Acessibilidade / Reportar erro

VIRGINIA WOOLF EM OUTRA CENA MODERNISTA: POR NOVAS LEITURAS DE FRESHWATER: A COMEDY

VIRGINIA WOOLF IN A DIFFERENT MODERNIST SCENE: TOWARDS NEW READINGS OF FRESHWATER: A COMEDY

Resumo

Este artigo objetiva inserir Freshwater: A Comedy (1923/1935), único experimento teatral assinado pela escritora inglesa Virginia Woolf, nos debates em torno da cena modernista, mobilizados em leituras críticas de seu amplo projeto literário. É consenso na crítica especializada que a obra de Woolf coaduna o estético e o político e que seus textos modernistas, além de brincadeiras e experimentos performáticos, questionam verdades estanques do pensamento ocidental, especialmente no que se refere a imbricações entre gêneros literários e performances de gênero nas transições críticas entre os termos “avant-garde”, “modernista”, e “pós-modernista” (GOLDMAN, 2004; WHITWORTH, 2010). Contudo, a peça Freshwater não figura como objeto de análise de muitos estudos dedicados à obra de Woolf. Então, este trabalho mostrará que essa comédia da autora em foco pode contribuir para releituras contemporâneas do modernismo, especialmente se lida como uma de suas intervenções vanguardistas, marcadas pelo pós-vitorianismo (ELLIS, 2007) de seu projeto literário.

Palavras-chave
Virginia Woolf; Freshwater ; Modernismo; Teatro; Comédia

Abstract

This article aims to insert Freshwater: a Comedy (1923/1935), the only theatrical experiment penned by the English writer Virginia Woolf, into the debates around the modernist scene, which are mobilized by critical readings of her broad literary project. It is a consensus among scholars that Woolf’s oeuvre aligns aesthetics with politics, and that her modernist writings, as well as hoaxes and experimental performances, call into question absolute truths of Western thought, especially when it comes to imbrications of genre and gender in the critical transitions between terms such as “avant-garde”, “modernist” and “postmodernist” (GOLDMAN, 2004; WHITWORTH, 2010). However, Freshwater does not appear as an object of critical analysis in many of the studies dedicated to the works of Woolf. Thus, this article will show that the mentioned play can contribute to contemporary rereadings of modernism, especially if read as one of her avant-garde interventions, marked by the post-Victorianism (ELLIS, 2007) of her literary project.

Keywords
Virginia Woolf; Freshwater ; Modernism; Theatre; Comedy

Introdução

Freshwater: A Comedy (1923/1935)1 1 Ao longo do presente artigo, faremos referência à peça apenas por Freshwater.Quando for necessário, deixaremos claro se fazemos referência à versão de 1923 ou à versão de 1935. é o único experimento teatral da escritora inglesa Virginia Woolf (1882-1941)WOOLF, Virginia. Between the Acts. Nova York: Harcourt, 1941.. Apesar de hoje contarmos com importantes contribuições críticas acerca da peça, que nos serviram de fonte para esta pesquisa2 2 Como, por exemplo, na tese de doutorado de Nicola Shaughnessy, The Dramatic Writings of Gertrude Stein, Virginia Woolf and Sylvia Plath (1995); no ensaio de Andrea Adolph, “Virginia Woolf’s Revision of a Shavian Tradition” (2001); no livro de Penny Farfan sobre a presença de mulheres no teatro modernista, Women, Modernism and Performance (2004); no livro de R.S. Koppen sobre moda e gênero na obra de Woolf, Virginia Woolf: Fashion and Literary Modernity (2009); em “Hothouse Victorians: Art and Agency in Freshwater” (2017), de Kristine Swenson; em “Bloomsbury At Play”, de E.H. Wright; e em “O anjo e suas asas: a representação da mulher vitoriana em Freshwater de Virginia Woolf” (2019). do pesquisador brasileiro Josenildo Ferreira Teófilo da Silva. , Freshwater ainda ocupa um lugar marginal em comparação às outras obras da autora. Em Virginia Woolf and the Theatre (2012), Steven D. Putzel chama atenção para certo silêncio crítico em torno da relação simbiótica da autora inglesa com as artes dramáticas, e nos convida a pensar mais seriamente sobre a relação entre Woolf e o teatro, não apenas como leitora, mas também membro de plateias e como dramaturga. Este artigo almeja, portanto, destacar alguns motivos pelos quais é relevante se debruçar sobre a peça de Woolf. O fato de que Freshwater figura tão pouco em grandes estudos da obra woolfiana talvez se dê porque, em 3 de dezembro de 1934, a própria Woolf anota em seu diário que (re)escreveria Freshwater como uma piada3 3 “That is, I will write the play for Xmas: Freshwater a farce—for a joke!” (WOOLF, 1982WOOLF, Virginia The Diary of Virginia Woolf: 1931-1935. Vol. 4. Edição de Olivier Bell. New York: Harcourt Brace Jovanovich, 1982., p. 265), chegando a chamá-la simplesmente de tolice, tosh4 4 “The play rather tosh; but I’m not going to bother about making a good impression as a playwright” , em 1º de janeiro de 1935 (WOOLF, 1982WOOLF, Virginia The Diary of Virginia Woolf: 1931-1935. Vol. 4. Edição de Olivier Bell. New York: Harcourt Brace Jovanovich, 1982., p. 271). A farsa por vezes é reduzida à referência de ter sido escrita como presente de aniversário para a sobrinha de Woolf, Angelica Bell (1918 – 2012), ou é incluída como um intervalo na obra woolfiana, uma mera folga entre projetos estéticos mais exigentes. No entanto, o fato é que a farsa, a partir da rememoração de figuras de destaque do período vitoriano de modo jocoso, coloca em xeque tanto os avanços artísticos e filosóficos quanto as possíveis repetições de padrões, principalmente no que tange a performances de gênero que colocavam – e ainda colocam – a mulher como receptáculo de um feminino dócil e subalterno.

A primeira versão da farsa foi escrita em 1923, com a intenção de ser performada no Natal daquele ano, mas Woolf decidiu engavetar o projeto, pois não se sentia muito segura acerca de seu valor, além de estar às voltas com o seu romance Mrs. Dalloway (1925)WOOLF, Virginia. Mrs. Dalloway. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012 [1925]., como observa na entrada de diário do dia 8 de julho de 1923.

Gostaria de poder escrever As horas [Mrs. Dalloway] tão livre e vigorosamente quanto escrevinho Freshwater: a Comedy. É uma coisa estranha o modo árduo com que encontro meus romances; e ainda assim Freshwater é apenas uma espirituosa diversão; e The Hours têm certo mérito sério5 5 No original: I wish I could write The Hours as freely and vigorously as I scribble Freshwater, a Comedy. It’s a strange thing how arduous I find my novels; and yet Freshwater is only spirited fun; and The Hours has some serious merit”.

(WOOLF, 2008WOOLF, Virginia. Selected Diaries. Edição de Anne Olivier Bell. London: Vintage, 2008. , p. 165).

