Acessibilidade / Reportar erro

Qualidade de vida pós-mastectomia e sua relação com a força muscular de membro superior

Resumos

Este estudo transversal, analítico, exploratório e quantitativo teve como objetivo identificar a qualidade de vida (QV) de mulheres mastectomizadas, relacionar os resultados à força muscular do membro superior afetado (MSA) e traçar um perfil sociofuncional. Participaram 10 mulheres, com idade de 30 a 60 anos, que realizaram mastectomia radical modificada unilateral em hospital de médio porte do interior do Rio Grande do Sul havia, no mínimo, um ano contado da data de início da coleta de dados. A força muscular dos membros superiores (MMSS) foi avaliada por meio de testes manuais e a preensão palmar com dinamômetro. Aplicou-se questionário sociofuncional e os dados relativos à QV foram coletados por meio do questionário European Organisation for Research and Treatment of Cancer (EORTC) QLQ-C30, módulo BR-23. A força estava diminuída em todos os grupos musculares homolaterais à cirurgia. A QV na saúde global foi percebida como regular. As principais alterações encontradas na funcionalidade foram nas escalas emocional, cognitiva e sexual. Estatisticamente, foi encontrada significância e correlação entre a saúde física e função social (p=0,04; r=0,65), cognição e desempenho funcional (p=0,01; r=0,75), desempenho emocional e cognição (p=0,005; r=0,9) e entre força de preensão palmar do membro afetado com a saúde global (p=0,008; r=0,77). O câncer de mama e a mastectomia exercem impacto direto na força de MMSS, na funcionalidade e na QV de mulheres nos domínios sexual, cognitivo e emocional, e a fisioterapia tem importante papel na reabilitação e reinserção social destas mulheres.

Mastectomia; Mulheres; Neoplasias da mama; Força muscular; Qualidade de vida; Fisioterapia


This research transversal, analytical, exploratory and quantitative approach aimed to identify the quality of life of women who have had a mastectomy surgery, relate the results with the strength of the upper limb muscle affected and draw a sociofunctional profile. A total of 10 women participated, from 30 to 60 years old, who underwent to unilateral modified radical mastectomy in a medium-sized hospital in an inner city of Rio Grande do Sul, for at least one year from the date of data collection. The strength of the upper limb muscle was evaluated by manual testing and the handgrip was tested with the dynamometer. A sociofunctional questionnaire was applied and the quality of life data were collected through the European Organisation for Research and Treatment of Cancer (EORTC) QLQ-C30 questionnaire, followed by the module BR-23. The strength had decreased in all muscle groups homolateral to the surgery. The life quality in a global health bases resulted as regular. The main changes found in the functionality were at scales: emotional, cognitive and sexual. Statistically, it was found significance and correlation between physical health and social function (p=0.04; r=0.65), cognition and functional performance (p=0.01; r=0.75), emotional performance and cognition (p=0.005; r=0.9) and between handgrip of the affected limb with the global health (p=0.008; r=0.77). Breast cancer and mastectomy has a direct impact on the upper limb muscle strength, functionality and on life quality of women, in sexual, cognitive and emotional domains, and physiotherapy plays an important role in the rehabilitation and in social rehabilitation of these.

Mastectomy; Women; Breast neoplasms; Muscle strength; Quality of life; Physical therapy specialty


