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Efeitos da atribuição de causalidade e custo pessoal sobre a intenção de ajuda

Effects of causal attribution and personal cost on helping intention

Resumos

Este artigo tem como objetivo avaliar o efeito da atribuição de responsabilidade e o custo em ajudar sobre a intenção de comportamento de ajuda, bem como a mediação exercida pelo estado emocional sobre a relação entre atribuição e ajuda. Realizou-se um estudo de simulação de cenários experimentais, do qual participaram 181 estudantes universitários. Foi desenvolvido um cenário organizado em um delineamento fatorial 2 (atribuição: controlabilidade X incontrolabilidade) X 3 (custo: alto, médio e baixo). Os resultados apontam que a percepção de falta de controle do alvo sobre a situação leva a estados de afeto positivo e maior intenção de ajuda e que quanto maior o custo, menor a intenção de ajuda. Conclui-se que o custo e a atribuição de culpa são fatores relevantes na determinação da intenção de ajuda.

psicologia social; comportamento pró-social; comportamento de ajuda; simulação experimental


This paper has the purpose of evaluating the effect of attribution of responsibility and helping cost on the helping intention, as well as the meditational role of emotional state over the relationship of attribution and helping intention. A study of experimental simulation was conducted, with the participation of 181 university students. A scenario organized in a factorial design of 2 (attribution: controllability X uncontrollability) X 3 (cost: high, medium and low) was developed. The results point that the perception of lack of control of the target on the situation leads to positive affective states and higher helping intention. It also indicated that the higher the cost the lesser the helping intention. We concluded that the cost and the attribution of guilty are important factors in the determination of helping intention.

social psychology; pro-social behavior; helping behavior; experimental simulation


ARTIGOS

Efeitos da atribuição de causalidade e custo pessoal sobre a intenção de ajuda

Effects of causal attribution and personal cost on helping intention

Ronaldo PilatiI; Mariana LeãoII; Julianna Neves VieiraI; Marcus de Miranda FonsecaI

IUniversidade de Brasília

IICentro Universitário de Brasília

Endereco para correspondência Endereco para correspondência: Instituto Central de Ciências Departamento de Psicologia Social e do Trabalho Instituto de Psicologia Universidade de Brasília Campus Universitário Darcy Ribeiro; Asa Norte Brasília, DF; CEP 70910-900 Fone/Fax: (55 61) 3272-2293 E-mail: rpilati@gmail.com

RESUMO

Este artigo tem como objetivo avaliar o efeito da atribuição de responsabilidade e o custo em ajudar sobre a intenção de comportamento de ajuda, bem como a mediação exercida pelo estado emocional sobre a relação entre atribuição e ajuda. Realizou-se um estudo de simulação de cenários experimentais, do qual participaram 181 estudantes universitários. Foi desenvolvido um cenário organizado em um delineamento fatorial 2 (atribuição: controlabilidade X incontrolabilidade) X 3 (custo: alto, médio e baixo). Os resultados apontam que a percepção de falta de controle do alvo sobre a situação leva a estados de afeto positivo e maior intenção de ajuda e que quanto maior o custo, menor a intenção de ajuda. Conclui-se que o custo e a atribuição de culpa são fatores relevantes na determinação da intenção de ajuda.

Palavras-chave: psicologia social; comportamento pró-social; comportamento de ajuda; simulação experimental.

ABSTRACT

This paper has the purpose of evaluating the effect of attribution of responsibility and helping cost on the helping intention, as well as the meditational role of emotional state over the relationship of attribution and helping intention. A study of experimental simulation was conducted, with the participation of 181 university students. A scenario organized in a factorial design of 2 (attribution: controllability X uncontrollability) X 3 (cost: high, medium and low) was developed. The results point that the perception of lack of control of the target on the situation leads to positive affective states and higher helping intention. It also indicated that the higher the cost the lesser the helping intention. We concluded that the cost and the attribution of guilty are important factors in the determination of helping intention.

Keywords: social psychology; pro-social behavior; helping behavior; experimental simulation.

O comportamento pró-social é um tópico bastante estudado na psicologia social. A indagação sobre que aspectos determinam o comportamento pró-social é recorrente na literatura da área. Batson (1998)(1998) indica que mais de 1.000 artigos sobre o tema foram publicados em periódicos científicos de psicologia social e áreas correlatas entre os anos 1970 e 1990. No Brasil, são poucos os estudos empíricos publicados sobre esta temática (e.g., Silva & Günther, 1999, 2001; Silva, Günther, Lara, Cunha, & Almeida, 1998), o que denota a necessidade de produção de conhecimento empírico e sistemático sobre o comportamento pró-social do brasileiro. Este artigo procura dar respostas a algumas indagações sobre a psicologia social do comportamento de ajuda do brasileiro. Seu objetivo é testar a influência da atribuição de responsabilidade pela necessidade de ajuda e o custo em ajudar sobre a intenção de ajuda em cenários experimentais.

