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Política e sujeitos coletivos: entre consensos e desacordos

Political and collective subjects: between consensus and disagreements

Temas políticos y colectivos: entre el consenso y los desacuerdos

Resumos

O texto apresenta duas concepções sobre política, buscando mapear o debate contemporâneo sobre a disputa epistemológica em torno da emergência do político como um ato de especificidade. Apresenta esse mapeamento objetivando discutir o elemento do antagonismo como definidor do conceito de político e as consequências desse tipo de abordagem para a compreensão do contemporâneo. A partir desse debate, evidencia-se a importância dos conceitos de poder e política em Michel Foucault como base para uma analítica dos antagonismos contemporâneos no campo da política e as consequências de se pensar no sujeito político a partir de uma ontologia do político. O artigo finaliza apontando a relevância desse debate para o contemporâneo dada a re-emergência do conceito do político frente à desvalorização da política nas sociedades atuais.

política; sujeitos coletivos; poder; político


The text aims to discuss two views on the concept of politics, seeking to map the contemporary debate about the epistemological dispute surrounding the emergence of the political as an act of specificity. By submitting this mapping, it discusses the element of antagonism as defining the concept of political and consequences of this approach for understanding the contemporary. From this discussion, it shows the importance of the concepts of power and politics in Michel Foucault as a basis for analytical antagonisms contemporaries in politics and the result of thinking about the political subject from a political ontology. Finally, it indicates the importance of this debate for the contemporary dialogue given the re-emergence of the concept of the political front the devaluation of politics in contemporary societies.

police; collective subject; power; the political


El texto presenta dos puntos de vista sobre la política, tratando de asignar el debate contemporáneo sobre la disputa epistemológica que rodea la aparición de la política como un acto de especificidad. Este mapeo se presenta con el objetivo de analizar el elemento del antagonismo como facilitador para definir el concepto de político y las consecuencias de este enfoque para la comprensión de lo contemporáneo. A partir de este debate, se muestra la importancia de los conceptos de poder y la política en Michel Foucault como base para los antagonismos analíticos contemporáneos en la política y el resultado de pensar en el sujeto político de una ontología política. Por último, indica la importancia de este debate para el contemporáneo que se da el resurgimiento del concepto de lo político de la devaluación de la política en las sociedades contemporáneas.

política; sujeto colectivo; poder; político


DOSSIÊ JUVENTUDE E POLÍTICA

Política e sujeitos coletivos: entre consensos e desacordos

Political and collective subjects: between consensus and disagreements

Temas políticos y colectivos: entre el consenso y los desacuerdos

Marco Aurélio Máximo PradoI; Maria Juracy Filgueiras ToneliII

IUniversidade Federal de Minas Gerais

IIUniversidade Federal de Santa Catarina

RESUMO

O texto apresenta duas concepções sobre política, buscando mapear o debate contemporâneo sobre a disputa epistemológica em torno da emergência do político como um ato de especificidade. Apresenta esse mapeamento objetivando discutir o elemento do antagonismo como definidor do conceito de político e as consequências desse tipo de abordagem para a compreensão do contemporâneo. A partir desse debate, evidencia-se a importância dos conceitos de poder e política em Michel Foucault como base para uma analítica dos antagonismos contemporâneos no campo da política e as consequências de se pensar no sujeito político a partir de uma ontologia do político. O artigo finaliza apontando a relevância desse debate para o contemporâneo dada a re-emergência do conceito do político frente à desvalorização da política nas sociedades atuais.

Palavras chave: política; sujeitos coletivos; poder; político.

ABSTRACT

The text aims to discuss two views on the concept of politics, seeking to map the contemporary debate about the epistemological dispute surrounding the emergence of the political as an act of specificity. By submitting this mapping, it discusses the element of antagonism as defining the concept of political and consequences of this approach for understanding the contemporary. From this discussion, it shows the importance of the concepts of power and politics in Michel Foucault as a basis for analytical antagonisms contemporaries in politics and the result of thinking about the political subject from a political ontology. Finally, it indicates the importance of this debate for the contemporary dialogue given the re-emergence of the concept of the political front the devaluation of politics in contemporary societies.

Keywords: police; collective subject; power; the political.

