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Estrutura de Eucalipto Roliço e o Subsistema de Vedação de Residência Unifamiliar

Round Eucalypt Structure and Wall Subsystem of Single-family Residence

RESUMO

A interface do sistema estrutural em eucalipto roliço com o subsistema de vedação requer detalhamento específico para cada tipo de parede. Como contribuição ao necessário aperfeiçoamento de técnicas construtivas mais sustentáveis, este trabalho tem como objetivo apresentar o estudo de caso de uma residência unifamiliar composta por eucalipto roliço (estrutura principal), laje-piso de madeira e vedações em taipa de mão e blocos de terra comprimida, analisando-se o comportamento das interfaces após dois anos e meio da conclusão da obra. A avaliação de desempenho dos subsistemas está baseada nos dados coletados a partir das plantas, desenhos, registros fotográficos e levantamento in loco por meio de observações diretas. Com esta avaliação, é possível identificar os cuidados necessários e apontar algumas soluções construtivas mais adequadas para este tipo de caso.

Palavras-chave:
interfaces entre subsistemas construtivos; técnicas mais sustentáveis; taipa de mão.

ABSTRACT

The interface between the structural system of round eucalyptus and the wall subsystem requires specific details for each type of wall. As a contribution to the necessary development of more sustainable construction techniques, the purpose of this research was to present a case study of a single-family house consisting of round log eucalyptus (main structure), wood slabfloors and walls of wattle-and-daub and compressed earth blocks, by analyzing the behavior of the interfaces after two and a half years of the work completion. Performance evaluation of the subsystems is based on data collected from the plans, drawings and photographs, as well as from on-site direct observation. With this evaluation it is possible to identify the necessary care and point out more adequate construction solutions for this type of case.

Keywords:
building subsystems interfaces; more sustainable techniques; wattle-anddaub.

1. INTRODUÇÃO

Do total da área ocupada por plantios florestais em 2010 no Brasil, 68,2% correspondia a plantios de Eucalyptus, 25,2% a plantios de Pinus e os demais 6,6% por outras espécies (ABRAF, 2011Associação Brasileira de Produtores de Florestas Plantadas - ABRAF. Anuário estatístico da ABRAF 2011 ano base 2010 [online]. Brasília: ABRAF; 2011. [cited 2011 oct. 25]. Available from: http://www.abraflor.org.br/estatisticas/ABRAF11/ABRAF11-BR.pdf.
http://www.abraflor.org.br/estatisticas/...
). O IBGE apontou que, em 2009Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Produção da extração vegetal e da silvicultura. Rio de Janeiro: IBGE; 2009. v. 24, p. 1-45., a produção de madeira das florestas plantadas somou 106.911.408 m3, dos quais 61% foram para papel e celulose e 39% para outras finalidades, entre elas a construção civil (Brasil & IBGE, 2009Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Produção da extração vegetal e da silvicultura. Rio de Janeiro: IBGE; 2009. v. 24, p. 1-45.).

No entanto, não há dados precisos, destes 39%, sobre a quantidade destinada especificamente à construção civil, porcentagem esta que engloba produtos que atendem também a outros setores industriais. Sabe-se apenas que existe uma tendência de crescimento do setor madeireiro, apontada pela ABRAF (2011)Associação Brasileira de Produtores de Florestas Plantadas - ABRAF. Anuário estatístico da ABRAF 2011 ano base 2010 [online]. Brasília: ABRAF; 2011. [cited 2011 oct. 25]. Available from: http://www.abraflor.org.br/estatisticas/ABRAF11/ABRAF11-BR.pdf.
http://www.abraflor.org.br/estatisticas/...
, por conta da demanda por produtos mais sustentáveis em conjunto com o aquecimento do setor da construção civil.

Atualmente a maior parte da madeira serrada produzida no País é de espécies nativas (região amazônica). No entanto, tem crescido o volume de produção oriunda de florestas plantadas (Pinus e Eucalyptus) (ABIMCI, 2009Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente - ABIMCI. Estudo Setorial 2009 ano base 2008: Indústria de Madeira Processada Mecanicamente [online]. ABIMCI; 2009. [cited 2011 oct 25]. Available from: http://www.abimci.com.br.
http://www.abimci.com.br...
).