Este estudio transversal, analítico, exploratorio y cuantitativo tuvo como objetivo identificar la calidad de vida (CV) de mujeres mastectomizadas, relacionar los resultados a la fuerza muscular del miembro superior afectado (MSA) y diseñar un perfil sociofuncional. Participaron 10 mujeres, con edad de 30 a 60 años, que realizaron mastectomía radical modificada unilateral en hospital de porte mediano del interior de Rio Grande do Sul hacía por lo menos un año desde la fecha de inicio de la recogida de datos. La fuerza muscular de los miembros superiores (MMSS) fue evaluada por medio de exámenes manuales y la prensión palmar con dinamómetro. Se aplicó cuestionario sociofuncional y los datos referentes a la CV fueron recogidos por medio del questionário European Organisation for Research and Treatment of Cancer (EORTC) QLQ-C30, módulo BR-23. La fuerza estuvo reducida en todos los grupos musculares homolaterales a la cirugía. La CV en la salud global fue percibida como regular. Los principales cambios encontrados en la funcionalidad fueron en las escalas emocional, cognitiva y sexual. Estadísticamente, fue encontrada significancia y correlación entre la salud física y función social (p=0,04; r=0,65), cognición y desempeño funcional (p=0,01; r=0,75), desempeño emocional y cognición (p=0,005; r=0,9) y entre fuerza de prensión palmar del miembro afectado con la salud global (p=0,008; r=0,77). El cáncer de mama y la mastectomía ejercen un impacto directo sobre la fuerza de MMSS, en la funcionalidad y en la CV de mujeres en los ámbitos sexual, cognitivo y emocional, y la fisioterapia tiene importante papel en la rehabilitación y reinserción social de estas mujeres.

Mastectomía; Mujeres; Neoplasias de la Mama; Fuerza muscular; Calidad de Vida; Fisioterapia


INTRODUÇÃO

Em 2014, estima-se o surgimento de 576 mil novos casos de câncer no Brasil, sendo 57 mil de câncer de mama. É o tipo mais frequente nas Regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste. Na região Norte, é o segundo mais incidente11. Brasil. Estimativa 2014: Incidência de Câncer no Brasil; 2013 [Internet]. [Citado em 10 fev 2014]. Disponível em: <http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/0129ba0041fbbc01aa4fee936e134226/Apresentacao+Estimativa+2014_final+corrigido+tireoide.pdf?MOD=AJPERES&CACHEID=0129ba0041fbbc01aa4fee936e134226>
http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/...
.

Um fator importante que influencia no prognóstico do câncer de mama é o diagnóstico precoce. Quando detectado em estágio inicial, o tumor apresenta altos índices de cura22. Batiston AP, Santiago SM. Fisioterapia e complicações físicas funcionais após tratamento cirúrgico do câncer de mama [Internet]. Fisioter Pesqui. 2005;12(3):30-35. [Citado em 28 nov 2013]. Disponível em: <http://www.crefito3.com.br/revista/usp/05_09_12/pdf/31_complicacoes.pdf>
http://www.crefito3.com.br/revista/usp/0...
. A idade é o principal fator de risco, e o número de casos aumenta de forma acelerada após os 50 anos, sendo sua ocorrência relacionada ao processo de urbanização da sociedade11. Brasil. Estimativa 2014: Incidência de Câncer no Brasil; 2013 [Internet]. [Citado em 10 fev 2014]. Disponível em: <http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/0129ba0041fbbc01aa4fee936e134226/Apresentacao+Estimativa+2014_final+corrigido+tireoide.pdf?MOD=AJPERES&CACHEID=0129ba0041fbbc01aa4fee936e134226>
http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/...
.

As opções de tratamento incluem a exérese do nódulo com radiação ou a mastectomia33. Fortner KD. Manual de ginecologia e obstetrícia do John Hopkins. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2007.. Estes procedimentos são agressivos, pois acarretam em consequências físicas e emocionais desfavoráveis à vida da mulher, tais como: lesões musculares, hemorragias, complicações cicatriciais, alterações na sensibilidade, fibroses, alterações posturais, algias, diminuição ou perda total da amplitude de movimento (ADM) e da força muscular, comprometimento da capacidade respiratória, perda ou redução da capacidade funcional e linfedema do braço homolateral44. Ferro ADM, Gontijo AD, Bottaro M, Viana J. O efeito do tratamento fisioterapêutico na biomecânica morfofuncional no pós-operatório do câncer de mama [Trabalho de Conclusão de Curso]. Rio de Janeiro: Universidade Gama Filho; 2003.. Na reabilitação pós-mastectomia destaca-se a fisioterapia. Para que a intervenção fisioterapêutica seja eficaz, é necessário conhecer o impacto das alterações geradas pela mastectomia.

