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Revisão das isozonas de chuvas intensas do Brasil

Review of the high intensity rainfall zones of Brazil

RESUMO

O conhecimento das relações entre intensidade, duração e frequência (relação IDF) das chuvas intensas é de enorme importância para o projeto de obras na Engenharia. No entanto, a disponibilidade desses dados é limitada no Brasil. Dessa forma, com a necessidade de estimar informações nos locais sem dados, o engenheiro Taborga Torrico, em 1974, propôs oito regiões brasileiras com condições microclimáticas homogêneas (isozonas), dentro das quais o comportamento das chuvas intensas é semelhante, sugerindo ainda valores para a sua estimativa. Na falta de melhores informações, ainda hoje, os valores apresentados no referido estudo são utilizados para diversos projetos da Engenharia. Neste trabalho, é apresentada uma nova análise dessas regiões e valores de parâmetros a partir de IDFs atualmente disponíveis. Verificou-se que, de forma geral, as regiões propostas ainda são válidas. No entanto, em diversos locais, os valores propostos apresentam grandes diferenças com relação aos dados atualizados, a exemplo da região Sudeste, em que houve uma intensificação das chuvas de mais curta duração, e a região Centro-Oeste, em que os resultados atuais indicam uma situação oposta. Assim, novos valores para estimativa da chuva intensa são apresentados neste artigo.

Palavras-chave:
chuvas intensas; isozonas; Brasil

ABSTRACT

The use of rainfall intensity-duration-frequency relationships (IDF relationship) is very important for the development of Engineering projects. However, the availability of this information is limited in Brazil. Due to this, the engineer Taborga Torrico, in 1974, proposed eight regions with homogeneous climatic conditions (named "isozonas" in Portuguese) with similar rainfall behavior, suggesting parameters for heavy rainfall estimative in ungagged places within them. Due to the absence of better information, the results presented in Torrico study are still used in several Engineering projects. This paper presents a reanalysis of these regions and parameters based on recent IDF's information. The results show that, in general, the proposed regions are still valid. However, in several places, the original values present large differences compared to the updated data, such as in Southeastern Brazil, where this paper results shows an intensification of smaller-duration rainfall, or the Midwest Brazil, where results indicate an opposite situation. In this light, this paper presents updated values for intense rainfall estimation in ungagged sites of Brazil.

Keywords:
heavy rainfall zones; isozonas; Brazil

INTRODUÇÃO

As chuvas intensas são responsáveis pela erosão dos solos, pela concentração de águas pluviais em vales e zonas ribeirinhas (VIEIRA, 1998VIEIRA, D.B (1998)Análise das Máximas Intensidades de Chuvas na Cidade de Campinas. IV Simpósio Brasileiro de Hidrologia e Recursos HídricosABRH. Fortaleza/ CE.). Assim, o conhecimento das relações entre intensidade, duração e frequência (relação IDF) dessas chuvas é de enorme importância para o projeto de obras de controle de erosão, dimensionamento de aterros, estruturas hidráulicas de condução das águas pluviais, como galerias, bueiros, vertedores de barragens, além de vãos de pontes, entre outros.

Em 1956, Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.) apresentou os resultados de um amplo estudo sobre chuvas intensas em todo o Brasil, que ainda hoje é referência para os projetos de engenharia e agronomia (o estudo foi republicado em 1982 sem atualizações). Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.) obteve a relação intensidade/duração/frequência (IDF) em 98 postos pluviográficos e pluviométricos espalhados por todo o país. A maioria dos postos utilizados no estudo localizava-se na região Sul e Sudeste do país, enquanto nas outras regiões os postos utilizados, em sua maioria, concentravam-se nas capitais.

Infelizmente, em função da pequena rede de estações pluviográficas, ou outras fontes de informação de chuvas intensas, muitos projetistas eram obrigados a realizar extrapolações a partir da informação de um ou mais postos pluviográficos distantes da área do projeto em locais sem dados. Esse procedimento simplificado não permitia avaliar se os dados dos postos escolhidos eram representativos para o local do projeto, dada a característica pontual das informações traduzidas nas equações estabelecidas por Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.).

Assim, com a finalidade de diminuir o erro associado às extrapolações, Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), utilizando os mesmos dados dos 98 postos utilizados por Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.), chegou à conclusão de que o Brasil possuía oito regiões microclimáticas (isozonas), dentro das quais as relações entre as durações obtidas a partir das IDFs de Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.) foram espacializadas.