Seguindo esta tendência (demanda por produtos mais sustentáveis, oferta crescente de madeiras de plantios florestais e aquecimento do setor da construção civil), os sistemas construtivos em madeira voltam a despertar interesse sob diferentes formas. Entre o leque de produtos madeireiros, encontra-se o sistema wood-frame, que está sendo apresentado como uma proposta alternativa de construção de casas para diversas classes sociais, e a madeira roliça como sendo um dos materiais viáveis para diversas estruturas, inclusive de edificações residenciais.

Embora a estrutura de madeira roliça não seja uma tipologia difundida na arquitetura brasileira, Lúcio Costa demonstrou já em 1940, com o seu projeto do Hotel do Parque São Clemente, em Nova Friburgo - RJ (Figura 1), que a arquitetura contemporânea não está obrigatoriamente ligada ao emprego de materiais artificiais (Bruand, 1991Bruand Y. Arquitetura contemporânea no Brasil. São Paulo: Perspectiva; 1981.), podendo-se obter resultados excepcionais utilizando-se materiais locais e de fontes renováveis. Isto aconteceu em uma época que ainda não se discutia sobre construção sustentável.

São várias as vantagens da estrutura de madeira roliça sobre outros materiais. Seu baixo peso, baixo consumo energético para processamento, baixa densidade que diminui a carga sobre as fundações e relativa facilidade de manuseio são algumas destas vantagens (Calil Junior & Brito, 2010Calil Junior C, Brito LD. Manual de projeto e construção de estruturas com peças roliças de madeira de reflorestamentos. São Carlos: EESC-USP; 2010.), sendo a madeira roliça apontada como um dos recursos florestais mais eficientes pelo seu processamento mínimo requerido entre a floresta e o produto final. A estrutura em madeira roliça pode ser mais resistente do que a madeira serrada, considerando que as fibras da madeira se mantêm inteiras, sem corte, garantindo desta forma a sua resistência original (Australian Hardwood Network, 2011Australian Hardwood Network. Round Timber - Piles, Poles & Girders [online]. Timber Development Association (NSW) Ltd. [cited 2011 oct 27]. Available from: http://www.hardwood.timber.net.au/docs/piles.pdf .
http://www.hardwood.timber.net.au/docs/p...
). Além disso, as madeiras serradas, no processo de aplainamento para garantir sua planicidade, geram resíduos em torno de 60-70% da peça original (Calil Junior & Brito, 2010Calil Junior C, Brito LD. Manual de projeto e construção de estruturas com peças roliças de madeira de reflorestamentos. São Carlos: EESC-USP; 2010.).

Diferentemente do wood-frame, cujo sistema já está consolidado e pode-se encontrar o devido detalhamento construtivo disponível em diferentes fontes de consulta (livros, internet e periódicos), a estrutura em madeira roliça carece ainda de várias especificações relacionadas a sua interface com outros subsistemas. Enquanto existem diversos estudos no Brasil sobre a estrutura em si e as ligações de seus elementos (ver Ino, 1992Ino A. Sistema estrutural modular em eucalipto roliço para habitação [tese]. São Carlos: Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo; 1992.; Partel, 1999Partel PMP. Sistemas estruturais e construtivos utilizando madeira roliça de reflorestamento [dissertação]. São Carlos: Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo; 1999.; Calil Junior & Brito, 2010Calil Junior C, Brito LD. Manual de projeto e construção de estruturas com peças roliças de madeira de reflorestamentos. São Carlos: EESC-USP; 2010.), ainda a interface entre a madeira com outros materiais de características distintas não tem sido contemplada por análises mais aprofundadas, conhecendo-se apenas o trabalho de Della Noce (1996)Della Noce LG. Parâmetros para projeto e controle da fabricação e montagem em canteiro de painéis de madeira [dissertação]. São Carlos: Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo; 1996. que tratou a interface entre pilar e viga roliça com painéis de vedação em madeira.

Figura 1
Hotel do Parque São Clemente, Nova Friburgo - RJ. a) Vista frontal. b) Detalhe da entrada (Costa, 1995Costa L. Lúcio Costa: registro de uma vivência. São Paulo: Empresa das Artes; 1995.).
Figure 1
Parque São Clemente Hotel, Nova Friburgo - RJ. a) Front view. b) Detail of the entrance (Costa, 1995Costa L. Lúcio Costa: registro de uma vivência. São Paulo: Empresa das Artes; 1995.).