A qualidade de vida (QV) pode ser definida como a percepção que um indivíduo tem de sua posição na vida, no contexto da cultura, sistemas de valores nos quais ele vive em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações55. Segre M, Ferraz FC. O conceito de saúde. Rev Saúde Pública. 1997;31(5):538-42..

A mudança do perfil de morbimortalidade, tendência universal também nos países em desenvolvimento, indica o aumento da prevalência das doenças crônico-degenerativas. Os avanços nos tratamentos e as possibilidades efetivas de controle dessas enfermidades têm acarretado o aumento da sobrevida e/ou a vida longa das pessoas acometidas por esses agravos. O campo da oncologia, nesse sentido, observou a necessidade de conhecer e avaliar toda a condição de vida dos pacientes, com o objetivo de aumentar a sobrevida destes e acrescentar QV para estas pessoas55. Segre M, Ferraz FC. O conceito de saúde. Rev Saúde Pública. 1997;31(5):538-42..

Informações sobre QV têm sido incluídas como indicadores para avaliação da eficácia, eficiência e impacto de determinados tratamentos para grupos de portadores de agravos diversos. Outro interesse que está diretamente ligado às práticas assistenciais cotidianas dos serviços de saúde refere-se à QV como um indicador nos julgamentos clínicos de doenças específicas. Trata-se da avaliação do impacto físico e psicossocial que as enfermidades, disfunções ou incapacidades podem acarretar para as pessoas acometidas, permitindo um melhor conhecimento do paciente e de sua adaptação à condição. Nesses casos, a compreensão sobre a QV do paciente incorpora-se ao trabalho do dia a dia dos serviços, influenciando decisões e condutas terapêuticas das equipes de saúde55. Segre M, Ferraz FC. O conceito de saúde. Rev Saúde Pública. 1997;31(5):538-42..

Conhecer o impacto que o tratamento cirúrgico causa em relação à força muscular e de preensão palmar no membro superior (MS) e diminuição da funcionalidade do membro superior afetado (MSA) permite definir as estratégias de atuação do fisioterapeuta no decorrer da reabilitação. Nesse sentido, identificar o impacto da diminuição da força muscular na QV das pacientes servirá de subsídio para pensar estratégias de como promover a reinserção social dessas mulheres.

Este estudo teve como objetivos identificar a QV de mulheres pós-mastectomia, relacionando a força muscular e a preensão palmar do MSA, traçar um perfil sociofuncional e verificar, de acordo com questionário European Organisation for Research and Treatment of Cancer (EORTC) QLQ-C30, os domínios de maior impacto na QV.

METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa transversal, analítica, exploratória e quantitativa. Os critérios de inclusão foram mulheres, entre 30 a 60 anos, que realizaram mastectomia radical modificada unilateral em hospital de médio porte do interior do Rio Grande do Sul, no período de março de 2011 a março de 2012, e que residiam nos municípios de Lajeado, Estrela, Arroio do Meio, Teutônia e Colinas. Os critérios de exclusão foram presença de qualquer patologia de MS e/ou mãos em algum momento da vida, estar em tratamento de quimioterapia/radioterapia, apresentar alterações cognitivas para responder aos questionários e executar os comandos da pesquisadora. A seleção das participantes consta na Figura 1.

Figura 1
Fluxograma de seleção dos participantes do estudo

A amostra quantitativa se deu a partir do número de mulheres que realizaram mastectomia radical modificada unilateral entre março de 2011 e março de 2012, no hospital referência. O total de mulheres das cidades limítrofes do hospital em questão foi de 24, no período compreendido entre março de 2011 e 2012. A amostra calculada foi de 10 mulheres, quantidade definida a partir do cálculo do total da população, respeitando 5% de erro.