Os resultados de Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) permitiram a elaboração de um mapa de isozonas (Figura 1A). Ainda hoje, esta espacialização é utilizada para a estimativa de chuvas intensas em diversos projetos de engenharia, embora o estudo tenha sido realizado há quase 50 anos, com informações coletadas há praticamente 70 anos. Importantes obras, a exemplo da Barragem de Gameleira no Piauí (CARVALHO, 2005CARVALHO, N.L. (2005) Barragem Gameleira: Projeto BásicoRiacho Seco. Disponível em: <Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/77289098/Barragem-Gameleira >.Acesso em: 17 ago 2012.
http://pt.scribd.com/doc/77289098/Barrag...
), Projeto Executivo de Engenharia para Pavimentação do Acesso ao Observatório do Município de Itacuruba (NORCONSULT, 2011NORCONSULT. Projetos e Consultoria Ltda (2011)Projeto Executivo de Engenharia para Pavimentação do Acesso ao Observatório do Município de Itacuruba no estado de Pernambuco. v, 1 - Relatório do Projeto Básico.), o Anel Rodoviário Metropolitano de Porto Alegre (ODEBRECHT, 2009ODEBRECHT. (2009) Estudo de Viabilidade e Modelagem Para a Implantação do Segmento Leste do Anel Rodoviário Metropolitano Através de Concessão pela Parceria Público Privada ..Disponivel em: Disponivel em: http://pt.slideshare.net/PLANORS/rs-010-plano-funcional-odebrecht . Acesso em: 31 mai. 2016.
http://pt.slideshare.net/PLANORS/rs-010-...
), entre outras, foram planejadas considerando as isozonas de Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.). A recomendação para a utilização das isozonas consta também no Plano Municipal Integrado de Saneamento Básico do Município de Florianópolis (FLORIANÓPOLIS, 2009PREFEITURA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS. (2011) Plano Municipal Integrado de Saneamento Básico - PMISB. Disponível em:Disponível em: http://portal.pmf.sc.gov.br/arquivos/arquivos/pdf/03_05_2012_14.46.49.25dd2a5bc5c3f7e5f6b89701f02e2594.pdf >. Acesso em: 19 ago. 2012.
http://portal.pmf.sc.gov.br/arquivos/arq...
), além de outros no país.

Figura 1:
Mapa de isozonas (A) apresentado por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), incluindo as relações de intensidade, duração e frequência determinadas por Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.) e as utilizadas neste estudo (B).

Diante desse cenário, este trabalho buscou analisar a validade do mapa de isozonas apresentado por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), a partir de um banco de dados com cerca de mil equações IDFs disponibilizadas no Brasil (BASSO et al., 2011aBASSO, F.; TASSI, R.; ALLASIA, D.G.P.; PERSCH, C.G.; PAVI, D.R.; BASSO. R.E. (2011a) Cadastro das Chuvas Intensas no Brasil. 26ª JAI - Jornada Acadêmica UFSM Santa Maria.; 2011bBASSO, R.E.; ALLASIA, D.G.P.; TASSI, R.; BASSO F.; PERSCH, C.G.; PAVI, D.R. (2011b) Análise regional das IDFs de Otto Pfafstetter. : 26ª JAI - Jornada Acadêmica UFSMSanta Maria.). O artigo apresenta uma discussão com relação às limitações do mapeamento anterior e propõe uma atualização das isozonas, quando possível.

FUNDAMENTOS DO MÉTODO DAS ISOZONAS

Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), ao analisar mediante plotagem no papel de probabilidade de Hershfield e Wilson (Publicação OMM nº 168 de 1967ORGANIZAÇÃO METEOROLÓGICA MUNDIAL - OMM. (1967) Guia de Práticas Hidrometeorológicas . Genova. Switzerland: WMO Publication.apudTORRICO 1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) as alturas de chuva de 24 horas e de 1 hora para as 98 estações pluviográficas brasileiras analisadas por Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.), constatou que, para determinadas áreas geográficas, ao prolongar as respectivas semirretas de alturas de chuva versus duração, elas tendiam a cortar o eixo das ordenadas em um mesmo ponto.

Esse comportamento indica que nessas regiões a relação entre as precipitações de 1 hora e de 24 horas (r1h24h - ou, dito de outra forma, a fração da chuva total de 24 horas que cai em uma única hora), assim como a relação entre a precipitação de 6 minutos e 24 horas (r6m24h), é homogênea e constante, independentemente da altura da precipitação. Esse tipo de relação é conhecido como "relação entre durações" (TUCCI, 1993TUCCI, C.E.M. (1993) Hidrologia: Ciência e Aplicação . Porto Alegre: Ed, da Universidade: ABRH: EDUSP, 943 p.), e permite que essas proporções sejam transferidas para a estimativa da precipitação em locais sem dados pluviográficos.

