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Desnutrição em escolares em região urbano-rural do extremo sul do município de São Paulo

RESUMO

Objetivo:

Verificar a persistência do déficit nutricional em amostra de escolares.

Métodos:

Estudo transversal com 1.761 escolares de 6 a 10 anos provenientes de 3 escolas de ensino fundamental. Foram avaliados pelos escores Z de peso/estatura e estatura/idade, segundo a Organização Mundial da Saúde. As variáveis estudadas foram: gênero, idade, série e período escolar. O teste do χ² relacionou o déficit nutricional com as variáveis.

Resultados:

Segundo o escore Z de peso/estatura 8,5% eram desnutridas; 21,6% de acordo com estatura/idade. A análise do escore Z de peso/estatura revelou que 59,7% eram meninos e 40,3% meninas. A média de idade foi de 8,9 anos. Quanto ao escore Z de estatura/idade 53,9% eram do gênero masculino e 46,1% do gênero feminino. O risco de desnutrição foi maior entre os meninos: 59,7% para o índice peso/estatura e 53,9% para o estatura/idade. Não houve diferença estatística na comparação entre as escolas, o gênero e o período escolar. Já entre estado nutricional, período (p < 0,0001) e série dos escolares (p = 0,0105), observamos significância.

Conclusão:

A desnutrição ainda é persistente entre a população de baixa renda e o gênero masculino apresentou maior prevalência. Pode-se considerar que a avaliação nutricional é uma ferramenta de extrema importância para compreensão da dinâmica nutricional de crianças e seu desenvolvimento.

Descritores:
Desnutrição proteico-energética; Estado nutricional; Avaliação nutricional; Nutrição da criança

ABSTRACT

Objective:

To evaluate the persistence of nutritional deficit in a sample of schoolchildren.

Methods:

A cross-sectional study of 1,761 schoolchildren between 6 and 10 years from 3 schools. They were assessed by Z scores of weight for height and height for age, according to the World Health Organization. The variables studied were gender, age, grade and school year. The χ² test was used to relate the nutritional deficit with the variables.

Results:

Of all children 8.5% were malnourished according to the weight for height Z score, 21.6%, according to height for age. The analysis of the weight for height Z score revealed that 59.7% were male and 40.3% female. The mean age was 8.9 years. As to the Z score of height for age, 53.9% were males and 46.1% females. The risk of malnutrition was higher among boys: 59.7% for the weight for height index and 53.9% for height for age. There was no statistical difference between schools, gender and school year. As to nutritional status, school period (p < 0.0001) and students’ grade (p = 0.0105), we observed statistical significance.

Conclusion:

Malnutrition still persists among the low-income population and males had a higher percentage of malnutrition. Nutritional evaluation of students is an extremely important tool for understanding the dynamics of child nutrition and development.

Keywords:
Protein-energy malnutrition; Nutritional status; Nutritional assessment; Child nutrition

INTRODUÇÃO

A desnutrição infantil continua a ser um dos problemas mais importantes de saúde pública no mundo atual, devido à sua magnitude e consequências desastrosas para o crescimento, ao desenvolvimento e à sobrevivência das crianças, relacionando-se com cerca de 50% das mortes infantis mundiais(11. Monte CM. Desnutrição: um desafio secular à nutrição infantil. J Pediatr (Rio J). 2000;76(Suppl 3):285-97.). A esse respeito, pode-se dizer que a desnutrição é, sem dúvida, um problema latente no contexto latino-americano, que atinge principalmente a população menor de 5 anos(22. Martins IS, Marinho SP, Oliveira DC, Araújo EA. Pobreza, desnutrição e obesidade: inter-relação de estados nutricionais de indivíduos de uma mesma família. Cienc Saúde Coletiva. 2007;12(6):1553-64.).

