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Perfil sociodemográfico e profissional de fisioterapeutas e origem das suas concepções sobre ética

Sociodemographic and professional profile of physical therapists and origin of their conceptions of ethics

Resumos

INTRODUÇÃO: Os estudos sobre o perfil de profissionais de saúde são informações relevantes para possibilitar aos órgãos de saúde, às instituições de ensino e aos órgãos de classe o planejamento de ações assistenciais e educativas. As ações em saúde e suas avaliações precisam levar em consideração o perfil dos profissionais disponíveis e o contexto macroeconômico de determinados grupos, de acordo com a época e a região em que se encontram, para o sucesso e a qualidade das atividades planejadas. OBJETIVO: Conhecer o perfil sociodemográfico e profissional dos fisioterapeutas que atuam na cidade de Santa Maria, RS, e a origem de suas concepções sobre ética. MATERIAIS E MÉTODOS: Foi realizado um estudo transversal e descritivo, com abordagem quantitativa. Participaram da pesquisa fisioterapeutas no exercício de atividades assistenciais e/ou educativas no campo da fisioterapia. Os dados foram coletados por meio de questionário semiestruturado, construído para essa finalidade. Para processamento e análise dos dados utilizou-se o banco de dados Microsoft® Excel 2002 e o pacote estatístico SAS (Statistical Analysis System), versão 8.02. RESULTADOS: A amostra consistiu de 167 fisioterapeutas, em sua maioria adultos jovens, entre 22 e 35 anos (60%), sendo 83% mulheres. Os fisioterapeutas atuavam predominantemente de forma autônoma, sem vínculo empregatício (52,4%), e também em serviços públicos (23,5%) e privados (20,5%); atendiam em domicílio, em clínicas e consultórios com maior frequência; e possuíam capacitação em diversos níveis e áreas. A área músculo-esquelética figurou como a de maior demanda de serviço, sendo, consequentemente, a mais procurada para a realização de especialização. A clientela predominante era de adultos, mulheres e idosos. Os conhecimentos sobre ética, em geral, eram provenientes da família e dos desafios colocados pela prática profissional. CONCLUSÃO: No exercício da profissão predominam os profissionais jovens, embora haja uma parcela significativa de fisioterapeutas experientes e renomados. O processo de crescimento da profissão é constante, tanto em áreas já consagradas como nas emergentes. Todavia, as questões éticas precisam ser mais discutidas tanto na formação acadêmica quanto nas atividades cotidianas.

Fisioterapia; Ética profissional; Recursos humanos


INTRODUCTION: Studies about the profile of health professionals provide relevant information which allows health agencies, educational institutions and professional organizations to project educational and assistential actions. These actions and their evaluation have to take into account the profile of the available professionals, as well the macroeconomic context of the groups considered, according to the period and the region they are placed, in order to give success and quality on the planned activities. OBJECTIVE: To know the sociodemographic and professional profile of physical therapists who work in the city of Santa Maria, RS, and the origin of their conceptions of ethics. MATERIALS AND METHODS: A descriptive and transversal study, with quantitative approach. Physical therapists working with professional and/or educational activities in the physical therapy field participated in the research. Data were collected through a semi-structured instrument construct for that purpose. The statistical package SAS (Statistical Analysis System), version 8.02, was used to process and analyze the data. RESULTS: The sample consisted of 167 physical therapists, most of them young adults, between 22 and 35 years old (60%) and 83% were women. They are predominantly self-employed, without working contract (52,4%), and also work in public (23,5%) and private (20,5%) services; they most often provide home care or work in private clinics and offices. They have competence in distinct levels and fields, being the musculoskeletal the one with higher request of their professional services. Consequently, this area is the most desired to do specialization. The predominant clientele are adults, women and the elderly. The origin of knowledge about ethics comes from the family and from the challenges imposed by the professional practice. CONCLUSION: Although there are many experienced and renowned physical therapists, the young ones predominate in the professional practice. Growing professional process is constant, not only in traditional fields but also in the emergent ones. Ethical issues must be more discussed not only during the formal academic course but also during the daily professional activities.