Na coleta de dados foi entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para todas as participantes, tendo uma cópia ficado com a participante e uma 2ª via com a pesquisadora. Foi aplicado questionário sociofuncional, para traçar o perfil das participantes, com questões relacionadas a idade, profissão, escolaridade, estado civil, número de filhos, tratamentos realizados, presença ou não de acompanhamento fisioterapêutico e histórico de câncer na família.

Os dados de QV foram coletados por meio do questionário EORTC QLQ-C30, que conta com um módulo de questionário genérico para pacientes oncológicos, seguido do módulo BR-23, específico para pacientes com câncer de mama. O escore de cada questão varia de 1 a 4, sendo 1 "não", 2 "pouco", 3 "moderadamente" e 4 "muito"66. Aaronson NK, Ahmedzai S, Bergman B, Bullinger M, Cull A, Duez NJ, et al. The European organization for research and treatment of cancer QLQ-C30: a quality-of-life instrument for use in international clinical trials in oncology. J Natl Cancer Inst. 1993;85(5):365-76..

O QLQ-C30 quantifica a QV segundo domínios de saúde global, funcionalidade e sintomatologia, com o escore total que varia de 0 a 100. Uma pontuação alta para o estado de saúde global e escala funcional representa alta QV e funcionalidade, respectivamente; e uma alta pontuação para a escala de sintomas representa um alto nível de sintomatologia66. Aaronson NK, Ahmedzai S, Bergman B, Bullinger M, Cull A, Duez NJ, et al. The European organization for research and treatment of cancer QLQ-C30: a quality-of-life instrument for use in international clinical trials in oncology. J Natl Cancer Inst. 1993;85(5):365-76..

O módulo específico para o câncer de mama contempla domínios que abordam imagem corporal, função e prazer sexual, efeitos colaterais, sintomas nos seios e braços e impacto da queda de cabelo66. Aaronson NK, Ahmedzai S, Bergman B, Bullinger M, Cull A, Duez NJ, et al. The European organization for research and treatment of cancer QLQ-C30: a quality-of-life instrument for use in international clinical trials in oncology. J Natl Cancer Inst. 1993;85(5):365-76..

A avaliação da força muscular de preensão palmar foi feita bilateralmente por intermédio do dinamômetro da Kratos Equipamentos, com graduação em escala quilograma-força (kgf). A participante foi orientada a apertar a alça do aparelho três vezes com cada mão, sendo registrado o maior valor obtido.

A avaliação da força muscular dos MMSS foi realizada bilateralmente e de acordo com a escala de O'Sullivan, que varia de 0 a 5, sendo 0 ausência de contração muscular e 5 quando o músculo suporta um forte grau de resistência imposto pelo terapeuta77. O'Sullivan SB, Schmitz TJ. Fisioterapia: avaliação e tratamento. 2ª ed. Barueri: Manole; 2004.. Foram avaliados os músculos flexores, extensores, abdutores, adutores, rotadores internos e externos de ombro, flexores e extensores de cotovelo, pronadores e supinadores de antebraço e flexores e extensores de punho.

Para análise estatística, foi utilizado o software BIOESTAT 5.0. As variáveis quantitativas foram descritas por meio de média e desvio-padrão. Os resultados estão apresentados em tabelas. O teste t de Student e a correlação de Pearson foram utilizados para a comparação dos grupos, em que se considera correlação moderada de 0,5 a 0,95, forte quando maior que 0,95 e perfeita quando 1, sendo que os valores podem ser positivos ou negativos. O nível de significância adotado foi de 5%, sendo considerados significativos valores de p<0,05. O poder da amostra considerado foi de 0,05.

RESULTADOS

O perfil sociofuncional das participantes está descrito na Tabela 1. Os escores médios e desvio-padrão por domínios do questionário QLQ-C30 de todas as participantes podem ser vistos na Tabela 2. No módulo geral, referente à percepção de saúde global, o escore médio foi de 67,5 (±19,8), indicando uma percepção regular de QV. O escore médio da funcionalidade global foi de 65,3 (±19,3), classificado como regular. O escore médio da sintomatologia foi de 24,9 (±19,2), indicando baixo nível de sintomas. Entre as escalas funcionais, o maior escore encontrado foi a função social, com média de escore de 85 (±18,3), já a menor pontuação encontrada refere-se à função emocional, com escore médio de 50 (±36,7).