Será que o comportamento pró-social continua um tema atual e relevante para ser estudado? Se for considerada a carência de conhecimento teórico-empírico produzido no Brasil, a resposta é sim. Se, por outro lado, também olharmos para o contexto social mais amplo, este tema parece que está, mais do que nunca, na agenda do dia. Por exemplo, organizações privadas têm produzido campanhas e iniciado ações de responsabilidade social por diversas razões. Por trás deste rótulo genérico se estruturam várias ações sociais que incentivam o voluntariado de clientes e colaboradores. Estas ações envolvem diretamente as pessoas, o que implica em alguma forma de comportamento pró-social. Além das grandes corporações privadas, organizações não-governamentais também desenvolvem ações de benefício a populações, a comunidades carentes e ao meio ambiente. Outro exemplo diz respeito às iniciativas de arrecadação de dinheiro desenvolvidas por várias entidades privadas e governamentais todos os anos em nosso país (e.g., ABRACE, Teleton, Criança Esperança). Ações como as descritas indicam que o comportamento pró-social é um fenômeno atual e que se renova, evidenciando novas questões na agenda da área, agora ressaltada por uma "nova ordem" social, do trabalho voluntário e da conduta socialmente responsável. Nesta nova "era" quais são os mecanismos determinantes do comportamento pró-social? As aplicações sociais do conhecimento produzido sobre este fenômeno são diretas, na medida em que podem auxiliar na produção de consciência e no desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária.

Comportamento pró-social pode ser definido como qualquer ato que beneficie a uma pessoa ou grupo e que é considerado, por uma parcela significativa da população, como uma ação de benefício e ajuda (Batson, van Lange, Ahmad, & Lishner, 2003; Dovidio & Penner, 2001; Penner, Dovidio, Piliavin, & Schroeder, 2005). Esta definição abrangente traz à tona a necessidade de algumas reflexões conceituais. Há uma grande variedade de comportamentos que podem ser categorizados como pró-sociais. Pearce e Amato (1980) propuseram um sistema de classificação de comportamentos pró-sociais, com base nos estudos da psicologia social. Por meio do uso do escalonamento multidimensional, os autores categorizaram 62 situações de ajuda em três grandes dimensões: (1) ajuda espontânea-informal a ajuda planejada-formal; (2) ajuda séria a ajuda não-séria; e (3) ajuda direta a ajuda indireta. Esta estratégia auxilia na compreensão da multiplicidade de comportamentos que podem ser considerados como pró-sociais. Mas vale à pena relativizar culturalmente os achados dos autores, pois este estudo foi realizado na Austrália, no final dos anos 1970 e não foram identificados estudos semelhantes ou replicações posteriores feitos em culturas distintas.

Mais recentemente, a modelagem teórica multinível tem contribuído para o avanço da teoria sobre a psicologia social do comportamento pró-social. Penner, Dovidio, Piliavin e Schroeder (2005) e Dovidio, Piliavin, Schroeder e Penner (2006) apresentam uma perspectiva abrangente para a compreensão deste fenômeno, quando integraram o atual estágio teórico da área em uma modelagem de múltiplos níveis de análise. Como micronível de análise os autores pontuam os fatores evolutivos (genéticos) e intraindividuais como determinantes do comportamento pró-social, apresentando evidências e desenvolvimentos teóricos destes fatores como antecedentes. Como mesonível de análise, os autores apresentam os aspectos de relações interpessoais e das situações sociais nas quais ocorre a necessidade de ajuda, como as normas sociais, os contextos urbanos, entre outros elementos. Este nível diz respeito às relações interpessoais como foco de análise do comportamento pró-social. Como macronível de análise, os autores pontuam os elementos organizacionais e sociais como determinantes, que funcionam como indicadores de condutas socialmente desejadas em um dado contexto social. Dentro deste último nível, encontram-se uma série de desenvolvimentos teóricos sobre o voluntariado. A modelagem multinível é relevante para o desenvolvimento teórico integrado da psicologia social do comportamento pró-social.

Cabe ressaltar que uma perspectiva transcultural também é importante no contexto da produção teórica sobre este fenômeno. O presente trabalho também se inspira na relativização cultural dos processos psicossociais que antecedem o comportamento de ajuda, propondo o desenvolvimento de pesquisa empírica no Brasil. Estudos que comparam o comportamento de ajuda em diferentes culturas apontam que esta exerce um efeito moderador entre a ajuda e diferentes variáveis antecedentes (Kemmelmeier, Jambor, & Letner, 2006; Van de Vliert, Huang, & Levine, 2004). O estudo mais abrangente identificado na literatura, em termos de comparação transcultural, foi apresentado por Levine, Norenzaya e Philbrick (2001). Os autores compararam o comportamento de ajuda de pedestres em 23 regiões metropolitanas de um mesmo número de países em quatro continentes. Eles encontraram que a taxa de ajuda variou significativamente entre as cidades; e o Rio de Janeiro obteve o mais alto índice de ajuda (93%). Os autores apontam o atributo de simpatia, definido por alguns psicólogos transculturais como um elemento característico das culturas latinas (Triandis, Marín, Lisansky, & Betancourt, 1984), como uma possível explicação do resultado. Este achado e interpretação teórica são relevantes e nos encaminham à indagação da importância do desenvolvimento de estudos para a compreensão do comportamento pró-social em nossa cultura. Com esta inspiração é que este trabalho se propõe a estudar o impacto de processos psicossociais sobre a intenção de ajuda em um estudo de simulação experimental no Brasil. Neste trabalho, os processos psicossociais são entendidos como processos psicológicos envolvidos no julgamento, tomada de decisões e comportamento dos indivíduos, e que sofrem influência social em sua determinação.

