Acessibilidade / Reportar erro

Comportamentos sexuais de risco e associação com sobrepeso e obesidade em adolescentes escolares: um estudo transversal

Resumo

Objetivo

Determinar a prevalência de comportamentos de risco e sua associação com sobrepeso e obesidade em adolescentes escolares.

Métodos

Trata-se de estudo transversal, realizado em escolas públicas com adolescentes de 12 a 17 anos. Foi utilizado o questionário Youth Risk Behavior Survey. Os percentis do índice de massa corporal foram obtidos utilizando as tabelas do Centers for Disease Control and Prevention. Possíveis associações foram avaliadas usando o teste do χ2 e um modelo de regressão logística binária. Foram calculados os valores de odds ratio e o IC95%.

Resultados

Foram avaliados 1.169 estudantes, e 33,9% reportaram ter tido relação sexual. Desse grupo, 33% não utilizaram preservativo na última relação sexual, e 32,7% relataram ter tido quatro ou mais parceiros na vida. Considerando o estado nutricional, 15,3% apresentavam sobrepeso ou obesidade. Em relação ao não uso de preservativo, somente foi observada associação com o número de parceiros sexuais na vida (OR: 0,50; IC95%: 0,28-0,88). O número de parceiros sexuais na vida apresentou associação com o sexo masculino (OR: 9,17; IC95%: 4,16-20,22), idade da primeira relação sexual inferior a 13 anos (OR: 2,51; IC95%: 1,23-5,13) e uso de álcool ou drogas antes da última relação sexual (OR: 6,16; IC95%: 2,14-17,73).

Conclusão

As taxas de comportamento sexual de risco foram altas, e não foi observada sua associação com sobrepeso e obesidade.

Comportamento sexual; Comportamento do adolescente; Sobrepeso; Obesidade; Criança

Abstract

Objective

To determine the prevalence of risky sexual behavior and its association with overweight and obesity among adolescent students.

Methods

This is a cross-sectional study, conducted in public schools with adolescents aged 12 to 17 years. We used the questionnaire Youth Risk Behavior Survey. The body mass index percentiles were calculated by means of table from the Center for Control and Prevention of Diseases. Possible associations were assessed using the χ2 test and binary logistic regression model. The odds ratio and 95%CI were calculated.

Results

We evaluated 1,169 students, and 33.9% reported having had sexual intercourse. Of those, 33% did not use a condom during their last intercourse, and 32.7% had had four or more sexual partners thus far. Regarding nutritional status, 15.3% were overweight or obese. In relation to the non-use of condoms, we observed only an association with the number of lifetime sexual partners (OR: 0.50; 95%CI: 0.28-0.88). The number of lifetime sexual partners was associated with males (OR: 9.17; 95%CI: 4.16-20.22), sexual debut age at 13 years or less (OR: 2.51; 95%CI: 1.23-5.13) and drinking alcohol or using drugs before the last intercourse (OR: 6.16; 95%CI: 2.14-17.73).

Conclusion

Risky sexual behavior rates were high and no association was found between risky sexual behaviors and overweight and obesity.

Sexual behavior; Adolescent behavior; Overweight; Obesity; Child

Introdução

A iniciação sexual entre adolescentes tem ocorrido cada vez mais cedo.(11. Malta DC, Silva MA, Mello FC, Monteiro RA, Porto DL, Sardinha LM, et al. Saúde sexual dos adolescentes segundo a Pesquisa Nacional de Saúde dos Escolares. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(1):147-56.) O impacto das atuais taxas de HIV e outras infecções sexualmente transmissíveis (IST) entre adolescentes é relevante para a saúde pública e constitui ameaça para a saúde dos jovens.(22. Lowry R, Robin L, Kann L, Galuska D. Associations of body mass index with sexual risk-taking and injection drug use among US high school students. J Obes. 2014;2014:816071.) Entre os fatores que também podem ser considerados de risco com relação ao comportamento sexual, estão idade de iniciação sexual e número de parceiros.(33. Bearinger LH, Sieving RE, Ferguson J, Sharma V. Global perspectives on the sexual and reproductive health of adolescents: patterns, prevention, and potential. Lancet. 2007;369(9568):1220-31. Review.)