Os resultados dessa análise permitiram a Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) propor oito regiões, ou isozonas de comportamento de chuvas intensas (Figura 1A). Assim, em uma determinada região, os dados pluviométricos coletados em uma estação poderiam ser utilizados para obter as chuvas intensas para diferentes períodos de recorrência (TR) por meio dos coeficientes de desagregação das chuvas, cujas relações (Tabela 1) foram obtidas a partir dos dados de Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.).

Tabela 1:
Coeficientes de desagregação das chuvas intensas associados às isozonas.

Uma análise sumária do mapa de isozonas do Brasil realizada por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) mostra as seguintes características:

  • As isozonas B e C tipificam a zona de influência marítima, com coeficientes de intensidades suaves.

  • As isozonas E e F tipificam as zonas continental e do Noroeste, com coeficientes de intensidade altos.

  • A isozona D tipifica as zonas de transição (entre continental e marítima). Essa isozona se prolonga, caracterizando a zona de influência do Rio Amazonas.

  • As isozonas G e H tipificam a zona da caatinga nordestina, com coeficientes de intensidade muito altos.

  • A isozona A coincide com a zona de maior precipitação média anual do Brasil, com coeficientes de intensidade baixos.

De forma curiosa, a zona de Guanabara aparece com características típicas de coeficientes de intensidade continentais (isozonas E e isozona F).

MATERIAIS E MÉTODOS

Para a realização deste estudo, foram utilizados dados de chuvas intensas obtidos de um banco de dados com quase 1.000 estações pluviográficas do Brasil com equação IDF definida (BASSO et al., 2011aBASSO, F.; TASSI, R.; ALLASIA, D.G.P.; PERSCH, C.G.; PAVI, D.R.; BASSO. R.E. (2011a) Cadastro das Chuvas Intensas no Brasil. 26ª JAI - Jornada Acadêmica UFSM Santa Maria.; 2011bBASSO, R.E.; ALLASIA, D.G.P.; TASSI, R.; BASSO F.; PERSCH, C.G.; PAVI, D.R. (2011b) Análise regional das IDFs de Otto Pfafstetter. : 26ª JAI - Jornada Acadêmica UFSMSanta Maria.).

Nesse banco de dados, verificou-se que, em alguns locais, é possível contar com mais de uma equação IDF, situação na qual foi utilizada a relação mais atualizada. Esse fato ocorreu normalmente nos locais com IDF originalmente desenvolvida por Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.). No banco de dados, somente foram incluídas IDFs obtidas a partir de dados pluviográficos, excluindo-se aquelas que eventualmente foram estimadas a partir de relações entre durações gerais, tais como as apresentadas em DAEE/CETESB (1980DEPARTAMENTO DE ÁGUAS E ENERGIA ELÉTRICA - DAEE; COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO - CETESB. (1980) Drenagem Urbana . Segunda Edição. São Paulo: CETESB.) ou Tucci (1993TUCCI, C.E.M. (1993) Hidrologia: Ciência e Aplicação . Porto Alegre: Ed, da Universidade: ABRH: EDUSP, 943 p.).

Vale destacar que, embora nesse banco de dados existam 10 vezes mais informações que as utilizadas por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), a cobertura de postos na região Centro-Oeste e Norte (Figura 1b) é restrita a algumas estações localizadas nos mesmos locais originalmente analisados por Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.).

Para realizar a comparação com o estudo realizado por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), determinou-se a utilização de um período de retorno (TR) de dez anos, seguindo a DAEE/CETESB (1980DEPARTAMENTO DE ÁGUAS E ENERGIA ELÉTRICA - DAEE; COMPANHIA AMBIENTAL DO ESTADO DE SÃO PAULO - CETESB. (1980) Drenagem Urbana . Segunda Edição. São Paulo: CETESB.) e Tucci (1993TUCCI, C.E.M. (1993) Hidrologia: Ciência e Aplicação . Porto Alegre: Ed, da Universidade: ABRH: EDUSP, 943 p.), uma vez que esse TR é usualmente utilizado para dimensionamento de obras de macrodrenagem urbana, um dos principais usos das IDF. Não foram analisados outros tempos de retorno, uma vez que não há diferenças significativas nos coeficientes para diferentes TRs (TUCCI, 1993TUCCI, C.E.M. (1993) Hidrologia: Ciência e Aplicação . Porto Alegre: Ed, da Universidade: ABRH: EDUSP, 943 p.).