Physical therapy; Ethics professional; Human resources


ARTIGOS ORIGINAIS

Perfil sociodemográfico e profissional de fisioterapeutas e origem das suas concepções sobre ética

Sociodemographic and professional profile of physical therapists and origin of their conceptions of ethics

Ana Fátima Viero BadaróI; Dirce GuilhemII

IDoutora em Ciências da Saúde - Universidade de Brasília (UnB), docente do Departamento de Fisioterapia e Reabilitação do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS - Brasil, e-mail: badaroana@uol.com.br

IIDoutora em Ciências da Saúde - Universidade de Brasília (UnB), docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF - Brasil, e-mail: guilhem@unb.com

RESUMO

INTRODUÇÃO: Os estudos sobre o perfil de profissionais de saúde são informações relevantes para possibilitar aos órgãos de saúde, às instituições de ensino e aos órgãos de classe o planejamento de ações assistenciais e educativas. As ações em saúde e suas avaliações precisam levar em consideração o perfil dos profissionais disponíveis e o contexto macroeconômico de determinados grupos, de acordo com a época e a região em que se encontram, para o sucesso e a qualidade das atividades planejadas.

OBJETIVO: Conhecer o perfil sociodemográfico e profissional dos fisioterapeutas que atuam na cidade de Santa Maria, RS, e a origem de suas concepções sobre ética.

MATERIAIS E MÉTODOS: Foi realizado um estudo transversal e descritivo, com abordagem quantitativa. Participaram da pesquisa fisioterapeutas no exercício de atividades assistenciais e/ou educativas no campo da fisioterapia. Os dados foram coletados por meio de questionário semiestruturado, construído para essa finalidade. Para processamento e análise dos dados utilizou-se o banco de dados Microsoft® Excel 2002 e o pacote estatístico SAS (Statistical Analysis System), versão 8.02.

RESULTADOS: A amostra consistiu de 167 fisioterapeutas, em sua maioria adultos jovens, entre 22 e 35 anos (60%), sendo 83% mulheres. Os fisioterapeutas atuavam predominantemente de forma autônoma, sem vínculo empregatício (52,4%), e também em serviços públicos (23,5%) e privados (20,5%); atendiam em domicílio, em clínicas e consultórios com maior frequência; e possuíam capacitação em diversos níveis e áreas. A área músculo-esquelética figurou como a de maior demanda de serviço, sendo, consequentemente, a mais procurada para a realização de especialização. A clientela predominante era de adultos, mulheres e idosos. Os conhecimentos sobre ética, em geral, eram provenientes da família e dos desafios colocados pela prática profissional.

CONCLUSÃO: No exercício da profissão predominam os profissionais jovens, embora haja uma parcela significativa de fisioterapeutas experientes e renomados. O processo de crescimento da profissão é constante, tanto em áreas já consagradas como nas emergentes. Todavia, as questões éticas precisam ser mais discutidas tanto na formação acadêmica quanto nas atividades cotidianas.

Palavras-chave: Fisioterapia (Especialidades). Ética profissional. Recursos humanos.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Studies about the profile of health professionals provide relevant information which allows health agencies, educational institutions and professional organizations to project educational and assistential actions. These actions and their evaluation have to take into account the profile of the available professionals, as well the macroeconomic context of the groups considered, according to the period and the region they are placed, in order to give success and quality on the planned activities.

OBJECTIVE: To know the sociodemographic and professional profile of physical therapists who work in the city of Santa Maria, RS, and the origin of their conceptions of ethics.

MATERIALS AND METHODS: A descriptive and transversal study, with quantitative approach. Physical therapists working with professional and/or educational activities in the physical therapy field participated in the research. Data were collected through a semi-structured instrument construct for that purpose. The statistical package SAS (Statistical Analysis System), version 8.02, was used to process and analyze the data.

RESULTS: The sample consisted of 167 physical therapists, most of them young adults, between 22 and 35 years old (60%) and 83% were women. They are predominantly self-employed, without working contract (52,4%), and also work in public (23,5%) and private (20,5%) services; they most often provide home care or work in private clinics and offices. They have competence in distinct levels and fields, being the musculoskeletal the one with higher request of their professional services. Consequently, this area is the most desired to do specialization. The predominant clientele are adults, women and the elderly. The origin of knowledge about ethics comes from the family and from the challenges imposed by the professional practice.