Além disso, a obesidade pode estar relacionada com comportamentos sexuais que aumentam o risco de IST.(22. Lowry R, Robin L, Kann L, Galuska D. Associations of body mass index with sexual risk-taking and injection drug use among US high school students. J Obes. 2014;2014:816071.) O sobrepeso e a obesidade podem influenciar no comportamento sexual dos adolescentes, já que o índice de massa corporal (IMC) está associado a fatores psicológicos de atratividade física.(44. Nagelkerke NJ, Bernsen RM, Sgaier SK, Jha P. Body mass index, sexual behaviour, and sexually transmitted infections: an analysis using the NHANES 1999-2000 data. BMC Public Health. 2006;6:199.)

Para melhor explicar essa relação, foram sugeridas duas teorias: a primeira propõe que a associação entre IMC e risco sexual é mediada por fatores de risco psicossociais. As consequências psicossociais da obesidade, incluindo o aumento de depressão e problemas sociais, podem afetar a capacidade de ter relacionamentos amorosos positivos e negociar práticas de sexo seguro, o que leva a um maior risco sexual.(55. Kershaw TS, Arnold A, Lewis JB, Magriples U, Ickovics JR. The skinny on sexual risk: the effects of BMI on STI incidence and risk. AIDS Behav. 2011;15(7):1527-38.) A segunda teoria sugere que o sobrepeso e a obesidade podem ser vistos como fatores relacionados a um menor risco sexual, já que reduzem o número de parceiros e a frequência sexual.(55. Kershaw TS, Arnold A, Lewis JB, Magriples U, Ickovics JR. The skinny on sexual risk: the effects of BMI on STI incidence and risk. AIDS Behav. 2011;15(7):1527-38.) Outro possível mecanismo para a associação entre obesidade e comportamento sexual de risco envolve a iniciação sexual precoce(22. Lowry R, Robin L, Kann L, Galuska D. Associations of body mass index with sexual risk-taking and injection drug use among US high school students. J Obes. 2014;2014:816071.) devido à maturação sexual precoce relacionada à presença de obesidade na infância.(66. Dietz WH. Health consequences of obesity in youth: childhood predictors of adult disease. Pediatrics. 1998;101(3 Pt 2):518-25. Review.)

Alguns estudos encontraram associação entre IMC alto e comportamentos sexuais de risco, como o não uso de preservativo e o consumo de álcool e outras drogas antes da última relação.(22. Lowry R, Robin L, Kann L, Galuska D. Associations of body mass index with sexual risk-taking and injection drug use among US high school students. J Obes. 2014;2014:816071.,77. Ratcliff MB, Jenkins TM, Reiter-Purtill J, Noll JG, Zeller MH. Risk-taking behaviors of adolescents with extreme obesity: normative or not? Pediatrics. 2011;127(5):827-34.

8. Leech TGJ, Johnson J. Risky sexual behavior: a race-specific social consequence of obesity. J Youth Adolesc. 2012;41(1):41-52.
-99. Gordon LP, Diaz A, Soghomonian C, Nucci-Sack AT, Weiss JM, Strickler HD, et al. Increased Body Mass Index Associated with Increased Risky Sexual Behaviors. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2016;29(1):42-7.) Além disso, a percepção errônea do peso também foi identificada como importante fator associado a comportamentos de risco.(1010. Akers AY, Lynch CP, Gold MA, Chang JC, Doswell W, Wiesenfeld HC, et al. Exploring the relationship among weight, race, and sexual behaviors among girls. Pediatrics. 2009;124(5):e913-20.)

Devido ao aumento em taxas de obesidade entre adolescentes, a compreensão da relação entre IMC e comportamento sexual se torna importante, pois certos comportamentos estabelecidos durante a adolescência podem comprometer a saúde a curto e longo prazo.(1111. Mmari K, Sabherwal S. A review of risk and protective factors for adolescent sexual and reproductive health in developing countries: an update. J Adolesc Health. 2013;53(5):562-72. Review.,1212. Sasaki RS, Souza MM, Leles CR, Malta DC, Sardinha LM, Freire MD. Sexual behavior of school-aged adolescents in the city of Goiânia, Goiás. Rev Bras Epidemiol. 2014;17(Suppl 1):172-82.)

Objetivo

Determinar a prevalência de comportamento sexual de risco e sua associação com sobrepeso e obesidade entre adolescentes em idade escolar.

Métodos

Trata-se de estudo epidemiológico transversal realizado em escolas públicas estaduais de Petrolina (PE). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Pernambuco, CAAE: 24288213.2.0000.5207.