Foi apenas em 1935 que ela decidiu não apenas revisar a peça, mas também montá-la. A versão de 1923, que tinha apenas um ato, torna-se uma peça de três atos no trabalho de colaboração com a sua irmã Vanessa Bell (1879-1961), e é encenada para familiares e amigos em uma das muitas festas organizadas pelos artistas e pensadores de Bloomsbury6 6 Em janeiro de 1935, como nos informa o biógrafo e sobrinho de Virginia Woolf Quentin Bell (1972, p. 189), no estúdio de sua mãe, Vanessa Bell, em uma das muitas festas organizadas pelos intelectuais e artistas de Bloomsbury, Freshwater, uma sátira da era vitoriana, é montada pela primeira vez. Figuras desse período são ficcionalizadas por Woolf e são performadas por amigos e familiares. Leonard Woolf, como o jurista Charles Hay Cameron; Vanessa Bell, como a fotógrafa Julia Margaret Cameron; Duncan Grant, como o pintor George Frederic Watts; Julian Bell, como John Craig (único personagem inteiramente ficcional); Adrien Stephen, como o poeta Alfred Tennyson; Angelica Bell, como a atriz Ellen Terry; Ann Stephen, como Mary, uma das empregadas de Julia Cameron; e Eve Younger (amiga de Angelica), como a Rainha Victoria. . Woolf ainda tinha receios acerca da qualidade de seu projeto, mas, dessa vez, parecia entender a potência de sua comédia, apesar de continuar expressando sentimentos dúbios em seus diários.

Assim, apesar de tais ressalvas e sentimentos ambivalentes da própria Woolf, acredita-se que traçar paralelos entre o seu projeto estético/político e sua única peça, inserindo Freshwater em um debate mais amplo sobre os diversos projetos modernistas e suas implicações contemporâneas, pode contribuir bastante não apenas para os estudos woolfianos no Brasil e no exterior, mas também para a abertura de novos caminhos de pesquisa nas Humanidades para se pensar produções e experimentos artísticos que em nada se dissociam de debates e embates políticos. Aliando-se aos estudos woolfianos e expandindo o escopo da atual virada estético-política dos intérpretes da escritora inglesa, este artigo estabelece, então, um outro lugar na crítica contemporânea para Freshwater, que será lida como mais uma interferência política, estética e feminista fundamental para continuarmos a apreender o amplo projeto experimental que Woolf elaborou ao longo de seus 59 anos.

Ver-se-á, portanto, que Freshwater é um projeto que conjuga tempos e espaços e pode ser lida com diferentes chaves de leitura, contribuindo para pensarmos e reavaliarmos qualificadores críticos tais como pós-vitoriano, modernista, e avant-garde. Ao contrário de uma análise da peça, aqui pretendemos fazer um mapeamento dos debates modernistas, criando sugestões de como Freshwater também pode contribuir para reavaliações de seu período de produção, o “modernismo”. Que a comédia de Woolf tenha sido produzida para um público convidado, reunido no estúdio de sua irmã Vanessa Bell, dá à peça o caráter de uma festa modernista. Como diz Kate McLoughlin ao pensar a festa como topos modernista, essas festas nos dão a oportunidade para “repensar espaço, lugar e tempo, e para nos engajarmos com micromodernismos (a noite única, o almoço isolado), para apreciar o potencial de um fenômeno que é ao mesmo tempo experiência social e geográfica e dispositivo literário” (MCLOUGHLIN, 2013MCLOUGHLIN, Kate. Introduction: A Welcome from the Host. In: MCLOUGHLIN, Kate (Org.). The Modernist Party. Edinburgh: Edinburgh University Press, 2013. p. 1-24., p. 19). Freshwater, performada em uma noite isolada como uma dessas experiências sociais e geográficas — atuada na e pela boemia de Bloomsbury, mas cuja ação se passa na boemia vitoriana de Freshwater —, nos guiará então em incursões críticas sobre seu tema pós-vitoriano, seu lugar de enunciação por e para o Bloomsbury Group, e as discussões recentes sobre conceituação do termo “modernismo”. Sugerido nas linhas a seguir está o entendimento de que a farsa de Woolf, mesmo que tenha sido concebida como uma mera brincadeira, também constitui de forma especial as cenas modernistas da primeira metade do século XX.

Freshwater, uma farsa pós-vitoriana

A primeira menção direta que Woolf faz sobre a possibilidade de escrever uma comédia é em seus diários, no dia 30 de janeiro de 1919. Embora seja possível inferir que esta ideia já rondasse o seu imaginário de escritora, é aqui que Woolf dá as primeiras pistas sobre o que virá a ser Freshwater: A Comedy, uma comédia de costumes da era Vitoriana, que irá debochar das excentricidades de artistas desse período, incluindo a renomada fotógrafa Julia Margaret Cameron (1815-1879), tia-avó de Woolf.

Agora, para que eu possa me recompor, vou parar de ler o que a Sra. Watts diz sobre George Frederic, e começar a ler Antígona de Sófocles. Um segundo — devo registrar, para uso futuro, as grandiosas possibilidades de Freshwater para uma comédia. O velho Cameron vestindo um roupão azul e não indo além do seu jardim por doze anos, de repente toma emprestado o casaco de seu filho, e caminha em direção ao mar. Então eles decidem ir para o Ceilão, levando consigo seus caixões, e a última aparição da tia Julia é a bordo de um navio, mostrando aos carregadores enormes fotografias de Sir Henry Taylor e da Madonna com uma pequena diferença no padrão.

(WOOLF, 1977WOOLF, Virginia. A Room of One’s Own. London: Grafton, 1977 [1929]., p. 237)7 7 No original: “Now to tune myself up I am going to shut Mrs Watts upon George Frederick, and open the Antigone of Sophocles. One second - I must note for future use, the superb possibilities of Freshwater for a comedy. Old Cameron dressed in a blue dressing gown and not going beyond his garden for twelve years, suddenly borrows his son’s coat, and walks down to the sea. Then they decide to proceed to Ceylon, taking their coffins with them, and the last sight of Aunt Julia is on board ship, presenting porters with large photographs of Sir Henry Taylor and the Madonna in default of small change”.

Nessa entrada de diário, Woolf faz referência à biografia do pintor simbolista George Frederick Watts (1817-1904), escrita por sua esposa, a designer simbolista Mary Watts (1849-1938), e comenta brevemente sobre a ida dos Camerons8 8 Julia Margaret Cameron era casada com o jurista Charles Hay Cameron (1795-1880). para o Ceilão (atual Sri Lanka), colônia do Império Britânico, levando consigo seus caixões (HERBERT, 2014HERBERT, Eugenia. Julia Margaret Cameron in Ceylon: Idylls of Freshwater vs. Idylls of Rathoongodde, 2014. Disponível em: <https://publicdomainreview.org/essay/julia-margaret-cameron-in-ceylon-idylls-of-freshwater-vs-idylls-of-rathoongodde>. Acesso em 22 de outubro de 2020.
https://publicdomainreview.org/essay/jul...
, n/p). Woolf deixa claro que pensa em Freshwater, e o grupo de artistas que lá se reuniam, de modo cômico. Desse modo, os efeitos cômicos que pretende performar em sua comédia colocam aqueles artistas da era Vitoriana em uma suspensão temporal e espacial a partir de um olhar que hoje podemos chamar de modernista, tendo como referência histórica a virada do século XIX para o XX e a arte experimental que se torna marca da literatura produzida entre 1910 e 1945, no dito “modernismo”, para seguir a eleição de datas arbitrárias, mas didáticas, da crítica literária woolfiana Jane Goldman (2004)GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004..