Dovidio e Penner (2001) apresentam três grandes conjuntos de fatores antecedentes do comportamento de ajuda: (a) aprendizagem; (b) afeto e excitação emocional; e (c) padrões sociais e pessoais. Na presente pesquisa os antecedentes de afeto e excitação são os mais relevantes, portanto serão revisados. Os aspectos afetivos imediatamente antecedentes à ajuda estão associados à produção de estresse em quem presencia uma pessoa em necessidade de ajuda. Segundo Dovidio e Penner (2001), a produção de emoção como antecedente de ajuda se situa nos desenvolvimentos teóricos da hipótese empatia-emoção. Nesse modelo, há evidências de que os observadores da pessoa que necessita de ajuda vivenciam diferentes tipos de emoções, a depender da situação presenciada (i.e., emergência severa ou situações de menor intensidade). Neste contexto, a hipótese de empatia-altruísmo já foi testada diversas vezes em diferentes situações (Batson, Eklund, Chermok, Hoyt, & Ortiz, 2007; Dovidio, Allen, & Schroeder, 1990). Os argumentos dos autores deste modelo (Batson e colegas) pontuam que o altruísmo verdadeiro existe na medida em que o espectador da situação de ajuda se encontra em alguma circunstância específica que produza sentimentos de compaixão e simpatia, direcionando sua ação para o bem-estar daquele que necessita.

Nesse contexto, a percepção social tem um papel central como gerador de estados emocionais antecedentes ao comportamento de ajuda. Especificamente, a atribuição de causalidade é o elemento desencadeador central de estados emocionais antecedentes da ajuda, como descrito pelo modelo teórico de Weiner (1980). O mecanismo de atribuição causal do comportamento pode ser definido com um processo de atribuições de sentido e significado ao comportamento de outros indivíduos com quem interagimos no meio social (Dela-Coleta & Dela-Coleta, 2006; Hilton, 2007). A descrição clássica do processo de atribuição causal está associada à idéia de que organizamos o significado do comportamento de nossa percepção social em duas grandes categorias: atribuições internas, na qual fatores disposicionais são utilizados para dar sentido a condutas de atores sociais; e atribuições externas, nas quais a causa do comportamento é atribuída a fatores do ambiente, externos ao indivíduo. No contexto do comportamento de ajuda entra em jogo a noção de controle sobre a situação que levou alguém a solicitar ajuda. Se havia possibilidade de o indivíduo evitar a solicitação, então haveria percepção de que isto estaria sob seu controle. Caso contrário, haveria percepção de falta de controle.

Com base nessa interpretação teórica, Weiner (1980) apresentou um modelo estabelecendo uma ligação entre atribuição de causalidade e a intenção de comportamento de ajuda. Nesse modelo, o processo de atribuição de causalidade funciona como um mecanismo que aciona a reação emocional motivadora do comportamento. O autor postula que quando o indivíduo percebe que a pessoa em necessidade de ajuda possui controle sobre a situação que a levou à solicitação, a intenção de ajuda seria menor. Isto ocorreria porque o indivíduo teria reações afetivas de culpabilização da vítima e desidentificação, pois o indivíduo, se quisesse, poderia ter evitado chegar àquela situação. Por outro lado, quando a percepção fosse de impossibilidade de controle, ou seja, o indivíduo não teve como evitar chegar à situação que o levou a solicitar auxílio, a intenção de ajuda seria maior, porque esta percepção levaria a geração de sentimentos de simpatia e condescendência com a vítima. Para testar sua elaboração teórica, Weiner realizou um estudo de simulação experimental com estudantes universitários, na qual a percepção de controle a emoções foram mensuradas e a atribuição de controle manipulada em cenários experimentais. Como resultado, Weiner apresentou evidências de que o grau de controle da situação, atribuída pelo observador ao comportamento do sujeito alvo, modera o tipo de reação emocional, que por sua vez está associada ao aumento de probabilidade em ajudar. O modelo teórico testado pelo autor recebeu suporte empírico.

Posteriormente, com o uso de outra técnica de análise de dados, mas com o mesmo delineamento de pesquisa, Reisenzein (1986) replicou os achados iniciais do modelo. O autor realizou um estudo de simulação experimental e analisou os dados por meio de modelagem por equações estruturais. Isto permitiu um teste robusto da hipótese de mediação do estado afetivo sobre a intenção em ajudar. O autor corroborou a hipótese teórica e obteve excelentes índices de ajuste do modelo estrutural aos dados empíricos. Outros estudos apontaram na mesma direção, reforçando a noção de que o processo de atribuição de causalidade é um indutor de emoções antecedentes do comportamento de ajuda. Schmidt e Weiner (1988) realizaram um amplo teste experimental do modelo da atribuição-emoção-ajuda e encontraram evidências robustas de que a percepção de controle leva a estados emocionais de raiva e diminui a intenção de ajuda e a percepção de falta de controle leva a estado de simpatia e aumenta a intenção de ajuda.