O crescimento é um processo dinâmico e contínuo, é um dos melhores indicadores de saúde de uma criança e reflete suas condições de vida no passado e presente. Quando o ser humano nasce, traz consigo um potencial genético de crescimento que, para ser alcançado, dependerá das condições de vida a que esteve exposto, desde sua concepção até a fase adulta. O crescimento é influenciado por fatores intrínsecos (genéticos) e extrínsecos (ambientais), que incluem alimentação, higiene e habitação, sendo que esses fatores podem tanto retardar como acelerar seu desenvolvimento(33. Romani SA, de Lira PI. Fatores determinantes do crescimento infantil. Rev. Bras. Saúde Mater Infant. 2004;4(1):15-23.,44. Neves OM, Brasil ALD, Brasil LM, Taddei JA. Antropometria de escolares ao ingresso no ensino fundamental na cidade de Belém, Pará, 2001. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2006;6(1):39-46.). A nutrição e o crescimento estão intrinsecamente associados, uma vez que as crianças não atingem seus potenciais genéticos de crescimento, se não tiverem atendidas suas necessidades nutricionais básicas, acarretando déficits de estatura para sua idade(55. Sichieri R, Taddei JA, Everhart JE. Influence of parental height and sociodemographic factors on adolescent height in Brazil. J Adolesc Health. 2000;26(6):414-9.).

O acompanhamento da situação nutricional das crianças de um país ou região constitui um instrumento essencial para a aferição das condições de saúde da população infantil(66. Silva KS, Lopes AS, Silva FM. Sensibilidade e especificidade de diferentes critérios de classificação do excesso de peso em escolares de João Pessoa, Paraíba, Brasil. Rev Nutr. 2010;23(1):27-35.). As medidas antropométricas são utilizadas desde o século XVIII como instrumento de avaliação da saúde, porém só há menos de 40 anos foram normalizadas para avaliação do estado nutricional individual e de populações. Nesse sentido, as medidas de peso e estatura são consideradas de alta sensibilidade, particularmente durante a idade pré-escolar, para refletir variações nas condições nutricionais e, indiretamente, as influências do ambiente socioeconômico. Assim sendo, os índices antropométricos podem ser tomados como indicadores positivos de saúde, pois permitem avaliar o potencial de desenvolvimento físico alcançado(77. Fernandes IT, Gallo PR, Advíncula AO. Avaliação antropométrica de pré-escolares do município de Mogi-Guaçú, São Paulo: subsídio para políticas públicas de saúde. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2006;6(2):217-22.).

No Brasil, embora os inquéritos nutricionais apontem o decréscimo da prevalência de desnutrição nos 30 últimos anos(88. Monteiro CA. A dimensão da pobreza, da desnutrição e da fome no Brasil. Est. Avançado. 2003;17(1):7-20.), a persistência das doenças infecciosas e parasitárias, reconhecidamente associadas à desnutrição, permanecem entre as 5 primeiras causas de óbito. Por outro lado, a ocorrência de altas taxas de mortalidade hospitalar por desnutrição, sugerem que ainda é importante o papel da desnutrição nas estatísticas de morbidade e mortalidade para os menores de cinco anos no país(99. Victora CG, César JA. Saúde materno-infantil no Brasil: padrões de morbimortalidade e possíveis intervenções. In: Rouquayrol MZ, Almeida Filho N. Epidemiologia e saúde. Rio de Janeiro: Medsi; 2003. p. 415-68.1212. Lima AL, Silva AC, Konno SC, Conde WL, Benicio MH, Monteiro CA. Causas do declínio acelerado da desnutrição infantil no Nordeste do Brasil (1986-1996-2006). Rev Saúde Pública. 2010;44(1):17-27.).

Diante do fato de que, atualmente, há menos crianças gravemente desnutridas, passou-se a minimizar a importância do problema e até a ignorar a existência da epidemia silenciosa de fome oculta e de desnutrição que se expressa por meio do contingente de crianças com desnutrição moderada e leve, estes menos evidentes(11. Monte CM. Desnutrição: um desafio secular à nutrição infantil. J Pediatr (Rio J). 2000;76(Suppl 3):285-97.).

OBJETIVO

Avaliar o estado nutricional de escolares frequentadores de escolas públicas da região de Parelheiros, na zona sul do município de São Paulo, de modo a detectar alterações nutricionais bem como as associações com gênero, série em curso e período escolar.

MÉTODOS

Este foi um estudo transversal que fez parte de um projeto em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde e Educação do Município de São Paulo realizado nos meses de setembro a outubro de 2009 com objetivo de investigar o estado nutricional de crianças de 6 a 10 anos, em uma região com características urbanas e rurais, alta taxa de fecundidade e violência urbana, baixo índice de desenvolvimento humano, social e econômico.