A vila de Freshwater, localizada no extremo oeste da Ilha de Wight, tornou-se um símbolo geográfico no qual uma comunidade artística vitoriana se formou. O poeta Alfred Tennyson (1809-1892) comprou uma casa (Farringford House) em Freshwater, a fim de se isolar e fugir da agitação urbana, mas sua casa acabou se tornando um chamariz para admiradores, turistas e artistas, tais como a fotógrafa Julia Margaret Cameron, que visitou o poeta e acabou se encantando por aquela atmosfera artística, decidindo mudar-se para a ilha em 1860 (Cf. FORD, 2003FORD, Colin. Geniuses, Poets and Painters: the World of Julia Margaret Cameron. In: COX, Julian; FORD, Colin (Orgs.). Julia Margaret Cameron: the complete photographs. Los Angeles: The J. Paul Getty Museum, 2003. p. 11-40.; SWENSON 2017SWENSON, Kristine. Hothouse Victorians: Art and Agency in Freshwater. In: Open Cultural Studies. California, vol.1, n. 1, p. 183-193, Oct./Nov. 2017.). A casa dos Camerons (Dimbola Lodge9 9 O nome da casa dos Camerons não é aleatório. Dimbola é também o nome de um distrito localizado na Província Central no Ceilão (atual Sri Lanka), colônia do Império Britânico onde os Camerons tinham terras (HERBERT, 2014). O país torna-se independente em 1948. ) era bem próxima à de Tennyson. Essas casas tornaram-se centros de produção artística, onde o poeta laureado recitava seus poemas e Julia Cameron exercitava a arte da fotografia, tendo o próprio Tennyson e outros artistas, tais como o pintor George Watts e sua primeira esposa, a jovem atriz Ellen Terry (1847-1928), como objetos dessa atividade. Como aponta Swenson (2017, p. 186)SWENSON, Kristine. Hothouse Victorians: Art and Agency in Freshwater. In: Open Cultural Studies. California, vol.1, n. 1, p. 183-193, Oct./Nov. 2017., essa comunidade de artistas reproduzia valores vitorianos de gênero (masculino/feminino), apesar de seu grande potencial boêmio para questionar os mesmos ideários.

Com Freshwater, Woolf, tanto na versão de 1923 quanto na de 1935, desconstrói comicamente as imagens desses artistas vitorianos. O poeta laureado Alfred Tennyson é um alienado que só consegue pensar em sua poesia, além de poder ser lido também, nos dias de hoje, como um libertino quando faz insinuações de cunho sexual a Ellen. “Você já viu a pele de um poeta? Ah, você tinha que me ver no banho!”10 10 No original: “[H]ave you ever seen a poet’s skin? — a great poet’s skin? Ah, you should see me in my bath!” ; “e você é uma moça muito bonita. Sente-se no meu colo”11 11 “No original: And you’re a very beautiful wench. Get on my knee” (WOOLF, 1923WOOLF, Virginia. Orlando: A Biography. Londres: Penguin Classics, 1993 [1928]., p. 71). Ellen responde prontamente a essas insinuações de modo debochado ao dizer que a pele de Tennyson é feia e murcha. Já o pintor simbolista George Watts tem uma de suas obras simbolistas mais famosas, o quadro Mammon (1884-5), simplesmente ridicularizada na farsa de Woolf. Watts, de forma exagerada, tem dificuldades para finalizar o dedão da Cobiça (Mammon), que soa como um detalhe bastante insignificante para um pintor tão experiente. E o casal Cameron é bastante excêntrico: Charles Cameron passa a maior parte do tempo dormindo e, quando acorda, diz coisas aparentemente sem sentido; e Julia Cameron é tão obcecada por sua arte que chega a mandar matar um peru para que sua fotografia saia do jeito que imagina. Se todas essas figuras contribuíram de forma significativa para a cena artística de seu tempo, Woolf questiona até que ponto os boêmios artistas de Freshwater viviam realmente de forma transgressiva, ou apenas sob um modo radical de encenação do mote “a arte pela arte”. Ao optar por enfatizar alguns dados biográficos desses artistas para fins cômicos, Woolf parece questionar se a transgressão não era mera alienação, direcionando seu riso tanto ao passado quanto ao seu presente, para a boemia e os debates avant-garde e modernistas dos amigos e intelectuais de Bloomsbury (GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004.; PINHO, 2015PINHO, Davi. Imagens do feminino na obra e vida de Virginia Woolf. Curitiba: Appris, 2015.), principalmente quando pensamos nas intervenções políticas que eles/elas realizaram via brincadeiras como forma de criticar os padrões de gênero (masculino e feminino), bem como afrontar o Império com embustes, como o infame Dreadnought Hoax (Cf. FARFAN, 2004FARFAN, Penny. Women, Modernism, and Performance. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.).

Em síntese, todos esses eventos são satirizados em Freshwater e, de acordo com Kristine Swenson (2017, p. 184)SWENSON, Kristine. Hothouse Victorians: Art and Agency in Freshwater. In: Open Cultural Studies. California, vol.1, n. 1, p. 183-193, Oct./Nov. 2017., o que há de cômico nesses eventos — e o fato de o subtítulo da peça ser a comedy não é por acaso — é justamente percebido por um distanciamento histórico. Afinal, o que ainda havia de vitoriano na vida e na arte daqueles que hoje qualificamos como modernistas? A comunidade de artistas de Freshwater que se formou em meados do século XIX pode ser comparada ao que veio a ser o grupo de intelectuais de Bloomsbury, e do qual Virginia Woolf fazia parte?

Para Marion Dell (2015, p. 85)DELL, Marion. Virginia Woolf’s Influential Forebears: Julia Margaret Cameron, Anny Thackeray Ritchie and Julia Prinsep Stephen. London: Palgrave Macmillan, 2015., Woolf falha em reconhecer os avanços artísticos de seus ascendentes, em especial de Julia Cameron, sua tia-avó, uma das mais proeminentes fotógrafas da era vitoriana. Contudo, o riso12 12 A qualidade profanadora, desierarquizante, e reorientadora do riso aparecerá diversas vezes na obra de Woolf, desde 1905, quando publica o ensaio “The Value of Laughter” (1905) no The Guardian em 16 de agosto daquele ano. que Woolf parece produzir não se direciona à arte dos seus antepassados, mas sim ao lugar que esses artistas ocupavam na sociedade vitoriana. O crítico woolfiano Steve Ellis, em seu livro Virginia Woolf and the Victorians (2007), discorre sobre a postura um tanto ambígua de Woolf em relação aos seus antecedentes vitorianos. Tal postura pode ser entendida como uma forma de admiração ou de crítica. A partir das considerações de Jane Marcus acerca da postura um tanto ambígua de Woolf diante de seu passado, Ellis faz a seguinte ponderação:

Se Woolf vez ou outra voltou o seu olhar para a era vitoriana com ‘ódio apaixonado’, nas palavras de Marcus, nós também com frequência nos deparamos com uma atitude de admiração, que não indica um desejo de ‘retorno’ ao passado, mas o reconhecimento de um legado que pode ser profícuo para a modernidade de várias formas.

(ELLIS, 2007ELLIS, Steve. Virginia Woolf and the Victorians. New York: Cambridge University Press, 2007., p. 4)13 13 No original: “If Woolf at times looked back at the Victorian era with ‘passionate hatred’ in Marcus’s phrase, we also frequently find an attitude of admiration, which indicates not a desire to ‘return’ to the past, but the recognition of an inheritance that can be serviceable to modernity in various ways”.