A população do estudo foi composta por adolescentes inscritos nessas escolas. A distribuição da amostra foi feita pelo tamanho da escola e pelo período de aula (diurno), para garantir a proporcionalidade da amostra. Para sustentar o planejamento da amostra, as escolas foram classificadas em três categorias: pequena (<200 alunos), média (200 a 499 alunos) e grande (≥500 alunos).

Para a seleção da amostra, usamos amostragem por conglomerados, em dois estágios, com a escola e a classe representando as unidades de amostra no primeiro e segundo estágio, respectivamente. Todas as escolas públicas e urbanas de Petrolina foram consideradas elegíveis para o estudo. Inicialmente, a estratificação foi feita para que o sorteio fosse dividido por tamanho da escola. Após todos os estágios, chegamos a nove escolas, o que representou 31,03% das escolas públicas de Petrolina.

Para a quantificação da amostra, consideramos população de 25.635 alunos, intervalo de confiança de 95% (IC95%), erro máximo tolerável de 5 pontos percentuais, perda amostral de 20% e prevalência estimada de 50%, pois o estudo cobriu diversos comportamentos sexuais de risco, com diferentes frequências de ocorrência. Foi aplicado efeito de desenho de 2,0 pontos, totalizando 948 adolescentes. Porém, para garantir boa proporcionalidade de indivíduos por escola e por classe, decidimos avaliar um mínimo de 17 alunos por classe. Assim, o presente estudo avaliou 1.226 adolescentes.

O estudo incluiu adolescentes que preencheram os seguintes critérios: idade entre 12 e 17 anos e matriculados em instituições educacionais localizadas na área urbana de Petrolina. Foram excluídos adolescentes com doenças ou distúrbios físicos ou psicológicos que interferissem na coleta de dados; aqueles que entregaram os formulários incompletos ou com erros; e que não aceitaram ter seu peso e/ou altura medidos.

Para a avaliação socioeconômica, foi utilizado um questionário estruturado, e os comportamentos de risco foram avaliados pela versão brasileira do Youth Risk Behavior Survey (YRBS).(1313. Guedes DP, Lopes CC. Validação da versão brasileira do Youth Risk Behavior Survey 2007. Rev Saude Publica. 2010;44(5):840-50.) A avaliação antropométrica incluiu a medição de peso e altura. Ambas as variáveis foram usadas para calcular o IMC, que foi categorizado como percentis para cada idade e sexo, utilizando-se os critérios do Centers for Disease Control and Prevention (CDC).

Antes da coleta de dados, foi conduzido estudo piloto, para testar a aplicabilidade dos instrumentos, fazer correções e identificar possíveis vieses ou limitações nos procedimentos de pesquisa. Os dados foram coletados em uma escola pública de Petrolina, com uma amostra de 80 adolescentes. Com relação aos procedimentos, o projeto foi apresentado e, depois, os questionários foram distribuídos para os adolescentes, que os preencheram na sala de aula, sem a presença do professor. Após o preenchimento do questionário, o pesquisador coletou os formulários e posteriomente registrou os dados antropométricos.

Variáveis do estudo

As variáveis dependentes usadas nesse estudo foram uso de preservativo, classificado como “sim” ou “não, e número de parceiros sexuais na vida, classificado como “até três parceiros” ou “quatro ou mais parceiros”.

As variáveis independentes foram: dados socioeconômicos (sexo, idade, raça/etnia, religião, estado civil, número de filhos, grau de escolaridade dos pais e renda mensal da família), variáveis de comportamento sexual (se havia iniciado a vida sexual, idade da iniciação sexual, número de parceiros nos últimos 3 meses, número de parceiros na vida, consumo de álcool ou drogas antes da última relação sexual e método contraceptivo usado na última relação), peso corpóreo, percepção errônea de peso corpóreo, violência entre parceiros íntimos (VPI) e IMC.

Para a classificação do IMC, os adolescentes com percentil <5 foram considerados abaixo do peso; ≥5 e <85, eutróficos; ≥85 e <95, acima do peso; e ≥95, obesos.(1414. Barlow SE; Expert Committee. Expert committee recommendations regarding the prevention, assessment, and treatment of child and adolescent overweight and obesity: summary report. Pediatrics. 2007;120(Suppl 4): S164-92.) Para verificar a percepção errônea do peso corpóreo, comparamos as categorias de IMC à percepção do peso corpóreo.

