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Currículos socioemocionais e liderança: da mobilização coletiva à motivação do eu

Social-emotional curricula and leadership: from collective mobilization to self-motivation

Resumo

Contextualizar os processos que instrumentalizam os afetos no currículo escolar hodierno, investigando como a liderança tem sido significada diante de um catálogo de emoções, constitui o objetivo deste estudo. Historicamente, a liderança compôs os movimentos sociais e tinha a escola como um de seus espaços de referência, mas essa afecção parece ter adquirido novos sentidos em programas específicos de educação socioemocional. Para desenvolver a argumentação, articulam-se referenciais teóricos críticos (como Dardot e Laval, Illouz, Collet e Grinberg, e Safatle) com uma análise documental (desenvolvida por meio das orientações de Cellard), por meio do exame de duas iniciativas singulares, em busca de compreender como a liderança tem figurado no cotidiano escolar, problematizando o que se entende como um redirecionamento de seus sentidos históricos a partir dos remanejos do neoliberalismo. Na discussão, percebe-se que a hierarquização desse afeto não tem mais se pautado unicamente na motivação de uma comunidade para a participação em uma pauta pública (sentido tradicionalmente atribuído), mas tem se reconfigurado, em contextos singulares, em uma mobilização de si mesmo. A liderança passa a ser concebida como um pilar para o empreendedorismo de si na constituição de uma conduta engajada do sujeito com seus objetivos pessoais, favorecendo a lapidação de seus próprios afetos em busca de se mostrar competitivo e flexível, exigências do capitalismo em sua face atual. De um líder carismático e comprometido com o coletivo erige-se um líder de si conformado a partir de um design psicológico que tem na escola (dualista e hierarquizada) seu espaço de formação.

Palavras-chave
Currículo escolar; Competências socioemocionais; Liderança

Abstract

This study contextualizes the processes that instrumentalize the impacts within today’s school curriculum and investigates the meaning of leadership in the face of a range of emotions. Historically, leadership has been part of social movements and has had the school as one of its reference points. However, this leadership appears to have acquired new meanings within specific social-emotional education programs. To develop the argument, critical theoretical references (such as Dardot and Laval; Illouz, Collet, and Grinberg; and Safatle) are used within a documentary analysis (developed using Cellard’s guidelines). Two singular initiatives are examined, in an attempt to understand how leadership has functioned within the school routine, which is understood to be a redirection of its historical meanings from the rearrangements of neoliberalism. In the discussion, the hierarchy of this impact was noted to have no longer been based solely on the motivation of a community to participate in a public agenda (the traditionally attributed meaning) but has been reconfigured, in singular contexts, into a mobilization of itself. Leadership is viewed as a pillar for self-entrepreneurship in the constitution of an engaged conduct of the subject with their personal goals, favoring the refining of their own affections in search of showing oneself to be competitive and flexible, which are demands of capitalism in its current state. From a charismatic leader committed to collective well-being, a selfmotivated leader arises, constructed from a psychological design that finds in the school (dualistic and hierarchical) its space for development.

Keywords
School curriculum ; Social-emotional skills ; Leadership

Considerações iniciais

Ao investigar a história das emoções, Sarah Chaney (2019)CHANEY, Sarah. Free Thinking Festival. BBC Radio 3. 22 abr. 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-47984629. Acesso em: 9 jul. 2022.
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discute como esses elementos são constituídos no tempo e no espaço, não sendo fixos, nem universais. Citando a acédia (um tipo específico de crise existencial) como exemplo, a pesquisadora mostra que essa emoção é apenas uma das que não sentimos mais, e também indica que aquilo que sentimos hoje já pode ter sido relacionado a algo diferente, como a melancolia, antes atrelada a um medo extremo. Os resultados da especialista da Queen Mary University apontam para a constituição coletiva das emoções, já que não são únicas para cada sujeito, mas assumidas pelas pessoas a partir de interpretações sociais compartilhadas nos diferentes contextos sócio-históricos.

Tais considerações são importantes para contextualizarmos esta discussão – que se aproxima de distintos estudos que relacionam o currículo escolar e a dimensão da formação emocional hodierna –, na medida em que alertam para emoções (que conduzem a modos de agir singulares) que podem estar sendo promovidas por meio das orientações e propostas curriculares recentes, calcadas em competências socioemocionais. Algumas delas são bastante explícitas, como as macrocompetências ranqueadas pelo Instituto Ayrton Senna e disseminadas nas formações e nos materiais que esse ente promove, estando entre elas a amabilidade, que intenta reforçar a confiança, o respeito e a empatia ( IAS, 2021IAS. Instituto Ayrton Senna. Competências socioemocionais para contextos de crise. [S. l.], 2021. Disponível em: https://institutoayrtonsenna.org.br/pt-br/socioemocionais-para-crises.html. Acesso em: 9 jul. 2022.
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). Outras são reveladas em estudos como o de Krawczyk e Zan (2021)KRAWCZYK, Nora; ZAN, Dirce. Resiliência ou resistência: um dilema social pós-pandemia. Políticas Educativas – PolEd, Montevidéu, v. 15, n. 1, p. 106-128, 2021. Disponível em: https://www.seer.ufrgs.br/index.php/Poled/article/view/119966. Acesso em: 9 jul. 2022.
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, em que a resiliência é problematizada no contexto de pandemia de Covid-19 (e do chamado novo normal) a partir de discursos disseminados em espaços sociais e institucionais, sendo atribuída à escola a tarefa de incluí-la entre as prioridades formativas do momento.

Neste estudo, apesar do reconhecimento dos diferentes vieses por meio dos quais as emoções foram debatidas academicamente nas décadas anteriores, utilizamo-nos da teoria social para problematizar esse tema. Partimos da premissa de que as emoções têm sido instrumentalizadas na atualidade neoliberal de forma que sejam assimiladas como competências que, propagadas pelas escolas de educação básica, promovem condutas condizentes com expectativas sociais diante de um capitalismo afetivo ( Illouz, 2011ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.). As reformas educativas que desde a década de 1990 incluem competências e habilidades nos currículos recentemente – a partir da Base Nacional Comum Curricular ( Brasil, 2018BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: MEC, 2018.) – inserem a dimensão socioemocional entre as aptidões a serem construídas, institucionalizando o compromisso formativo da escola com um conjunto específico de afetos, que direcionam determinados comportamentos.

Contextualizar os processos que instrumentalizam os afetos no currículo escolar é parte do objetivo deste estudo, que se complementa com a investigação de um elemento singular que figura nesse catálogo de emoções: a liderança. Esse investimento formativo, que historicamente compôs os movimentos sociais e tinha a escola como um espaço de referência, é indicado entre as competências a serem desenvolvidas por programas e projetos específicos de educação socioemocional, mas parece adquirir um novo sentido. Segundo nossa hipótese, ao invés de seguir promovendo a coletividade e o engajamento em torno de pautas compartilhadas, a liderança tem sido abordada a partir de uma orientação individualista e comprometida com o êxito pessoal em um cenário de competitividade e de flexibilização.