Esse legado para o qual Woolf olha com olhos modernistas é chamado por Ellis de “pós-vitoriano”, o que é bem diferente de “anti-vitoriano”, “pró-vitoriano” ou “neo-vitoriano”. O prefixo “pós”, muitas vezes utilizado por críticos com a conotação de “depois”, é trabalhado por Ellis como uma forma modernista de coexistir com o passado. “Nesse sentido, ‘pós’ tem mais o atributo que se expressa em conceitos como pós-impressionismo ou pós-modernismo, uma relação complexa de diferença e dívida”14 14 No original: “In this sense, ‘Post’ has more of the value it carries in expressions like post-Impressionism or postmodernism, a complex relationship of difference and debt”. (ELLIS, 2007ELLIS, Steve. Virginia Woolf and the Victorians. New York: Cambridge University Press, 2007., p. 1). Chamar Woolf de “pós-vitoriana” é reconhecer que a escrita de Woolf tem a potência não de eliminar ou se desconectar do passado, mas de performar novas formas de ser e estar no mundo em relação ao que veio antes. Ellis afirma que a relação ambígua que Woolf estabelece entre os vitorianos e a cultura modernista e sua acepção de perda e ganho, de desejo e rejeição, é uma forma de desmantelar falsos monumentos e falsas certezas, posto que tais monumentos e afirmações podem atenuar a força criativa da mudança e da reinterpretação dos mitos que circundam a sociedade (ELLIS, 2007ELLIS, Steve. Virginia Woolf and the Victorians. New York: Cambridge University Press, 2007., p. 6). Ao longo de toda a sua carreira, Woolf nunca deixou de voltar o seu olhar modernista para o seu passado, política e artisticamente. As personagens satirizadas em Freshwater, assim como suas histórias de vida, deixam entrever a poética “pós-vitoriana” de Woolf. Ou seja, se em A Room of One’s Own (1929), ao destacar que as mulheres pensam através dos corpos de suas mães, Woolf dá contornos feministas à questão modernista elaborada por Eliot em “Tradition and the Individual Talent” (1919)ELIOT, T. S. Tradition and the Individual Talent. In: ELIOT, T. S. Selected Essays, 1917-1932. Nova York: Harcourt, Brace and Company, 1932 [1919]. p. 3-11., Freshwater também o faz. Olhar para o seu passado diz menos sobre a não superação do que veio antes e mais sobre a tentativa de reescrever narrativas mal contadas, exumar corpos que foram enterrados nas tumbas do silêncio, assim como questionar as instituições que mantêm essas histórias nos recônditos da história.

“Em ou por volta de dezembro de 1910 o caráter humano mudou” — Freshwater em Bloomsbury

No ensaio “Mr. Bennett and Mrs. Brown” (1924), que pode ser considerado mais um polêmico manifesto modernista, como sugerem S. P. Rosenbaum (1993)ROSENBAUM, S. P. (Org.) A Bloomsbury Group Reader. Cambridge: Blackwell Publishers, 1993. e Jane Goldman (2004)GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., Woolf tece considerações sobre as relações conflituosas entre personagem e ficção, a fim de fazer uma crítica direta aos escritos e escritores que ela denominou Eduardianos — fazendo referência ao reinado de Eduardo VII (1841 – 1910) —, em oposição aos Georgianos - com referência ao rei George V (1865 – 1936), cujo reinado começou em 1910 após a morte do rei Eduardo. Aqueles, para Woolf, não foram capazes de acompanhar as transformações que ocorriam no início do século XX. E, quando o mundo muda, as formas de narrar e construir personagens também mudam. Os Georgianos, por outro lado — tal como Lytton Strachey, T. S. Eliot, James Joyce — comungavam com as mudanças sociais, culturais e históricas do início do século (principalmente se levarmos em consideração que a rainha Victoria [1819 -1901] morrera em 1901, após seu reinado que começara em 1837). Para Woolf, tais mudanças culminam na seguinte assertiva: “em ou por volta de dezembro de 1910 o caráter humano mudou”15 15 No original: “[...] on or about December 1910 human character changed”. (WOOLF, 1924, p. 235). Em 1924, portanto um ano após dar início ao seu trabalho em Freshwater, ela olhava para o seu recente passado e examinava as mudanças pelas quais a Inglaterra e o mundo passaram, principalmente após a Primeira Guerra Mundial, que assolou a Europa de 1914 a 1918. Com isso em mente, faremos uma breve parada em Bloomsbury nesta seção.

Como anota Jane Goldman (2004)GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., entre 1910 e 1924 o mundo já havia visto e enfrentado grandes mudanças e catástrofes, cujos efeitos deixaram uma espessa nuvem de dúvida e impossibilidade no ar acerca das instituições seculares erigidas pelo pensamento ocidental. Além da Primeira Guerra Mundial, houve a Revolução Russa de 1917 e a ascensão do Partido Bolchevique com o assassinato do imperador russo, marcando o fim o Império Tsarista. Em 1922, após o Tratado Anglo-Irlandês, a República da Irlanda tornou-se um estado independente do domínio do Império Britânico. A Marcha sobre Roma de Mussolini marca a ascensão do fascismo em 1922. Com o fracassado Putsch de Munique, Adolf Hitler tentou dar um golpe de estado contra a região da Baviera na Alemanha em 1923. Já no contexto britânico, em 1910, o movimento sufragista começou a ganhar força e, consequentemente, começou a incomodar o sistema político da época. No dia 18 de novembro de 1910, dez dias após a exibição pós-impressionista, como nos informa Goldman (2004, p. 157), centenas de mulheres reuniram-se e marcharam em direção às Casas do Parlamento Inglês, como forma de protesto contra a legislação que daria direito ao voto apenas às mulheres da elite. A manifestação foi esmagada por uma violenta investida policial e esse dia ficou conhecido como Black Friday (Sexta-feira Sangrenta). Já nas eleições de 1924, a Inglaterra viu Ramsay MacDonald (1866 – 1937), o primeiro trabalhista a tornar-se primeiro-ministro do Reino Unido, ser derrotado pelo conservador Stanley Baldwin (Cf. GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., p. 37).

Esses breves exemplos ilustram e revelam a crise da modernidade que marca a primeira metade do século XX e a formação de novas ordens sociais, e para Woolf as mudanças pelas quais o mundo estava passando colocavam em xeque não apenas essa tal modernidade, seus avanços tecnológicos e suas instituições, mas também o modo como as narrativas políticas e artísticas poderiam elaborar e rearticular tais mudanças. Afinal, “quando relações humanas mudam há ao mesmo tempo uma mudança na religião, no comportamento, na política e na literatura” (WOOLF, 1924, p. 235). Portanto, o ensaio “Mr. Bennett and Mrs. Brown”, além de poder ser lido como um manifesto modernista, como sugerem Rosenbaum e Goldman, pode também ser lido como um manifesto “pós-vitoriano”, para utilizar o conceito de Ellis. Este ensaio de Woolf foi escrito no limiar do tempo, tempo este que tensiona as turbulências do presente e do passado.