A VPI foi avaliada pelas perguntas: “Nos últimos 12 meses, você sofreu alguma agressão física de seu parceiro com tapas, socos ou chutes?” e “Você já foi forçado pelo seu parceiro a ter relação sexual contra sua vontade?”. Os participantes que responderam “sim” a qualquer uma dessas perguntas foram considerados como tendo histórico de VPI.(1010. Akers AY, Lynch CP, Gold MA, Chang JC, Doswell W, Wiesenfeld HC, et al. Exploring the relationship among weight, race, and sexual behaviors among girls. Pediatrics. 2009;124(5):e913-20.)

Análise de dados

A análise de dados foi feita com o software Statistical Package for Social Science (SPSS), versão 20.0. A análise descritiva para as variáveis categóricas incluiu a distribuição de frequências absolutas e relativas. Para variáveis numéricas, valores de tendência central e dispersão foram calculados de acordo com a distribuição dos dados, que foi verificada pelo teste de Kolmogorov-Smirvov.

Para verificar possíveis fatores associados com as variáveis dependentes, foi feita análise de regressão logística binária, utilizando-se a odds ratio (OR) e seus respectivos IC95%. Um modelo bivariado de associação (análise bruta) foi previamente construído para verificar a presença e/ou magnitude das associações entre cada variável independente e a variável dependente. O modelo de regressão logística binária adotado foi a utilização do método retroativo manual. A decisão de manter ou remover as variáveis do modelo foi determinada pela análise de valores da OR, estatística Deviance, mudanças no valor de p das variáveis e intervalo de confiança. Com esse modelo, encontramos dois modelos concorrentes, e o critério para a escolha do melhor modelo foi baseado nos menores valores observados nas estatísticas da Análise de Informação de Akaike (AIC) e do Critério de Informação Bayesiano (BIC - Bayesian Information Criterion). Finalmente, a qualidade do ajuste do modelo foi determinada pela análise de multicolinearidade pelo fator de inflação de variância (FIV), teste de Hosmer-Lemeshow e análise dos pontos influentes. Todos os testes foram bicaudais, e todas as análises adotaram nível de significância de p<0,05.

Resultados

O estudo avaliou 1.226 alunos, mas apenas 1.169 foram incluídos na análise final de dados. Foram excluídos 57 indivíduos devido à falta de informações relevantes em seu questionário. A idade dos adolescentes variou entre 12 e 17 anos.

Com relação às características socioeconômicas, 56,6% (n=660; IC95%: 53,6-59,3) dos adolescentes eram do sexo feminino, 55,0% (n=639; IC95%: 52,1-57,9) se autorrelataram pardos, 50,1% (n=575; IC95%: 47,1-53,0) eram católicos, 94,9% (n=1.088; IC95%: 93,4-96,1) eram solteiros e 66,5% (n=453; IC95%: 62,8-70,0) tinham renda familiar de até dois salários mínimos. Com relação ao grau de instrução dos pais, 33,8% (n=273; IC95%: 30,7-37,0) relataram que sua mãe completara o Ensino Fundamental ou tinha Ensino Médio incompleto, e 34,8% (n=280; IC95%: 31,5-38,2) relataram que seu pai completara Ensino Fundamental ou tinha Ensino Médio Incompleto.

Em nossa amostra, 33,9% (n=388; IC95%: 31,2-36,8) relataram já terem tido relações sexuais. A tabela 1 mostra a distribuição do comportamento sexual dos adolescentes. Apenas 1,2% (n=13; IC95%: 0,6-2,0) dos alunos relataram ter filhos. Dos indivíduos avaliados, 3,5% (n=40; IC95%: 2,4-4,6) relataram histórico de VPI: 1,5% (n=17; IC95%: 0,9-2,3) relataram terem sido forçados a terem relações sexuais e 2,0% (n=23; IC95%: 1,3-3,0) sofreram agressão física do parceiro.

Tabela 1
Comportamento sexual entre adolescentes que relataram ter iniciado atividade sexual

Com relação a peso e altura, a mediana, e os valores máximo e mínimo foram 1,63m (1,36m a 1,95m) e 53,2kg (26,1kg a 106,5kg), respectivamente. Dados referentes ao estado nutricional dos adolescentes, de acordo com IMC e peso corpóreo, são apresentados na tabela 2. A comparação entre as categorias de IMC e percepção de peso corpóreo mostrou que 49,4% (n=574; IC95%: 46,5-52,3%) dos adolescentes tinham percepção errônea do peso corpóreo, sendo 51,1% (n=336; IC95%: 47,2-55,0) das mulheres e 47,1% (n=238; IC95%: 42,7-51,1) dos homens.

