Acessibilidade / Reportar erro

Distúrbios neurológicos e neuropsiquiátricos associados à COVID-19. Parte II: distúrbios neuropsiquiátricos e considerações finais

Caro Editor,

Pacientes com a doença pelo coronavírus 2019 (COVID-19) podem apresentar confusão mental, agitação, sintomas de depressão, ansiedade e insônia.(11. Xiang YT, Zhao YJ, Liu ZH, Li XH, Zhao N, Cheung T, et al. The COVID-19 outbreak and psychiatric hospitals in China: managing challenges through mental health service reform. Int J Biol Sci. 2020;16(10):1741-4. Review.) Diversos fatores de risco têm sido descritos para as complicações neuropsiquiátricas da COVID-19, muitos dos quais já são conhecidos por estarem associados com outros problemas de saúde mental.(22. Yahya AS, Khawaja S, Chukwuma J. The impact of COVID-19 in psychiatry. Prim Care Companion CNS Disord. 2020;22(2):20l02627.)

O estado psicológico de pacientes com COVID-19 pode ser agravado por diferentes aspectos, como a quarentena, o isolamento social, o medo sobre a transmissão do vírus e a preocupação sobre a possibilidade de complicações da doença.(33. Percudani M, Corradin M, Moreno M, Indelicato A, Vita A. Mental health services in Lombardy during COVID-19 outbreak. Psychiatry Res. 2020; 288:112980.) Além disso, altos níveis de estresse têm sido reportados em pacientes hospitalizados com COVID-19 comparados aos da população geral.(44. Armitage R, Nellums LB. COVID-19 and the consequences of isolating the elderly. Lancet Public Health. 2020;5(5):e256.) Dessa forma, o monitoramento constante desses pacientes é essencial, tanto do ponto de vista psicológico quanto clínico. As sequelas neuropsicológicas podem levar ao comportamento de evitação e distanciamento, sintomas pré-clínicos de transtorno de estresse pós-traumático e a comportamento suicida. Essas condições podem por sua vez resultar em doenças psiquiátricas de longa duração.(55. Pfefferbaum B, North CS. Mental health and the Covid-19 pandemic. N Engl J Med. 2020;383(6):510-2.) Nesse sentido, sempre que possível, a assistência psiquiátrica deve ser disponibilizada por meio da telemedicina. Todavia, há casos em que a consulta presencial com o paciente é indispensável, como em situações de emergência psiquiátrica, risco de recaída psiquiátrica ou de novos casos emergentes de doença mental grave.(66. Garriga M, Agasi I, Fedida E, Pinzón-Espinosa J, Vazquez M, Pacchiarotti I, et al. The role of mental health home hospitalization care during the COVID-19 pandemic. Acta Psychiatr Scand. 2020;141(5):479-80.) Também, plataformas de mídia social (por exemplo: WeChat e Weibo) podem ser utilizadas para compartilhar estratégias, diretrizes e programas educacionais para manejo de distúrbios mentais relacionados.(77. Zhou J, Liu L, Xue P, Yang X, Tang X. Mental health response to the COVID-19 outbreak in China. Am J Psychiatry. 2020;177(7):574-5.)

Outro ponto importante é o fato de que as doenças mentais têm impacto significativo na saúde geral, bem como no bem-estar social e individual dos pacientes. Logo, é imprescindível integrar o suporte psicológico ao atendimento médico padrão por meio de protocolos específicos, a fim de garantir melhor qualidade de atendimento para os pacientes e seus familiares.(88. Tovani-Palone MR, Ali S. Psychological support to relatives of critically ill patients with COVID-19. einstein (São Paulo). 2020;18:eCE6032.)

Conclusões e perspectivas

Dada a propagação da pandemia da COVID-19, é de valiosa importância o estudo da ampla variedade de manifestações clínicas da doença. Apesar das manifestações do sistema nervoso serem cada vez mais reconhecidas em pacientes com COVID-19, ainda há poucos estudos na literatura sobre o assunto. Além disso, a falta de uma coleta sistemática de dados torna muitas vezes qualquer interpretação difícil. Desse modo, há necessidade de se adotar uma abordagem sistemática e metódica para melhor explicar a magnitude da neuroinvasão viral e as sequelas neurológicas e neuropsiquiátricas relacionadas.