Em 1910, além da morte de Eduardo VII e da ascensão de George V, ocorreu uma exposição de arte pós-impressionista, organizada pelo pintor e crítico de arte inglês Roger Fry (1866-1934), intitulada Manet and the Post- Impressionists. Essa exposição objetivava romper e questionar os ideários acerca das pinturas tridimensionais que ainda estavam em voga na Inglaterra (PINHO, 2015PINHO, Davi. Imagens do feminino na obra e vida de Virginia Woolf. Curitiba: Appris, 2015., p. 61). Essa tentativa de rompimento causou muita polêmica e alvoroço, posto que muitos dos pintores Impressionistas – Monet, Renoir, Degas, por exemplo – ainda estavam produzindo suas obras. Contudo, para Fry, havia um novo modo de expressão, visto que, embora pintores impressionistas ainda estivessem produzindo, já havia na Europa novas técnicas e pintores – tais como Paul Cézanne, Vincent van Gogh e Paul Gauguin – que pensavam em novas formas para a noção de Impressionismo. Para a crítica de arte Belinda Thompson, em seu livro Post Impressionism (1998), o que separa Cézanne dos impressionistas é a sua “preocupação com a forma sólida, com valores táteis, com representar não a luz do sol em si, mas seu efeito através de um efeito de pintura, a cor” (THOMPSON, 1998 apud PINHO, 2015PINHO, Davi. Imagens do feminino na obra e vida de Virginia Woolf. Curitiba: Appris, 2015., p. 62). Ou seja, os pós-impressionistas utilizavam formas geométricas, figuras fragmentadas e distorcidas, a fim de conectar o observador com a coisa em si imaginada e concebida pelo artista, pois essa coisa em si potencialmente permite gerar diversas interpretações.

Em 1912, houve a segunda mostra de arte pós-impressionista na Inglaterra. Esta deu destaque para artistas ingleses, como a pintora Vanessa Bell, irmã de Woolf. Não apenas a presença de uma mulher diferenciava esta exibição daquela de 1910. A mostra de 1912 destacou os conceitos de “forma significativa” e “emoção estética”16 16 “significant form” e “aesthetic emotion”. , cunhados pelo crítico de arte, e marido de Vanessa Bell, Clive Bell. Esses termos apareceram pela primeira vez no catálogo da exibição de 1912 e acabaram tornando-se sinônimos para pós-impressionismo para aqueles artistas, como destaca Goldman (2004, p. 45)GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004.. Alguns anos depois, Clive Bell elabora o seu conceito de “forma significativa” em seu ensaio intitulado “The Artistic Problem” (1919), escrito para a revista The Athenaeum. Para Bell, obras de arte são “formas significativas”, não necessariamente belas, posto que trabalhos artísticos são “criações e expressões de mentes conscientes”17 17 No original: “[...] creations and expressions of conscious minds”. (BELL, 1919BELL, Clive. The Artistic Problem. In: ROSENBAUM, S.P. (Org.) A Bloomsbury Group Reader. Cambridge: Blackwell Publishers, 1993 [1919]. p. 102-106., p. 103). Em outras palavras, obras de arte são “formas significativas” completas em si e que são capazes de gerar “emoções estéticas”, e estas seriam características comuns a todos os trabalhos de arte, incluindo textos literários e teatrais, embora estes últimos não componham a análise de Bell. Entretanto, há um “problema artístico” que circunda a concepção dessas obras. Para Bell, há uma diferença entre concepção e criação. O impulso criativo do artista é atravessado pela técnica a ser utilizada no momento da criação, e tal impulso precisará de algo que ultrapasse o mero desejo de criação (BELL, 1919BELL, Clive. The Artistic Problem. In: ROSENBAUM, S.P. (Org.) A Bloomsbury Group Reader. Cambridge: Blackwell Publishers, 1993 [1919]. p. 102-106., p. 104). Bell, parece sugerir que a concepção de uma obra deva ser mobilizada pela experiência estética do artista, sem a preocupação de meramente representar formas belas. “Formas significativas”, então, são aquelas que harmonizam, ao mesmo tempo em que apagam, impulso artístico e processo de criação, e que esse movimento gere imagens várias paras leitores e espectadores.

Desse modo, os amigos do grupo de Bloomsbury— Virginia Woolf, Vanessa Bell, Leonard Woolf, Duncan Grant, Roger Fry, Lytton Strachey, John Maynard Keynes, E.M. Foster, entre outros —, buscavam experimentar novas formas de ler, pintar e escrever o mundo, além de questionar a tradição e performances de gênero que ainda assombravam o início do século, tal como Woolf vislumbrou e teorizou em seu “Mr. Bennett and Mrs. Brown”. As intervenções artísticas dos amigos de Bloomsbury foram deveras influenciadas tanto pelo conceito de “forma significativa” de Bell quanto pelo “método formalista” que Fry herdou de Cambridge e contribuiu para os movimentos artísticos de vanguarda na Inglaterra, dentre os quais podemos destacar sua exposição de 1910.

É importante ressaltar que o pensamento de Bloomsbury herdou também os fundamentos da teoria do conhecimento que foram amplamente debatidos em Cambridge. Alguns dos homens intelectuais que haviam terminado seus estudos na Universidade de Cambridge, tais como Roger Fry, Desmond MacCarthy, E. M. Foster e Lytton Strachey, foram recrutados pela irmandade que ficou conhecida como os Apóstolos de Cambridge, sociedade de intelectuais que debatiam diversos assuntos de cunho acadêmico, e a participação dessa irmandade era apenas consentida sob convite prévio. No caso dos intelectuais de Bloomsbury, eles disseminaram pressupostos teóricos e filosóficos com base nas palestras proferidas por Bertrand Russell (1872 – 1970) e G. E. Moore (1873 – 1958). Como nos informa Pinho ao ler Ann Banfield (2000)BANFIELD, Ann. The Phantom Table. Cambridge: Cambridge University, 2000., o método filosófico e científico propagado em Bloomsbury fora herdado dos ilustres intelectuais de Cambridge, mas em se tratando de um círculo fechado, havia uma dimensão social que ficava fora desse grupo (PINHO, 2015PINHO, Davi. Imagens do feminino na obra e vida de Virginia Woolf. Curitiba: Appris, 2015., p. 43). Mas, se os projetos políticos e artísticos de Bloomsbury surgem como resposta à mesma teoria que influenciou seus debates iniciais em Cambridge, Pinho propõe que a experiência de Vanessa e Virginia na casa vitoriana da família Stephen pode ser um outro mito de origem para Bloomsbury, um mito que reenquadra a influência de Cambridge para pensar o desejo por mudança como algo que as jovens meninas Stephen já almejavam — um mito feminino, portanto. Então, se os debates embrionários dos amigos de Bloomsbury têm uma herança masculina, como aponta Goldman, a estética formalista de Woolf ganha contornos feministas (GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., p. 40), muitas vezes fazendo da comicidade e do riso suas formas de intervenção.

Apesar das significativas considerações teóricas e filosóficas de Fry e Clive Bell terem forte e amplamente influenciado o pensamento desse grupo de amigos, intelectuais e artistas, a presença de Woolf e Vanessa Bell deu novos ares à estética de Bloomsbury. Woolf e Bell não frequentaram as salas de aula de Cambridge. Por conseguinte, suas obras são informadas tanto por suas participações em encontros e festas (tal como a festa na qual Freshwater foi encenada) realizados por seus amigos quanto pela educação privada que receberam. Mesmo tendo acesso à biblioteca do pai, intelectual e biógrafo, a conversas com o irmão Thoby Stephen (1880 – 1906), que foi para Cambridge, e a aulas de literatura e pintura, a contribuição estética e política de Woolf e Bell parte do silêncio imposto às mulheres pelas cerimônias do lar vitoriano. A parceria delas18 18 No livro Virginia Woolf and the Theatre (2012), Steven D. Putzel mostra imagens das anotações que Vanessa Bell, irmã de Virginia Woolf, fez para a performance de Freshwater em 1935, o que evidencia que as irmãs trabalharam juntas. Essas anotações dão evidências do cuidado e do profissionalismo que Vanessa Bell teve com os ensaios. Além de interpretar amadoramente Julia Margaret Cameron, Vanessa pode ser considerada também a diretora da peça, levando em consideração tanto as suas notas acerca do elenco e quanto as alterações feitas ao texto. Além disso, Putzel (2012, p. 67) nos informa que Vanessa Bell também havia feito uma lista de fantasias, intitulada “Roupas”, e desenhos que faziam sugestões sobre tipos de penteado. Ver também a tese de doutorado Freshwater: uma comédia de Virginia Woolf – uma farsa modernista em traduação (UERJ, 2022), de Victor Santiago. na produção e elaboração de Freshwater, então, se torna fundamental para pensarmos as dimensões públicas e privadas de Bloomsbury.

