Acessibilidade / Reportar erro

Editorial

Editorial

Há cinquenta anos, precisamente no último dia do mês de março de 1964, o Brasil presenciou a instalação, por meio de um golpe de estado, daquela que seria a mais brutal e duradoura ditadura da história republicana brasileira. A insatisfação de parte significativa dos militares apoiada por importantes setores conservadores da sociedade civil depôs João Goulart, que tinha se tornado presidente após a renúncia de Jânio Quadros.

Uma vez instalada a ditadura civil-militar, esses rebelados enxergaram como um perigo ao país a aproximação do presidente deposto com a esquerda. O autoritarismo dos novos dirigentes deu margem à supressão dos direitos constitucionais do cidadão, à reinvenção da censura, a novas perseguições, torturas e prisões; entretanto, não podemos deixar de enfatizar que quanto mais forte se tornou esse autoritarismo, maior foi a resistência à ditadura.

Recentemente foi criada no Brasil a Comissão Nacional da Verdade (CNV), por meio da Lei 12.528/2011 (instituída em maio de 2012), para apurar as graves violações de Direitos Humanos que se desenrolaram no Brasil, entre os anos de 1946-1988.

Paulo Sérgio Pinheiro, na apresentação dos trabalhos da CNV, realizada em 2013, esclarece que a primeira linha investigativa desta comissão é resgatar os fatos de desrespeito aos direitos humanos ocorridos naquele período, em especial os eventos relacionados ao regime da ditadura civil-militar. Já a segunda linha tem tratado dos testemunhos das vítimas do terrorismo de Estado e dos depoimentos dos agentes do Estado.

Visto que a prioridade da CNV é tratar de um conjunto de informações que dizem respeito às atrocidades cometidas pelo Estado naqueles "anos de chumbo", contribuindo para desvelar a metodologia que organizou sistematicamente a repressão aos direitos humanos, não é de se admirar que o volume de documentos investigado seja de uma quantidade avassaladora.

Uma das peculiaridades do caso brasileiro é que a CNV iniciou seus trabalhos com milhões de documentos, sobre o período, já disponíveis - como, por exemplo, os do STM, utilizados no projeto Brasil Nunca Mais, e os acervos recolhidos ao Arquivo Nacional [...] O Núcleo dos Acervos do Regime Militar do Arquivo Nacional já identificou aproximadamente 250 estruturas de informações instaladas em Ministérios, Autarquias, Fundações, Universidades e Empresas Públicas. Essas estruturas, conhecidas como Divisões de Segurança e Informações e Assessorias de Segurança e Informações, foram instrumentos essenciais para a ampliação do Sistema Nacional de Informações, cujo núcleo se encontrava no SNI. (PINHEIRO, 2013, p. 2).

O ano de 2014 está repleto de expectativas à atual geração de uma Copa do Mundo de Futebol a se realizar, brevemente, pela segunda vez, em solo nacional. O desejo de sucesso dos jovens brasileiros para a conquista de mais um campeonato é semelhante àquele das juventudes que vivenciaram os "anos de chumbo" nas cinco copas que aconteceram entre os anos de 1966-1982. Contudo, junto a esta vontade de conquista que, certamente, enaltece o orgulho futebolístico, este é também o tempo de refletir a respeito de nossas outras conquistas alcançadas nesses últimos cinquenta anos, quando parte das gerações que nos antecedeu lutou e morreu pelo retorno da democracia neste país após o Golpe de 1964.

Acredito que é com essa vontade de provocar reflexão que os organizadores deste dossiê, Marcus Taborda de Oliveira (Universidade Federal de Minas Gerais) e Suzete de Paula Bornatto (Universidade Federal do Paraná), nos oferecem um interessantíssimo conjunto de artigos o qual será melhor apresentado por eles a seguir.

Em nossa seção de demanda contínua recebemos a colaboração de pesquisadores dos diversos campos da investigação educacional. A começar pelo artigo de Norberto Dallabrida (Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC) intitulado Limites sociológicos da leitura foucaultiana sobre a escolarização, como o próprio título sugere, trata-se de uma análise detalhada de uma das obras vitais de Michel Foulcault, Vigiar e punir, extraindo dela interpretações em diálogo com o pensamento de outros dois importantes pensadores do século XX, Norberto Elias e Pierre Bourdieu.

Em seguida, contamos com a colaboração da jovem pesquisadora Olivia Morais Medeiros Neta (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte) com o artigo Pela cidade, educabilidades (Príncipe, Rio Grande do Norte - século XIX)¸que tem como objetivo abordar a relação entre os espaços da cidade Príncipe (atual Caicó, Rio Grande do Norte) e as sociabilidades constituídas por práticas sociais e valores da vida material e das elaborações simbólicas.

Encontros cotidianos e a pesquisa em Educação: relações raciais, experiência dialógica e processos de identificação é o título do artigo de Mailsa Carla Pinto Passos (Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ), que a partir da análise das enunciações e diálogos que emergem dos contextos educativos, procurou compreender como as populações de afro-brasileiros estabelecem laços e alianças culturais e identitárias.

A colaboração de Paulo Gomes Lima (Universidade Federal de São Carlos - UFSCAR) aborda as contribuições dos pensadores Habermas, Mészáros, Adorno e Horkheimer e Karel Kosik sobre as questões sociais que não devem sucumbir à lógica capitalista, que resultou no artigo intitulado: Universalização da Educação Superior no Brasil: contrapontos e possibilidades.

O artigo Alunos ProUni e não ProUni nos cursos de licenciatura: evasão em foco, de autoria de Vera Lucia Felicetti e Paulo Fossatti (Centro Universitário La Salle - Unilasalle), nos traz um tema contemporâneo que discute o "Programa Universidade para Todos" frente aos índices de evasão entre as populações de estudantes atendidas e não atendidas por esta política.

Para finalizar esta seção, temos o artigo de Glauco Gomes de Menezes (Universidade Federal do Paraná - UFPR) intitulado A utilização das TIC nos processos de formação continuada e o envolvimento dos professores em comunidades de prática. Nele o autor apresenta e discute a função das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) no processo de produção de conhecimento, a partir dos conteúdos desenvolvidos pelos professores de educação básica da Rede Estadual de Educação Básica do Estado do Paraná.

Desejamos uma boa leitura!

Curitiba, março de 2014.

Marcus Levy Bencostta

Editor

  • PINHEIRO, Paulo Sérgio. Apresentação do informe de balanço da CNV Brasília, 21 de maio de 2013. Disponível em: <http://www.cnv.gov.br/images/pdf/fala_psp_21_maio_13.pdf>. Acesso em: 26/01/2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Abr 2014
  • Data do Fascículo
    Mar 2014
Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná Educar em Revista, Setor de Educação - Campus Rebouças - UFPR, Rua Rockefeller, nº 57, 2.º andar - Sala 202 , Rebouças - Curitiba - Paraná - Brasil, CEP 80230-130 - Curitiba - PR - Brazil
E-mail: educar@ufpr.br