Outra questão importante levantada por alguns estudos é a necessidade de compreender os mecanismos subjacentes aos danos neuronais. De fato, não se conhece se o dano celular observado em pacientes que desenvolvem manifestações neurológicas, como neuropatia, doença cerebrovascular ou encefalomielite disseminada aguda, seja causado pela resposta imune do hospedeiro à infeção viral ou pelo próprio vírus.

Em resumo, até o momento, as complicações neurológicas mais comuns associadas à COVID-19 são o estado de hipercoagulabilidade e o desconforto cerebrovascular. Contudo, outras manifestações menos frequentes, como a síndrome de Guillain-Barré e mielite, também têm sido descritas. Embora o número de pacientes com COVID-19 apresentando manifestações neurológicas seja significativo, tal número é consideravelmente menor em comparação ao de pacientes com sintomas respiratórios isolados. Por outro lado, como o envolvimento do sistema nervoso central e periférico pode causar incapacidades graves e irreversíveis, tais casos devem, por vezes, requerer tratamento médico de longo prazo, bem como suporte econômico e social.(99. Giacalone M, Tovani-Palone MR, Marin L, Febbi M, Russano T, Giacalone A. Neurological and neuropsychiatric disorders associated with COVID-19 - Part I: overview and neurological disorders. einstein (São Paulo). 2021;19:eCE6448.) Assim, são necessários mais estudos clínicos, diagnósticos e epidemiológicos criteriosos para melhor definir as manifestações neurológicas da COVID-19, buscando elucidar sua patogênese, orientar o manejo de pacientes e estimar a carga de sequelas neuropsiquiátricas associadas, especialmente em vista das muitas incertezas que ainda existem sobre a doença.(1010. Tovani-Palone MR, Lacagnina S, Desideri LF. Number of COVID-19 patients classified as cured: an imminent danger for the population. einstein (São Paulo). 2020;18:eCE6146.)

REFERENCES

  • 1
    Xiang YT, Zhao YJ, Liu ZH, Li XH, Zhao N, Cheung T, et al. The COVID-19 outbreak and psychiatric hospitals in China: managing challenges through mental health service reform. Int J Biol Sci. 2020;16(10):1741-4. Review.
  • 2
    Yahya AS, Khawaja S, Chukwuma J. The impact of COVID-19 in psychiatry. Prim Care Companion CNS Disord. 2020;22(2):20l02627.
  • 3
    Percudani M, Corradin M, Moreno M, Indelicato A, Vita A. Mental health services in Lombardy during COVID-19 outbreak. Psychiatry Res. 2020; 288:112980.
  • 4
    Armitage R, Nellums LB. COVID-19 and the consequences of isolating the elderly. Lancet Public Health. 2020;5(5):e256.
  • 5
    Pfefferbaum B, North CS. Mental health and the Covid-19 pandemic. N Engl J Med. 2020;383(6):510-2.
  • 6
    Garriga M, Agasi I, Fedida E, Pinzón-Espinosa J, Vazquez M, Pacchiarotti I, et al. The role of mental health home hospitalization care during the COVID-19 pandemic. Acta Psychiatr Scand. 2020;141(5):479-80.
  • 7
    Zhou J, Liu L, Xue P, Yang X, Tang X. Mental health response to the COVID-19 outbreak in China. Am J Psychiatry. 2020;177(7):574-5.
  • 8
    Tovani-Palone MR, Ali S. Psychological support to relatives of critically ill patients with COVID-19. einstein (São Paulo). 2020;18:eCE6032.
  • 9
    Giacalone M, Tovani-Palone MR, Marin L, Febbi M, Russano T, Giacalone A. Neurological and neuropsychiatric disorders associated with COVID-19 - Part I: overview and neurological disorders. einstein (São Paulo). 2021;19:eCE6448.
  • 10
    Tovani-Palone MR, Lacagnina S, Desideri LF. Number of COVID-19 patients classified as cured: an imminent danger for the population. einstein (São Paulo). 2020;18:eCE6146.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Out 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    20 Jan 2021
  • Aceito
    22 Fev 2021
Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein Avenida Albert Einstein, 627/701 , 05651-901 São Paulo - SP, Tel.: (55 11) 2151 0904 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@einstein.br