Betancourt (1990) realizou um estudo em que associou o modelo motivacional de ajuda atribuição-emoção com a hipótese da empatia-ajuda. O autor desenvolveu dois experimentos em que obteve evidências de que a atribuição de controle e as emoções empáticas exercem um papel determinante de mediação sobre o comportamento de ajuda. O autor relata que, por meio de modelagem por equações estruturais, foi possível integrar no mesmo modelo as atribuições causais, a empatia induzida e as emoções empáticas como determinantes do comportamento de ajuda. De forma geral, estes estudos apontam que a atribuição da possibilidade de controle sobre as condições que levam alguém a uma situação de necessidade de ajuda está diretamente associada à produção de estados emocionais específicos que impactam no comportamento de ajuda.

Apesar de várias evidências terem sido apresentadas na literatura de psicologia social publicada em língua inglesa, não foram identificados estudos brasileiros que tenham buscado testar empiricamente a hipótese do modelo atribuição-emoção-ajuda. Em revistas científicas brasileiras são encontrados poucos relatos de pesquisa empírica que tenham tido como variável critério o comportamento de ajuda. Silva e Günther (2001) apresentaram um experimento de campo no qual se observou a ajuda entre passageiros de ônibus na cidade de Brasília. Os autores compararam a taxa de ajuda em diversas linhas de coletivos e relataram que mulheres e passageiros da linha que liga a periferia ao centro de Brasília tendem a ajudar mais ao experimentador. Em outro estudo Silva, Günther, Lara, Cunha e Almeida (1998) realizaram um delineamento fatorial quase-experimental com o uso da técnica da carta perdida. O comportamento de ajuda esperado dos sujeitos era remeter a carta. Os autores não observaram diferença significativa de ajuda para grupos sociais distintos (i.e., negro, homossexual ou controle), mas sim para as pessoas que poderiam contatar por telefone o autor da carta, o que indica a importância da possibilidade de contato e da proximidade social com àquele que necessita de ajuda como um fator relevante na decisão em ajudar. Estes estudos são pioneiros no país e indicam resultados interessantes sobre o comportamento de ajuda em nosso contexto, mas nenhum dos dois tinha como objetivo mensurar o impacto de processos psicossociais sobre o comportamento de ajuda.

Outro aspecto sistematicamente apontado na literatura da área como preditor do comportamento de ajuda é o custo pessoal em ajudar (Batson, 1998; Batson et al., 2003). Segundo Dovidio e Penner (2001), a abordagem do custo do comportamento de ajuda postula que um custo elevado para quem ajuda diminui a probabilidade da oferta de auxílio. No concernente aos custos de não ajudar, os autores apresentam evidências empíricas de que o julgamento sobre a responsabilidade de quem necessita de ajuda é crucial para a diminuição do custo de não ajudar. Neste contexto, quando aquele que necessita de ajuda é responsável pela situação em que se encontra, o custo percebido em não ajudar é menor. O inverso ocorre quando o sujeito não é responsável pelo estado em que se encontra. Com base nos aspectos teóricos aqui apresentados, evidencia-se uma relação teórica significativa entre a atribuição de responsabilidade e o custo em ajudar. Isto porque a atribuição de responsabilidade está relacionada à geração de um estado motivacional que antecede o comportamento de ajuda, mas o custo em ajudar, neste contexto, exerce um papel relevante na decisão em ajudar. Desta forma, o estudo interativo destes elementos como antecedentes de ajuda é importante para a produção de conhecimento teórico sobre os antecedentes da intenção em ajudar. A relevância em associar o custo pessoal em ajudar com a ligação atribuição-ajuda também está associada à não identificação de trabalhos empíricos anteriores que tenham relacionado estas variáveis como determinantes de ajuda.

Ainda cabe ressaltar que apesar de este estudo possuir argumentação teórica desenvolvida fora do Brasil, principalmente da psicologia social estadunidense, ele é relevante para o contexto cultural brasileiro, uma vez que testará estes princípios em nossa realidade sócio-cultural, auxiliando no desenvolvimento de estudos sistemáticos para a compreensão desse fenômeno.

Considerando os aspectos teóricos do modelo de atribuição-emoção-ajuda, de Weiner (1980), e as demais evidências empíricas sobre o custo em ajudar (Batson, 1998; Batson et al, 2003; Dovidio & Penner, 2001) podem ser formuladas as seguintes hipóteses:

H1 – A atribuição de controlabilidade, feita pelo observador, sobre o comportamento do indivíduo que necessita de ajuda está associada a uma menor intenção de ajuda.

H1a – A atribuição de incontrolabilidade, feita pelo observador, sobre o comportamento do indivíduo que necessita de ajuda está associada a sentimentos de simpatia no observador.

H1b – A relação entre atribuição e intenção de ajuda é mediada pelas emoções de simpatia.

H2 – Uma situação de maior custo de ajuda estará diretamente relacionada a uma menor intenção de ajuda.

H3 – Situações de incontrolabilidade estarão relacionadas a uma maior intenção de ajuda quando a situação for de maior custo de ajuda.

Método

Para se alcançar os objetivos descritos, foi utilizado um estudo de simulação quase-experimental de cenários com delineamento fatorial 2 X 3. Considera-se este estudo como quase-experimental por não haver garantia de designação aleatória dos participantes para cada uma das condições experimentais (Shadish, Cook, & Campbell, 2002).