CONCLUSION: Although there are many experienced and renowned physical therapists, the young ones predominate in the professional practice. Growing professional process is constant, not only in traditional fields but also in the emergent ones. Ethical issues must be more discussed not only during the formal academic course but also during the daily professional activities.

Keywords: Physical therapy (Specialties). Ethics professional. Human resources.

Introdução

A área de recursos humanos em saúde ocupa posição estratégica no âmbito da discussão e da implementação das políticas nacionais de saúde. Acredita-se que a qualidade dos serviços prestados na área da saúde tem estreito vínculo com a formação, o desempenho e a gestão dos recursos humanos (1, 2). Em vista disso, os estudos sobre o perfil de profissionais de saúde adquirem relevância, uma vez que possibilitam aos órgãos de saúde, às instituições de ensino e aos órgãos de classe o planejamento de ações assistenciais e educativas. As ações em saúde e suas avaliações precisam levar em consideração o perfil dos profissionais disponíveis e o contexto macroeconômico de determinados grupos, de acordo com a época e a região em que se encontram, para o sucesso e a qualidade das atividades planejadas (1).

Na fisioterapia, a realidade da atuação desses profissionais é ainda pouco estudada. Suas características sociodemográficas são apontadas por alguns estudos, em âmbito nacional, com enfoque localizado geograficamente e/ou por áreas de atuação (3-6). Frequentemente, os fisioterapeutas trabalham de forma autônoma, sem vínculo empregatício, sem garantia de direitos sociais, como férias, décimo terceiro, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), licenças e aposentadoria. Essa é uma situação que interfere diretamente na prática profissional, e os conflitos que dela emergem devem ser explicitados para que se possa pensar em promover mudanças.

Durante aproximadamente 50 anos, a fisioterapia evoluiu de uma profissão da saúde que nasceu da intenção de auxiliar o médico e com atuação limitada à reabilitação motora, para uma profissão autônoma, com inserção nas diversas áreas clínicas e com espaços ampliados na prevenção e na promoção da saúde (7, 8). Outras possibilidades de atuação encontram-se em áreas como a educação, as políticas públicas, a indústria, o ambiente de trabalho, o esporte e o lazer. No cenário nacional, o desenvolvimento da profissão foi acompanhado pelo crescimento da oferta de cursos de graduação, que evoluíram de seis, em 1970, para 48, em 1991, (8) alcançando o aumento considerável, em 2008, para 505 cursos de graduação em fisioterapia no Brasil (9).

Esse crescimento está relacionado com as mudanças ocorridas no perfil da saúde da população e na educação dos profissionais. Os avanços na saúde estiveram vinculados com o início da Reforma Sanitária, nos anos 1970, que passou a enfocar uma intervenção complexa e integral, direcionada para a promoção da saúde. Na educação, essas mudanças foram alicerçadas na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1996, que determinou as Diretrizes Curriculares para os cursos de graduação e a consequente atualização dos currículos e do ensino das profissões da saúde (10). Entre as recomendações das Diretrizes Curriculares para os cursos de Fisioterapia, promulgadas em 2002, está a ênfase na formação ética dos fisioterapeutas, no que se refere aos princípios necessários à sua formação e atuação (11).

As questões éticas perpassam o exercício profissional, com concepções advindas da formação moral, da deontologia, acrescidas de reflexões conceituais e de desafios provenientes da experiência profissional. A ética deontológica caracteriza-se por normas a serem seguidas. Essas normas são provisórias, orientam comportamentos cotidianos e atitudes práticas para atender a determinadas situações e delimitar o caminho das pessoas inseridas em um grupo (12). Por sua vez, a ética, compreendida como campo disciplinar, seria a representação de uma concepção de vida, um estilo (12), ou seja, "um questionamento das práticas, uma interrogação sobre o como e o por que se faz" (13, p. 43). Esses conhecimentos não fazem parte de um saber formal e requerem avaliação e acompanhamento constantes para o desenvolvimento ético dos fisioterapeutas (14).

Considerando-se os aspectos mencionados, este estudo foi delineado com o intuito de possibilitar um novo olhar sobre a formação e a inserção profissional dos fisioterapeutas. Teve como objetivo conhecer o perfil sociodemográfico (sexo, faixa etária, escolaridade e remuneração) e profissional (local e situação de trabalho, formação e capacitação, campo e áreas de atuação, clientela, demanda de serviços e participação em associações de classe) dos fisioterapeutas, bem como a origem de seus conhecimentos sobre ética.