Para desenvolvermos tal argumento, uma base teórica crítica é discutida em relação a materiais que denotam a tendência à ressignificação da liderança quando parte de artefatos de desenvolvimento socioemocional direcionados a realidades singulares. Na primeira seção do estudo, articulamos proposições de autores como Roudinesco (2022)ROUDINESCO, Elizabeth. O eu soberano: ensaio sobre as derivas identitárias. Rio de Janeiro: Zahar, 2022., Illouz (2011)ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011., Safatle (2021aSAFATLE, Vladimir. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo. Belo Horizonte: Autêntica, 2021a., 2021b)SAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46. e Dardot e Laval (2016)DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016. para debater as remodelações geridas pelo capitalismo ao incluir os afetos entre os pilares de sua sustentação. Em seguida, abordamos a apropriação dessas concepções pelo currículo, no cotidiano da escola, como parte de seus investimentos formativos, com as competências socioemocionais figurando entre eles. Para tanto, partimos de referenciais como Laval (2019)LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019., Collet e Grinberg (2021)COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia. La educación managerial y sus fugas: entre la individualización y lo común. In: COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia (org.). Hacia una escuela para lo común. Madrid: Morata, 2021. p. 13-30. e do documento Competências para o progresso social: o poder das competências socioemocionais, publicado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Na sequência, utilizamo-nos de análise documental, desenvolvida por meio das orientações de Cellard (2008)CELLARD, André. A análise documental. In: JACCOUD, Mylène; MAYER, Robert. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 295-315., para investigar como a liderança tem figurado entre as demandas formativas hodiernas a partir do exame de duas iniciativas singulares, problematizando o que se entende como um redirecionamento de seus sentidos históricos a partir dos remanejos atuais do neoliberalismo.

No entrelaçamento das seções e na construção da discussão pretendida, por mais que um viés crítico seja privilegiado, não se intenta desconsiderar a relevância da dimensão emocional dos estudantes em seus processos de aprendizagem, principalmente diante do contexto de sofrimento psíquico nas populações das faixas etárias escolares com a pandemia de Covid-19 2 2- A pandemia de Covid-19, deflagrada no final de 2019 na China e com posterior alcance mundial, trouxe implicações que ultrapassaram a dimensão sanitária e incluíram as diferentes esferas sociais. O requerido isolamento social trouxe sofrimento psíquico, inclusive entre crianças e jovens, como a pesquisa organizada pelo UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância) e pelo Gallup (uma empresa americana de pesquisa de opinião) mostrou. Nela, aferiu-se que 22% dos adolescentes brasileiros de 15 a 24 anos entrevistados em 2021 estavam deprimidos ou sem interesse em suas atividades. Outros dados, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), confirmaram esse índice e incluíram as crianças nessa mesma situação. Essas informações foram acessadas nos seguintes links: https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/impacto-da-covid-19-na-saude-mental-de-criancas-adolescentes-e-jovens; https://www.camara.leg.br/noticias/774133-uma-a-cada-4-criancas-e-adolescentes-teve-sinais-de-ansiedade-e-depressao-na-pandemia-aponta-estudo. Acesso em: 21 jun. 2023. . Pelo contrário, intentamos apontar as fragilidades de uma formação pautada em competências socioemocionais que, ao invés de garantir autoconhecimento e reconhecimento às singularidades e individualidades dos estudantes, promovem o gerenciamento de comportamentos por meio da inculcação de modos de sentir e de experienciar emoções específicas – afinadas a uma racionalidade instrumental. Reconhecemos os afetos, inclusive, como um alicerce do pensamento crítico, tal como discutido por Steinert, Marin e Roeser (2022)STEINERT, Steffen; MARIN, Lavinia; ROESER, Sabine. Feeling and thinking on social media: emotions, affective scaffolding, and critical thinking. Inquiry, 2022. Disponível em: https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/0020174X.2022.2126148. Acesso em: 2 jun. 2023.
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, na medida em que favorecem a flexibilidade e o convívio com o contraditório, elementos a serem ponderados mesmo que a brevidade deste estudo não permita sua abordagem de modo mais aprofundado.

A hipertrofia do eu em uma economia libidinal e a constituição do capitalismo afetivo

O sujeito moderno se converteu em vítima de si mesmo. É o que diagnostica Elizabeth Roudinesco (2022)ROUDINESCO, Elizabeth. O eu soberano: ensaio sobre as derivas identitárias. Rio de Janeiro: Zahar, 2022. ao discutir as identidades constituídas hoje. Para a autora, os discursos sobre o eu têm se sobreposto a pautas coletivas e a interesses compartilhados porque o ser humano se tornou “[...] incapaz de interessar-se por outra coisa além do próprio umbigo” (p. 21). A constante autoafirmação de si, intensificada em uma hipertrofia do eu, prega o cultivo do indivíduo e a luta pela garantia de seu direito à diferença, mas faz isso ao ponto de que o pertencimento narcísico a um grupo se sobreponha a uma concepção universal do humano ( Roudinesco, 2022ROUDINESCO, Elizabeth. O eu soberano: ensaio sobre as derivas identitárias. Rio de Janeiro: Zahar, 2022.).

O eu soberano, apresentado pela psicanalista francesa, sintetiza – em grande medida – o sujeito hoje, com a intensificação das preocupações por si, pela satisfação de seus gostos, por seu bem-estar e por seus prazeres norteando seus modos de vida e sendo o objeto de sua busca existencial. Safatle (2021a)SAFATLE, Vladimir. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo. Belo Horizonte: Autêntica, 2021a., contudo, esclarece que isso não ocorre por um simples e puro egoísmo cultivado pelo humano, mas porque o capitalismo atual se baseia em uma economia libidinal, em que os processos disciplinares não se pautam mais em padrões normativos, mas se articulam em um circuito de afetos. Os vínculos sociais, por isso, fundamentam-se em movimentos de atração ou de repulsa e a adesão a eles se constitui por afecções ( Safatle, 2021aSAFATLE, Vladimir. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo. Belo Horizonte: Autêntica, 2021a.), que expressam a hiperindividualização do sujeito hoje.

Isso acontece pela instauração, no neoliberalismo, de uma psicologia implícita – uma psicologia moral, que não molda apenas comportamentos, mas os próprios desejos, recodificando “[...] identidades, valores e modos de vida por meio dos quais os sujeitos realmente modificam a si próprios, e não apenas o que eles representam de si próprios” ( Safatle; Silva Júnior; Dunker, 2021SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021., p. 11). Há, nesse processo, a psicologização do campo econômico, que se constitui com a desvinculação da economia em relação ao campo político, pelo esvaziamento dessa última esfera como espaço de deliberação pública e pela incorporação de uma gramática das emoções ( Safatle, 2021bSAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46.). Nela, descrevem-se lutas políticas com termos emocionais e os problemas públicos são individualizados, com a internalização da racionalidade econômica e do empreendedorismo de si por meio de um design psicológico ( Safatle, 2021bSAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46.).

Ratificam-se os aspectos mais subjetivos e particulares do sujeito como centrais para o capitalismo em sua forma atual, com os afetos sendo alvo de lapidação a fim de se otimizarem competências e de se produzir inteligência emocional ( Safatle, 2021bSAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46.). Com isso, internalizam-se a vigilância e o controle, mobilizados em muito pela concorrência pacífica ( Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.) e generalizada ( Laval, 2019LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019.), mas que também se escondem sob um verniz de autoavaliação regulada por critérios mercantis que acompanham cotidianamente os sujeitos em um modo de governamento enraizado psiquicamente ( Safatle, 2021bSAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46.). Como Safatle (2021b)SAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46. explica, há a constituição de uma engenharia emocional que intensifica a busca por produtividade por meio de um vocabulário humanizado que psicologiza as relações laborais, mas que mascara o alheamento à solidariedade, a competição inflamada, a exploração dos indivíduos e da natureza e a intensificação das desigualdades sociais ( Safatle, 2021bSAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46.).

Essa constituição, no neoliberalismo, reverte-se em um sujeito empresarial ( Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.), do qual se exige uma entrega completa à atividade laboral, incluindo-se a de sua subjetividade. Como Dardot e Laval (2016)DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016. explicam, seu desejo é racionalizado para a autorrealização e ser bem-sucedido resume, em meio ao risco naturalizado ao se tornar um empreendedor de si, o objetivo desse indivíduo que, no agora, se mobiliza pelos dispositivos do desempenho e do gozo. A partir de uma gestão de si sob a lógica da empresa, a autocoerção e a autoculpabilização são refinadas por técnicas de motivação, incentivo e estímulo aliadas às da autoavaliação ( já indicadas por Safatle, 2021bSAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46.). Com isso, sentimentos e afetos são instrumentalizados por estratégias econômicas para o consumo e para o empresariamento em uma ascese na qual a imposição de tarefas é substituída pelo engajamento ( Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.).