Os dados aqui apresentados referem-se ao conjunto de crianças de 3 escolas do ensino fundamental I (Escola Municipal de Ensino Fundamental Manuel Vieira de Queiroz Filho, Escola Municipal de Ensino Fundamental Pedro Geraldo Shunck e Escola Municipal de Ensino Fundamental Vargem Grande), totalizando 2.173 crianças. No estudo foram incluídas 1.761 crianças correspondendo a 81% do total da amostra. A perda de 19% deu-se por faltas no dia da avaliação.

Salienta-se que em uma das escolas (Escola Municipal de Ensino Fundamental Pedro Geraldo Schunck) havia apenas dois períodos (7 às 11 horas e 15 às 19 horas), diferente das demais que possuíam três (7 às 11 horas, 11 às 15 horas e 15 às 19 horas), dado levado em consideração no resultado.

As medidas de peso e estatura foram obtidas de cada criança de acordo com protocolo internacional da Organização Mundial da Saúde (OMS)(1313. Organización Mundial de la Salud. El estado físico: uso e interpretación de la antropometría: informe de um Comité de Expertos de la OMS. Ginebra; OMS; 1995. (Serie de Informes Técnicos, 854).). Foram realizadas por discentes da Faculdade de Medicina de Santo Amaro (UNISA) devidamente treinados quanto à padronização das técnicas.

O equipamento antropométrico consistiu de balança de plataforma Filizola® com capacidade de 150 kg e precisão de 100 g. As crianças foram pesadas sem calçados e com roupas leves. Para aferição da estatura foi utilizado estadiômetro portátil com extensão máxima de 2 m.

A estatura para idade (E/I) e o peso para estatura (P/E) foram os indicadores antropométricos utilizados. O estado nutricional foi avaliado a partir do cálculo de escores Z dos índices acima descritos para as médias e os desvios padrão da população de referência da OMS(1414. de Onis M, Garza C, Victora CG, Maharaj K, Bhan MK, Norum KR. The WHO multicentre growth reference study (MGRS): Rationale, planning, and implementation. Food Nutr Bull. 2004:25(1 Suppl. 1):S1- S45.). Para classificação da desnutrição foram utilizados os pontos de corte de E/I de ≥ -2 como risco de desnutrição e < -2 escores Z e ≥ -3 escores Z como desnutrição. Para índice de P/E os pontos de corte foram: ≥ -3 escores Z e < -2 escores Z para risco de desnutrição e < -3 escores Z para desnutrição.

A variável dependente foi a medida de escore Z separado em E/I e P/E. Adicionalmente os dados foram correlacionados com gênero, série e período de frequência às aulas (7 às 11 horas, 11 às 15 horas e 15 às 19 horas).

O banco de dados foi analisado no programa Epi-Info e Epinut(1515. Dean AG, Dean JA, Coulombier D, Brendel KA, Smith DC, Burton HA, et al. Epi Info, version 6.04: a word processing database and statistics program for a epidemiology on microcomputers. Atlanta: Centers for Disease Control and Prevention; 1996.). Utilizou-se o teste do χ² com nível de significância de 0,05 para avaliar a relação do estado nutricional e as variáveis estudadas(1616. Siegel S, Castellan NJ Jr. Estatística não paramétrica para ciências do comportamento. 2a ed. Artmed. Porto Alegre. 2006.).

Atendendo às Resoluções 196/96 do Ministério da Saúde, dias antes da realização da pesquisa foram enviados às residências dos pesquisados um informativo e um pedido de autorização dos pais ou responsáveis para que as crianças pudessem participar da pesquisa.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa da UNISA com o protocolo nº040/2006.

O absenteísmo de 19% das crianças e a falta de um período em uma das escolas estudadas foi levado em consideração como possíveis limitações do estudo.

RESULTADOS

Das 1.761 crianças estudadas, 149 (8,5%) eram desnutridas segundo o escore Z de P/E e 380 (21,6%) de acordo com escore Z de E/I.

A análise do escore Z de P/E revelou que 59,7% eram do gênero masculino e 40,3% do gênero feminino. A média de idade foi de 8,9 anos sendo o mínimo de 6,9 e o máximo de 10,3 anos.

A análise do escore Z de E/I revelou que 53,9% eram do gênero masculino e 46,1% do gênero feminino. A média de idade foi de 9,4 anos sendo o mínimo de 6,8 e o máximo de 10,2 anos.