RESUMEN

El texto presenta dos puntos de vista sobre la política, tratando de asignar el debate contemporáneo sobre la disputa epistemológica que rodea la aparición de la política como un acto de especificidad. Este mapeo se presenta con el objetivo de analizar el elemento del antagonismo como facilitador para definir el concepto de político y las consecuencias de este enfoque para la comprensión de lo contemporáneo. A partir de este debate, se muestra la importancia de los conceptos de poder y la política en Michel Foucault como base para los antagonismos analíticos contemporáneos en la política y el resultado de pensar en el sujeto político de una ontología política. Por último, indica la importancia de este debate para el contemporáneo que se da el resurgimiento del concepto de lo político de la devaluación de la política en las sociedades contemporáneas.

Palabras clave: política; sujeto colectivo; poder; político.

O político em questão: Consenso, dissenso e democracia

O debate em torno do que vem a ser o político tem emergido nesse início de século com a mesma força que se ensejou durante as guerras mundiais. Diversos autores da filosofia política às ciências sociais têm se pronunciado em torno do conceito de político exatamente quando o político no contemporâneo ganhou tanto descrédito. A hegemonia do pensamento liberal tanto através de sua ideologia política quanto de seu pragmatismo deestado relegou ao político o fim das lógicas de dissenso através da difusão das lógicas hegemônicas de consenso e deliberação (Mouffe, 1998). No entanto, o debate acerca do político como fenômeno das sociedades e dos agrupamentos tem em sua longa trajetória mais disputas e dissensos do que algum tipo de acordo conceitual. Heller (1991) ao retomar esse debate em texto intitulado The concept of the political revisited, no qual a autora revisita o conceito de político a partir de Carl Schmitt, declara que o que mais se faz presente nesse debate sobre o político é a obsessão com a exclusão:

It comes as no surprise, then, to find that Arendt, despite the sophistication of her theory, occasionally suffered from the malaise which, as a rule, accompanies the concept of the political: the obsession with exclusion. Human groups or diverging opinions are, of course, not excluded from their theory; but is sues are. In fact, far too many issues have to be excluded from the concept the political, if we are to accept her understanding of the concept. (p. 336)

Hannah Arendt recupera, dos gregos antigos, a ideia de que política se confunde com a de liberdade. Afinal, ser-livre e viver-numa-pólis eram num certo sentido a mesma coisa, já que para poder viver numa pólis, o homem deveria ser livre (não ser escravo nem trabalhador e, portanto, não ser submetido à coação de outrem ou à necessidade de trabalhar para sobreviver), além de que essa condição estaria reservada aos homens e não às mulheres. Essa ideia do convívio entre iguais na pólis marcou profundamente a concepção européia do que seria política originalmente e a concepção do Estado moderno: o sentido da política é os homens terem relações entre si em liberdade, para além da força, da coação e do domínio. A política surge no entreos-homens e, portanto, fora dos homens e se estabelece como relação. Nesse caso, não seria algo "essencial" ou imanente aos homens, implicando, sim, um processo de construção histórica que existiu por um curto período mesmo entre os gregos. (Arendt, 1998).

Essa concepção marcou, culturalmente, uma tradição de reconhecimento do político como contingente a ação coletiva dos homens. Embora, contraditoriamente, a ideia de que política se confunde com liberdade, autores como Heller (1991) chamam atenção de que as compreensões sobre o político sempre estiveram em disputa, seja pela obsessão da especificidade, seja pelo seu caráter exclusivo de constituição da classe política e do fenômeno político. Indubitavelmente, as concepções de político quase nunca passaram pelo consenso entre os diferentes autores e autoras, mas, antes, pelo diálogo crítico que enseja sempre desenhar uma especificidade para o ato político ou para a forma de relação que intrinsicamente submete os agentes e sujeitos a determinadas posições. Apesar dessa disputa, como bem caracterizou Heller, esse debate foi, por alguns liberais apressados, declarado como um debate morto, uma vez que a política, naquela visão, teria atingido seu próprio fim com as democracias liberais. No entanto, o que fez ressurgir esse debate, sem dúvida, foi a própria historicidade humana, ou seja, a consciência da contingência da ação humana. De modo que o político enquanto disputa emerge toda vez que os sistemas de controle insistem no cerceamento dos próprios dissensos, de forma a caracterizá-los como problemas para a democracia e para a vida pública em comum (Mouffe, 1993).