A pesquisa foi realizada na cidade de Santa Maria, RS, que possui aproximadamente 270 mil habitantes e se destaca economicamente no setor terciário pelo comércio e pela prestação de serviços nas áreas da saúde e da educação. Como polo regional de saúde, a cidade oferece grande variedade de serviços públicos e privados. Possui sete hospitais, entre os quais está o Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM), que é referência no atendimento pelo SUS.

Esse complexo assistencial institucionalizado inclui a fisioterapia, que abrange ainda a assistência domiciliar e atividades docentes. Há três cursos de Fisioterapia na cidade: o da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), o da Universidade Franciscana (Unifra) e o da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra). Entidades de classe têm sede na cidade, como é o caso da Associação dos Fisioterapeutas de Santa Maria (AFISM) e a sede regional do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional - RS - 5ª região (Crefito-5).

Materiais e métodos

Os dados referentes ao perfil sociodemográfico e profissional dos fisioterapeutas estudados e à origem da sua concepção sobre ética foram coletados por meio de instrumento semiestruturado, construído para esse fim e validado por teste piloto com fisioterapeutas de outras cidades e, também, pela apreciação de pesquisadores experientes em áreas de conhecimento relacionadas ao estudo proposto e à metodologia utilizada. A coleta ocorreu no período de novembro de 2006 a fevereiro de 2007. O estudo é descritivo, com abordagem quantitativa, e caracteriza-se por ser um estudo transversal, em que os dados relativos a cada indivíduo expressam aquela população no momento da coleta.

Para localizar os potenciais participantes deste estudo, tomou-se como referência a relação dos fisioterapeutas e das empresas de fisioterapia com registro na cidade, fornecida pelo Crefito-5 em 1º de novembro de 2006. Buscou-se a complementação desses endereços em anúncios de jornais ou com colegas. A população deste estudo foi procurada e localizada nos serviços de atendimento fisioterapêutico (hospitais, clínicas, consultórios, ambulatórios) e nos cursos de Fisioterapia.

Os critérios de inclusão no estudo foram os seguintes: ser fisioterapeuta com atuação na assistência e/ou na docência da fisioterapia; exercer atividades em Santa Maria, RS, independente de ter ou não registro profissional na cidade; e aceitar participar da pesquisa. Foram excluídos os fisioterapeutas que, mesmo listados na relação do Crefito-5, não atendiam plenamente aos critérios de inclusão.

Dos 276 profissionais listados pelo Crefito-5, foram incluídos na população deste estudo outros 27 fisioterapeutas, que também exerciam a profissão em Santa Maria, mas possuíam seu registro profissional em outra cidade. Foram excluídos os indivíduos que não residiam mais na cidade, não atuavam mais no campo da fisioterapia assistencial ou trabalhavam em outra cidade, ainda que residindo em Santa Maria. Assim, a população consistiu em 259 fisioterapeutas, e a amostra resultou em 167 participantes, uma vez que 38 não devolveram o instrumento de pesquisa e com 54 deles não se conseguiu estabelecer nenhum contato.

No que diz respeito às questões éticas, a pesquisa pautou-se pelas diretrizes preconizadas na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e nas normativas da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep). O projeto deste estudo foi aprovado no CEP-UFSM (Processo n. 23081.015630/2006-25; em 07/11/06).

Os dados coletados foram codificados e transcritos utilizando-se o banco de dados Microsoft® Office Excel 2002 e processados pelo pacote estatístico SAS (Statistical Analysis System), versão 8.02. Os resultados foram compilados por meio de frequência simples e por alguns cruzamentos, e analisados de forma descritiva.

Resultados e discussão

Perfil sociodemográfico e profissional dos fisioterapeutas

As características sociodemográficas do grupo investigado são apresentadas na Tabela 1, onde estão elencadas as informações ligadas ao sexo, à faixa etária, ao período da graduação, à realização de outro curso de graduação e à renda mensal.