A tabela 1 revela a prevalência de 83,9% de crianças em risco de desnutrição segundo o escore Z de P/E não havendo diferença estatística entre as escolas estudadas. Comparando o estado nutricional da criança com o gênero, 59,7% das crianças em risco eram do gênero masculino. Quanto à série e o período escolar não houve diferença estatisticamente significante.

Tabela 1
Crianças em risco de desnutrição e desnutridas de acordo com o índice de peso para estatura, matriculadas nas três escolas municipais de ensino fundamental da Região de Parelheiros, segundo gênero, série e período de estudo

Em relação ao escore Z de E/I, a tabela 2 mostra a prevalência de 81,8% de crianças em risco de desnutrição não havendo diferença estatística entre as escolas estudadas. Comparando o estado nutricional das crianças com o gênero 53,9% das crianças em risco eram do gênero masculino. Quanto à série e o período escolar não houve diferença estatisticamente significante.

Tabela 2
Crianças em risco de desnutrição e desnutridas de acordo com o índice de estatura para idade, matriculadas nas três escolas municipais de ensino fundamental da Região de Parelheiros, segundo gênero, série e período de estudo

Analisando o estado nutricional em relação aos escores Z de P/E e E/I (Tabela 3) não encontramos diferenças estatisticamente significantes na comparação entre as escolas, o gênero e o período escolar. Já na relação entre estado nutricional e série dos escolares observamos significância estatística (p = 0,0105) nessa associação.

Tabela 3
Crianças desnutridas de acordo com o índice de peso para estatura e estatura para idade, matriculadas nas três escolas municipais de ensino fundamental da região de Parelheiros, segundo gênero, série e período de estudo

A tabela 4 mostra a associação da desnutrição com o período de estudo. Vê-se uma diferença estatística significante entre o período das 11 às 15 horas (p < 0,0001) para as crianças com déficit nutricional segundo índice P/E e entre o período das 7 às 11 horas (p < 0,0001) para crianças com déficit nutricional segundo o índice E/I.

Tabela 4
Crianças desnutridas de acordo com o índice de peso/estatura e estatura/idade segundo série e período de estudo

DISCUSSÃO

Apesar da melhoria das condições nutricionais das crianças no Brasil, a desnutrição tem ocorrido de forma muito desigual e o problema ainda é muito grave nas regiões mais pobres do país e nos bolsões de pobreza das grandes cidades(1717. Santos RB, Martins PA, Sawaya AL. Estado nutricional, condições socioeconômicas, ambientais e de saúde de crianças morados em cortiços e favela. Rev Nutr. 2008;21(6):671-81.).

Nos países em desenvolvimento, estima-se que a prevalência da desnutrição em crianças até 60 meses seja de 8% para peso/altura, 32% para altura/idade e 27% para peso/idade(1818. Goulart RM, Junior IF, Souza MF. Recuperação nutricional de crianças desnutridas e em risco nutricional em programa de suplementação alimentar no Município de Mogi das Cruzes, São Paulo, Brasil. Cad Saúde Pública. 2007;23(1):147-56.).

Estudo realizado por Burlandy(1919. Burlandy L, Anjos LA. Acesso à alimentação escolar e estado nutricional de escolares no Nordeste e Sudeste do Brasil, 1997. Cad Saúde Pública. 2007;23(5):1217-26.) com escolares entre 7 e 10 anos, encontrou no total de crianças, 13,2% apresentando desnutrição por déficit de estatura (13,8 e 12,5% dos meninos e meninas, respectivamente). A maior prevalência ocorreu, como esperado, no nordeste rural (21,9%), e a menor, no sudeste rural (8,4%). A prevalência na área rural é ainda superior à da área urbana. A desnutrição por déficit de peso foi bem baixa e, na verdade, pode-se dizer que não havia desnutrição, visto que as frequências de valores de Z < −2 estão perto do esperado para uma população sadia (aproximadamente 2,5%).

No Ceará, Paraíba e Piauí foram realizados censos estaduais de estatura para a idade. No estado da Paraíba, foi encontrada uma prevalência de 14,5% para todo o Estado, com um déficit de 17,86% de estatura na zona rural e de 11,87% na zona urbana(2020. Carvalho AT, Costa MJ, Ferreira LO, Batista Filho M. Cartografia do retardo estatural em escolares do Estado da Paraíba, Brasil. Rev Saúde Pública. 2000;34(1):3-8.).