Se Bloomsbury estava eletrizado por questões da representação literária e pictórica, não é por acaso então que Woolf escolha outra comunidade de artistas que também estava às voltas com as mesmas questões no século XIX, justamente o século dos Eminent Victorians19 19 Referência a Eminent Victorians (1918), estudo do biógrafo e crítico literário Lytton Strachey (1880-1932) sobre a Era Vitoriana. , que os Bloomsburies tentavam superar. Voltar ao grupo de amigos de sua tia-avó, Julia Margaret Cameron, se torna uma forma irônica de autorreflexão, de autocrítica, como se, com sua comédia, Woolf levantasse espelhos para sua plateia, ao modo de Miss La Trobe em Between the Acts (1941), último romance de Woolf. Bloomsbury pode ser lido como uma ilha nesse sentido, como um lugar que faz da vida privada um experimento aberto a novos modos de ocupar o mundo público. Mas até que ponto, ao fazer da comunidade privada um experimento aberto para novas possibilidades na vida e na arte, Bloomsbury se esquivava da realidade material do mundo à sua volta? Seria essa a pergunta constitutiva de Freshwater: a Comedy? Ou seja, seria essa a pergunta que a fez recuperar e redimensionar a comunidade de Freshwater?

Tanto na versão de 1923 quanto na de 1935, o personagem Watts fala com Tennyson sobre o seu processo criativo e sua preocupação em concluir sua obra de modo satisfatório. A obra à qual Woolf faz referência é Mammon (1884-5), que se encontra no museu de arte Tate Britain, um dos museus mais importantes e reconhecidos do Reino Unido. Apesar da importância de Watts para a história da arte, Woolf o pinta como um artista um tanto fútil e deveras preocupado com detalhes aparentemente insignificantes. Em dado momento, após perguntar se alguém havia visto Ellen, musa de sua pintura, que havia saído de cena, Watts mostra-se bastante preocupado com a perfeição do dedão de Mammon, a Cobiça. O seu trabalho árduo diz mais respeito à perfeição dos traços do que à presença de sua jovem esposa que sumira há poucos minutos. “Tudo por um bem maior. Finalmente a minha prece foi ouvida; meu pedido contemplado. O dedão, o grande dedão está agora em harmonia com a pintura”20 20 No original: “The Utmost for the Highest! The Utmost for the Highest. At last my prayer has been heard; my request granted. The toe, the big toe, is now in drawing”. (WOOLF, 1923WOOLF, Virginia. Orlando: A Biography. Londres: Penguin Classics, 1993 [1928]., p. 73). Após essa fala, Watts é questionado por Tennyson acerca da real importância do dedão da Cobiça. Watts sente-se despertado de uma exaltação momentânea e concorda com o poeta. Ele resolve voltar a sua atenção para os trajes da Modéstia, como se pode observar na seguinte passagem da versão de 1935.

Você me faz perceber que mesmo sendo bem-sucedido, humanamente falando, com o dedão, ainda não resolvi o problema dos trajes. [Ele vai até o quadro e pega o tento.]. Isso de fato é um problema profundamente difícil. Pela minha forma de lidar com os trajes, desejo expressar duas importantes ideias, embora bem contraditórias. Em primeiro lugar, desejo passar para o espectador a ideia de que a Modéstia está sempre usando um véu; em segundo lugar, de que a Modéstia está completamente nua. Por muito tempo, tenho refletido com incertezas. Finalmente, consigo pensar em uma solução. Vou envolvê-la em uma bela textura branca que tenha a aparência de um véu; mas se examiná-la de perto parece ser composta de inúmeras estrelas. Trata-se basicamente da Via Láctea. Você me pergunta por quê? Vou te dizer. Porque se você consultar a mitologia dos antigos Egípcios, você verá que a Via Láctea estava lá para simbolizar – deixe-me ver, o que ela simbolizava - [Ele abre o seu livro.]21 21 No original: “You are right, Alfred. You have recalled me from my momentary exaltation. You remind me that even if I have succeeded, humanly speaking, with the great toe, I have not solved the problem of the drapery. [He goes to the picture and takes a mahlstick.] That indeed is a profoundly difficult problem. For by my treatment of the drapery I wish to express two important but utterly contradictory ideas. In the first place I wish to convey to the onlooker the idea that Modesty is absolutely naked. For a long time I have pondered at a loss. At last I have attempted a solution. I am wrapping her in a fine substance which has the appearance of a veil; but if you examine it closely it is seen to consist of innumerable stars. It is in short the Milky Way. I will tell you. For if you consult the mythology of the ancient Egyptians, you will find that the Milky Way was held to symbolise – let me see, what did it symbolise – [He opens his book.]”

(WOOLF, 1935, p. 17-19)

Atentemos para a brincadeira que Woolf faz, na citação acima, com o fato de Watts, um pintor simbolista, querer que sua pintura se baseie na mitologia dos antigos egípcios. De fato, Watts era fascinado pela arte egípcia e chegou a passar a sua lua-de-mel com Mary Watts, sua segunda esposa, no Egito. Mary Watts, responsável pela biografia do marido, anota que “o antigo Egito interessava profundamente a Watts. Quanto mais remota fosse a dinastia, mais atenção era exigida dele”22 22 No original: “[...] ancient Egypt was of absorbing interest to Signer. The more remote the dynasty, the greater the claim made on his attention”. (WATTS, 1912WATTS, Mary S. George Frederic Watts: the Annals of an Artist’s Life. vol. 2. London: MacMillan & Co. Limited, 1912., p. 68). Durante a lua-de-mel, eles visitaram vários monumentos, mas foi a Grande Esfinge de Gizé que mais chamou a atenção do pintor. Mary Watts diz que o marido observou a estátua de pedra calcária por diferentes ângulos para ser capaz de vê-la sob diferentes pontos de iluminação. Para o artista, aquela esfinge representava o “epítome de toda a arte egípcia, com sua solenidade, mistério – imensidão!”23 23 No original: “[…] an epitome of all Egyptian art, its solemnity, mystery – infinity!” (Ibidem, 1912, p. 66) E como resultado de seu grande interesse pela arte egípcia, George Watts pintou Sphinx (1887).