Tabela 1
Perfil sociofuncional da amostra
Tabela 2
Escore de qualidade de vida nos domínios indicados a partir do questionário QLQ-C30

Na análise estatística dos domínios funcionais foram encontradas significância e correlação moderadas entre a saúde física e a função social (p=0,04; r=0,65), mostrando que quanto maior a saúde física, melhor a função social. Entre a cognição e o desempenho funcional também foi encontrada correlação moderada (p=0,01; r=0,75), ou seja, quanto maior a cognição, maior o desempenho funcional. Quanto à relação da função cognitiva com o desempenho emocional, observou-se significância extrema (p=0,005; r=0,9), com forte correlação entre estes domínios, concluindo-se que quanto maior a função cognitiva, maior a função emocional.

No módulo específico (BR-23) sobre a imagem corporal, as participantes refletiram sobre a dificuldade que sentem ao se observarem nuas e a satisfação com o próprio corpo. Em relação à função sexual, o escore médio da imagem corporal mostra QV moderada em relação à percepção das pacientes sobre o seu corpo. No que se refere à função sexual, o escore aponta baixa frequência de relações sexuais.

A questão sobre o prazer sexual foi respondida pelas participantes que se perceberam sexualmente ativas nas últimas quatro semanas e os resultados estão descritos na Tabela 3. Referente ao domínio "efeitos colaterais a partir da terapia sistêmica", o escore médio foi de 28,1 (±19,9), revelando sua pouca incidência. O escore médio dos sintomas nos seios foi de 46,7 (±33,6) e nos MMSS foi de 46,7 (±26,6), mostrando sintomatologia moderada. Apenas 2 mulheres relataram perda de cabelo nos últimos 7 dias, com escore médio de impacto de 83 (3±23,6), indicando forte incômodo com tal situação.

Tabela 3
Escore de qualidade de vida do questionário BR-23, específico para câncer de mama

Em relação à força de preensão palmar do MSA (Tabela 4) e o domínio da saúde global, verificou-se forte significância (p=0,008) entre esses fatores, bem como correlação de Pearson moderada (r=0,773). Quanto maior a força muscular das mulheres em relação à preensão palmar, melhor a percepção sobre a sua saúde global.

Tabela 4
Força muscular preensão palmar (quilograma-força)

No que se refere à avaliação da força muscular de MMSS, comparando membro saudável e afetado, há uma correlação moderada com os grupos musculares flexores (r=0,73; p=0,02; poder=0,7477), adutores (r=0,78; p=0,01, poder=0,8274) e abdutores (r=0,8; p=0,0093; poder=0,8550) de ombro e extensores de punho (r=0,7; p=0,05; poder=0,6303). Houve forte correlação entre os grupos musculares extensores (r=0,9; p=0,0003; poder=0,9916) e rotadores externos (r=1; p<0,0001) de ombro, afirmando que quanto mais semelhantes os resultados da avaliação da força muscular dos dois segmentos corporais, mais forte a correlação encontrada.

DISCUSSÃO

De acordo com os domínios analisados neste estudo por meio do EORTC QLQ-C30, a QV das mulheres entrevistadas no aspecto social foi a maior encontrada (85±18,3), já a média de QV no aspecto emocional foi 50 (±36,7), a menor encontrada. Em outro estudo, ao investigarem a QV pós-mastectomia, pesquisadores encontraram alterações no funcionamento social de 40% das participantes, em que as mulheres relataram depressão, isolamento e diminuição do prazer sexual88. Anjos ACY, Paiva L, Sales CACCS, Scandiuzzi D. Qualidade de vida de mulheres tratadas de câncer de mama: funcionamento social. Rev Bras Cancerol. 2001;47(3):263-72.. Este dado corrobora os resultados encontrados no presente estudo, pois quanto menor o convívio com os pares, por medo ou vergonha de sua condição, menor será a QV das mulheres nos domínios apresentados, principalmente no que se refere à saúde física e emocional.