A prevalência de risco de desnutrição e desnutrição neste estudo foi relativamente alta. Quanto à relação entre gênero e desnutrição houve predomínio no sexo masculino, embora sem significância estatística, estando de acordo com os resultados apresentados em outras pesquisas.

No que se refere mais especificamente à faixa etária do escolar, análises de âmbito nacional sobre o estado nutricional desse segmento são bastante escassas. Estudos desse porte normalmente focalizam a situação de crianças menores do que 5 anos ou de escolares de regiões/cidades específicas no país. Por exemplo, em amostra representativa de escolares do município do Rio de Janeiro, Anjos et al.(2121. Anjos LA, Castro IR, Engstrom EM, Azevedo AMF. Crescimento e estado nutricional em amostra probabilística de escolares no Município do Rio de Janeiro, 1999. Cad Saúde Pública. 2003;19 Suppl 1:S171-9.) encontraram prevalências bastante baixas de desnutrição por déficit de estatura (1,9 e 2,8% para meninas e meninos até 10 anos de idade, respectivamente). Análise dos dados da Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição (PNSN) indicou um percentual de 12,9% de desnutrição por déficit de estatura em crianças brasileiras de 6 a 10 anos, sendo as maiores prevalências encontradas nas regiões Nordeste e Norte(2222. Engstrom EM, Anjos LA. Déficit estatural nas crianças brasileiras: relações com condições sócio-ambientais e estado nutricional materno. Cad Saúde Pública. 1999;15(3):559-67.).

O ponto de corte recomendado internacionalmente para classificar a criança como desnutrida (escore Z abaixo de 2 desvios-padrão, comparado ao valor médio da referência internacional)(2323. Blössner M, Onis M. Malnutrition: quantifying the health impact at national and local levels. Geneve: WHO; 2005. (Environmental Burden of Disease Series, nº 12).) tem sido utilizado nas pesquisas populacionais, identificando as prevalências e as tendências da desnutrição moderada e grave.

No Brasil, entre 1975 e 1989, como resultado dos ganhos econômicos e da grande expansão de serviço e programas de saúde, a prevalência da desnutrição infantil foi reduzida em cerca de 60%, representando mais de 1 milhão de crianças. No entanto, a forma mais comum de desnutrição, o déficit de altura por idade, está concentrado nas regiões mais pobres do país, evidenciando que o problema não está de todo controlado(11. Monte CM. Desnutrição: um desafio secular à nutrição infantil. J Pediatr (Rio J). 2000;76(Suppl 3):285-97.,22. Martins IS, Marinho SP, Oliveira DC, Araújo EA. Pobreza, desnutrição e obesidade: inter-relação de estados nutricionais de indivíduos de uma mesma família. Cienc Saúde Coletiva. 2007;12(6):1553-64.).

Estima-se que 38,1% das crianças menores de 5 anos que vivem em países em desenvolvimento padeçam de grave comprometimento do crescimento (stunting) e que 9,0% apresentem emagrecimento extremo (wasting). A essas condições associam-se, entre outros danos, o aumento na incidência e na gravidade de enfermidades infecciosas, a elevação das taxas da mortalidade na infância, o retardo do desenvolvimento psicomotor, as dificuldades no aproveitamento escolar e a diminuição da altura e da capacidade produtiva na idade adulta(2424. Monteiro CA, Conde WL. Tendência secular da desnutrição e da obesidade na infância na cidade de São Paulo (1974-1996). Rev Saúde Pública. 2000; 34(6 Supl):52-61.,2525. Ministério da Saúde. Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN): Orientações básicas para coleta, processamento, análise de dados e informação em serviços de saúde. Brasília: Ministério da Saúde. 2008.).

A desnutrição grave pode deixar duas sequelas importantes: uma relacionada à estatura e a outra ao desenvolvimento mental. A estatura pode se desenvolver caso a criança não apresente infecções recorrentes e receba dietas adequadas, mas as alterações do desenvolvimento mental podem ser graves e permanentes e, dependendo do grau de desnutrição, essas lesões são as responsáveis pelo atraso do desenvolvimento neuropsicomotor das crianças, mas esse atraso pode ser recuperado caso a criança receba uma dieta adequada e esteja em um ambiente sociocultural que a estimule(2626. Muradas MR, Carvalho SD. Fatores que influenciam a desnutrição infantil em um centro de saúde do município de Campinas (SP). Cienc Cuid Saúde. 2008; 7(1):53-8.).