Por conta disto, este trabalho tem como objetivo fazer um estudo detalhado das interfaces entre o sistema estrutural de eucalipto roliço de uma residência com o sistema de vedação composto de taipa de mão e bloco de terra comprimida (BTC), analisando as patologias surgidas dois anos e meio após a conclusão da obra, com o intuito de apontar questões importantes a serem consideradas no projeto executivo de edificações que utilizam estes materiais.

2. MATERIAL E MÉTODOS

Para este estudo, foram utilizadas as plantas e cortes do projeto arquitetônico, registros fotográficos do período da construção e do momento atual, além do levantamento resultante das observações diretas.

A estrutura metodológica se divide nas seguintes etapas:

  • descrição do histórico do projeto e construção da casa;

  • localização na planta baixa dos tipos de vedações;

  • descrição ilustrada das patologias identificadas;

  • análise das patologias;

  • elaboração de recomendações sobre detalhes construtivos.

Considerando o escopo do trabalho, este estudo pode ser classificado como uma análise preliminar de desempenho da estrutura e das vedações.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Descrição da casa em estudo

O lote de 15 × 37 m, localizado no bairro Parque Santa Mônica, no município de São Carlos, SP, apresenta um desnível ascendente da rua de 7 m até o fundo do lote (Figura 2). A obra desta residência teve seu início em 31 de julho de 2007. O partido da casa sobre pilotis originou justamente do respeito ao desnível do lote, evitando-se ao máximo a movimentação de terra.

A área total é de 194,56 m2, dividida em pavimento inferior (76,80 m2 - Figura 3) e pavimento superior (117,76 m2 - Figura 4).

A base da planta é composta por módulos de 3,20 × 3,20 m, eixo a eixo, utilizando-se também ½ módulo (1,60 × 3,20 m). As vigas intermediárias de eucalipto roliço têm a função de verga a 2,50 m de altura nos módulos que tem abertura de janelas e/ou portas, e nos módulos de parede cega compõem um quadro de 3,00 × 2,50 m (Figura 5).

3.2. Descrição da execução da estrutura em eucalipto roliço

A construção iniciou-se em agosto de 2007 se estendendo até abril de 2009, completando um total de 21 meses de obra. Os eucaliptos da espécie Citriodora, tratados em autoclave (CCA), foram adquiridos em dezembro de 2007 e foram recebidos no canteiro logo após o tratamento, sem passar por uma secagem sugerida pela norma de 15 dias. A estrutura foi montada em período de chuva, janeiro a marco de 2008, recebendo a cobertura somente em abril desse mesmo ano.

Figura 2
Foto da fachada principal da residência (face oeste) - São Carlos, SP (Foto: autoras, 2011).
Figure 2
Picture of the main facade of the residence (west side) - São Carlos, SP (Credit: authors, 2011).

Figura 3
Planta baixa - pavimento inferior com a identificação das paredes de taipa de mão (cor alaranjada) e as paredes de BTC (cor cinza escuro) - (Adaptado de Ipê Amarelo, 2011Ipê Amarelo Arquitetura e Engenharia. São Carlos; 2011.).
Figure 3
Floor plan - first floor with the identification of the wattle-and-daub walls (orange color) and the compressed earth blocks walls (dark grey color) - (Adapted from Ipê Amarelo, 2011Ipê Amarelo Arquitetura e Engenharia. São Carlos; 2011.).

Figura 4
Planta baixa - pavimento superior com a identificação das paredes de taipa de mão (cor alaranjada) e as paredes de BTC (cor cinza escuro) - (Adaptado de Ipê Amarelo, 2011Ipê Amarelo Arquitetura e Engenharia. São Carlos; 2011.).
Figure 4
Floor plan - second floor with the identification of the wattle-and-daub walls (orange color) and the compressed earth blocks walls (dark grey color) - (Adapted from Ipê Amarelo, 2011Ipê Amarelo Arquitetura e Engenharia. São Carlos; 2011.).