Mouffe (2007) é uma das autoras que resgatou o debate sobre os sentidos do político a partir de sua obra sobre democracia radical e plural. A autora por sua vez, em seu livro Em torno do político, propõe uma distinção importante entre o político e a política. Segundo ela, inspirando-se em Heidegger, o primeiro termo remete ao nível ontológico, com o modo em que se institui a sociedade. Já o segundo termo, a política, tem a ver com o nível ôntico, ou seja, com a multiplicidade das práticas/fatos da política convencional. A política é constituída pelo "conjunto de práticas e instituições através das quais se cria uma determinada ordem, organizando a coexistência humana no contexto da conflitividade derivada do político" (Mouffe, 2007, p.16). Por político pode-se entender, a partir de Mouffe, "como a dimensão de antagonismo que é constitutiva das sociedades humanas" (Mouffe, 2007, p. 16). Tomando em sua análise uma posição com e contra Carl Schmitt, a autora compreende no nível ontológico o político como o grau de intensidade da associação/ não-associação da relação amigos x adversários, relação sem substância própria, destarte sua forma específica de legitimidade conflitiva. Portanto, o político nesta visada é uma forma de relação própria, ainda que sem conteúdo único, pois essa forma de relação se alimentaria de outras esferas da vida em sociedade. O que se pretende nessa interpretação, nos parece, é exatamente instituir o conflito e o dissenso como elemento constitutivo das democracias. A autora analisa a possibilidade de se considerar o conflito como inerente da organização das democracias se impondo na crítica ao modelo da democracia deliberativa ao considerar a redução do conceito de político -"democracia deliberativa, em sua neutralização e redução do pluralismo político e abuso dos propósitos democráticos de legitimidade e racionalidade" (Mouffe, 2005, p.11).

De fato, a deliberação pública livre e desimpedida de todos sobre matérias de interesse comum é uma impossibilidade conceitual, dado que formas particulares de vida que são apresentadas como seus 'empecilhos' são sua própria condição de possibilidade. Sem elas, a comunicação ou a deliberação jamais adviriam. Não há justificação alguma para atribuir privilégio ao chamado "ponto de vista moral" governado pela racionalidade e pela imparcialidade e em que um consenso racional universal poderia ser alcançado.

(...). A democracia requer, portanto, que a natureza puramenteconstruída das relações sociais encontre seu complemento nos fundamentos puramente pragmáticos das pretensões de legitimidade do poder. Isso implica que não haja nenhuma lacuna insuperável entre poder e legitimidade obviamente não no sentido de que todo poder seja automaticamente legítimo, mas no sentido de que a) se qualquer poder é capaz de se impor, é porque foi reconhecido como legítimo em algumas partes e b) se a legitimidade não se baseia em um fundamento apriorístico, é porque se baseia em alguma forma de poder bem-sucedido. (Mouffe, 2005, p.19)

O que estas duas concepções aparentemente antagônicas têm em comum? De um lado, o político aparece relacionado à liberdade e à deliberação pública. De outro, trata-se de um espaço de poder, conflito e antagonismo. Essas duas concepções representam tradições do pensamento bastante contraditórias, senão, antagônicas. Enquanto podemos perceber em Arendt uma fundamentação baseada na elevação moral de conteúdo cidadão na política, vemos em Mouffe, em sua releitura de Carl Schmitt, uma forma de relação antagônica, por princípio, sem conteúdo.

Na concepção filosófica de Arendt a emergência de uma classe política democrática contra a banalização da política ou sua vulgarização é o melhor antídoto ao radical extremismo com que autores definiram o político. Sua concepção está assentada na ação, na discussão e na atividade teórica (Heller, 1991). Sua recuperação da classe política moderna buscou classificar a diferença entre o ativismo político e a mera cidadania passiva para compreender a democracia e a cidadania dos direitos sociais, ainda que resida aí uma negação das práticas cotidianas como parte do político.

O debate em torno do político tem ganhado na atualidade contornos importantes, sobretudo a partir de concepções que inspiradas pelo trabalho de Michel Foucault implementaram formas de compreender os antagonismos contemporâneos sem abrir mão dos processos de subjetivação na formação das formas de governo. De tempos em tempos esse debate reaparece sempre bastante contextualizado em determinadas ideologias políticas, caso exemplar do início do século XX quando esse debate se tornou um campo específico de compreensão das diferenças subjetivas entre as massas e os grupos políticos. No entanto, é na contemporaneidade, quando parece existir uma vulgarização da política e uma negação dos conflitos entre as diferenças e as desigualdades, que esse debate faz-se urgente a partir dos sujeitos, das experiências e de tempos e espaços próprios.