Tabela 2
Classificação do índice de massa corporal e percepção do peso corpóreo pelos adolescentes (n=1.169)

A tabela 3 apresenta os resultados das variáveis independentes no modelo final de regressão logística. Nessa análise, apenas o número de parceiros mostrou associação significativa com o uso de preservativo durante a última relação sexual.

Tabela 3
Análise de regressão logística binária entre não uso de preservativos e variáveis independentes

A tabela 4 mostra os resultados do modelo de regressão, demonstrando que sexo, idade de iniciação sexual e uso de álcool ou drogas tiveram associação significativa com o número de parceiros sexuais.

Tabela 4
Análise de regressão logística binária entre número de parceiros e variáveis independentes

Discussão

Com relação ao comportamento sexual dos adolescentes, a maioria relatou ter tido apenas um parceiro, seguido de 32,7% que relataram ter tido quatro ou mais parceiros. Corroborando tais achados, Lowry et al.,(22. Lowry R, Robin L, Kann L, Galuska D. Associations of body mass index with sexual risk-taking and injection drug use among US high school students. J Obes. 2014;2014:816071.) encontraram prevalência similar de jovens com quatro ou mais parceiro, o que pode ser explicado pelo fato de que a adolescência é uma fase de experimentação, na qual a troca de parceiros é comum. Porém, o alto número de parceiros é preocupante com relação à saúde, pois isso pode aumentar o risco de transmissão de HIV e outras IST.(1212. Sasaki RS, Souza MM, Leles CR, Malta DC, Sardinha LM, Freire MD. Sexual behavior of school-aged adolescents in the city of Goiânia, Goiás. Rev Bras Epidemiol. 2014;17(Suppl 1):172-82.)

A maioria dos adolescentes fez uso do preservativo durante a última relação. Porém, é importante notar que por volta de um terço dos jovens que tinham iniciado a vida sexual não usaram preservativo durante a última relação. Isso mostra que, embora os jovens tenham acesso a informações sobre IST, isso não é suficiente para estabelecer ações preventivas.

Com relação ao estado nutricional dos adolescentes com base no IMC, a prevalência de sobrepeso e obesidade encontrada foi de 10,5% e 4,8%, respectivamente, e mostrou-se mais alta entre as mulheres. Esses números foram mais baixos do que aqueles encontrados em outros estudos nacionais e internacionais.(22. Lowry R, Robin L, Kann L, Galuska D. Associations of body mass index with sexual risk-taking and injection drug use among US high school students. J Obes. 2014;2014:816071.,1515. Flores LS, Gaya AR, Petersen RD, Gaya A. Trends of underweight, overweight, and obesity in Brazilian children and adolescents. J Pediatr (Rio J). 2013; 89(5):456-61.,1616. Farhat T, Iannotti RJ, Simons-Morton BG. Overweight, obesity, youth, and health-risk behaviors. Am J Prev Med. 2010;38(3):258-67.)

Além da análise do IMC, outra importante variável que pode influenciar no comportamento é a percepção de peso corpóreo. Nesse estudo, a maioria dos alunos relatou estar dentro do peso esperado. Contudo, observamos que a prevalência de indivíduos que se consideravam abaixo do peso mostrou-se mais alta entre os homens. Por outro lado, a prevalência de alunos com a percepção de que estavam acima do peso ideal ou muito acima do peso ideal mostrou-se mais alta entre as mulheres. Esses achados podem ser explicados pela tendência das mulheres de superestimarem e dos homens de subestimarem seu peso corpóreo.

Na análise da associação entre variáveis independentes e o não uso de preservativo, vimos que as variáveis com probabilidade de serem incluídas no modelo de regressão foram grau de escolaridade da mãe, IMC, percepção de peso corpóreo, número de parceiros durante a vida e VPI. Porém, após a análise de regressão logística binária, a única variável que permaneceu associada foi o número de parceiros na vida. Os resultados mostraram que os indivíduos que relataram terem tido quatro ou mais parceiros tinham 50% menos chance de não terem usado preservativo durante a última relação sexual. A partir desses dados, podemos concluir que os adolescentes que tiveram mais parceiros usaram preservativo com mais frequência. Contudo, esse estudo não avaliou o tipo de relacionamento como estável ou casual – um número mais alto de parceiros está associado a relações casuais.