Figura 5
Corte esquemático A-A (Adaptado de Ipê Amarelo, 2011Ipê Amarelo Arquitetura e Engenharia. São Carlos; 2011.).
Figure 5
Schematic Section A-A (Adapted from Ipê Amarelo, 2011Ipê Amarelo Arquitetura e Engenharia. São Carlos; 2011.).

A estrutura roliça foi montada por patamares, ou seja, os pilares do pavimento térreo foram posicionados sobre o dispositivo metálico chumbado na fundação (sapata direta isolada), na cota de 4 m da rua, sendo travados provisoriamente para receber as vigas na altura do segundo piso (cota de 7 m da rua). As ligações pilar/viga foram executadas por meio de entalhes e fixadas com grampos produzidos a partir de barra de aço de construção ø 1/4”. A maioria dos pilares era descontínua, assim, os pilares do térreo tinham altura de 3 a 4 m e os pilares do pavimento superior até a cumeeira tinham aproximadamente 4 m. Depois da colocação dos pilares do segundo pavimento, estes eram travados por vigas roliças (inclinadas nos oitões), fechando assim o pórtico, recebendo depois as terças-ripas (2,5 × 12 cm) de eucalipto serrado que venciam o vão de 3,00 m do módulo.

3.3. Análise das patologias identificadas

A principal patologia encontrada foi o “descolamento” das vedações dos pilares e das vigas. Isto ocorreu tanto nas vedações de taipa de mão como de bloco de terra comprimida (BTC). Este descolamento foi provocado pela retração do eucalipto como consequência da perda de umidade. Observando a folga gerada entre o anel metálico e o topo do eucalipto, mediu-se retração de até 12 mm em alguns pontos (Figura 6).

Percebeu-se que a maioria das patologias desenvolvidas nas interfaces entre o sistema de vedação e a estrutura em eucalipto roliço se encontra nas paredes das fachadas norte e oeste. A hipótese é o fato dessas fachadas estarem mais expostas ao sol direto e às chuvas.

No caso da interface do pilar A4 (Figura 7a), a retração do eucalipto criou uma fresta que proporcionou a infiltração de água, inchando o barro da taipa de mão e, consequentemente, provocando o descolamento da argamassa de revestimento (Figura 7b).

Figura 6
folga entre o pilar e o anel metálico.
Figure 6
gap between the column and the metal ring.

Seguindo por esta fachada norte, em um módulo recuado, entre os pilares B8 e B9, percebe-se o descolamento de toda a vedação de taipa de mão em relação à estrutura (Figuras 8 a 10).

Com as vedações de BTC, a retração do eucalipto provocou a quebra da argamassa de acabamento (Figura 11). Além do mais, os blocos estão apresentando fissuras em toda a parede, mostrando que não resistem a nenhum movimento da estrutura, no caso o eucalipto roliço.

Outra patologia observada foi na viga de piso, entre os pilares A2 e B2, que fletiu e deslocou a meia parede de taipa de mão, fletindo também o batente da janela em até 3 cm. A hipótese para este comportamento da viga é a qualidade da peça de eucalipto utilizada como viga que não suportou a baixa carga de uma meia parede. Além disso, a trama em diagonal da taipa não ajuda a segurar o peso do barro, empregando mais esforço sobre a viga (Figura 12).

Figura 7
Pilar A4 e parede de taipa de mão. a) Localização em planta; b) Descolamento da argamassa de revestimento da parede de taipa de mão.
Figure 7
Column A4 and the wattle-and-daub wall. a) Location in the plan; b) Detachment of the coating of the wattle-and-daub wall.

Figura 8
Fachada esquemática com a localização das fotos.
Figure 8
schematic elevation with the location of the photos.

Figura 9
Pilar B8. a) a fresta superior, entre a viga e a vedação, chegou a medir 12 mm; b) a fresta inferior entre o pilar e a vedação mediu 10 mm.
Figure 9
Column B8. a) the upper gap, between the beam and the wall, came to be 12 mm; b) the lower gap between the column and the wall, measured 10 mm.

A casa passou por uma primeira manutenção em dezembro de 2010, quando foram preenchidas as frestas entre os pilares e a vedação em taipa de mão, resultantes do processo de secagem, principalmente das toras. Depois de oito meses desse reparo, surgiram novas fissuras na parede cega do quarto (NORTE) (Figura 13).