Considerar o campo do político como um campo de emergência de antagonismos tem consequências importantes para duas questões que nos interessam sobremaneira nesse debate: quem são esses sujeitos políticos e como se constituem em ato. Estas duas questões, que permeiam todo o debate e as aproximações entre as distintas visões teóricas sobre o político, no permite articular, portanto, uma concepção de sujeito da cena política e seus processos de constituição.

A influência do pensamento foucaultiano nesse debate na contemporaneidade é muito relevante não só pela própria concepção de poder e política, mas, sobretudo pelas formas de compreensão do processo de constituição do sujeito, pensado como processo constituinte e constituído das/nas relações de poder. Muitos autores (Ross, 1998) contemporâneos ao reconsiderar o político, tomam o pensamento foucaultiano como uma importante base na determinação do conflito como elemento constituidor da própria ação humana coletiva.

Leitores de Foucault: Poder, política e governo

O exercício do poder para Foucault é um modo de ação sobre as ações dos outros, o "governo" dos homens uns pelos outros [...] e só se exerce sobre "sujeitos livres" [...] sujeitos individuais ou coletivos que têm diante de si um campo de possibilidade onde diversas condutas, diversas reações e diversos modos de comportamento podem acontecer. [...] A relação de poder e a insubmissão da liberdade não podem, então, ser separadas. O problema central da relação de poder não é o da "servidão voluntária" [...] no centro da relação de poder, "provocando-a" incessantemente, encontra-se a recalcitrância do querer e a intransigência da liberdade. Mais do que um "antagonismo" essencial, seria melhor falar de um "agonismo"- de uma relação que é, ao mesmo tempo, de incitação recíproca e de luta; trata-se, portanto, menos de uma oposição de termos que se bloqueiam mutuamente do que de uma provocação permanente. (Foucault, 1994c).

As relações de poder se enraízam no conjunto da rede social, de sorte que o Estado nas sociedades contemporâneas é apenas uma das formas ou um dos lugares - ainda que o mais importante - de exercício do poder ao qual todos os outros tipos se referem. Isso se dá porque se produziu uma estatização constante das relações de poder que foram progressivamente governamentalizadas, elaboradas, racionalizadas e centralizadas na forma ou sob a caução das instituições do Estado.

A racionalidade política no ocidente enraizou-se, primeiramente, na ideia de poder pastoral e, depois, na razão de Estado. A individualização e a totalização são seus efeitos inevitáveis, segundo Foucault (1994a). Em suas palavras:

A característica maior de nossa racionalidade política radica, em meu juízo, nesse fato: esta integração dos indivíduos em uma comunidade ou uma totalidade é resultado de uma cor relação permanente entre uma individualização cada vez maior e uma consolidação desta totalidade. Desde este ponto de vista, podemos compreender porque a antinomia direito/ordem permite a racionalidade política moderna. (Foucault, 1994b, p. 827)

O direito remete a um sistema jurídico e a ordem a um sistema administrativo. Foucault (1994b) encara a problemática da razão do estado desde a perspectiva da racionalidade política e no contexto da formação da biopolítica, ou seja, do governo das populações, da integração dos indivíduos a uma totalidade vivente. Ora, para Foucault, o poder é finalmente o poder do governo, no sentido amplo do termo, no sentido da condução das condutas. Assim, suas análises das formas modernas de governo se interessaram particularmente pela literatura das "artes de governar" que floresce nos séculos XVI e XVII.

A partir deste ponto, as noções de governo e de governamentalidade passam a centralizar as análises de Foucault sobre o poder - o governo de si mesmo e o governo dos outros. Por sua vez, a noção de governo entrecuza-se com a história da ética, ou seja, com as formas de subjetivação (cuidado, ascesis, parresía, etc.). As práticas de subjetivação são também formas de objetivação - os modos pelos quais o sujeito se torna objeto de saber e de poder para si mesmo e para os outros.

A noção de governo tem dois eixos fundamentais: governo como relação entre sujeitos - conjunto de ações sobre ações possíveis, conduta que tem por objetivo a conduta de outro indivíduo ou de grupos (Foucault, 1994c) - e governo como relação consigo mesmo - por exemplo, trata-se de dominar os desejos e os prazeres (Foucault, 1984). Os modos de subjetivação-objetivação situam-se no cruzamento dos dois eixos.