Quanto ao empreendedorismo de si, Alvez, Klaus e Loureiro (2021)ALVES, Alexandre; KLAUS, Viviane; LOUREIRO, Carine Bueira. Do sonho à realização: pedagogia empreendedora, empresariamento da educação e racionalidade neoliberal. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 47, p. 1-19, 2021. DOI: https://doi.org/10.1590/S1678-4634202147226115
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esclarecem que esse conceito remonta à destituição da lógica de inovação e de criação de negócios singulares como mérito de um contingente reduzido de empresários talentosos, tornando-se um modelo de comportamento a ser assimilado por todos. E, para além de sua difusão recente como uma maneira de contornar problemas sociais estruturais como o desemprego, o empreendedorismo passa a ser subjetivado como um princípio de conduta do qual depende não somente o bem-estar material, mas a satisfação pessoal dos indivíduos. Como frisado pelos pesquisadores, mais do que um meio de se estabelecer profissionalmente, o empreendedorismo é apropriado como um modelo normativo no qual os sujeitos se autogerenciam como empresas, reconhecendo sua propensão a riscos, ao fracasso ou ao êxito, a depender de seus próprios méritos.

Conforma-se, diante de tais processos, uma ultrassubjetivação, resultante da subjetivação contábil e financeira, que se define como o “ excesso de si em si” ( Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016., p. 348, grifos dos autores) e na qual se impõe o sucesso individual como imperativo de vida. Com isso, as instituições, sejam políticas ou religiosas, deixam de ser referências e as próprias identidades podem ser adquiridas através do consumo. Para os autores, nesse cenário, “[...] a estrutura simbólica é alvo de uma instrumentalização por parte da lógica econômica capitalista” (p. 358), em que “[...] o sentimento de si é dado no excesso” (p. 363) e expõe “[...] o neossujeito à depressão e à dependência, mas também possibilita aquele estado ‘conexionista’ do qual ele tira, na falta de um vínculo legítimo com uma instância outra, um apoio frágil e uma eficácia esperada” (p. 364).

Na direção de esclarecer essa estrutura simbólica ( constituinte do circuito de afetos sintetizado por Safatle, 2021aSAFATLE, Vladimir. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo. Belo Horizonte: Autêntica, 2021a.), Illouz (2011)ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011. conceitua os afetos não como ações, mas como uma energia que as impulsiona, estando essa energia assentada em significados culturais e ações sociais que norteiam as relações entre os sujeitos. Cezar e Jucá-Vasconcelos (2016)CEZAR, Adieliton Tavares; JUCÁ-VASCONCELOS, Helena Pinheiro. Diferenciando sensações, sentimentos e emoções: uma articulação com a abordagem gestáltica. IGT Rede, Rio de Janeiro, v. 13, n. 24, p. 4-14, 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1807-25262016000100002. Acesso em: 18 jan. 2023.
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auxiliam a compreender o que as emoções podem (ou não) significar a partir das distinções que fazem entre os termos sensação, sentimento e emoção. Sensações, para os autores, são impressões deflagradas por um estímulo, enquanto sentimentos são a compreensão e a integração desses estímulos à sua experiência pessoal. Já para elucidar as emoções, os psicólogos recorrem a Scherer (2005)SCHERER, Klaus. What are emotions? And how can they be measured? Social Science Information, v. 44, n. 4, 2005. Disponível em: http://ssi.sagepub.com/content/44/4/695. Acesso em: 20 jan. 2023.
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, que as sintetiza como resultado de alterações subjetivas, biológicas e sociais diante de estímulos relevantes. As emoções, por isso, possuem intensidades distintas e podem ser geradas a partir de eventos internos (sensações e comportamentos do próprio indivíduo que geram emoções variadas) ou externos (quando ações de outras pessoas modificam estados internos do sujeito).

Aprofundando essa concepção, Costa (1998)COSTA, Jurandir Freire. Sem fraude nem favor: estudos sobre o amor romântico. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. discute como as emoções, além de serem constituídas por sentimentos e sensações, também se constroem a partir de crenças e julgamentos, sem possuir apenas uma base neuroquímica, nem se vincularem exclusivamente a sentimentos universais. Não somente subjetivas e muito menos irracionais, as emoções expressam uma maneira de, conscientemente, estar no mundo. Tendo como bases teóricas Bauman e Ehrenberg, Costa (1998)COSTA, Jurandir Freire. Sem fraude nem favor: estudos sobre o amor romântico. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. problematiza a tese de que, atualmente, o sujeito mais coleciona sensações do que se dedica a cultivar sentimentos, ansiando obter dos últimos o que obtém das primeiras. Com isso, prende-se ao efêmero e evita sentimentos intensos, fortalecendo um comércio de sensações e de imagens publicitárias que ditam o que e como se deve sentir ( Costa, 1998COSTA, Jurandir Freire. Sem fraude nem favor: estudos sobre o amor romântico. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.).

Assim, os afetos não são apenas entidades psicológicas, mas “[...] muitos dos arranjos sociais são também arranjos afetivos” ( Illouz, 2011ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011., p. 7) que conformam uma hierarquia social estruturada por uma cultura também afetiva. E é nessa direção que “[...] repertórios culturais baseados no mercado moldam e impregnam as relações interpessoais e afetivas, e as relações interpessoais encontram-se no epicentro das relações econômicas” (p. 8). Com isso, a linguagem da psicologia se entrelaça aos repertórios de mercado, oferecendo “[...] novas técnicas e sentidos para cunhar novas formas de sociabilidade” (p. 8), em um capitalismo afetivo. Este pode ser conceituado como “[...] uma cultura em que os discursos e práticas afetivos e econômicos moldam uns aos outros, com isso produzindo [...] um movimento largo e abrangente em que o afeto se torna um aspecto essencial do comportamento econômico” (p. 8), com as relações afetivas sendo gerenciadas pelos mesmos princípios das econômicas.

Para a mobilização desses afetos, que precisam estar implicados para a autorrealização do sujeito explicada por Dardot e Laval (2019)LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019., empregam-se discursos que promovem a motivação, calcada na autoajuda e em técnicas afins, como a programação neurolinguística e o coaching (2021). Collet e Grinberg (2021)COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia. La educación managerial y sus fugas: entre la individualización y lo común. In: COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia (org.). Hacia una escuela para lo común. Madrid: Morata, 2021. p. 13-30. explicam que, nesse contexto, conformam-se tecnologias que atuam sobre a subjetividade de forma que os indivíduos se empoderem e gerenciem seus corpos e suas emoções, com o prefixo auto sendo agregado às mais distintas ações. Na educação, as pedagogias incorporam essa lógica, frisando o autocontrole, a autoavaliação, a autodisciplina e a autorresponsabilização, com uma de suas estratégias sendo as competências socioemocionais, mais bem discutidas na próxima seção.

Diante da contextualização construída, contudo, um adendo é necessário: a exacerbação da individualização em um cenário em que o eu é mobilizado pelo mercado e se torna um dos eixos centrais do capitalismo – em seus afetos, emoções e prazeres – não significa um recolhimento dos sujeitos em seu próprio universo, um isolamento. Illouz (2011)ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011. esclarece que, como “[...] o eu privado nunca foi tão publicamente posto em ação e atrelado aos discursos e valores das esferas econômica e política” (p. 8), as identidades individuais são motivadas ao compartilhamento, com o eu revertido em matéria afetiva e também pública, o que se potencializa com a massificação da internet. Mas as implicações desse processo não se restringem ao contexto digital e também chegam à escola com um modo distinto de se conceber o currículo, hierarquizando novas prioridades formativas para o tempo presente, como abordaremos na seção seguinte.