No entanto, a tumba do jovem Tutancâmon foi encontrada em 1922, um ano antes dos primeiros rascunhos de Freshwater, o que põe em xeque a ideia simbólica de George Watts acerca de a Esfinge de Gizé ser a grande representante da arte egípcia, posto que havia ainda muito a ser descoberto e revelado acerca dessa cultura. Desse modo, Woolf lança um olhar modernista e cômico para a era vitoriana, em especial na passagem acima, para a arte simbolista de Watts e seu interesse pela cultura egípcia, cujo ideário artístico objetivava capturar emoções e aspirações da vida através de uma linguagem simbólica universal (Cf. SHAUGHNESSY, 1995SHAUGHNESSY, Nicola. The Dramatic Writings of Gertrude Stein, Virginia Woolf and Sylvia Plath, 1913 -1962: Theatre of Identity. 374p. Doctoral Dissertation, Centre of Women’s Studies. The University of York, London, 1995.). O deboche de Woolf parece sugerir que a tentativa de Watts em representar a Modéstia sempre utilizando um véu, fazendo alusão aos manuais de conduta vitorianos, à própria noção de representação e à repressão que mulheres sofriam como receptáculos de um feminino dócil, falharia mais cedo ou mais tarde. Quando Watts abre o livro para consultar a mitologia dos antigos egípcios, ele poderia até achar informações relevantes para suas indagações, mas elas mudariam dali a alguns anos com as pesquisas dos egiptólogos no início do século XX e fora do reinado da rainha Victoria. Para Shaughnessy, o Watts pintado por Woolf é um bufão, um bobo da corte vitoriano, que vive em um mundo paralelo e fantasioso, e que é incapaz de se engajar em relações sociais (SHAUGHNESSY, 1995SHAUGHNESSY, Nicola. The Dramatic Writings of Gertrude Stein, Virginia Woolf and Sylvia Plath, 1913 -1962: Theatre of Identity. 374p. Doctoral Dissertation, Centre of Women’s Studies. The University of York, London, 1995., p. 174). Além disso, a pesquisadora salienta a sátira que Woolf faz acerca da arte simbolista de Watts e da idealização do feminino na era vitoriana.

Somos informados, em ambas as versões de Freshwater, de que a jovem Ellen Terry, primeira esposa de Watts, é a sua musa inspiradora. Contudo, ela é tratada de formas diferentes nas duas versões de Woolf. Na versão de 1923, a primeira menção à Ellen é feita em terceira pessoa em uma direção de palco.

[SR. TENNYSON fica compenetrado em sua leitura e não percebe que a SRA. CAMERON saiu da sala e SR. CAMERON adormeceu e ronca suavemente. TENNYSON não para de ler. A porta é aberta e ELLEN TERRY entra, envolta em um véu branco que cai por sobre sua cabeça, ombros e chega até os seus pés. SR. TENNYSON continua lendo para si mesmo em um tom de voz relativamente baixo, sem perceber que ELLEN está lá. SR. CAMERON continua roncando levemente]24

(WOOLF, 1923, p. 69).

Como podemos observar, Ellen já entra em cena envolta em um véu branco sobre sua cabeça. Woolf, no entanto, já parece estar debochando das expectativas vitorianas, mesmo antes de ela abrir a boca. Woolf coloca Ellen como uma caricatura da moça virgem vitoriana, mas aqui ela parece estar fantasiada e sua primeira fala quebra com tal expectativa. Ao observar que o Sr. Tennyson estava a ler seus poemas como de costume e o Sr. Cameron encontrava-se adormecido, Ellen diz:

ELLEN [olhando para os dois homens que ali estão]

Ah, sempre a mesma coisa. Nada muda nesta casa. Tem sempre alguém dormindo. O Sr. Tennyson está sempre lendo Maud. A cozinheira está sempre sendo fotografada. Os Camerons estão sempre dizendo que vão à Índia. Eu estou sempre posando para o meu marido. Sou a Modéstia hoje – a Modéstia aos pés da Cobiça. Se não fosse pela Cobiça, eu deveria estar lá ainda. Mas o dedão do pé da Cobiça não está em harmonia com a pintura. É óbvio que o Sr. Watts com os seus ideais não deixaria isso passar despercebido. Então eu saí de fininho e fugi25 25 No original: “O how usual it all is. Nothing ever changes in this house. Somebody’s always asleep. Lord Tennyson is always reading Maud. The cook is always being photographed. The Camerons are always starting for India. I’m always sitting to Signor. I’m Modesty today — Modesty crouching at the feet of Mammon. If it weren’t for Mammon, I should be there still. But Mammon’s big toe is out of drawing. Of course, Signor with all his high ideals couldn’t pass that. So, I slipped down and escaped”. .

(WOOLF, 1923, p. 69. Grifo nosso)

Essa fala de Ellen mostra que ela está atenta aos e ciente dos papéis que tanto seu marido quanto a sociedade vitoriana querem que ela performe. Vale notar, no entanto, que essa é a Ellen criada por Woolf, logo trata-se de uma personagem pós-vitoriana conjurada na cena modernista (Cf. ELLIS, 2007ELLIS, Steve. Virginia Woolf and the Victorians. New York: Cambridge University Press, 2007.). Ellen, na performance de 1935 no estúdio de Vanessa Bell, foi interpretada por Angelica Bell. Forma-se, então, com a performance, uma materialidade vanguardista dos debates empreendidos pelos amigos festeiros de Bloomsbury. Como já mencionado, Freshwater foi também um presente de aniversário para Angelica; assim, Woolf parece estar dando para a sua sobrinha uma oportunidade de reflexão teatral acerca de suas próprias performances sociais em comparação aos seus ascendentes vitorianos. Contudo, não foi apenas a sobrinha de Woolf que passou por esse processo de reflexão. Alguns dos artistas que performaram amadoramente na farsa de Woolf eram membros do grupo de Bloomsbury que pensaram e alargaram o “método formalista” proposto por Fry e o conceito de “forma significativa” de Clive Bell. A comicidade de Freshwater coloca em suspensão e satiriza os debates filosóficos desses intelectuais, que se iniciaram em Cambridge.

De acordo E. H. Wright (2011)WRIGHT, E. H. Bloomsbury at Play. In: Woolf Studies Annual. v. 17, p. 77–107, 2011. Disponível em: <www.jstor.org/stable/24906873>. Acesso em 07/08/2021.
www.jstor.org/stable/24906873...
acerca da estética da brincadeira em Bloomsbury, as noites teatrais e as festas, organizadas por amigos e familiares daquela comunidade de intelectuais, permitiam que opiniões, críticas e piadas sobre questões públicas e privadas fossem dramatizadas e satirizadas em esquetes cômicos. Por conseguinte, esses ambientes privados e protegidos pela comédia tornavam-se lugares seguros para que questões familiares pudessem se tornar não-familiares, e vice-versa (WRIGHT, 2011WRIGHT, E. H. Bloomsbury at Play. In: Woolf Studies Annual. v. 17, p. 77–107, 2011. Disponível em: <www.jstor.org/stable/24906873>. Acesso em 07/08/2021.
www.jstor.org/stable/24906873...
, p. 78). Diferentemente dos Apóstolos de Cambridge, os Bloomsberries criticavam e debochavam dos mesmos pressupostos que os formaram, principalmente aqueles herdados da era vitoriana. Porém, foi também nesse período que esses artistas, nascidos ainda no reinado da rainha Victoria, participavam de noites teatrais bastante comuns nos salões vitorianos (WRIGHT, 2011WRIGHT, E. H. Bloomsbury at Play. In: Woolf Studies Annual. v. 17, p. 77–107, 2011. Disponível em: <www.jstor.org/stable/24906873>. Acesso em 07/08/2021.
www.jstor.org/stable/24906873...
, p. 79). Por outro lado, de modo similar, os amigos de Bloomsbury também formavam um grupo cujas primeiras reuniões, os At Homes (Cf. PINHO, 2015PINHO, Davi. Imagens do feminino na obra e vida de Virginia Woolf. Curitiba: Appris, 2015., p. 42), e suas festas, repletas de piadas internas, não eram abertas a todos que quisessem ir, mas apenas para convidados seletos (WRIGHT, 2011WRIGHT, E. H. Bloomsbury at Play. In: Woolf Studies Annual. v. 17, p. 77–107, 2011. Disponível em: <www.jstor.org/stable/24906873>. Acesso em 07/08/2021.
www.jstor.org/stable/24906873...
, p. 83). Portanto, pensar o grupo de Bloomsbury, e suas intervenções artísticas e políticas, como um movimento avant-garde (de vanguarda, revolucionário) revela as complicações e as ambiguidades da cena modernista na qual Woolf estava inserida.