Em resumo, a partir das IDFs atuais, foram obtidas informações de intensidades e relações entre durações, que foram comparadas com as apresentadas por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.). Quando necessário, a análise dos resultados de Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) foi complementada a partir dos resultados de Pfafstetter (1956PFAFSTETTER, O. (1956) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento. 426 p.; 1982PFAFSTETTER, O. (1982) Chuvas Intensas no Brasil: Relação entre Precipitação, Duração e Freqüência de Chuvas em 98 Postos com Pluviógrafos, Rio de Janeiro: Departamento Nacional de Obras e Saneamento . 426 p.), uma vez que os dados utilizados são os mesmos.

Posteriormente, as relações entre durações obtidas para cada posto foram espacializadas, utilizando ferramentas de geomática e análise visual, de maneira a gerar um zoneamento do comportamento regional, o que permitiu comparar o resultado encontrado com o trabalho de Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.).

Para melhorar a determinação das novas isozonas, nas regiões com menor quantidade de informações, utilizou-se como apoio os mapas de Unidades Climáticas do Brasil apresentado por IBGE (1997INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. (1997) Anuário estatístico do Brasil 1996 . Rio de Janeiro: IBGE .) e o apresentado por Gusmão et al. (1990GUSMÃO, R.P.; MAIO, C.R.; CARREIRA, M.E.deP.C.deS.; ESTEVES, M.G.; CASTELLO BRANCO, M.L.G.; AMÊNDOLA, P.L. (1990) Diagnóstico Brasil: a ocupação do território e o meio ambiente. Rio de Janeiro: IBGE. 170 p.), além do Atlas Pluviométrico do Brasil (CPRM, 2011COMPANHIA DE PESQUISA DE RECURSOS MINERAIS - CPRM [homepage da internet]. (2011) Atlas Pluviométrico do Brasil Disponível em: <Disponível em: http://www.cprm.gov.br/publique/Hidrologia/Mapas-e-Publicacoes/Atlas-Pluviometrico-do-Brasil-1351.html >. Acesso em: 20 jan. 2014.
http://www.cprm.gov.br/publique/Hidrolog...
) e informações contidas em Terra, Araújo e Guimarães (2008TERRA, L.A.R.; ARAÚJO, R.; GUIMARÃES, R.B. (2008) Conexões: estudos de geografia geral e do Brasil . São Paulo: Moderna. ). Para uma nomenclatura consistente das novas isozonas, foram observadas informações contidas nas Unidades Climáticas do Brasil, apresentadas por Gusmão et al. (1990GUSMÃO, R.P.; MAIO, C.R.; CARREIRA, M.E.deP.C.deS.; ESTEVES, M.G.; CASTELLO BRANCO, M.L.G.; AMÊNDOLA, P.L. (1990) Diagnóstico Brasil: a ocupação do território e o meio ambiente. Rio de Janeiro: IBGE. 170 p.).

Posteriormente, realizou-se a estatística descritiva (média, mediana, desvio padrão, mínimo e máximo) de cada nova isozona, para verificar a dispersão nos valores das relações de precipitação, avaliando, assim, se realmente a região é homogênea ou não. Também foi realizada a comparação dos valores entre as zonas, com a finalidade de estabelecer semelhanças e detectar tendências.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir da comparação entre a espacialização da r1h24h obtida neste estudo com a de Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) (Figura 2), foi possível observar que, embora existam diferenças nos valores dos coeficientes de desagregação entre chuvas, a forma geral das isozonas apresentadas por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) é relativamente bem preservada (com exceção da Isozona Continental - E). Assim, de forma geral, verifica-se que o procedimento empregado é bastante adequado e consegue captar o comportamento climático regional.

Figura 2:
Valores da r1h24h determinada neste estudo (A), e com base nos resultados de Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) (B).

Por outro lado, embora haja manutenção da forma geral das regiões homogêneas, uma análise numérica das diferenças de intensidade mostra que os coeficientes estimados por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) encontram-se desatualizados em praticamente todas as regiões do país. Na região Sudeste, por exemplo, observam-se mudanças significativas nos valores apresentados por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), existindo locais em que a r1h24h passou de 37 para 67%. Isso significa, de outra forma, que os registros disponíveis hoje em dia indicam que as chuvas estariam mais intensas, já que chove quase 70% do total de 24 horas na primeira hora de chuva, contra menos de 40% observados na primeira metade do século XX.