A governamentalidade trata das maneiras de governar e, portanto, da análise das formas de racionalidade, procedimentos técnicos, formas de instrumentalização. Engendra, portanto, 1) um conjunto de instituições, procedimentos, cálculos etc., que permitem o domínio sobre as populações (como a economia política e a segurança); 2) a linha de força que o Ocidente conduziu a partir da predominância deste tipo de poder que é o governo sobre todos os outros - a soberania, a disciplina - e permitiu o desenvolvimento de toda uma série de saberes (como a demografia); 3) o resultado do processo pelo qual o Estado de justiça da Idade Média se converteu no Estado administrativo e no Estado governamentalizado (Foucault, 1982). Além disso, a governamentalidade é "... o encontro entre as técnicas de dominação exercidas sobre os outros e as técnicas de si" (Foucault, 1994d, p. 785). Pode-se chegar, então, à argumentação de que o estudo das relacões entre o governo dos outros e o governo de si no marco da governamentalidade permite a articulação das estratégias de resistência.

Na medida em que esta abordagem possibilita desfibrar uma determinada racionalidade política, identificar sua gênese histórica e descrever seu funcionamento, também deverá abrir espaço para uma reflexão sobre as "contra-condutas" possíveis. No reverso das análises das governamentalidades políticas se contém, de maneira indissociável, uma interrogação sobre as "crises de governamentalidade".

Nesses trabalhos do final dos anos de 1970 e início dos anos de 1980, há um forte apelo do pensamento político de Foucault às novas formas que podem assumir as modalidades de luta e de resistência. Elas terão a densidade de contracondutas individuais, mas também coletivas. Podem se configurar como as ações e os movimentos que se opõem às formas de condução das condutas no interior de uma racionalidade política.

Em um manuscrito sobre a governamentalidade, após comentar que a análise das governamentalidades implica que "tudo é político", Foucault afirmará: "Melhor dizer: nada é político, tudo é politizável, tudo pode tornar-se político. A política não é nada mais nada menos do que o que nasce com a resistência à governamentalidade, a primeira sublevação, o primeiro enfrentamento." (Foucault, 2008, p. 287). O engajamento, na perspectiva de Foucault, deve ser situado em referência a esse vasto domínio. Se não tem pretensão totalizadora nem assume forma exemplar, ele encontra-se aberto, em sua forma e conteúdo, ao amplo domínio do politizável.

O retorno aos gregos que Foucault efetua não significa tomá- los como modelo, já que não se pode considerá-los admiráveis, nem que oferecem uma alternativa. Foucault volta aos gregos em seus últimos escritos com o objetivo de recuperar a ascese, acentuando a importância do contato com a filosofia antiga e o valor do exemplo de experiências éticas. A razão pela qual efetua esse retorno é o entendimento de que a Antiguidade apresenta uma experiência moral centrada na relação consigo (Ética) não ligada a nenhum sistema social, jurídico ou institucional. Entende ele que a situação contemporânea apresenta um cenário similar na medida em que não se acredita mais na religião como fundamento da ética, assim como se recusa a interferência de um sistema jurídico em nossa vida pessoal, moral, privada, fazendo com que os movimentos de libertação atuais não encontrem um fundamento sobre o qual possam erigir uma nova ética.

A atualidade do problema de uma ética entendida como a forma que se pode dar à própria vida leva Foucault (1994d; 1994f) a conceber o cuidado de si como ponto de resistência preferencial e útil contra o poder político e a localizar o objetivo político no incentivo a novas formas de subjetivação. O indivíduo alcançaria autonomia mediante as práticas de si e mediante a junção da própria transformação com as mudanças sociais e políticas. Por estética, entende-se a produção/lapidação de si de acordo com preceitos éticos que regem as relações dos sujeitos consigo mesmos e com os demais. Ética e estética complementam-se, portanto, convocando o cuidado de si como exercício político. Inventar-se, descristalizar os pontos de assujeitamento, resistir. Essa relação consigo mesmo autônoma e não normalizada não deve ser entendida no sentido liberal. Ela constitui antes uma subjetividade anárquica posto que se trata de se libertar do Estado e das formas de subjetivação por ele impostas. Ao invés do sujeito dócil, tem-se a metáfora do guerreiro e da guerra, a intensidade das lutas.