Calazans et al.,(1717. Calazans G, Araujo TW, Venturi G, Franc I. Factors associated with condom use among youth aged 15-24 years in Brazil in 2003. AIDS. 2005;19 (Suppl 4): S42-50.) encontraram diferenças significativas no uso de preservativo entre jovens de acordo com o tipo de relacionamento durante a última relação – o uso da preservativo com parceiros casuais ocorre com mais frequência do que com parceiros estáveis. Portanto, os adolescentes acreditam que relacionamentos estáveis oferecem menor risco de infecções, o que resulta em um desafio maior com relação ao uso da preservativo.

Na associação entre variáveis independentes e número de parceiros durante a vida, as variáveis que entraram no modelo de regressão foram idade, sexo, renda familiar, IMC, idade de iniciação sexual, consumo de álcool e drogas antes da última relação e VPI. Porém, após a regressão logística binária, as variáveis que permaneceram foram aquelas relacionadas a sexo, idade de iniciação sexual e ingestão de álcool ou drogas antes da última relação.

Nossos resultados demonstraram que adolescentes do sexo masculino apresentaram 9,17 vezes mais chances de ter quatro ou mais parceiros durante a vida. Todavia, essa diferença era esperada, já que a sexualidade é muito influenciada pelas relações assimétricas entre os sexos observadas na sociedade. Para os homens, a iniciação sexual e a mudança de parceiro são vistas como mais naturais, ao contrário do que ocorre com as mulheres, de quem é esperado um comportamento mais recatado.

Com relação à idade de iniciação sexual, os alunos que começaram a ter relações com 13 anos ou menos tinham 2,51 mais chances de terem tido quatro ou mais parceiros na vida. Essa relação já era esperada, pois a iniciação precoce mostra associação com maior número de parceiros ao longo da vida. A literatura mostra que a associação entre a iniciação precoce da atividade sexual e IST é mediada pelo número de parceiros sexuais.(1818. Epstein M, Bailey JA, Manhart LE, Hill KG, Hawkins JD, Haggerty KP, et al. Understanding the link between early sexual initiation and later sexually transmitted infection: test and replication in two longitudinal studies. J Adolesc Health. 2014;54(4):435-441. e2.)

O consumo de álcool e drogas antes da última relação foi apresentado como fator de risco que aumenta em 6,16 vezes a chance de se ter quatro ou mais parceiros durante a vida; quando os jovens estão sob a influência dessas substâncias, ficam mais propensos a terem relações não planejadas em encontros casuais.(1919. Slater C, Robinson AJ. Sexual health in adolescents. Clin Dermatol. 2014; 32(2):189-95. Review.)

A variável IMC foi incluída nos modelos de regressão com as variáveis dependentes não uso da preservativo e número de parceiros sexuais. Porém, a análise de regressão não permaneceu associada a essas variáveis, o que está de acordo com os resultados de outros estudos que não encontraram associação entre IMC e comportamento sexual de risco.(1010. Akers AY, Lynch CP, Gold MA, Chang JC, Doswell W, Wiesenfeld HC, et al. Exploring the relationship among weight, race, and sexual behaviors among girls. Pediatrics. 2009;124(5):e913-20.,2020. DeMaria AL, Lugo JM, Rahman M, Pyles RB, Berenson AB. Association between body mass index, sexually transmitted infections, and contraceptive compliance. J Womens Health (Larchmt). 2013;22(12):1062-8.) Por outro lado, outros autores encontraram associação entre IMC alto e comportamentos sexuais de risco, como não uso da preservativo e consumo de álcool ou drogas antes da última relação.(22. Lowry R, Robin L, Kann L, Galuska D. Associations of body mass index with sexual risk-taking and injection drug use among US high school students. J Obes. 2014;2014:816071.,77. Ratcliff MB, Jenkins TM, Reiter-Purtill J, Noll JG, Zeller MH. Risk-taking behaviors of adolescents with extreme obesity: normative or not? Pediatrics. 2011;127(5):827-34.