Para aumentar o contraste e melhor visualizar as diferenças, os valores negativos apresentados na Figura 3 mostram que os coeficientes de relações apresentados por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) são maiores do que os obtidos atualmente por meio do cálculo da diferença percentual entre os mapas da Figura 2. Nessa figura os valores positivos indicam que a relação atual é maior que a obtida por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.).

Figura 3:
Percentagem de mudança na r1h24h entre os coeficientes de Torrico e deste estudo.

A Figura 3, além de evidenciar as consideráveis mudanças no comportamento das chuvas intensas na região Sudeste, como já comentado, mostra as diferenças observadas na região Centro-Oeste, onde os resultados obtidos por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) apresentam, em alguns locais, chuva horária 15% maior que a estimada com dados mais atuais.

Assim, em termos gerais, se alguma estrutura é dimensionada segundo os coeficientes determinados por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) para chuvas com duração de 1 hora (como seriam redes de microdrenagem pluvial e muitas de macrodrenagem), as estruturas resultantes estariam superdimensionadas na região Centro-Oeste e Norte, e subdimensionadas na região Sul, Sudeste e Nordeste.

Em função dessas diferenças, procedeu-se com a rediscretização das isozonas com base nas informações mais atualizadas de chuva, utilizando a r1h24h, e informações climáticas auxiliares (mapas climáticos, atlas pluviométrico, etc.) já mencionadas. O novo mapeamento das isozonas é apresentado na Figura 4 e na Tabela 2.

Figura 4:
Proposta das novas isozonas.

Tabela 2:
Identificação das novas isozonas

Na Tabela 3 são indicados os coeficientes de desagregação (relações entre durações) que caracterizam a distribuição da chuva para um período de retorno de dez anos. Os valores apresentados correspondem à média dos valores em uma isozona, observando-se que a máxima diferença encontrada entre os valores dentro de uma única isozona foi de 2,24%. Em outras palavras, há pouca variabilidade nos resultados dentro de cada isozona, demostrando que se trata de uma região de características homogêneas. Deve-se destacar que, igualmente à metodologia desenvolvida por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), as novas isozonas correspondem a comportamentos médios regionais e não levam em consideração eventuais microclimas locais.

Tabela 3:
Coeficientes de desagregação das relações (rmin24h) entre as precipitações das novas isozonas para o período de recorrência de dez anos.

CONCLUSÃO

O trabalho de espacialização dos coeficientes de relação entre durações de chuvas intensas de 98 postos pluviométricos, apresentado por Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.), foi pioneiro no estudo da extrapolação de chuvas intensas para locais sem dados. No entanto, a falta de inclusão de séries históricas mais recentes sobre chuvas intensas torna questionável a sua aplicação para as condições atuais.

Neste artigo foram apresentados os resultados de um estudo de atualização dos coeficientes de relações entre durações de chuvas intensas. Para isso, foram utilizados dados de aproximadamente 1.000 pluviógrafos através das suas IDF's.

Com o tratamento dos dados e espacialização dos atuais padrões de relação entre as chuvas, verificou-se que, embora o trabalho de Torrico (1974TORRICO, J.J.T. (1974) Práticas hidrológicas . Rio de Janeiro: Transcon, 120 p.) ainda consiga captar as diferenças regionais nas chuvas intensas, as diferenças encontradas para os coeficientes são significativas em algumas regiões, diferenças de quase 50% nos coeficientes. Algumas regiões apresentam diferenças mais significativas, como, por exemplo, a região Sudeste, onde se verificou que maiores volumes de chuva passaram a ocorrer em menores durações, enquanto na região Centro-Oeste os resultados atuais indicam uma situação oposta.

Assim, o trabalho apresentou um novo mapa de isozonas e tabelas com os coeficientes de relações entre durações atualizados para o período de recorrência de dez anos.

Embora os resultados apresentados neste estudo sejam atualizados e contem com uma maior representatividade de postos e de séries temporais, é importante ressaltar que, particularmente, no Centro-Oeste e no Norte do Brasil, a densidade de postos pluviométricos ainda é baixa. Portanto, a incerteza associada aos resultados nestas regiões pode ser mais significativa.

Assim, sugere-se uma complementação da rede de monitoramento atualmente existente, a realização de novos estudos, e cuidados na aplicação dos resultados apresentados, especialmente na suspeita da existência de microclimas ou anomalias climáticas pontuais.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    17 Abr 2014
  • Aceito
    18 Mar 2016
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