Ao avaliar, por meio do questionário FACT-B, a QV de mulheres tratadas cirurgicamente do câncer de mama foram encontrados resultados semelhantes aos do presente estudo, no qual os valores médios demonstraram tendência para boa QV, sendo o domínio emocional o mais comprometido. Para as mulheres que realizaram a cirurgia não conservadora, os resultados apresentaram piores níveis de QV99. Bezerra KB, Silva DSM, Chein MBC, Ferreira PR, Maranhão JKP, Ribeiro NL, et al. Qualidade de vida de mulheres tratadas de câncer de mama em uma cidade do nordeste do Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(7):1933-41..

Em um estudo sobre a QV de mulheres em tratamento de quimioterapia, as sem companheiros apresentaram percepção mais negativa (63,5) do que as mulheres com companheiro (75,9). Esse padrão se repete em relação à função sexual, em que as mulheres com companheiros apresentam média de 40,91; já as sem companheiro, 16,67. Em contrapartida, as mulheres com companhei- ro referem menor prazer sexual (48,14), diferentemente das mulheres sem companheiro, cuja média foi de 67,00. Foi observado também que as mulheres sem companheiro apresentam menor preocupação com a queda de cabelo (29,56) do que as mulheres com companheiro (43,33)1010. Albuquerque V, Leite J, Silva CB. Qualidade de vida em pacientes portadoras de neoplasia mamária submetidas a tratamento quimioterápico. Rev Bras Cancerol. 2010;56(2):227-36..

A baixa incidência de sintomas (24,9±19,2) provavelmente deve-se ao fato de nenhuma das participantes realizar quimioterapia ou radioterapia no momento da pesquisa. De acordo com estudos, pacientes que realizaram quimioterapia e mastectomia apresentaram mais sintomas de fadiga, náuseas, vômitos e dor média a moderada, quando comparados com mulheres com câncer de mama que foram submetidas apenas à quimioterapia1010. Albuquerque V, Leite J, Silva CB. Qualidade de vida em pacientes portadoras de neoplasia mamária submetidas a tratamento quimioterápico. Rev Bras Cancerol. 2010;56(2):227-36..

Em um estudo concluiu-se que o método cirúrgico no tratamento do câncer de mama é um fator determinante nos índices de QV. Utilizando o questionário SF-36, resultados apontaram que mulheres que realizaram a cirurgia de quadrantectomia e não necessitaram de reconstrução mamária possuem os melhores escores médios em todos os domínios e, portanto, têm melhor QV, seguidas do grupo de mastectomizadas que fizeram reconstrução. O grupo de mulheres mastectomizadas que não fizeram a reconstrução tem um nível muito baixo de QV, seguido pelo grupo das mulheres que realizaram a quadrantectomia e também não fizeram a reconstrução 1111. Simeão SFAP, Landro ICR, Conti MHS, Gatti MAN, Delgallo WD, Vitta AD. Qualidade de vida em grupos de mulheres acometidas de câncer de mama. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(3):779-88..