A recomposição dos afetos na escola: do cultivo dos saberes às competências socioemocionais

Na direção de se produzir um sujeito engajado completamente – a partir de seu próprio desejo – em se tornar um empresário de si, comprometido subjetivamente com a forma-empresa ( Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.) e autogerenciado pelos afetos socialmente produzidos ( Illouz, 2011ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.), a educação escolar se coloca como uma das bases dessa ultrassubjetivação ( Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016.). Não à toa, reformas macroestruturadas para a inovação, para a flexibilização e para a otimização dos processos educacionais a partir de expectativas socioeconômicas se naturalizaram nos cotidianos escolares, principalmente a partir da década de 1990.

Collet e Grinberg (2021)COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia. La educación managerial y sus fugas: entre la individualización y lo común. In: COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia (org.). Hacia una escuela para lo común. Madrid: Morata, 2021. p. 13-30., inclusive, diagnosticam a prevalência de uma reforma constante, implementada pelo diagnóstico de crise permanente, em que o conteúdo da reforma não é tão importante quanto a reforma em si. Essas práticas, que são conformadas diante da instauração da Nova Gestão Pública, são impulsionadas por agências globais que, mobilizadas por uma governamentalidade gerencial, promovem especialmente o empreendedorismo de si, a autogestão e a responsabilização ( Collet; Grinberg, 2021COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia. La educación managerial y sus fugas: entre la individualización y lo común. In: COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia (org.). Hacia una escuela para lo común. Madrid: Morata, 2021. p. 13-30.). Com uma escola em incessante mudança, imita-se a instável forma assumida no campo laboral, impondo uma resiliente adaptação perene como conteúdo intrínseco das práticas educativas.

E é nessa direção que a pedagogia das competências é ratificada nos documentos curriculares atuais, efetivando a substituição da validação do conhecimento escolar até então realizada pelo Estado pela legitimação feita pelo mercado ( Laval, 2019LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019.). Com esse movimento, a concepção de conhecimento como norteador dos processos escolares é convertida na de competência, que se transforma em uma ferramenta que facilita “[...] uma análise fina da empregabilidade, a vigilância constante da mão de obra e controle mais estrito sobre o trabalho” ( Laval, 2019LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019. p. 78). Essa estratégia se torna parte de um novo modo de gerir os recursos humanos, de quem a lógica empresarial exige capacidade de comunicação, adaptação, trabalho em equipe e iniciativa, aptidões que podem ser apropriadas por contextos profissionais variados a partir de seu desenvolvimento na escola ( Laval, 2019LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019.).

Laval (2019)LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019. ratifica que a supressão dos saberes não se torna a maior preocupação nesse contexto, “[...] mas a tendência a vê-los somente como ferramentas ou estoques de conhecimentos operatórios utilizáveis para resolver problemas, tratar informações ou implementar projetos” (p. 81). Isso faz com que a avaliação se torne o centro do processo de ensino-aprendizagem e o trabalho docente fique restrito a recomendações específicas ( Laval, 2019LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019.). Nessa direção, Laval (2019)LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019. aponta que, como os conhecimentos escolares não são mais considerados basilares às atividades profissionais, comportamentos e modos de agir passam a ser priorizados. Daí a ênfase nas competências socioemocionais, tornadas estruturais aos currículos brasileiros a partir da Base Nacional Comum Curricular ( Brasil, 2018BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: MEC, 2018.), mas antes já discutidas por organismos internacionais.

O documento Competências para o progresso social: o poder das competências socioemocionais, publicado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em 2015, tinha como objetivo identificar competências socioemocionais que influenciassem as conquistas futuras das crianças, seu bem-estar e o progresso social. Partindo do que cita como uma “[...] necessidade de desenvolver uma ‘criança completa’ com um conjunto equilibrado de competências cognitivas e socioemocionais que lhe permitam enfrentar melhor os desafios do século 21” ( OCDE, 2015OCDE. Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Competências para o progresso social: o poder das competências socioemocionais. Estudos da OCDE sobre competências. São Paulo: Fundação Santillana, 2015. Disponível em: https://www.moderna.com.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A808A82511476410151158EF501439E. Acesso em: 28 mai. 2022.
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, p. 13), o texto destaca que enquanto competências cognitivas são relacionadas à frequência no ensino superior e a melhores resultados no mercado de trabalho, as não-cognitivas 3 3- Estudos têm mostrado que, por mais que corriqueiramente as emoções sejam referenciadas em uma dimensão não-cognitiva, são resultado de complexas alterações subjetivas, biológicas e sociais, como mencionado a partir de Cezar e Jucá-Vasconcelos (2016). Essa elucidação é importante porque, principalmente quando se trata de competências ou skills, costuma haver uma diferenciação entre aquelas que seriam soft (ou emocionais) e as hard (que implicam um saber-fazer), forjando dualidades como a indicada no documento da OCDE e que vêm sendo criticadas no campo científico. promovem a saúde e o bem-estar subjetivo. Ambas, assim, precisariam estar articuladas, pois interagem entre si e ampliam possibilidades dos estudantes no futuro.

Esse equilíbrio evocado pela OCDE (2015)OCDE. Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Competências para o progresso social: o poder das competências socioemocionais. Estudos da OCDE sobre competências. São Paulo: Fundação Santillana, 2015. Disponível em: https://www.moderna.com.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A808A82511476410151158EF501439E. Acesso em: 28 mai. 2022.
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pauta-se pela lógica da competência que, como Laval (2019)LAVAL, Pierre. A escola não é uma empresa: o neoliberalismo em ataque ao ensino público. São Paulo: Boitempo, 2019. indica, já parte de uma compreensão utilitarista dos saberes, racionalizados para uma formação instrumentalizada. O documento, inclusive, destaca que as competências não são inatas, mas boa parte delas pode ser desenvolvida pelas crianças e pelos adolescentes. Por isso, na infância, tornar-se-ia importante que os responsáveis fossem treinados em programas de intervenção; quando maiores, os professores é que precisariam ser submetidos a processos formativos que enfatizassem esses temas. Quanto aos adolescentes, a pesquisa mostra que mentorias costumam ser mais recomendadas, estimulando o trabalho em equipe, a motivação e a autoeficácia. Tal entendimento parece reafirmar a educação escolar como formação de capital humano – mas em um viés ressignificado, como uma coleção de competências acumuladas que podem ser disponibilizadas futuramente não ao mercado, mas a si mesmo em sua busca de adaptabilidade incessante ao instável contexto social.

Na direção da concepção exposta pela OCDE (2015)OCDE. Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Competências para o progresso social: o poder das competências socioemocionais. Estudos da OCDE sobre competências. São Paulo: Fundação Santillana, 2015. Disponível em: https://www.moderna.com.br/lumis/portal/file/fileDownload.jsp?fileId=8A808A82511476410151158EF501439E. Acesso em: 28 mai. 2022.
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e institucionalizada pela Base, currículos socioemocionais têm sido promovidos em reformas educacionais, sendo entendidos como modos de se realizar um investimento econômico e se baseando, em grande medida, nos Big Five ( Carvalho; Silva, 2017CARVALHO, Rodrigo Saballa de; SILVA, Roberto Rafael Dias da. Currículos socioemocionais, habilidades do século XXI e o investimento econômico na educação: as novas políticas curriculares em exame. Educar em Revista, Curitiba, n. 63, p. 173-190, jan./mar. 2017. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/educar/article/view/44451/31743. Acesso em: 19 set. 2022.
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). O termo em inglês, que remonta ainda à década de 1930 e aos estudos de McDougal (que delimitou a priori cinco fatores de personalidade, sendo eles intelecto, caráter, temperamento, disposição e humor, como sintetizado por Silva e Nakano, 2011SILVA, Izabella Brito; NAKANO, Tatiana de Cássia. Modelo dos cinco grandes fatores da personalidahde: análise de pesquisas. Avaliação Psicológica, Porto Alegre, v. 10, n. 1, p. 51-62, abr. 2011. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1677-04712011000100006. Acesso em: 13 jun. 2023.
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), refere-se a “[...] um conjunto de cinco grandes fatores que, enquanto traços de personalidade, podem ser medidos cientificamente, em especial em seu potencial para as organizações” (p. 181). Difundidos no Brasil pelo Instituto Ayrton Senna, considerado o tradutor das competências socioemocionais para o contexto brasileiro, os Big Five são resumidos no estímulo à amabilidade, à extroversão, à estabilidade emocional, à conscienciosidade e à abertura ao novo – afetos enfatizados em diferentes materiais do IAS e desdobrados em propostas distintas.