A faixa etária dos fisioterapeutas variou de 22 a 58 anos, 40,7% tendo até 30 anos, o que aponta para uma predominância de profissionais jovens e em início de carreira. Dos 31 aos 40 anos, encontraram-se 32,3% dos participantes. Quanto ao sexo, 83% eram mulheres, e a proporcionalidade encontrada entre elas e os homens foi de cinco para um. Verificou-se que a maior discrepância na proporção entre mulheres e homens foi na faixa etária entre os 31 e 40 anos (9, 8:1). Na década de 1990, a proporção foi de 9,0 mulheres para cada homem, o que demonstra um afastamento masculino da profissão naquele período. Na amostra deste estudo, esses índices (4, 3:1) tornam-se mais próximos daqueles encontrados nos anos 1980 (3,0:1).

Ao se verificar os dados sobre a escolaridade, notou-se que, a partir do ano 2000, o aumento do número de fisioterapeutas foi mais expressivo e superou o número de formados na década de 1990. No que se refere à instituição formadora, 74,7% graduaram-se na UFSM, 10,2% formaram-se na Universidade de Cruz Alta (Unicruz), 6,6% na Unifra e 4,8% em outras instituições.

A procura por outro curso, que ocorreu nos anos 1990, foi uma iniciativa mais observada também entre as mulheres. Dos 13 fisioterapeutas que realizaram outro curso de graduação, apenas um era do sexo masculino. Essa foi uma situação que não se manteve, apesar do vultoso crescimento do número de fisioterapeutas nos últimos anos.

Quanto à remuneração, verificou-se que 44,7% dos fisioterapeutas recebiam até quatro salários mínimos, e 38,3% referiram renda acima de nove salários.

Na Tabela 2, apresentam-se as características da atuação profissional dos fisioterapeutas. Foram observados o local de trabalho, a atuação no ensino de Fisioterapia, a dedicação a mais de um emprego, o exercício de outra atividade profissional e a presença de vínculo empregatício.

Verificou-se a predominância da assistência realizada em consultórios e em clínicas (41%), seguida pelo atendimento domiciliar (29,7%). Muitos se envolveram com a docência (32,9%) e, destes, 19,5% ainda estavam em atividade. A maioria dos profissionais pesquisados (52,4%) trabalhava como autônoma e 33,1% possuíam vínculo empregatício. Uma parcela desses fisioterapeutas (26%) referiu possuir mais de um emprego, outros (14,7%) exerciam outra atividade profissional concomitante ao exercício da fisioterapia.

Quanto à área de atuação profissional, a maioria dos fisioterapeutas (76,6%) apontaram a traumato-ortopedia como a de maior demanda de serviços, seguida da neurologia (60%), acompanhada de perto da reumatologia (55,7%) e da pneumologia (50,3%). Com índices menores de demanda foram mencionadas as áreas de cardiologia (22,1%), dermato-funcional (22,1%), saúde pública (21,5%) e gineco-obstetrícia (18,5%). A acupuntura e as áreas de urologia e de gerontologia foram menos apontadas, mas se apresentaram como áreas de demanda principal para muitos fisioterapeutas.

Quanto ao público atendido, os idosos, os trabalhadores e as mulheres foram referidos por 82% dos fisioterapeutas. Na sequência, foram apontados os adolescentes (57,4%), as crianças (32,9%) e os escolares (24,5%).

Observou-se que 103 fisioterapeutas trabalhavam com convênios e que, para 81,5% deles, esses atendimentos significavam mais de 50% da sua demanda de serviço. Já a assistência a pacientes particulares representou até 25% da clientela atendida por 62 fisioterapeutas; entretanto, outros 42 atendiam em torno de 80% a 100% dessa categoria. Esses dados demonstram que os fisioterapeutas dependem muito dos convênios para se manterem atuando na profissão.

Em relação à participação em associações de classe, apenas 31,7% referiram participar de alguma delas, e a maioria dos que participavam (70%) procuravam a entidade local, a AFISM. O pequeno envolvimento dos fisioterapeutas com suas entidades representativas contraria o Código de Ética dos Fisioterapeutas, cujos art. 17 e 18 do cap. III tratam, respectivamente, da atuação dos fisioterapeutas nos órgãos de classe e do dever desses profissionais de pertencer a, no mínimo, uma entidade associativa (15). Todavia, Battisti e Quirino lembram que a Constituição Federal, no art. 8, refere que a associação profissional é de livre vínculo, e sugerem que a palavra "dever", que aponta para a obrigatoriedade, poderia ser substituída por "recomendável" (16).