Figura 10
Pilar B9 - a fresta entre o pilar e a vedação mediu 10 mm.
Figure 10
Column B9 - the gap between the column and the wall measured 10 mm.

Existem algumas hipóteses para a causa destas patologias, além da retração das toras de eucalipto:

  • estrutura portante flexível (as ligações são articuladas);

  • características individuais de cada peça de eucalipto;

  • alta incidência de sol e chuva;

  • detalhes construtivos insuficientes nos encontros para absorver os distintos comportamentos dos materiais: madeira roliça, taipa de mão e BTC;

  • vigas de aproximadamente 20 cm de diâmetro com paredes mais finas (~12-14 cm);

  • secagem insuficiente das camadas de barro da taipa;

  • acomodação da estrutura e da taipa de mão;

  • execução da montagem da estrutura de eucalipto e do barreamento da taipa em período de chuva.

3.4. Recomendações sobre projetos com eucalipto roliço

Tendo em vista estas hipóteses, alguns aspectos precisam ser considerados na construção de estrutura de madeira roliça com suas respectivas vedações:

Figura 11
Pilar B4 e a parede de BTC. a) localização das fotos (11b, c); b, c) Argamassa de acabamento do BTC danificada.
Figure 11
Column B4 and the compressed earth blocks wall. a) location of the photos (11b, c); b, c) Damaged coating of the compressed earth blocks wall.

Figura 12
Parede entre os pilares A2 e B2. a) trama em diagonal da taipa de mão; b) execução da meia parede de taipa de mão; c) batente fletido da janela.
Figure 12
Wall between the columns A2 and B2. a) diagonal woven lattice of the wattle-and-daub; b) building the half wattle-and-daub wall; c) flexed window jamb.

Figura 13
Pilar B8 e parede interna com fissura recente.
Figure 13
Column B8 and the inner wall with recent cleft.

  1. Seleção das peças de eucalipto antes do tratamento em autoclave, utilizando o critério visual: fuste mais retilíneo; superfície mais uniforme; sem rachadura de topo. Separação das peças por peso, ou seja, mesmo sendo de uma mesma espécie, cada árvore possui características distintas que afetam principalmente nos seus comportamentos físicos (rachaduras de topo, estabilidade dimensional) e mecânicos (resistência à flexão).

  2. Ainda nessa etapa, recomenda-se, também, verificar se estas peças passaram pelo estágio de secagem no pátio da usina, até alcançarem estado considerado seco, mesmo que seja superficial. Este tempo depende das condições do clima local.

  3. Outra recomendação que deve ser considerada é a secagem pós-tratamento, normalmente nas usinas este tempo leva em torno de 15 dias.

  4. Estocagem na obra das toras - deve receber o mesmo tratamento que é dada às madeiras serradas, ou seja, entabicar e separar por diâmetro e comprimento, de maneira que possa criar condições favoráveis para continuar o processo de secagem.

No planejamento de obra, estes tempos devem ser considerados para adequar esta etapa de construção com o período de chuva. É quase óbvia esta recomendação, mas, tratando-se de construção em madeira, ainda mais em eucalipto roliço, este tempo antes da aquisição deste material é bastante distinto do tempo da compra dos materiais que passaram por produção industrial.

3.5. Recomendações sobre detalhes construtivos

Considerando as patologias analisadas, percebe-se que grande parte dos problemas surgiu com a retração do eucalipto, seja na função de pilar como de viga. Sabe-se que a madeira é um material que dilata e retrai conforme a umidade do meio ambiente, podendo ser maior ou menor de acordo com a espécie da madeira ou com seu tempo de uso. Portanto, uma coisa é certa: a interface entre a madeira e materiais com outras características precisa ser flexível.

As recomendações sobre a interface entre o eucalipto roliço e a taipa de mão são basicamente as seguintes:

  • Sistema de macho e fêmea entre a estrutura e a trama da taipa: os lados do eucalipto que receberão a parede devem ser levemente aplainados para serem fixadas réguas ou ripas, funcionando como “macho”; o quadro da trama precisa ser feito de réguas espessas onde serão feitos rasgos que desempenharão a função de “fêmea”.