Outra organização autointitulada sem fins lucrativos, a CASEL (sigla para Collaborative for Academic, Social and Emotional Learning), com sede nos Estados Unidos, tem produzido há cerca de 30 anos estudos que influenciam políticas e práticas pedagógicas a partir de seu conceito de Social Emotional Learning (aprendizagem socioemocional). Ele implica o entendimento e o manejo das emoções, amparados em cinco competências sugeridas pela entidade: autoconsciência, autogestão, consciência social, habilidades de relacionamento e tomada de decisão responsável. Não somente questões como o combate ao bullying, na perspectiva da CASEL, seriam beneficiadas com o desenvolvimento desse âmbito, mas também o desempenho acadêmico dos estudantes e o amparo a uma sociedade referenciada como pró-social 4 4- As informações deste excerto foram retiradas de: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/implementacao/praticas/caderno-de-praticas/aprofundamentos/195-competencias-socioemocionais-como-fator-de-protecao-a-saude-mental-e-ao-bullying?highlight=WyJlc2NyaXRhIl0. Acesso em: 13 jun. 2023. .

As competências elencadas pelo CASEL dão suporte às dez competências gerais definidas pela Base Nacional Comum Curricular, que não as conceitua de maneira clara – uma recorrência nos documentos que abordam o espectro socioemocional. Mas as expressões que costumam referenciá-las, como Manfré ( 2021, p. 272MANFRÉ, Ademir Henrique. O conceito de competências socioemocionais nas reformas educacionais brasileiras. Série-Estudos, Campo Grande, v. 26, p. 267-288, maio/ago. 2021. Disponível em: http://educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2318-19822021000200267. Acesso em: 14 jun. 2023.
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) sintetiza, são “[...] relacionamento interpessoal, gerenciar as próprias emoções para atingir determinados fins, ser motivador, perceber e valorizar as emoções do outro, valorizar sentimentos diversos dos seus, agir com bom humor”, sentidos que também podem ser identificados na Base. Aliás, a BNCC, por introduzir e difundir essas competências em âmbito macro, tem o potencial de propagar tal concepção amplificado por projetos e ações de institutos e fundações filantrópicos – mas articulados ao mercado – que se comprometem com essa dimensão formativa, sendo o Instituto Ayrton Senna apenas um deles. Outros sujeitos têm desenvolvido propostas singulares e hierarquizado afetos específicos, como abordaremos na seção seguinte.

Mas, antes de avançar, cabe problematizar que a apropriação, pelos currículos escolares, dessas acepções, por mais que estimuladas por organismos internacionais ou induzidas por orientações institucionais, não ocorre por coerção, mas porque o corpo social reconhece tais premissas e se constitui no presente por meio delas. Como contextualizado na seção anterior, há uma engenharia emocional ( Safatle, 2021bSAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46.) que atua sobre as diferentes esferas da vida social reafirmando o trabalho sobre si mesmo como imperativo para o sucesso, o que impõe a relevância dessa construção através da escola, até mesmo para que essa instituição se mostre útil diante das exigências da atualidade capitalista. Os afetos incluídos e os comportamentos esperados a partir deles não costumam ser questionados, já que são apresentados como competências notadamente reconhecíveis em sua aplicabilidade social.

Como Pacheco (2003)PACHECO, José Augusto. Políticas curriculares: referenciais para análise. Porto Alegre: ArtMed, 2003. discute, o currículo não se separa “[...] nem do contexto amplo que o define no tempo e no espaço nem da organização escolar que o concretiza” (p. 14). Por isso, os processos sociais, econômicos e culturais são parte constitutiva da escola a partir da seleção daquilo que, em distintos espaços-tempos, é definido como relevante. Ao mesmo tempo, nas singularidades das escolas, há disputas e resistências, com iniciativas participativas e democráticas que dão significado e tornam o conhecimento escolar não uma ferramenta de instrumentalização de competências, mas de construção coletiva de sentidos e saberes. Desse modo, interpretações como as compartilhadas por meio deste estudo não contemplam a totalidade das realidades, por mais que orientações macroestruturadas sejam incisivas em sua disseminação.

Sua relevância, apesar disso, reside no fato de que não se pode desconsiderar que as orientações advindas de esferas de gestão centrais difundem um discurso oficial que representa interesses e alianças balizadas pelo Estado ( Pacheco, 2003PACHECO, José Augusto. Políticas curriculares: referenciais para análise. Porto Alegre: ArtMed, 2003.). Ainda, narrativas que circulam socialmente reafirmam lógicas quanto à gestão, à avaliação e aos usos do conhecimento, por exemplo, que influenciam o modo como as reformas curriculares chegam às escolas, geralmente apoiando suas promessas de transformar essas instituições, de lugares obsoletos, em espaços de formação comprometidos com a empregabilidade e com o sucesso futuro dos jovens.

Por isso, entendemos que, apesar dos embates possíveis, as competências socioemocionais institucionalizam certos afetos, enquanto energia para a ação ( Illouz, 2011ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.), como integrantes do currículo escolar, secundarizando saberes e comprometendo-se com a formação do sujeito engajado, comprometido em se dedicar integralmente ao que faz e disposto a se adaptar à sociabilidade vigente (sem se mobilizar para transformá-la), agindo em direção à autorrealização e ao sucesso individual. E, por esse ângulo, tem sido identificado um afeto singular nas orientações curriculares e em projetos assumidos por escolas de educação básica: a liderança. Porém, ao contrário de sua percepção habitual como a de mobilização de um grupo para a ação coletiva, outro sentido parece estar sendo constituído, como discutido na próxima seção.

A liderança de si como constituinte das hierarquias afetivas conformadas nos currículos escolares

Liderança é um termo com acepções históricas, o que, como problematizado por Bobbio, Matteucci e Pasquino (1992)BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Poder. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Brasília, DF: UNB, 1992. p. 933-943. e ratificado por um conjunto de outros pesquisadores 5 5- Alguns desses estudos são de Herkenhoff (1995), Morris e Staggenborg (2004) e Melucci (2001). , não torna tangíveis seus significados, já que suas definições costumam ser vagas e pouco aprofundadas nos estudos que o mencionam. No Dicionário de política ( Bobbio; Matteucci; Pasquino, 1992BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Poder. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Brasília, DF: UNB, 1992. p. 933-943.), a compreensão tradicional de liderança é retomada como uma relação unilateral entre a referência de um movimento e seus liderados. Contudo, o mesmo referencial aponta que, já há cerca de um século, a literatura tem reconhecido a reciprocidade entre os que são guiados e os que guiam. A partir disso, de modo sintético e fugindo à generalidade que criticam, para Bobbio, Matteucci e Pasquino ( 1992, p. 713BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Poder. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Brasília, DF: UNB, 1992. p. 933-943.) a liderança pode ser racionalizada como

[...] um papel que: a) desenvolve-se num contexto específico de interações e reflete em si mesmo (e na sua “tarefa”) a “situação” desse contexto; b) manifesta determinadas motivações do líder e exige atributos peculiares de personalidade e habilidade, além de recursos específicos, tudo isso (motivações, atributos e recursos) variáveis do papel, relacionadas com o contexto; c) relaciona-se com as expectativas dos liderados, seus recursos, suas aspirações e suas atitudes.