Na Tabela 3 são apresentados os cursos de pós-graduação realizados pelos fisioterapeutas. Consideraram-se os níveis de especialização, mestrado e doutorado, concluídos ou em fase de conclusão.

Os dados sobre a formação em nível de pós-graduação revelam que 63,5% dos participantes cursaram a especialização, e 7,5% deles fizeram duas. Entre os anos de 2001 e 2005, uma parcela significativa dos fisioterapeutas (38,7%) a realizou, superando as três décadas anteriores, o que aponta para a inserção da pós-graduação como parte fundamental do processo de formação dos fisioterapeutas. As áreas da especialização são diversas, destacando-se a músculo-esquelética, na qual estão capacitados 31,5% dos fisioterapeutas, entre os quais 53% especializaram-se em traumato-ortopedia. As outras áreas mais referidas foram saúde pública (11,7%), respiratória (11,7%) e dermato-funcional (9,1%). Aparecem, ainda, duas áreas mais novas - a osteopatia e a uroginecologia -, que estão se inserindo no contexto de trabalho dos fisioterapeutas com grandes perspectivas de crescimento. A acupuntura, apesar de não ser propriamente uma área de atuação, também apresentou crescimento no número de fisioterapeutas com ela envolvidos.

A realização do curso de mestrado foi referida por 33 fisioterapeutas, e 67,7% deles o realizaram a partir do ano 2000. A área de ciências básicas foi a mais procurada, talvez pela maior oferta de cursos. Encontraram-se 11 fisioterapeutas com doutorado realizado nas áreas de ciências da saúde e, entre eles, apenas um teve sua formação na década de 1990.

A busca por capacitação pelos fisioterapeutas levou o Coffito a emitir títulos de especialista em distintas áreas, estando a traumato-ortopedia funcional, a neuro-funcional, a acupuntura e a respiratória entre as primeiras a serem normatizadas. No entanto, apenas 16,7% dos fisioterapeutas pesquisados têm alguma dessas titulações.

No que se refere à correlação entre formação em saúde coletiva/pública e atuação profissional dos fisioterapeutas, observou-se que, entre aqueles com capacitação nessa área, apenas quatro dos especialistas e dois dos mestres estavam inseridos em ações comunitárias. Dos 44 fisioterapeutas que trabalhavam em serviços públicos de saúde, somente 11 tinham capacitação em saúde pública/coletiva.

Conhecimentos dos fisioterapeutas sobre ética

A origem dos conhecimentos sobre ética mencionados pelos fisioterapeutas é apresentada no Gráfico 1, na qual se observa que a família apareceu como a principal fonte de informações nesse campo, seguida pelos desafios decorrentes do exercício profissional. A escola apareceu em terceiro lugar, com a metade da representação da família.


No Gráfico 2, apresentam-se os termos relacionados à ética, referidos como os mais discutidos durante a graduação. Os principais temas mencionados foram a responsabilidade (85%), a ética (82,6%) e o respeito (76,6%); na sequência apareceram a confidencialidade (57%), a autonomia (50%) e a moral (50%); já a bioética e a verdade foram mencionadas por cerca de 37,5% dos fisioterapeutas. Cabe observar que a disciplina de bioética passou a fazer parte dos programas curriculares dos cursos da área da saúde somente após a promulgação das Diretrizes Curriculares (11), o que justifica a baixa referência desses conhecimentos por esses profissionais.


Considerações finais

Tradicionalmente, a Fisioterapia é uma profissão predominantemente feminina, e estudos apontam um percentual de 70% a 80% de mulheres no exercício da profissão (3-6). De acordo com Moreira (17), na história da humanidade as relações de trabalho masculino se relacionavam à força física e à abstração, enquanto as femininas estavam ligadas à sensibilidade e à observação. Talvez isso justifique, em parte, a grande inserção das mulheres na fisioterapia, por ser essa uma área que exige dos profissionais muita atenção e grande sensibilidade.