8. Leech TGJ, Johnson J. Risky sexual behavior: a race-specific social consequence of obesity. J Youth Adolesc. 2012;41(1):41-52.
-99. Gordon LP, Diaz A, Soghomonian C, Nucci-Sack AT, Weiss JM, Strickler HD, et al. Increased Body Mass Index Associated with Increased Risky Sexual Behaviors. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2016;29(1):42-7.)

Diferentemente, Averett et al.,(2121. Averett S, Corman H, Reichman NE. Effects of Overweight on Risky Sexual Behavior of Adolescent Girls. Econ Inq. 2013;51(16172):605-19.) observaram que mulheres com sobrepeso têm menor probabilidade de terem coitos vaginais sem preservativo, e Nagelkerke et al.,(44. Nagelkerke NJ, Bernsen RM, Sgaier SK, Jha P. Body mass index, sexual behaviour, and sexually transmitted infections: an analysis using the NHANES 1999-2000 data. BMC Public Health. 2006;6:199.) viram que adultos com sobrepeso relataram menos parceiros sexuais no último ano do que seus pares eutróficos. Dessa forma, não foi encontrado consenso na literatura sobre o tema, e os resultados variam muito. Isso pode ser resultado das diferenças nas metodologias aplicadas com relação à caracterização das amostras, com diferentes perfis e tamanhos, além dos diferentes pontos de corte para o IMC na avaliação do estado nutricional.

Com relação aos nossos resultados, que não mostraram associação entre IMC e comportamento sexual, destacamos o fato de que todos os outros estudos foram feitos nos Estados Unidos. É importante notar que características culturais podem influenciar o comportamento dos adolescentes. Além disso, nesse estudo, a prevalência de sobrepeso e obesidade mostrou-se baixa, o que pode ter influenciado os resultados.

Embora a percepção do peso corpóreo tenha entrado apenas no modelo com a variável dependente “não uso da preservativo”, após a análise de regressão, a associação entre esses dois fatores desapareceu. Isso pode contradizer os achados de Akers et al.,(1010. Akers AY, Lynch CP, Gold MA, Chang JC, Doswell W, Wiesenfeld HC, et al. Exploring the relationship among weight, race, and sexual behaviors among girls. Pediatrics. 2009;124(5):e913-20.) que revelaram que os adolescentes que se percebiam com sobrepeso tinham menos probabilidade de relatar o uso de preservativo durante a última relação. Porém, seu estudo incluiu apenas indivíduos do sexo feminino.

Pode-se inferir que essa pesquisa oferece informações relevantes sobre os adolescentes nessa região do Brasil, e que tais dados podem auxiliar em decisões sobre ações de saúde para essa população. Porém, destacamos algumas limitações do presente estudo. Os dados foram obtidos em uma pequena cidade do Estado de Pernambuco, portanto, suas realidades local, social e cultural podem não refletir o perfil de todo o país. O desenho transversal do estudo não permite análise do efeito causal desses comportamentos. Ademais, o questionário foi feito por autorrelato, o que pode resultar em maior suscetibilidade a vieses de recordação, limitação intrínseca de estudos transversais e retrospectivos.(2222. Pitangui AC, Gomes MR, Lima AS, Schwingel PA, Albuquerque AP, Araújo RC. Menstruation disturbances: prevalence, characteristics, and effects on the activities of daily living among adolescent girls from Brazil. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2013;26(3):148-52.) Finalmente, todos os participantes vieram de escolas públicas, o que limita a reprodutibilidade dos resultados para alunos do setor privado.

Sugerimos mais estudos sobre o assunto, que tenham desenho longitudinal e analisem adolescentes de instituições públicas e privadas de diferentes regiões.

Conclusão

As taxas de comportamento sexual de risco foram altas, e não houve associação entre o sobrepeso e obesidade e os comportamentos de risco analisados.

