos em idade produtiva, entre a segunda e sexta décadas de vida, sendo responsável por elevados números de internações hospitalares anuais, com elevado custo para o orçamento da saúde.(2424. Fernandes S, Silva R, Silva SL, Campos HH, Daher EF, Silva CA. [Demographic, clinical and laboratory data of patients with urinary lithiasis in Fortaleza, Ceará]. J Bras Nefrol. 2011;33(3):295-9. Portuguese.,2525. Korkes F, Silva Ii JL, Heilberg IP. Costs for in hospital treatment of urinary lithiasis in the Brazilian public health system. einstein (Sao Paulo). 2011;9(4): 518-22.)

As limitações do presente estudo incluem o fato de ser retrospectivo e aqueles inerentes aos estudos clínicos, porém os dados, foram coletados por dois pesquisadores, sendo homogêneos e fidedignos. O presente ambulatório foi iniciado pelo próprio pesquisador com protocolo adaptado de instituições de excelência na investigação metabólica de nefrolitíase. Os pacientes analisados foram avaliados por outras especialidades e encaminhados para a nefrologia especificamente para investigação metabólica de litíase. Quanto à infecção urinária, os pacientes foram encaminhados com o histórico de infecção do trato urinário de repetição com posterior formação de cálculos e não foram manejados pelo pesquisador no momento da infecção. O sódio urinário não foi dosado rotineiramente, no entanto, todos os pacientes tiveram a determinação da calciúria. Nos hipercalciúricos, foi recomendada restrição de sódio na dieta. A natriúria pode servir para avaliar a ingestão de sódio, sendo importante para avaliar a adesão a dieta. Há relatos na literatura sem avaliar o sódio urinário.(2626. Abu-Ghanem Y, Kleinmann N, Winkler HZ, Zilberman DE. Nephrolithiasis in Israel: epidemiological characteristics of return patients in a tertiary care center. Isr Med Assoc J. 2016;18(12):725-8.)O potássio e o magnésio urinário também não foram dosados, utilizando-se a citratúria para avaliação dos inibidores da cristalização.

Futuros estudos são necessários para melhor compreender as alterações metabólicas em pacientes do sexo feminino, diminuir a recorrência da nefrolitíase e, consequentemente, reduzir o risco cardiovascular nesta população.

CONCLUSÃO

As alterações metabólicas mais frequentes na população feminina foram hipocitratúria, infecção do trato urinário, baixo volume urinário e hiperuricosúria. Foram encontradas alterações metabólicas distintas em ambos os sexos; enquanto que, no sexo feminino, ocorreu mais infecção urinária, no masculino observamos mais hipercalciúria e hiperuricosúria.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2017
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    17 Fev 2017
  • Aceito
    04 Ago 2017
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