Comparando-se os dados deste estudo com os realizado com 62 fisioterapeutas, nessa mesma cidade, no ano de 1990 (3), pode-se observar que houve um crescimento dessa população de 4,2 vezes, o que é característica de profissão muito jovem. O aumento do número de fisioterapeutas entre adultos jovens foi verificado também em estudos estadunidenses (18, 19). No Brasil, isso se deve à expansão do ensino superior na última década do século XX, decorrente das mudanças na política educacional, bem como ao reconhecimento sociocientífico da profissão, resultante dos esforços envidados pelos próprios fisioterapeutas.

Outro aspecto constatado foi a baixa remuneração desses profissionais, o que acentua as dificuldades enfrentadas pelos fisioterapeutas para se firmarem na profissão. Apesar de o código de ética dos fisioterapeutas (15) referir, no cap. V, art. 27, que esse profissional tem direito à justa remuneração por seus serviços, e no Art. 30 apontar a proibição da assistência prestada por um valor ínfimo, isso não garante rendimentos condizentes com a qualificação dessa categoria. No que tange aos valores dos honorários, os fisioterapeutas dispõem de um Referencial Nacional de Honorários Fisioterapêuticos (RNHF) (20), lançado pelo Coffito em 1998 e somente reeditado em 2009, o que demonstra a dificuldade em se estabelecer parâmetros para a valorização do trabalho do fisioterapeuta. Também existem propostas de determinação de um piso salarial, pela Federação Nacional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Fenafito), em torno de oito salários mínimos para uma jornada de 30 horas semanais (21). No entanto, essas normativas e discussões ainda não são suficientes para alavancar a profissão no que diz respeito a uma remuneração digna desses profissionais.

No que se refere às áreas de atuação, esta pesquisa confirma os dados obtidos em outras pesquisas realizadas em nível nacional (4), que apontam a área de traumato-ortopedia como o campo mais importante de atuação profissional, seguida pelas áreas de reumatologia, neurologia e pneumologia. Os fisioterapeutas são profissionais que investem em sua capacitação e, embora alguns se interessem em capacitar-se na área de saúde coletiva ou pública, isso não garante sua atuação nessa área. Além disso, não existe política mais expressiva do sistema de saúde público local para absorver esses profissionais.

A vulnerabilidade da profissão pode ser apontada a partir de fatores confirmados pelos resultados deste estudo: aumento desordenado da oferta de cursos de graduação, com prejuízo da qualidade do ensino; crescimento exponencial de egressos a cada ano, comprometendo a autonomia profissional; inserção marginal no mercado de trabalho, o que leva à inexistência de vínculo empregatício; ausência de uma política pública para a inserção desses profissionais no sistema de saúde; carência de estudos sobre o perfil profissional dos fisioterapeutas, o que impede um planejamento eficaz das ações fisioterapêuticas na área da saúde. Todos esses fatores demandam um comprometimento ético dos envolvidos com a assistência à saúde da população.

A ética vem ocupando espaços importantes nas discussões em saúde e na formação de profissionais. O ensino da ética é preconizado tanto para otimizar a prática clínica com responsabilidade como para desenvolver o reconhecimento da importância da análise crítica sobre os dilemas éticos e morais durante as práticas profissionais cotidianas. Contudo, os dados mostraram que a universidade não foi a principal responsável pela formação ética dos fisioterapeutas, apesar de essa questão estar entre as mais abordadas na graduação, ao lado da responsabilidade e do respeito.

Muitos são os autores que insistem na necessidade de se preparar os fisioterapeutas para enfrentarem os conflitos éticos que as mudanças no perfil epidemiológico da saúde estão provocando neste século (14, 22 ,23). Em vista disso, entende-se que o fortalecimento da classe passa pela formação ética abrangente e inclusiva, por meio da qual o profissional seja estimulado a assumir postura autônoma, que deverá ser adotada mediante fundamentação científica e não apenas pela convicção de um ideal.

Agradecimentos

Agradecemos a todos que contribuíram para a realização deste estudo, pois sem a colaboração dos colegas fisioterapeutas, a ajuda de profissionais de outras áreas de conhecimento e o apoio do Crefito-5-RS este estudo não seria possível.

Recebido: 23/01/2011

Aprovado: 26/03/2011

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Maio 2012
  • Data do Fascículo
    Set 2011

Histórico

  • Recebido
    23 Jan 2011
  • Aceito
    26 Mar 2011
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