Participantes

Participaram do estudo 181 estudantes universitários, convidados a participar voluntariamente em salas de aula de instituições de ensino superior do Distrito Federal. Suas idades variaram entre 16 e 60 anos com média de 23,7 anos (DP = 7,9). A maioria dos respondentes (59,1%) foi do sexo feminino. A mediana da renda familiar mensal foi de R$5.900,00 e a renda média relatada pelos participantes foi de R$7.860,00 (DP = 7.540,00).

Instrumentos

O instrumento utilizado foi um questionário de uma folha, frente e verso. Este era composto por quatro partes. A primeira continha explicações gerais sobre o projeto de pesquisa e sobre o grupo responsável pelo mesmo. Nesta primeira seção foi apresentado: (a) o termo de consentimento livre e esclarecido, informando que a pesquisa não envolvia qualquer tipo de risco aos participantes; (b) sobre o caráter voluntário da participação e da possibilidade, sem prejuízo, de desistência a qualquer momento; (c) do tratamento agregado dos dados para garantir anonimato dos participantes; e (d) da não necessidade de identificação pessoal. A segunda parte continha o texto com a apresentação do cenário experimental e instruções de que o participante deveria considerar apenas as informações contidas na situação apresentada para responder as questões da pesquisa.

A terceira parte do questionário continha: (a) a medida da variável dependente, intenção de ajuda, feita em uma pergunta associada a uma escala Likert com 11 pontos ancorada nas extremidades, sendo o 0 a certeza de não ajudar e 10 a certeza de ajudar; (b) dez questões para checagem da manipulação experimental (i.e., com propósito de avaliar se os participantes percebiam a situação como delineado em cada condição experimental) e mensuração da percepção de controle e sentimentos de simpatia em relação ao indivíduo do cenário. Estas questões estavam associadas a uma escala Likert ancorada em sete pontos (níveis) de concordância. A última parte do questionário era composta por indicadores de caracterização sócio-demográficas: sexo, idade, escolaridade e renda mensal.

Antes do início da coleta de dados esse questionário foi submetido a um processo de validação semântica e a um teste piloto do procedimento experimental. A validação semântica foi realizada com 25 estudantes universitários, que, inicialmente, responderam o instrumento e, posteriormente, foram questionados sobre a compreensibilidade de todas as partes do questionário. Os resultados desta validação semântica demonstraram a necessidade de se alterar a forma de redação do item de mensuração da variável dependente, assim como alguns aspectos das instruções e do cenário.

O teste piloto foi realizado com 30 estudantes universitários, 5 para cada condição experimental. Os resultados desse teste indicaram adequação do procedimento experimental desenvolvido, mas foi detectada a necessidade de se aprimorar alguns elementos da instrução que os aplicadores deveriam fornecer.

Foram realizadas duas análises fatoriais com oito itens da segunda parte do questionário. A primeira análise foi realizada com os itens de percepção de controle (i.e., (1) O seu colega não é responsável pela situação na qual se encontra; (2) O seu colega é responsável pela situação na qual se encontra; (3) A necessidade de seu colega pedir ajuda surgiu por uma razão externa a ele; (4) A necessidade de seu colega pedir ajuda surgiu por uma razão interna a ele), que se agregaram em um fator, com cargas fatoriais variando de 0,39 a 0,65 e bom índice de consistência interna (α = 0,83). Foi feita a inversão do primeiro e terceiro itens acima descritos, e esse fator foi denominado Atribuição Interna. Uma segunda análise fatorial foi feita com os itens de avaliação do estado emocional provocado pela situação (i.e., (1) Você sente irritação em relação ao seu colega que lhe pede ajuda; (2) Você sente raiva do seu colega que lhe pede ajuda; (3) Você sente simpatia em relação ao seu colega que lhe pede ajuda; (4) Você sente pena em relação ao seu colega que lhe pede ajuda) e resultou em uma estrutura unifatorial com a eliminação do quarto item. As cargas fatoriais variaram entre 0,37 e 0,91 e um índice de precisão muito baixo foi obtido (α = 0,40). Este índice baixo pode ser explicado pela pequena quantidade de itens no fator, bem como pelas intercorrelações negativas entre os itens de afetos positivos e afetos negativos. Este fator foi denominado Emoções Simpáticas. Decidiu-se por manter o indicador, graças à boa estrutura fatorial, como forma de se testar a relação de mediação entre atribuição, emoção e intenção de ajuda. Vale ressaltar que para a criação do escore fatorial de Emoções Simpáticas os itens um e dois desta escala foram invertidos.

Cabe, ainda, mais uma ressalva sobre estas análises de estruturas latentes. Optou-se por testar estas estruturas pela necessidade de se realizar uma análise de trajetórias para o teste do modelo de mediação proposto por Weiner (1980). Como o objetivo principal do estudo é alcançado por meio do delineamento experimental desenvolvido, considera-se que os índices psicométricos são satisfatórios neste contexto e servem, a contento, para o alcance do objetivo de teste da relação de mediação. Argumenta-se que a principal contribuição deste estudo está no procedimento de manipulação experimental, que permite o teste das hipóteses formuladas, e não no desenvolvimento de escalas psicométricas.