A média de força muscular no lado sadio da amostra deste estudo foi de 26,9 kgf (±5,3), enquanto que no lado afetado foi de 18,5 kgf (7,9). Outro estudo observou a frequência dessas complicações e quando as mulheres mastectomizadas foram encaminhadas para a fisioterapia. As principais complicações foram a limitação do movimento do ombro (61,9%), dor (32,5%), linfedema (29,4%), aderência cicatricial (3,1%) e alterações sensitivas (2,5%); 19,4% das mulheres não apresentavam complicações. Os encaminhamentos médicos foram, em sua maioria, para tratamento de complicações já instaladas (76,9%), e somente 23,1% das mulheres foram encaminhadas para atendimento com o objetivo de investir em prevenção. Os resultados deste estudo apontam que, quando encaminhadas de modo preventivo, as participantes não apresentavam alterações33. Fortner KD. Manual de ginecologia e obstetrícia do John Hopkins. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2007.. Nesse sentido, estudos apontam que o tratamento fisioterapêutico já no período pré-operatório tem como objetivo conhecer alterações prévias, verificar fatores de risco para o pós-operatório, sendo possível iniciá-lo já nessa fase e no pós-operatório imediato, o que contribui para a melhora funcional MSA1212. Brasil. Controle do câncer de mama: documento de consenso; 2004 [Internet]. [Citado em 05 dez 2013]. Disponível em: <http://www.inca.gov.br/publicacoes/consensointegra.pdf>
http://www.inca.gov.br/publicacoes/conse...
, 1313. Bergmann A, Nogueira EA, Oliveira ACG, Pedrosa E, Ribeiro MJP. Fisioterapia em mastologia oncológica: rotinas do Hospital do Câncer III. Rev Bras Cancerol. 2006;52(1):97-109..

Com relação às técnicas de tratamento fisioterapêutico, um estudo demonstrou aumento significativo (p<0,0001) na ativação e força dos músculos deltoide médio e trapézio superior, por meio da facilitação neuromuscular proprioceptiva (FNP), de mulheres submetidas à mastectomia radical modificada. Estas foram separadas em dois grupos: 1) mastectomia recente (até dois anos após a cirurgia); 2) mastectomia tardia (após dois anos de cirurgia), tratadas com a técnica de FNP, duas vezes por semana, durante quatro meses. Ao término do tratamento, a força muscular do MSA foi avaliada por meio da eletroneuromiografia e a ADM por intermédio da goniometria, sendo a melhora da força e ADM mais evidente no grupo de mastectomia recente, concluindo-se que quanto antes o início na intervenção fisioterapêutica, melhores serão os resultados da reabilitação e a reinserção dessas mulheres em suas atividades cotidianas1414. Nogueira PVG, Guirro ECO, Guirro RRJ, Palauro VA. Efeitos da facilitação neuromuscular proprioceptiva na performance funcional de mulheres mastectomizadas. Fisioter Bras. 2005;6(1):28-35..

Por fim, destaca-se a limitação em relação à população que integra este estudo. Por se tratar de uma região composta por cidades de pequeno e médio porte, foi encontrada dificuldade para entrar em contato com as mulheres e para que elas se deslocassem de suas cidades até o local da avaliação. Nesse sentido, a seleção inicial de mulheres que haviam realizado mastectomia radical modificada unilateral no hospital referência da região foi de 48 mulheres no período compreendido entre março de 2011 e 2012. Destas, 27 residiam em cidades limítrofes ao município de referência e, por isso, compuseram a amostra deste estudo; entretanto, 3 faleceram e 24 foram convidadas a participar do estudo, indicando no cálculo da amostra, respeitando 5% de erro padrão, que o n de entrevistas era de 10 mulheres.

CONCLUSÃO

Os resultados do estudo apontam o impacto do câncer de mama em relação à QV de mulheres mastectomizadas, em especial nos aspectos sociais de suas vidas. Mostram também a perda de força muscular decorrente do processo cirúrgico, impactando na funcionalidade do MSA. Estudos ressaltam a importância da fisioterapia em todas as fases do tratamento do câncer de mama, sendo um dos principais agentes preventivos de complicações após a mastectomia.