Quanto à série em que a criança estuda a quarta possui as crianças com maior idade escolar e apresenta os piores resultados quanto à desnutrição segundo escore Z de E/I. Quanto à desnutrição segundo o escore Z de P/E, observou-se que a primeira série foi a mais atingida, sendo essa diferença estatisticamente significante. Isso mostra que ainda há uma grande porcentagem de crianças em idade escolar com déficit de estatura incorrigível por tratamentos.

O turno intermediário (11 às 15 horas) foi criado pela Prefeitura de São Paulo na década de 1970 para atender áreas de grande demanda, onde não havia vagas nas turmas da manhã e da tarde. Por isso, o terceiro turno ficou espremido entre aqueles dois períodos, com a carga horária limitada ao mínimo de 4 horas diárias imposto por lei. Essa solução provisória se estende até os dias de hoje(2727. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. O turno da fome. Porta ClippingMP de 08/01/2010. [Internet] [citado 2010 Mar 1] Disponível em: https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br.
https://conteudoclippingmp.planejamento....
).

Quando analisado o período escolar das crianças estudadas, observamos que o período das 11 às 15 horas foi estatisticamente significante para as crianças com déficit nutricional segundo índice P/E e, entre o período das 7 às 11 horas, para crianças com déficit nutricional segundo o índice E/I. Por esse turno coincidir com a hora do almoço, é chamado de “turno da fome”, o que pode prejudicar o rendimento escolar e o horário das refeições. Isso pode repercutir no estado nutricional da criança, nesse caso, principalmente para desnutrição aguda, por conta do horário inadequado da refeição.

A avaliação nutricional de crianças, por meio da vigilância nutricional, utilizando-se repetidas coletas de dados antropométricos, permite orientar o planejamento, execução e avaliação de programas de saúde em uma determinada população(44. Neves OM, Brasil ALD, Brasil LM, Taddei JA. Antropometria de escolares ao ingresso no ensino fundamental na cidade de Belém, Pará, 2001. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2006;6(1):39-46.,2828. Martino HS, Ferreira AC, Pereira CN, Silva RR. Avaliação antropométrica e análise dietética de pré-escolares em centros educacionais municipais no Sul de Minas Gerais. Cienc Saúde Coletiva. 2010;15(2):551-558.,2929. Tuma RC, Costa TH, Schmitz BA. Avaliação antropométrica e dietética de pré-escolares em três creches de Brasília, Distrito Federal. Rev Bras Saúde Matern Infant. 2005;5(4):419-28.).

Devido ao estado nutricional aumentar os riscos de desenvolvimento de doenças, bem como interferir no crescimento e desenvolvimento da criança, é necessária uma avaliação nutricional precoce da população infantil, que revele a magnitude da deficiência presente e os fatores determinantes para a ocorrência do agravo(3030. Castro TG, Novaes JF, Silva MR, Costa NR, Franceschini SC, Tinoco AL, et al. Caracterização do consumo alimentar, ambiente socioeconômico e estado nutricional de pré-escolares de creches municipais. Rev Nutr. 2005;18(3):321-30.).

CONCLUSÃO

A desnutrição ainda é persistente entre a população de baixa renda e a forma irrecuperável de déficit nutricional é a maior em número absoluto. O sexo masculino apresentou maior porcentagem de desnutrição. A partir da análise feita na região de Parelheiros, pode-se considerar que a avaliação nutricional de escolares – a realização da técnica antropométrica, em especial – é uma ferramenta de extrema importância para compreensão da dinâmica nutricional de crianças e seu desenvolvimento, assim, auxiliando para a formulação de políticas de saúde e ações mais efetivas para erradicar esse problema há tanto tempo persistente na história da saúde do Brasil. Sugere-se continuidade do trabalho em outras regiões do município.

  • Trabalho realizado na Universidade de Santo Amaro – UNISA, São Paulo (SP), Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2011

Histórico

  • Recebido
    15 Jul 2011
  • Aceito
    01 Nov 2011
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