Procedimentos

Os questionários foram aplicados pelos integrantes do grupo de pesquisa. Em sua maioria, a coleta foi realizada em grupos de alunos nas salas de aula, com a anuência do professor responsável. Após a distribuição de um questionário para cada participante, garantindo equilíbrio de participantes em cada condição experimental, foi feito um rapport, que consistia em apresentar o aplicador, o grupo responsável pela pesquisa, o tema e o objetivo do estudo. Estas informações estavam padronizadas, descritas na primeira seção do questionário de pesquisa. O instrumento era apresentado, enfatizando-se que este consistia em frente e verso e que a leitura atenta da história era essencial. Não se estabeleceu um tempo limite de preenchimento e, em média, os participantes levaram 15 minutos para cumprir a tarefa.

O cenário utilizado foi o de pedido de empréstimo de anotações por um colega de sala de aula, adaptado do estudo de Weiner (1980). Este cenário foi escolhido por tratar-se de uma situação corriqueira para estudantes universitários. A base geral do texto do cenário é a seguinte:

Suponha que um colega de sua turma lhe procura e pede suas anotações das aulas da última semana para copiá-las, com o objetivo de preparar-se para a próxima prova.

As condições de manipulação das variáveis independentes estão associadas à finalização da história do cenário. Estas condições correspondem a um delineamento fatorial 2 (atribuição: controlabilidade X incontrolabilidade) X 3 (custo: baixo, médio e alto). As finalizações relativas à atribuição são as seguintes:

Diz que não anotou nada porque estava viajando a lazer durante a semana anterior.

Diz que não anotou nada na última semana porque estava com uma infecção no olho que lhe impedia de ler as informações anotadas no quadro pelo professor.

As finalizações relativas, respectivamente, aos níveis de custo baixo, médio e alto são as seguintes:

Ele diz que só vai gastar dez minutos para lhe devolver as folhas.

Ele diz que só poderá lhe devolver as anotações três dias antes da prova.

Ele diz que só poderá lhe devolver as anotações no dia da prova

A distribuição do número de questionários em cada uma das condições experimentais do delineamento é apresentada na Tabela 1.

Inicialmente os dados foram analisados quanto à acuracidade da digitação. Posteriormente foram realizadas análises exploratórias, visando adequação dos dados aos pressupostos do modelo linear geral (Hair, Anderson, Tatham, & Black, 2005; Tabachnick & Fidell, 2001). Foram realizadas análises fatoriais exploratórias para o estabelecimento de indicadores fatoriais dos itens que mensuravam percepção de controle e reações emocionais a situação do cenário, como já foi descrito na sessão de instrumentos. Os dados foram analisados por meio de ANOVA univariada de múltiplas vias e análise de trajetória. A análise de trajetórias foi realizada com o programa AMOS 7.0, utilizando-se o estimador da Máxima Verossimilhança (MLE) para o cálculo dos coeficientes de regressão do modelo de mediação.

Resultados

As análises exploratórias demonstraram que há anormalidade leve a moderada na variável dependente. Como a ANOVA é robusta a este pressuposto, optou-se por não adotar nenhum procedimento de transformação. Para a análise de trajetórias observou-se a consistência da estimação dos parâmetros, o que indicou que as análises são confiáveis mesmo com a ausência de normalidade dos dados. Os dados omissos observados, da ordem de 5%, foram substituídos pela média geral, pois constatou-se que eram completamente assistemáticos. Os resultados descritivos de média e desvio-padrão da variável dependente do estudo são apresentados na Tabela 2, organizados por resultados gerais e específicos por cada condição experimental.

Foi feita uma checagem de manipulação experimental por meio de uma ANOVA, tendo como variável dependente o escore do fator Atribuição Interna. Como esperado, houve uma diferença estatisticamente significativa (F(1,179) = 141,85; p < 0,000), tendo o grupo de participantes da condição controlabilidade obtido uma média (M = 5,43; DP = 0,99) superior à do grupo na condição de incontrolabilidade (M = 3,28; DP = 1,41). Este resultado indica que a manipulação experimental surtiu o efeito desejado na percepção dos participantes.

Para se testar as hipóteses da pesquisa, foram realizadas análises de variância de múltiplas vias. Os resultados indicaram que a intenção de ajuda foi significativamente superior (F(1,175) = 9,73; p < 0,002) para os participantes na condição de incontrolabilidade (para as médias, ver Tabela 2). Esta evidência dá suporte à hipótese H1 do estudo, que afirma que aqueles que percebem que o indivíduo-alvo do cenário tem controle sobre a situação dizem aquiescer menos ao pedido feito. As análises também apontaram diferença significativa para a condição custo (F(2,175) = 34,91; p < 0,001). Análise de comparação par a par (i.e., teste post hoc de Scheffé) indica que a ajuda diminui à medida que o custo em ajudar aumenta (ver Tabela 2). Esta evidência corrobora a hipótese H2 do estudo, que afirma que a taxa de intenção de ajuda decresceria em função do aumento do custo pessoal da ajuda. Com relação à interação entre as variáveis independentes, a análise de variância indicou que não há diferença significativa quando as duas interagem (F(2,175) = 1,74; p = 0,18). Essa evidência não dá suporte para H3.