Em O Sujeito e o Poder (1994c), Foucault enumera e retoma as características das lutas na atualidade. Dentre elas encontram se aquelas que questionam o estatuto do indivíduo, opondo-se ao que se pode chamar de "governo por individualização" e opõem formas de resistência aos efeitos de poder que estão ligados ao saber, à competência e à qualificação.

Dentre as possibilidades de criação de novos estilos de si, a amizade é uma forma de existência considerada por Foucault (1994e) quando ele pensa em uma possível atualização da "estética da existência", embora ele tenha limitado suas análises quase que exclusivamente à cultura homossexual, o que não exclui sua ampliação a outros grupos.

Se Michel Foucault dedicou boa parte seus trabalhos ao saberpoder, pode-se acompanhar, por outro lado, alguns deslocamentos por ele mesmo efetuados. Um destes deslocamentos é aquele que se efetua no eixo do poder e permite o surgimento de um si mesmo constituído esteticamente. Sua preocupação com a ética aqui, com aquilo que rompe com a moral vigente, leva-o a perspectivar a capacidade do sujeito se transformar estilizando sua existência na presença do outro. Entra em cena a amizade como um jogo agonístico e estratégico, pelo qual uns agem sobre os outros com o mínimo domínio possível. Esse projeto inacabado por Foucault deixou pistas importantes para se pensar formas de subjetivação que permitam o agenciamento de necessidades individuais e objetivos coletivos.

Sujeitos Coletivos: Articulação, identidades e subjetivação política

A discussão que Butler (1998) desenvolve em alguns de seus textos, e que já aparece de forma substancial no seu primeiro livro de impacto intitulado "Problemas de Gênero", publicado originalmente em 1990 e, no Brasil, em 1998 nos permite uma articulação entre a experiência e as formas de poder. Ao questionar os jogos discursivos (incluindo aqui fortemente aqueles dos sistemas jurídicos de poder) que produzem os sujeitos que subsequentemente passam a representar, inspirando se em Foucault, Butler afirma que a questão do "sujeito" é crucial para a política, pois os sujeitos coletivos/políticos são produzidos por práticas de exclusão. A representação serve para garantir legitimidade e visibilidade a determinados sujeitos como sujeitos polítcos, por exemplo "mulheres", "jovens", "negros". No entanto, também é uma função normativa da linguagem que revela ou distorce o que seria tido como verdadeiro nessas categorias (a verdadeira mulher, o verdadeiro jovem etc). Nesse caso, a tarefa seria a de formular, no interior da estrutura jurídica contemporânea (da linguagem e da política que constituem o campo do poder) uma crítica às categorias identitárias naturalizadas e imobilizadas por essa estrutura mesma. Assim, o sujeito político passa a ser compreendido sempre como algo que é construído discursivamente, em contextos políticos específicos, a partir de articulações, alianças, coalizões. Portanto, sempre contingente.

Embora o sujeito coletivo universal deixe de ser o principal referencial, a saída não se encontra na direção inversa, ou seja, nas práticas individuais, pois, não se trata de uma recaída neo-liberal, como deixam bem claro as exposições de Butler. O respeito às diferenças não significa a nulidade de limites ou parâmetros ético-morais, contudo, implica em pensar a auteridade fora das polarizações a que estamos habituados.

Butler pergunta se é necessária a "unidade" para a ação política efetiva e argumenta que a crítica ao essencialismo e a defesa da diferença podem revigorar a prática política, de sorte que "... sem a pressuposição ou o objetivo da 'unidade', sempre instituído no nível conceitual, unidades provisórias podem emergir no contexto de ações concretas que tenham outras propostas que não a articulação de identidade". (Butler, 2003, p. 36)

Se tomamos a identidade como discursivamente construída, negar a essência da identidade não implica negar a existência de sujeitos políticos e de prática política, mas sim redefinir sua constituição. Para tanto, Butler distingue "política de identidade" de "política de coalizões". A primeira implica a afirmação de uma unidade e a segunda a constituição de alianças contingentes. Como diz Butler, "a política de coalizões não exige uma categoria ampliada de 'mulheres' nem um eu internamente múltiplo a desvelar de chofre sua complexidade". (Butler, 2003, p. 37). Ainda sobre a mesma questão, em outro texto, Butler afirma:

No feminismo, parece haver uma necessidade política de falar enquanto mulher e pelas mulheres, e não vou contestar essa necessidade. [...] Mas essa necessidade precisa ser reconciliada com uma outra. No instante em que se invoca a categoria mulheres como descrevendo a clientela pela qual o feminismo fala, começa invariavelmente um debate interno sobre o conteúdo descritivo do termo. [...] Mas cada vez que essa especificidade é articulada, há resistência e formação de facções dentro da própria clientela supostamente unificada pela articulação de seu elemento comum. [...] Eu diria que qualquer esforço para dar conteúdo universal ou específico à categoria mulheres, supondo-se que essa garantia de solidariedade é exigida de antemão, produzirá necessariamente facções e que a 'identidade' como ponto de partida jamais se sustenta como base sólida de um movimento político feminista. As categorias de identidade nunca são meramente descritivas, mas sempre normativas e como tal, exclusivistas. Isso não quer dizer que o termo 'mulheres'não deva ser usado, ou que devamos anunciar a morte da categoria. Ao contrário, se o feminismo pressupõe que 'mulheres' designa um campo de diferenças indesignáveis, que não pode ser totalizado ou resumido por uma categoria de identidade descritiva, então o próprio termo se torna um lugar de permanente abertura e re-significação. (Butler, 1998, p. 35-36)

Chantal Mouffe considera que a rejeição do essencialismo e a inclusão das diferenças são questões cruciais para realização de um projeto de democracia plural e radical, por meio da desconstrução das identidades essenciais, como "condição necessária para uma compreensão adequada da variedade de relações sociais onde se teriam que aplicar os princípios de liberdade e igualdade". (Mouffe, 1999, p. 32). Nessa interpretação, as lutas políticas contemporâneas têm seus conflitos e antagonismos marcados por sujeitos constituídos por um conjunto de posições de sujeitos. A identidade de tal sujeito múltiplo e contraditório é construída discursivamente por vários componentes como sexo, raça, etnia, classe, idade e sexualidade, entre outros. Em resumo, para Chantal Mouffe, assim como para Judith Butler, a crítica à identidade essencial não conduz necessariamente à rejeição absoluta de qualquer conceito de identidade. Dentro dessa interpretação, ainda é possível, com as ressalvas e limites, reter noções como "classe trabalhadora", "homens", "mulheres", "negros", ou outros significantes que se referem a sujeitos coletivos.

Para Chantal Mouffe, devemos reconhecer que o paradoxo entre liberdade e igualdade, que é também o paradoxo entre diferença e igualdade, é inerente à democracia moderna, pois esta tenta conciliar duas tradições distintas: a tradição liberal (que dá margem às reivindicações pela liberdade e diferença) e a tradição republicana (que dá margem à defesa da igualdade). Entre essas duas tradições não existe uma relação necessária, "sólo una imbricación histórica e contingente". (Mouffe, 2003, p. 20)

Rejeitar os esquemas dicotômicos de pensamento; não ocultar as diferenças internas de cada categoria e pensar em termos de pluralidades e diversidades; rechaçar as abordagens essencialistas são pontos sobre os quais os autores aqui utilizados estão plenamente de acordo e que os aproximam ao pós-estruturalismo.

Trata-se, fundamentalmente, de jogar com as relações de poder de sorte a que elas não se transformem em estados de dominação. Multiplicidade, intensidade, experimentação entram em cena permitindo a emergência de subjetivações coletivas e novas formas de comunidade. Essa é, ao menos, a aposta que Foucault fez e sobre a qual trata esse trabalho, em um cenário como o da contemporaneidade, no qual política é sinônimo de poder e dominação.

Por que pensar política e sujeito no contemporâneo?

Como vimos o pensamento sobre o político é algo em disputa constante, fruto do que Agnes Heller (1991) reconhece como sendo a obsessão pela exclusão. No entanto, essa disputa traz em seu bojo diferentes maneiras de concebermos as sociedades e os sujeitos, o bem comum e os indivíduos. Duas tradições são bastante exemplares e consideradas fundamentais para o debate contemporâneo sobre a emergência do político como um campo específico, exclusivo e próprio: de um lado uma visão de que a construção do consenso é possível se criada a partir de procedimentos e processos próprios de forma que consensuar sobre decisões coletivas, rumos da sociedade e participação implicaria mudanças na própria experiência e no processo de constituição dos sujeitos, por outro, indubitavelmente, essa emergência contemporânea estaria se dando exatamente pela negação do caráter constitutivo do dissenso como elemento próprio do ato democratizador, portanto, aqui, nessa visão, o sujeito existe porque age e se constitui a partir do desentendimento e do desacordo com outras formas de vida social.