A colaboração e o contexto são, para esses autores, definidores dos objetivos e das funções de liderança, já que as ações orquestradas “[...] não podem ser vistas como refletindo unicamente as motivações (e os interesses) do líder. Ao contrário, estas funções (e objetivos) precisam ser, cada vez mais, relacionadas à ‘tarefa’ que o contexto atribui à liderança que dele é a expressão” (p. 714). Mas um outro elemento atinente à liderança não é aprofundado por Bobbio e seus colaboradores: a relação que essa afecção costuma estabelecer com os movimentos sociais (e suas conquistas históricas), principalmente com aqueles clássicos (relacionados a pautas da classe trabalhadora). Ganz (2009)GANZ, Marshall. Leading Change: Leadership, Organization, and Social Movements. In: NOHRIA, Nitin; KHURANA, Rakesh (org.). Handbook of leadership theory and practice: A Harvard Business School Centennial Colloquium. Boston: Harvard Business Press, 2009. p. 509-550. aborda esse aspecto afirmando que, nesses processos, a figura do líder ultrapassava a de um representante carismático, mas constituía uma comunidade em torno de uma pauta, mobilizando-a. De forma dinâmica e comprometida em afirmar publicamente a voz de um coletivo, o líder garantia a participação voluntária e engajada com uma narrativa pública.

Contudo, Araújo (2021)ARAÚJO, Maria Laís Alves de. Os movimentos sociais da atualidade e o papel do líder na construção dos movimentos em rede. Conexão Política, Teresina, v. 10, n. 1, p. 146-159, jan./jun. 2021. Disponível em: https://revistas.ufpi.br/index.php/conexaopolitica/article/view/12569. Acesso em: 9 jun. 2023.
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diferencia esses primeiros processos coletivos – que nomeia como clássicos (que eram marcados por uma organização verticalizada e geralmente possuíam figuras de liderança reconhecidas) – dos mais contemporâneos. Entre os recentes estão os novos movimentos sociais, que se vinculam a bandeiras de identidade e se organizam em grupos específicos – aos moldes do que Roudinesco (2022)ROUDINESCO, Elizabeth. O eu soberano: ensaio sobre as derivas identitárias. Rio de Janeiro: Zahar, 2022., anteriormente mencionada, problematiza –, e os novíssimos movimentos sociais. Os últimos em muito são articulados por meio das redes sociais e possuem hierarquias mais diluídas, sem geralmente contar com uma figura representativa, mas há exceções, como o Movimento Brasil Livre, organizado através da internet e com lideranças políticas estandardizadas, conforme discute Araújo (2021)ARAÚJO, Maria Laís Alves de. Os movimentos sociais da atualidade e o papel do líder na construção dos movimentos em rede. Conexão Política, Teresina, v. 10, n. 1, p. 146-159, jan./jun. 2021. Disponível em: https://revistas.ufpi.br/index.php/conexaopolitica/article/view/12569. Acesso em: 9 jun. 2023.
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A diluição dos estratos dessas organizações, tal como Bobbio, Matteucci e Pasquino (1992)BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Poder. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Brasília, DF: UNB, 1992. p. 933-943. já identificavam e a análise de Araújo (2021)ARAÚJO, Maria Laís Alves de. Os movimentos sociais da atualidade e o papel do líder na construção dos movimentos em rede. Conexão Política, Teresina, v. 10, n. 1, p. 146-159, jan./jun. 2021. Disponível em: https://revistas.ufpi.br/index.php/conexaopolitica/article/view/12569. Acesso em: 9 jun. 2023.
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reforça, denota alterações na concepção de liderança hodiernamente, já que as estruturas organizacionais dos movimentos sociais têm se tornado mais fluidas, com menor proeminência de figuras em destaque, o que não indica uma democratização social ou a desvalorização dessa figura, mas talvez sua remodelação no contexto hiperneoliberalizado. Isso porque a ênfase na liderança tem se exacerbado no contexto empresarial (e não somente entre organizações populares), em que até mesmo cursos 6 6- Algumas opções disponíveis são: https://educacao-executiva.fgv.br/sp/sao-paulo/cursos/alta-gestao/alta-gestao/lideranca-e-gestao; https://www.pucrs.br/negocios/cursos/lideranca-e-gestao-de-equipes/. Acesso em: 13 jun. 2023. têm sido ofertados para despertar esse diferencial entre os colaboradores. Nas escolas, esse afeto também tem sido estimulado, mesmo que atrelado a sentidos distintos dos habituais, como problematizaremos nesta seção por meio da análise de alguns documentos singulares.

Antes de abordá-los, esclarecemos que, neste estudo, os documentos são entendidos como fontes de pesquisa que permitem a compreensão sobre determinado tempo e seu contexto social ( Cellard, 2008CELLARD, André. A análise documental. In: JACCOUD, Mylène; MAYER, Robert. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 295-315.). Por isso, o exame desses materiais deve se estabelecer através de critérios que vão desde a sua seleção até a sua análise efetiva, com os questionamentos que mobilizam uma pesquisa sendo articulados a elementos colhidos na pré-análise, de forma que sua interpretação possa ser construída. Cellard (2008)CELLARD, André. A análise documental. In: JACCOUD, Mylène; MAYER, Robert. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 295-315. orienta esse processo a partir de dois momentos: o preliminar, primeira etapa da análise, em que o documento é aceito em suas especificidades e incompletudes e são buscados contexto, autoria, autenticidade, confiabilidade, natureza, conceitos-chave e lógica do texto; e a análise em si, em que questionamentos iniciais que mobilizaram a pesquisa são agregados aos elementos anteriormente listados, favorecendo a interpretação adequada do material.

Além disso, os documentos que traduzem sentidos de liderança e que são analisados neste excerto do estudo, por mais que produzidos sob certo viés de neutralidade, são entendidos, já a priori, como expressão de projetos políticos, de conflitos e de interesses ( Evangelista, 2012EVANGELISTA, Olinda. Apontamentos para o trabalho com documentos de política educacional. In: ARAÚJO, Ronaldo Marcos de Lima; RODRIGUES, Doriedson S. A pesquisa em trabalho, educação e políticas educacionais. Campinas: Alínea, 2012. p. 52-71.). Seus contextos diferenciados de elaboração e os públicos aos quais se destinam também esboçam, preliminarmente, concepções que parecem ratificar a hipótese delineada (sobre a redefinição de acepções de liderança), indicando, ainda, reforçar dualismos que, historicamente, marcam fraturas na educação básica ofertada ( Esquinsani; Esquinsani, 2019ESQUINSANI, Rosimar Serena Siqueira; ESQUINSANI, Valdocir Antonio Esquinsani. A reforma do ensino médio como mecanismo de intensificação do dualismo escolar. Revista Espaço do Currículo, João Pessoa, v. 12, n. 1, p. 171-181, jan./abr. 2019. Disponível em: http://portal.amelica.org/ameli/journal/439/4392759014/4392759014.pdf. Acesso em: 20 jun. 2023.
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). Na direção de esclarecer esses indícios, examinam-se duas propostas: uma que se dirige a uma rede pública de ensino e que conserva um conceito de liderança tradicionalmente articulado ao ambiente escolar; e outra que tem se tornado popular em instituições de ensino privadas e que denota uma ressignificação desse afeto, trazendo elementos para se questionar um redirecionamento de sentidos históricos a partir dos remanejos atuais do neoliberalismo.