Foi realizada uma análise para testar o efeito da diferença do estado afetivo em função do grau de atribuição da situação. Uma ANOVA, tendo como variável dependente o fator Emoções Simpáticas, indica que há diferença significativa (F(1,179) = 3,95; p < 0,05), com média superior para o grupo de controlabilidade (M = 5,49; DP = 1,06) e inferior para o grupo incontrolabilidade (M = 5,16; DP = 1,17). Este resultado corrobora a hipótese H1a e indica que as pessoas relatam mais afetos positivos, com geração de sentimentos de simpatia, para o indivíduo que pede ajuda devido a uma situação que estava fora de seu controle.

Para o teste da mediação que as Emoções Simpáticas exercem sobre a relação entre Atribuição e Intenção de Ajuda, foi realizada uma análise de trajetórias. Os resultados indicaram que há corroboração da hipótese H1b, pois, como pode ser observado na Figura 1, o fator Atribuição Interna prediz significativamente e com relação negativa (B = -0,14; p < 0,05) o fator Emoções Simpáticas que, por sua vez, prediz significativamente (B = 1,25; p < 0,001) a Intenção de Ajuda. Este modelo de mediação alcançou bons índices de ajuste (CFI = 0,93; GFI = 0,98).


Foi, ainda, realizada uma análise relacionando a variável dependente com os dados sócio-demográficos coletados. As análises indicaram que não existe diferença significativa na intenção de ajuda para sexo (F(1,179) = 0,87; p > 0,05) e escolaridade (F(4,176) = 1,89; p > 0,05). Correlações bivariadas entre intenção de ajuda e idade (r = -0,03; ns) e renda (r = 0,01; ns) também não foram significativas. Isto indica que diferenças individuais, nestas variáveis, não são relevantes na intenção em ajudar.

Discussão

O presente artigo teve como objetivo avaliar o efeito da percepção de controlabilidade e do custo pessoal sobre a intenção de ajuda. Também foi objetivo do estudo relatado testar o efeito da mediação de emoções simpáticas sobre a relação entre atribuição e ajuda. Estes objetivos foram alcançados.

Os dados empíricos deste estudo corroboram a H1, o que vai ao encontro das evidências da literatura atribuição-emoção-ajuda (Meyer & Mulherin, 1980; Reisenzein, 1986; Schmidt & Weiner, 1988; Weiner, 1980). Os resultados aqui apresentados indicam que o grau de culpabilização atribuída ao indivíduo que solicita ajuda é relevante na decisão das pessoas em ajudar. A H1a também foi corroborada, o que dá suporte ao modelo teórico, pois há diferença do grau de simpatia entre os participantes das diferentes condições experimentais. As análises realizadas para o teste de H1b também dão apoio aos achados da pesquisa publicada em outros países, pois emoções simpáticas são mediadoras da relação entre atribuição e intenção de ajuda. Estas evidências permitem concluir que a percepção de infortúnio tende a gerar mais emoções simpáticas que, por sua vez, tendem a levar a mais intenção de ajuda. Ainda que a média geral de ajuda possa ser considerada alta (acima do ponto médio da escala de resposta), há diferenças significativas das médias entre as condições experimentais. Apesar da escala de resposta do estudo de Weiner (1980) ser ligeiramente diferente da utilizada neste estudo, as médias relativas às variáveis de percepção de controle e emoções simpáticas são bastante semelhantes às relatadas por Weiner para as mesmas variáveis. Os dados aqui apresentados indicam clara diferença da média entre as condições experimentais, apesar de um valor aparentemente alto de intenção de ajuda em todos os grupos.

De forma geral, os resultados que apóiam as hipóteses H1, H1a e H1b evidenciam a conexão de que a forma como interpretamos os eventos sociais são desencadeadoras de estados emocionais que influenciam a forma como dizemos agir. Esta formulação geral vai ao encontro da proposição teórica de Weiner (1980). No caso do comportamento de ajuda, pode-se entender porque pessoas em situação de infortúnio podem receber mais auxílio, do que aquelas que seriam "culpadas" por encontrar-se em uma situação que demanda auxílio. Os resultados deste estudo indicam que processos psicossociais semelhantes aos relatados na pesquisa estadunidense ocorrem, também, entre estudantes universitários brasileiros. A percepção de controle da situação leva os indivíduos a demonstrarem menor intenção de ajuda. Isto é reforçado pelo processo de afeto positivo gerado em relação àqueles que não conseguiram anotar as aulas devido a um infortúnio que estava fora de seu controle.

Quando o custo pessoal em ajudar é incluído, alguns elementos importantes devem ser considerados. A pesquisa aqui relatada dá suporte a H2, o que também ocorre na pesquisa sobre custo da ajuda publicada em língua inglesa (Batson, 1998; Batson et al., 2003; Dovidio & Penner, 2001; Penner et al., 2005), na qual um maior custo pessoal também está associado à menor ajuda. Estes resultados são relevantes como evidências iniciais do papel do custo sobre a ajuda no contexto nacional.

Não foram identificados, na literatura de psicologia social, estudos que relacionassem a percepção de controle e o custo pessoal em ajudar como fatores independentes da intenção de ajuda em um mesmo delineamento. Considera-se esta uma contribuição deste trabalho para o campo, mas a não corroboração de H3 merece nossa atenção. No grupo estudado, alterar o custo não exerceu efeito relevante quando a percepção de controle estava presente. Os dois fatores independentes são importantes, mas sua interação não é. Uma possível explicação para esse resultado está na independência entre estas variáveis, pois a percepção de controle exerce maior efeito do que o custo pessoal. Talvez isto possa ser explicado pelo fato de a atribuição de controle ser mais central na decisão de ajuda no cenário apresentado, considerando que o mesmo gera um estado afetivo específico. Esta característica diminuiria a importância do custo pessoal.