  • Aplicação de resina elástica entre o barro e o eucalipto roliço: existem no comércio resinas de poliuretano vegetal, como aquela à base de mamona, que pode desempenhar este papel de impermeabilização das juntas ao mesmo tempo em que acompanha a movimentação da madeira.

  • Sobre o comportamento da estrutura de eucalipto roliço junto com a vedação de BTC, concluiu-se que este material é muito rígido para absorver qualquer movimento da madeira, principalmente se for da viga. O BTC precisa de uma base muito estável para poder ser assentado, o que não é oferecido pelas vigas de madeira. Caso a viga seja de material rígido e apenas os pilares de madeira, existe uma possibilidade de fazer uma interface com o BTC utilizando-se outro elemento de madeira entre a estrutura e a parede que “abrace” o BTC, utilizando-se também uma resina entre o BTC e este elemento em “U” para impermeabilizar a junta.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É difícil para o consumidor ter o controle de quanto tempo a madeira ficou no pátio secando. Uma forma de amenizar isto seria sua estocagem no canteiro de obras por um tempo necessário para que a madeira seque mais antes de ser usada, minimizando assim o efeito de grandes retrações.

Esta questão de usar madeira com grau de umidade ainda muito alto pode ter levado à deformação horizontal da peça utilizada como viga. A madeira ainda verde trabalha mais sob o carregamento do que a madeira seca. Este foi o caso da viga que fletiu excessivamente com o peso da parede. Porém, pode-se também questionar se as peças utilizadas foram aquelas que tinham menor resistência à flexão, assim mesmo recebendo cargas menores do que outras vigas (vão modular de 3,20 m).

Considerando que a madeira é um material que sempre terá retrações e dilatações conforme a umidade do meio ambiente, passa a ser de fundamental importância que os elementos de ligação com outros materiais sejam flexíveis. Esses elementos absorveriam a movimentação da madeira e não tencionariam os materiais que compõem a vedação, como o barro da taipa de mão e os blocos de terra comprimida, que, por sua vez, são rígidos.

Estes detalhes de interface precisam ser testados e melhor desenvolvidos. São justamente os detalhes que podem comprometer a difusão de certas técnicas mais sustentáveis, como é o caso de estruturas em madeira roliça.

REFERÊNCIAS

  • Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente - ABIMCI. Estudo Setorial 2009 ano base 2008: Indústria de Madeira Processada Mecanicamente [online]. ABIMCI; 2009. [cited 2011 oct 25]. Available from: http://www.abimci.com.br
    » http://www.abimci.com.br
  • Associação Brasileira de Produtores de Florestas Plantadas - ABRAF. Anuário estatístico da ABRAF 2011 ano base 2010 [online]. Brasília: ABRAF; 2011. [cited 2011 oct. 25]. Available from: http://www.abraflor.org.br/estatisticas/ABRAF11/ABRAF11-BR.pdf
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  • Australian Hardwood Network. Round Timber - Piles, Poles & Girders [online]. Timber Development Association (NSW) Ltd. [cited 2011 oct 27]. Available from: http://www.hardwood.timber.net.au/docs/piles.pdf .
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  • Bruand Y. Arquitetura contemporânea no Brasil São Paulo: Perspectiva; 1981.
  • Calil Junior C, Brito LD. Manual de projeto e construção de estruturas com peças roliças de madeira de reflorestamentos. São Carlos: EESC-USP; 2010.
  • Costa L. Lúcio Costa: registro de uma vivência São Paulo: Empresa das Artes; 1995.
  • Della Noce LG. Parâmetros para projeto e controle da fabricação e montagem em canteiro de painéis de madeira [dissertação]. São Carlos: Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo; 1996.
  • Ino A. Sistema estrutural modular em eucalipto roliço para habitação [tese]. São Carlos: Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo; 1992.
  • Ipê Amarelo Arquitetura e Engenharia. São Carlos; 2011.
  • Partel PMP. Sistemas estruturais e construtivos utilizando madeira roliça de reflorestamento [dissertação]. São Carlos: Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo; 1999.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2012

Histórico

  • Recebido
    14 Set 2011
  • Aceito
    21 Fev 2012
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