References

  • 1
    Malta DC, Silva MA, Mello FC, Monteiro RA, Porto DL, Sardinha LM, et al. Saúde sexual dos adolescentes segundo a Pesquisa Nacional de Saúde dos Escolares. Rev Bras Epidemiol. 2011;14(1):147-56.
  • 2
    Lowry R, Robin L, Kann L, Galuska D. Associations of body mass index with sexual risk-taking and injection drug use among US high school students. J Obes. 2014;2014:816071.
  • 3
    Bearinger LH, Sieving RE, Ferguson J, Sharma V. Global perspectives on the sexual and reproductive health of adolescents: patterns, prevention, and potential. Lancet. 2007;369(9568):1220-31. Review.
  • 4
    Nagelkerke NJ, Bernsen RM, Sgaier SK, Jha P. Body mass index, sexual behaviour, and sexually transmitted infections: an analysis using the NHANES 1999-2000 data. BMC Public Health. 2006;6:199.
  • 5
    Kershaw TS, Arnold A, Lewis JB, Magriples U, Ickovics JR. The skinny on sexual risk: the effects of BMI on STI incidence and risk. AIDS Behav. 2011;15(7):1527-38.
  • 6
    Dietz WH. Health consequences of obesity in youth: childhood predictors of adult disease. Pediatrics. 1998;101(3 Pt 2):518-25. Review.
  • 7
    Ratcliff MB, Jenkins TM, Reiter-Purtill J, Noll JG, Zeller MH. Risk-taking behaviors of adolescents with extreme obesity: normative or not? Pediatrics. 2011;127(5):827-34.
  • 8
    Leech TGJ, Johnson J. Risky sexual behavior: a race-specific social consequence of obesity. J Youth Adolesc. 2012;41(1):41-52.
  • 9
    Gordon LP, Diaz A, Soghomonian C, Nucci-Sack AT, Weiss JM, Strickler HD, et al. Increased Body Mass Index Associated with Increased Risky Sexual Behaviors. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2016;29(1):42-7.
  • 10
    Akers AY, Lynch CP, Gold MA, Chang JC, Doswell W, Wiesenfeld HC, et al. Exploring the relationship among weight, race, and sexual behaviors among girls. Pediatrics. 2009;124(5):e913-20.
  • 11
    Mmari K, Sabherwal S. A review of risk and protective factors for adolescent sexual and reproductive health in developing countries: an update. J Adolesc Health. 2013;53(5):562-72. Review.
  • 12
    Sasaki RS, Souza MM, Leles CR, Malta DC, Sardinha LM, Freire MD. Sexual behavior of school-aged adolescents in the city of Goiânia, Goiás. Rev Bras Epidemiol. 2014;17(Suppl 1):172-82.
  • 13
    Guedes DP, Lopes CC. Validação da versão brasileira do Youth Risk Behavior Survey 2007. Rev Saude Publica. 2010;44(5):840-50.
  • 14
    Barlow SE; Expert Committee. Expert committee recommendations regarding the prevention, assessment, and treatment of child and adolescent overweight and obesity: summary report. Pediatrics. 2007;120(Suppl 4): S164-92.
  • 15
    Flores LS, Gaya AR, Petersen RD, Gaya A. Trends of underweight, overweight, and obesity in Brazilian children and adolescents. J Pediatr (Rio J). 2013; 89(5):456-61.
  • 16
    Farhat T, Iannotti RJ, Simons-Morton BG. Overweight, obesity, youth, and health-risk behaviors. Am J Prev Med. 2010;38(3):258-67.
  • 17
    Calazans G, Araujo TW, Venturi G, Franc I. Factors associated with condom use among youth aged 15-24 years in Brazil in 2003. AIDS. 2005;19 (Suppl 4): S42-50.
  • 18
    Epstein M, Bailey JA, Manhart LE, Hill KG, Hawkins JD, Haggerty KP, et al. Understanding the link between early sexual initiation and later sexually transmitted infection: test and replication in two longitudinal studies. J Adolesc Health. 2014;54(4):435-441. e2.
  • 19
    Slater C, Robinson AJ. Sexual health in adolescents. Clin Dermatol. 2014; 32(2):189-95. Review.
  • 20
    DeMaria AL, Lugo JM, Rahman M, Pyles RB, Berenson AB. Association between body mass index, sexually transmitted infections, and contraceptive compliance. J Womens Health (Larchmt). 2013;22(12):1062-8.
  • 21
    Averett S, Corman H, Reichman NE. Effects of Overweight on Risky Sexual Behavior of Adolescent Girls. Econ Inq. 2013;51(16172):605-19.
  • 22
    Pitangui AC, Gomes MR, Lima AS, Schwingel PA, Albuquerque AP, Araújo RC. Menstruation disturbances: prevalence, characteristics, and effects on the activities of daily living among adolescent girls from Brazil. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2013;26(3):148-52.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jun 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    26 Set 2018
  • Aceito
    27 Fev 2019
Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein Avenida Albert Einstein, 627/701 , 05651-901 São Paulo - SP, Tel.: (55 11) 2151 0904 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@einstein.br