Além dessa interpretação teórica, dois aspectos metodológicos também podem auxiliar na explicação da não corroboração de H3. O primeiro centra-se na desejabilidade social contida na resposta, devido ao tipo de delineamento. Isto significa que o custo em ajudar era hipotético, então demonstrar intenção de ajuda não traria custo pessoal real. O segundo é relativo à forma como o custo foi manipulado neste cenário, pois as três situações descritas (i.e., tempo de antecedência de devolução das anotações antes da prova) podem não ter sido suficientemente fortes para gerar o efeito na interação. De qualquer forma, estas especulações necessitam de novos estudos para a produção de evidências explicativas da relação entre custo e percepção de controle.

Novos estudos empíricos devem ser realizados no campo do comportamento de ajuda no contexto brasileiro. O trabalho aqui apresentado tem várias limitações que devem ser consideradas em uma agenda de pesquisa nacional sobre comportamento de ajuda no mesonível de análise. Uma limitação diz respeito ao tema do cenário utilizado. Novos estudos devem ser realizados utilizando-se outros temas, pois devemos considerar que o tipo de história pode exercer influência significativa na decisão de ajuda dos sujeitos. Características como o grau de proximidade da pessoa que pede auxílio, o tipo de auxílio prestado, o grau de espontaneidade, o nível de identidade social do participante da pesquisa com o protagonista do cenário, entre outros fatores, devem ser observados. Vale considerar, também, que os desfechos das histórias devem ser cuidadosamente trabalhados e testados, para se buscar efeitos significativos na variável dependente. Dentro da linha de taxonomização dos comportamentos de ajuda (Pearce & Amato, 1980), é essencial que os cenários experimentais sejam desenvolvidos considerando os aspectos culturais e locais que os comportamentos de ajuda possuem.

Outro fator relevante que deve ser considerado como uma limitação deste estudo é o fato de o mesmo ter sido uma simulação experimental em que não foi observado o comportamento dos participantes da pesquisa, mas apenas sua intenção comportamental. É relevante o desenvolvimento de estudos experimentais que criem situações nas quais os participantes se comportem e tenham seu comportamento registrado. Além disto, é importante conjugar a experimentação em campo ou laboratorial com a avaliação de variáveis psicossociais, como atribuição de causalidade, estereotipia, entre outras. Essa avaliação poderia ser feita com a aplicação de instrumentos padronizados e entrevistas aos participantes, em um delineamento que conjugue pré e pós-abordagem. Esta seria uma forma de avançar com a produção teórica em comportamento de ajuda no mesonível de análise, propiciando conhecimento relevante sobre esse fenômeno.

Ainda é importante salientar o aspecto da influência da cultura local sobre o comportamento de ajuda, como discutido em estudos de psicologia social transcultural (Levine, Norenzaya, & Philbrick, 2001; Smith, Bond, & Kagitçibasi, 2006). Nesse sentido, além de uma agenda de pesquisa que compare e descreva o significado da cultura local sobre o comportamento de ajuda, é essencial o desenvolvimento de estudos sobre conduta pró-social nas diferentes regiões brasileiras, principalmente quando consideramos que há diferenças culturais regionais significativas no Brasil (Torres, Porto, & Fischer, 2007). Assim, é fundamental que uma agenda de pesquisa brasileira sobre comportamento de ajuda seja desenvolvida, por meio da aplicação de projetos sobre comportamento de ajuda nas diferentes regiões brasileiras e em diferentes localidades urbanas, com o uso de instrumentos para avaliação da cultura local.

Considerando a pouca quantidade de estudos nacionais sobre comportamento de ajuda e a grande demanda social para que as pessoas se engajem neste tipo de conduta é fundamental que a psicologia social brasileira construa compreensões teóricas conectadas com nossa realidade social e cultural. Portanto, espera-se que este trabalho seja uma contribuição para o desenvolvimento continuado de pesquisas empíricas sobre o comportamento pró-social do brasileiro.

Agradecimentos

Os autores agradecem as sugestões e recomendações feitas pelos revisores anônimos das versões iniciais deste manuscrito.

Recebido em 16.jan.08

Revisado em 06.fev.09

Aceito em 20.fev.09

Ronaldo Pilati, doutor em Psicologia pela Universidade de Brasília, é professor adjunto do Instituto de Psicologia da mesma universidade.

Mariana Leão é graduanda em Psicologia no Centro Universitário de Brasília (UniCEUB). E-mail: mari1503@gmail.com

Julianna Neves Vieira é graduanda em Psicologia na Universidade de Brasília (UnB). E-mail: juliannanv@gmail.com

Marcus de Miranda Fonseca é graduando em Psicologia na Universidade de Brasília (UnB). E-mail: marcus.mmf@gmail.com

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Maio 2009
    • Data do Fascículo
      Dez 2008

    Histórico

    • Aceito
      20 Fev 2009
    • Revisado
      06 Fev 2009
    • Recebido
      16 Jan 2008
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