REFERENCES

  • 1
    Brasil. Estimativa 2014: Incidência de Câncer no Brasil; 2013 [Internet]. [Citado em 10 fev 2014]. Disponível em: <http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/0129ba0041fbbc01aa4fee936e134226/Apresentacao+Estimativa+2014_final+corrigido+tireoide.pdf?MOD=AJPERES&CACHEID=0129ba0041fbbc01aa4fee936e134226>
    » http://www2.inca.gov.br/wps/wcm/connect/0129ba0041fbbc01aa4fee936e134226/Apresentacao+Estimativa+2014_final+corrigido+tireoide.pdf?MOD=AJPERES&CACHEID=0129ba0041fbbc01aa4fee936e134226
  • 2
    Batiston AP, Santiago SM. Fisioterapia e complicações físicas funcionais após tratamento cirúrgico do câncer de mama [Internet]. Fisioter Pesqui. 2005;12(3):30-35. [Citado em 28 nov 2013]. Disponível em: <http://www.crefito3.com.br/revista/usp/05_09_12/pdf/31_complicacoes.pdf>
    » http://www.crefito3.com.br/revista/usp/05_09_12/pdf/31_complicacoes.pdf
  • 3
    Fortner KD. Manual de ginecologia e obstetrícia do John Hopkins. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2007.
  • 4
    Ferro ADM, Gontijo AD, Bottaro M, Viana J. O efeito do tratamento fisioterapêutico na biomecânica morfofuncional no pós-operatório do câncer de mama [Trabalho de Conclusão de Curso]. Rio de Janeiro: Universidade Gama Filho; 2003.
  • 5
    Segre M, Ferraz FC. O conceito de saúde. Rev Saúde Pública. 1997;31(5):538-42.
  • 6
    Aaronson NK, Ahmedzai S, Bergman B, Bullinger M, Cull A, Duez NJ, et al. The European organization for research and treatment of cancer QLQ-C30: a quality-of-life instrument for use in international clinical trials in oncology. J Natl Cancer Inst. 1993;85(5):365-76.
  • 7
    O'Sullivan SB, Schmitz TJ. Fisioterapia: avaliação e tratamento. 2ª ed. Barueri: Manole; 2004.
  • 8
    Anjos ACY, Paiva L, Sales CACCS, Scandiuzzi D. Qualidade de vida de mulheres tratadas de câncer de mama: funcionamento social. Rev Bras Cancerol. 2001;47(3):263-72.
  • 9
    Bezerra KB, Silva DSM, Chein MBC, Ferreira PR, Maranhão JKP, Ribeiro NL, et al. Qualidade de vida de mulheres tratadas de câncer de mama em uma cidade do nordeste do Brasil. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(7):1933-41.
  • 10
    Albuquerque V, Leite J, Silva CB. Qualidade de vida em pacientes portadoras de neoplasia mamária submetidas a tratamento quimioterápico. Rev Bras Cancerol. 2010;56(2):227-36.
  • 11
    Simeão SFAP, Landro ICR, Conti MHS, Gatti MAN, Delgallo WD, Vitta AD. Qualidade de vida em grupos de mulheres acometidas de câncer de mama. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(3):779-88.
  • 12
    Brasil. Controle do câncer de mama: documento de consenso; 2004 [Internet]. [Citado em 05 dez 2013]. Disponível em: <http://www.inca.gov.br/publicacoes/consensointegra.pdf>
    » http://www.inca.gov.br/publicacoes/consensointegra.pdf
  • 13
    Bergmann A, Nogueira EA, Oliveira ACG, Pedrosa E, Ribeiro MJP. Fisioterapia em mastologia oncológica: rotinas do Hospital do Câncer III. Rev Bras Cancerol. 2006;52(1):97-109.
  • 14
    Nogueira PVG, Guirro ECO, Guirro RRJ, Palauro VA. Efeitos da facilitação neuromuscular proprioceptiva na performance funcional de mulheres mastectomizadas. Fisioter Bras. 2005;6(1):28-35.
  • Fonte de financiamento: nenhuma
  • Parecer de aprovação no Comitê de Ética no 138.425.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2014

Histórico

  • Recebido
    Dez 2013
  • Aceito
    Mar 2014
Universidade de São Paulo Rua Ovídio Pires de Campos, 225 2° andar. , 05403-010 São Paulo SP / Brasil, Tel: 55 11 2661-7703, Fax 55 11 3743-7462 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revfisio@usp.br