O primeiro documento analisado não se trata de uma orientação curricular em si, mas, como o currículo se constitui pelas práticas cotidianas construídas na escola, entendeu-se, mesmo assim, que seu conteúdo é relevante para esta discussão por se direcionar às experiências dos estudantes nesse espaço singular. Disponibilizado pelo governo da Paraíba, tem como título Cartilha de formação de líderes estudantis e foi publicado em 2019. O material, ao ser selecionado, já inicialmente demonstrou cumprir os requisitos de autoria, autenticidade, confiabilidade e natureza indicados por Cellard (2008)CELLARD, André. A análise documental. In: JACCOUD, Mylène; MAYER, Robert. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 295-315.. Na pré-análise, constatou-se que o contexto em que a cartilha foi difundida foi o de estímulo, pela Secretaria Estadual da Educação e da Ciência e Tecnologia ( SEECT, 2019SEECT. Secretaria Estadual da Educação e da Ciência e Tecnologia. Cartilha de formação de líderes estudantis. João Pessoa: Governo da Paraíba, 2019. Disponível em: https://paraiba.pb.gov.br/diretas/secretaria-da-educacao/arquivos/desenvolvimento-estudantil/cartilha-de-formacao-de-lideres.pdf. Acesso em: 11 jun. 2023.
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), à eleição de representantes de turmas nas escolas de sua esfera e, para clarificar as incumbências dessas lideranças, compartilhou-se o documento em questão. A lógica organizativa explicita a função, as especificidades sobre o mandato do líder e do vice-líder, as responsabilidades da escola e do professor, os programas da secretaria, as principais políticas públicas da educação nacional, possibilidades de atividades extracurriculares e espaços e órgãos de participação na escola (como Grêmio Estudantil, Assembleias Escolares e Conselho Escolar).

No material, que conta com 32 páginas, há explanações breves, geralmente em formato de itens, das quais se depreendem dois conceitos estruturais, sendo eles o de liderança e o de protagonismo juvenil. O primeiro é evocado a partir da menção ao papel de mediação de diálogos éticos entre entes da comunidade na busca de consensos, de participação e de integração entre o coletivo, sendo o líder de turma uma referência no sentido de se estabelecer um ambiente democrático e colaborativo na escola. O segundo é retratado no documento menos como posicionamentos individuais e mais como espaços de participação e de iniciativa para os jovens em busca de proporcionar desenvolvimento pessoal e também de promover transformação social, garantindo autonomia e valorização da diversidade.

Apesar de sucinto, o primeiro documento analisado denota reforçar, nas escolas, uma concepção de liderança implicada com a comunidade, indicando-a como um pilar para sua organização e dinamicidade. Articulado ao protagonismo, esse conceito se aproxima das distinções de Bobbio, Matteucci e Pasquino (1992)BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Poder. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de política. Brasília, DF: UNB, 1992. p. 933-943., apontando o líder como uma referência da coletividade e como alguém que se compromete com suas aspirações. Além disso, estimula o engajamento e a colaboração, promovendo a identificação e a escuta do contexto. Parece ratificar, nesse sentido, uma percepção mais tradicional de liderança, afinada àquela dos movimentos sociais e contextualizada por Ganz (2009)GANZ, Marshall. Leading Change: Leadership, Organization, and Social Movements. In: NOHRIA, Nitin; KHURANA, Rakesh (org.). Handbook of leadership theory and practice: A Harvard Business School Centennial Colloquium. Boston: Harvard Business Press, 2009. p. 509-550., já que se mostra comprometida com a constituição e a mobilização de uma comunidade em torno de uma pauta, algo distinto do viés enfatizado pelo segundo material de análise.

O outro documento se refere à homepage do programa Líder em Mim, comercializado como uma solução educacional e que no Brasil tem como principal empresa vinculada a Somos Educação. O artefato, por mais que se configure em um formato atualizável (não é um e-book ou material fechado, mas uma página on-line passível de alterações quando necessário for), também se mostra articulado aos critérios elencados por Cellard (2008)CELLARD, André. A análise documental. In: JACCOUD, Mylène; MAYER, Robert. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 295-315. por possuir autoria explicitada, mostrar-se autêntico, ter sido produzido a partir de referências e de um objetivo que denotam confiabilidade e expressam sua natureza. Essas questões se ratificam pela apresentação feita acerca do programa e de seu conteúdo, destacando-o como um produto de uma editora reconhecida nacionalmente e com atuação consolidada no ramo de materiais didáticos (a Somos), e por se autoindicar como o único sistema de ensino brasileiro aprovado pelo CASEL, apontado pela página como uma organização reconhecida mundialmente quanto à aprendizagem socioemocional na educação ( Somos Educação, 2023SOMOS EDUCAÇÃO. O líder em mim. [S. l.], 2023. Disponível em: https://www.olideremmim.com.br/. Acesso em: 18 jun. 2023.
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), o que denota sua intenção em frisar os requisitos apontados por Cellard (2008)CELLARD, André. A análise documental. In: JACCOUD, Mylène; MAYER, Robert. A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 295-315. como forma de reafirmar sua credibilidade.

Os dados disponibilizados no endereço eletrônico também esclarecem o contexto e os conceitos-chave do programa. Como deixado claro no material, a solução educacional é destinada a escolas parceiras, que devem solicitar informações por meio de um formulário. Contudo, os relatos no site mostram sua utilização em escolas privadas, com o material sendo direcionado para esse contexto específico ou para outras instituições que desejem adquiri-lo. Sua elaboração, ainda de acordo com esse endereço, direciona-se ao desenvolvimento de competências socioemocionais (o que pode ser entendido como seu conceito-chave) ao prover um contexto adequado para que instituições e estudantes alcancem uma formação integral, mas com uma acepção que remonta designadamente ao desenvolvimento das emoções.

O material é formulado a partir da obra Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes (escrita por Stephen Covey e produzida a partir de princípios de liderança indicados como bases da formação de reconhecidos líderes mundiais), um best-seller (como se faz questão de mencionar) que visa estimular o protagonismo dos estudantes nos estudos, mas também nas demais esferas de sua vida, fomentando a participação, a responsabilidade e a autonomia, porém com adaptações das lições de Covey para o contexto brasileiro. A partir da obra, o Líder em Mim visa equalizar a linguagem utilizada por estudantes, professores, funcionários e familiares (acreditando que isso facilite a comunicação) em torno de sete hábitos para a formação de todos os estudantes como líderes. São eles: ser proativo; ter um objetivo; fazer o mais importante primeiro; pensar que todos podem vencer; compreender os seus pares; criar sinergia com o grupo; e buscar o equilíbrio.

Esses hábitos se amparam pelo que o material denomina como os cinco domínios das competências socioemocionais (consciência, estabilidade emocional, abertura a novas experiências, amabilidade e extroversão, afins às macrocompetências disseminadas pelo Instituto Ayrton Senna e similares às orientadas pelo CASEL). O Programa, na análise que desenvolvemos, denota hierarquizar a liderança como mobilizadora das competências socioemocionais, utilizando-se de uma fórmula difundida em um best-seller para promover um projeto educacional distinto. Priorizando essa afecção, que não aparece com tanta ênfase em referenciais gerais (como o estudo da OCDE citado na seção anterior, a BNCC ou as próprias macrocompetências do IAS, já descritas) e que norteiam a educação pública, o Líder em Mim utiliza um conceito distinto daquele identificado no documento anterior, mais voltado à mobilização de pautas coletivas e a uma narrativa pública ( Ganz, 2009GANZ, Marshall. Leading Change: Leadership, Organization, and Social Movements. In: NOHRIA, Nitin; KHURANA, Rakesh (org.). Handbook of leadership theory and practice: A Harvard Business School Centennial Colloquium. Boston: Harvard Business Press, 2009. p. 509-550.). No Programa, a liderança se relaciona com o protagonismo e a iniciativa não em acepção compartilhada, mas sim individual, em busca de se alcançar êxito não somente nos estudos, mas em todos os aspectos da vida do estudante.