Em uma visão ou em outra, o estatuto do sujeito nos parece fundamental para pensarmos a contemporaneidade e suas reconceituações, uma vez que realinhar um pensamento sobre os conflitos políticos atuais faz-se importante quando a política parece ter atingindo na contemporaneidade o lugar de dominação, exploração ou vulgarização da construção da vontade coletiva.

Aqui advogamos por uma ideia já apontada no pensamento de Mouffe (1993) que reconceitua o político a partir da noção de antagonismo, contrapondo o pensamento hegemônico sobre o político a partir da universalização da liberal democracia que tem como centralidade o fim da própria noção de dissenso, dado que qualquer conflito não discursado a partir dos parâmetros institucionais é tomado rapidamente como sendo o resquício do arcaico. Nesta visão liberal o sujeito falante do político é uma racionalidade estratégica de caráter universal, de forma que sua permanência e instituição se dariam pelo abandono completo das experiências particulares. O que nos parece sintoma do tempo presente é que o que se vê no pensamento do consenso político é sua incapacidade para abarcar o dissenso como elemento legítimo próprio do ato democrático, portanto, uma visão que escorrega o político para outras esferas da experiência social.

They respond as if it represented only a temporary delay on the road that necessarily leads to the universalization of liberal democracy: a short parenthesis before rationality reimposes its order, or a last desperate cry of the political before it is de finitively destroyed by the forces of law and universal reason. (Mouffe,1993, p. 1)

O político considerado nessa perspectiva não poderá estar restrito às instituições racionais da política liberal, ao discurso acordado pelas leis e pela universalidade de qualquer prática coletiva. Mas muito pelo contrário, o político é sempre aquilo que escapa às malhas da regulação e da conformidade com o consenso. Motivo esse que permite aos autores contemporâneos dessa perspectiva argumentar que o que sustenta um projeto democrático é exatamente a sua capacidade de deslizar desacordos e desentendimentos no âmbito da experiência coletiva dos processos de subjetivação. E é a partir dessa visão que se pode advogar por uma noção de sujeito político que não seja, portanto, a encarnação de valores universais condizentes com a lógica de regulação sobre o político.

Nesse sentido, a centralidade do estatuto do sujeito nos serve tanto para evidenciar a questão da liberdade, a possibilidade de reclamar sobre a liberdade, mas também nos mostra que há uma constitutiva impossibilidade dessa liberdade ser realizada por completo, pois o sujeito é a afirmativa constituinte de que não há uma racionalidade capaz de abarcar a transparência da experiência humana, pelo contrário, a afirmativa de uma teoria do sujeito no campo político é exatamente a afirmativa de que o projeto de racionalidade moderna não foi capaz de confrontar o algo estranhamente constituinte da própria experiência de tornar-se sujeito. Esse pluralismo dos processos de identificação que não se destina a posições perenes é que nos permitiria compreender que para além de uma racionalidade universal, o sujeito político é o esforço de tornar-se cotidianamente um sujeito em ato. Portanto, sujeito e político nesta consideração são processos da experiência que se instituem na contingência da ação e não da recuperação do projeto de conciliação.

Recebido em 28. Mai. 13

Revisado em 02. Jun. 13

Aceito em 04. Jun. 13

Marco Aurélio Máximo Prado, Doutor em Psicologia Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), é professor Adjunto do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Bolsista Produtividade do CNPq e FAPEMIG. Endereço para correspondência: Universidade Federal de Minas Gerais Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Av. Antônio Carlos, 6.627 - Caixa Postal Nº 253, CEP: 31.270-901 - Belo Horizonte - MG. Tel/Fax: (31) 3499-5042. E-mail: mamprado@gmail.com

Maria Juracy Filgueiras Toneli, Doutora em Psicologia Escolar pela Universidade de São Paulo, com pósdoutorado pela Universidade do Minho em Portugal e pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é professora Associada do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Bolsista Produtividade do CNPq. E-mail: juracy.toneli@gmail.com

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    Jun 2013

Histórico

  • Recebido
    28 Maio 2013
  • Aceito
    04 Jun 2013
  • Revisado
    02 Jun 2013
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