Percebe-se, nessa direção, uma ressignificação da concepção de liderança, tornando-a afim à lógica vivenciada na atualidade: o Programa enfatiza a liderança de si mesmo, em um movimento de estimular a motivação dos estudantes, bem como sua organização e a eficácia de sua comunicação para que alcance seus objetivos pessoais. Nesse viés, todos podem se tornar lideranças em busca de sua autorrealização e de seu sucesso pessoal, conforme Dardot e Laval (2016)DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016. indicam como atinente a este tempo. Utilizando-se da lógica do engajamento, enfatiza-se o prefixo auto ( já destacado por Collet e Grinberg, 2021COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia. La educación managerial y sus fugas: entre la individualización y lo común. In: COLLET, Jordi; GRINBERG, Silvia (org.). Hacia una escuela para lo común. Madrid: Morata, 2021. p. 13-30.) para oferecer o que se referencia como uma educação adaptada às demandas atuais por meio de habilidades existenciais – pessoais e interpessoais ( Covey et al., 2017 COVEY, Stephen R.; COVEY, Sean; SUMMERS, Muriel; HATCH, David K. O líder em mim: como escolas ao redor do mundo estão inspirando a grandeza, uma criança por vez. São Paulo: Benvirá, 2017.).

Há de se considerar também que a linguagem de autoajuda utilizada (muito em voga nos discursos públicos atuais) e a alusão a uma obra com reconhecimento público (principalmente entre a classe média) reforçam as expectativas dos responsáveis pelos estudantes com a proposta. Isso porque fortalece a simpatia que determinados grupos sociais (que frequentam escolas que podem adquirir pacotes educacionais como esse) possuem com a ideia de liderança e de protagonismo, principalmente no sentido de garantir aos filhos um posicionamento social singular. Com isso, reafirmam-se disparidades e dualidades entre redes de ensino ( Esquinsani; Esquinsani, 2019ESQUINSANI, Rosimar Serena Siqueira; ESQUINSANI, Valdocir Antonio Esquinsani. A reforma do ensino médio como mecanismo de intensificação do dualismo escolar. Revista Espaço do Currículo, João Pessoa, v. 12, n. 1, p. 171-181, jan./abr. 2019. Disponível em: http://portal.amelica.org/ameli/journal/439/4392759014/4392759014.pdf. Acesso em: 20 jun. 2023.
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), rompendo-se com sentidos popularmente construídos e estabelecendo-se outros mais próximos de suas expectativas e ambições individuais.

Ao oferecer uma proposta direcionada a um propósito desde a infância, estimulando o controle da própria vida e a motivação para o alcance de metas pessoais, o Líder em Mim assevera a lógica do empreendedorismo de si disseminado pelo neoliberalismo. Com uma linguagem acolhedora, que se utiliza da lógica de uma educação integral para comercializar propostas gourmet como diferenciais a instituições particulares, oferece um ideal educativo articulado aos discursos disseminados por uma economia libidinal ( Safatle, 2021aSAFATLE, Vladimir. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo. Belo Horizonte: Autêntica, 2021a.) em um capitalismo afetivo ( Illouz, 2011ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.). Daí sua ampla aceitação e seu sucesso (indicados em seu material de divulgação), já que articula o currículo escolar às expectativas socioeconômicas contemporâneas em relação à escola.

Considerações finais

A orientação teórica que guia esta escrita se assenta na compreensão de que, hodiernamente, “[...] o afeto se torna um aspecto essencial do comportamento econômico, e no qual a vida afetiva [...] segue a lógica das relações econômicas e da troca” ( Illouz, 2011ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011., p. 8). Nesse contexto, os sentimentos “[...] organizam-se hierarquicamente, e esse tipo de hierarquia afetiva, por sua vez, organiza implicitamente os arranjos morais e sociais” (p. 7). A partir desse entendimento, investigou-se a atenção dispensada à liderança em artefatos curriculares recentes, buscando entender como esse elemento é contextualizado e ressignificado.

A análise ratificou a hipótese de que a liderança – enquanto energia para a ação ( Illouz, 2011ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.) – está presente em materiais que produzem sentidos e efeitos na escola básica, mas com concepções distintas. Enquanto o documento direcionado para uma rede pública conserva uma acepção de liderança comprometida com a coletividade e com pautas de uma comunidade, a solução educacional disponibilizada a escolas predominantemente particulares mostra uma ressignificação desse viés. Afinada à ultrassubjetivação neoliberal que se pauta no “ excesso de si em si” ( Dardot; Laval, 2016DARDOT, Pierre; LAVAL, Christian. A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo: Boitempo, 2016., p. 348, grifos dos autores) e que impõe o sucesso individual como imperativo de vida, a segunda proposta analisada difunde a liderança em uma perspectiva pessoal, vinculada à motivação de si mesmo na busca por êxito em seus propósitos.

Como um dos afetos que têm sido inseridos na educação básica como parte de uma formação socioemocional, essa remodelação conceitual da liderança esboça, muito mais do que a preocupação com a educação integral que argumenta conter, a integração explícita, por meio de hierarquias afetivas ( Illouz, 2011ILLOUZ, Eva. O amor nos tempos do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.), entre elementos subjetivos e o comportamento econômico. A participação comprometida de um sujeito como mobilizador de um coletivo em torno de uma narrativa pública ( Ganz, 2009GANZ, Marshall. Leading Change: Leadership, Organization, and Social Movements. In: NOHRIA, Nitin; KHURANA, Rakesh (org.). Handbook of leadership theory and practice: A Harvard Business School Centennial Colloquium. Boston: Harvard Business Press, 2009. p. 509-550.) cede espaço ao sujeito motivador de si, empreendedor de uma conduta engajada com seus objetivos e lapidador de seus próprios afetos em busca de se mostrar (e de se convencer) competitivo e flexível para alcançar seus anseios individuais. Um eu soberano ( Roudinesco, 2022ROUDINESCO, Elizabeth. O eu soberano: ensaio sobre as derivas identitárias. Rio de Janeiro: Zahar, 2022.) que se torna líder de si mesmo a partir de um design psicológico ( Safatle, 2021bSAFATLE, Vladimir. A economia é a constituição da psicologia por outros meios: sofrimento psíquico e o neoliberalismo como economia moral. In: SAFATLE, Vladimir; SILVA JÚNIOR, Nelson da; DUNKER, Christian (org.). Neoliberalismo como gestão do sofrimento psíquico. Belo Horizonte: Autêntica, 2021b. p. 17-46.) que tem na escola (dualista e também hierarquizada) um de seus espaços de formação.

Não que, com essa argumentação, se defenda uma educação enciclopédica e desarticulada das necessidades emocionais e das individualidades discentes. Pesquisas organizadas em razão da ainda recente pandemia de Covid-19 mostram altos índices de problemas emocionais em crianças e adolescentes que agora estão na escola e precisam de atenção e apoio. Contudo, isso exige profissionais especializados, formação docente adequada, debates curriculares aprofundados e espaços de escuta e acolhimento que ultrapassam intenções de gerenciamento afetivo e de adestramento emocional. Este momento específico exige olhares singulares e estudos qualificados quanto ao que está sendo vivido na escola a fim de ampliar a crítica à formação que está sendo oferecida com vistas a aprimorá-la.

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Editado por

Editor:Prof. Dr. Roni Cleber Dias de Menezes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    03 Nov 2011
  • Aceito
    07 Ago 2023
  • Revisado
    29 Maio 2023
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