Freshwater, uma farsa modernista: por uma não conclusão

Os estudos de Jane Goldman (2004)GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004. e Michael H. Whitworth (2010)WHITWORTH, Michael H. Virginia Woolf, modernism and modernity. In: SELLERS, Susan (Org.). The Cambridge Companion to Virginia Woolf. New York: Cambridge University Press, 2010. p. 107-123. são lapidares para se pensar as diferenças entre as diversas cenas modernistas e seus potenciais vanguardistas. Os termos críticos avant-garde, moderno, modernista e pós-modernista são muitas vezes confundidos, posto que, de algum modo, todos são comumente entendidos como respostas às mudanças sociais e políticas da modernidade enquanto projeto. Mas há diferenças. Após o fim da Segunda Guerra Mundial em 1945, Goldman afirma que o termo “Modernismo”, principalmente quando associado aos movimentos artísticos do início do século XX, ganhou o epíteto de arte “autônoma” e “experimental”, ou seja, como autorreflexiva e desconectada dos debates sociais, algo que ficou conhecido como o High Modernism da década de 1920 (GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., p. 8). Do mesmo modo, o crítico woolfiano Michael H. Whitworth afirma nas primeiras linhas de seu ensaio, “Virginia Woolf, Modernism and Modernity” (2010), que pesquisas feitas entre as décadas de 1950 e 1960, bastante influenciadas pelo movimento formalista New Criticism, entendiam os movimentos modernistas em termos de experimentos na forma e no estilo, isolando o modernismo de qualquer engajamento sociopolítico (WHITWORTH, 2010WHITWORTH, Michael H. Virginia Woolf, modernism and modernity. In: SELLERS, Susan (Org.). The Cambridge Companion to Virginia Woolf. New York: Cambridge University Press, 2010. p. 107-123., p. 108). Para o New Criticism, por exemplo, o modernismo de Woolf era associado, de modo limitante, à delicadeza, à sensibilidade de um feminino fragilizado, descolado dos debates políticos e culturais de sua época (WHITWORTH, 2010WHITWORTH, Michael H. Virginia Woolf, modernism and modernity. In: SELLERS, Susan (Org.). The Cambridge Companion to Virginia Woolf. New York: Cambridge University Press, 2010. p. 107-123., p 108).

Já o termo francês avant-garde, de origem militar, significa literalmente a parte frontal de um exército, as tropas que caminham à frente nos campos de batalha (GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., p. 7). Essa expressão começou a ser usada por volta de 1830 e era empregada exclusivamente nos campos políticos e sociais, principalmente por grupos socialistas que refletiam sobre liberdade e progresso nas primeiras décadas do século XIX. Mas, como nos informa Goldman, o filósofo e economista francês Henry de Saint-Simon (1760 – 1825) utilizou o termo avant-garde pela primeira vez em referência às artes. Para Saint-Simon (1825 Apud GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., p. 7), a arte seria a forma mais ágil e veloz de disseminar ideias entre os seres humanos. Assim, o termo avant-garde era aplicado a questões políticas e socialmente engajadas e opunha-se à ideia de l’art pour l’art (arte pela arte), que era diretamente associada à concepção de modernismo após a Segunda Guerra Mundial. Diante disso, movimentos avant-garde foram associados ao seu antônimo, se transformando, portanto, em um termo crítico sinônimo de modernismo enquanto l’art pour l’art. Ou seja, tanto “modernista” quanto “vanguardista” são cooptados retroativamente pela ideia de “arte pela arte” (GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., p. 11).

Whitworth complica ainda mais a questão ao trazer à baila considerações sobre o conceito de pós-modernismo. De acordo com o crítico, alguns teóricos do pós-modernismo enxergavam a prática modernista como autoritária, primitiva e irracionalmente fascista, pois seu foco exacerbado na forma deixava de fora a aleatoriedade do mundo real (WHITWORTH, 2010WHITWORTH, Michael H. Virginia Woolf, modernism and modernity. In: SELLERS, Susan (Org.). The Cambridge Companion to Virginia Woolf. New York: Cambridge University Press, 2010. p. 107-123., p. 109). Em vista disso, o pós-modernismo teria surgido como uma forma de superar essa arte desengajada. Contudo, leituras críticas mais mediadas começaram a perceber que a arte modernista tinha características embrionárias pós-modernistas, o que fez com que o modernismo fosse revisitado. Obras, tais como Orlando: A Biography (1928), foram vistas como pós-modernas avant la lettre e passaram por uma reavaliação crítica. Se desfazendo de qualquer periodização entre modernismo e pós-modernismo, Goldman pensará que não existe um movimento modernista unificado, mas cenas diversas com intervenções avant-garde localizadas que cortam a primeira metade do século XX e que continuam a despontar para além da data que usa como balizador final em seu livro, 1945. Ambos sugerem, em última instância, que o problema de dizer que a estética modernista se distanciava da práxis da vida deve-se ao fato de se confundir “modernismo” com “modernidade”. Em suas críticas à lógica progressivista da modernidade na representação do tempo e da subjetividade, modernistas foram lidos como se estivessem se evadindo de processos históricos, mas é justamente essa ideia de progresso que está sendo questionada e frontalmente debatida pelos modernistas, incluindo aqui os amigos de Bloomsbury. Ao passo que os ditos avanços tecnológicos e políticos da modernidade davam as costas para o passado, os modernistas engajavam-se política e artisticamente com fragmentos desse passado que poderiam ser reorganizados para dar forma ao “novo”. Vale notar que os artistas vitorianos, com todos os seus avanços econômicos e tecnológicos, entendiam-se como modernos também e reagiam de modo ambivalente à dita modernidade (WHITWORTH, 2010WHITWORTH, Michael H. Virginia Woolf, modernism and modernity. In: SELLERS, Susan (Org.). The Cambridge Companion to Virginia Woolf. New York: Cambridge University Press, 2010. p. 107-123., p. 112).

Essa ambivalência aparece em Freshwater, na versão de 1923, quando a Sra. Cameron, antes de partir para a Índia com seu marido, dá a sua câmera para Ellen como presente de casamento, antes de ela fugir para Bloomsbury. “Este é o meu presente de casamento, Ellen. Pegue a minha câmera. Eu passo adiante para os meus descendentes. Veja que as lentes estão sempre um pouco fora de foco. Adeus! Adeus!”26 26 No original: “It is my wedding gift, Ellen. Take my lens. I bequeath it to my descendents. See that it is always slightly out of focus. Farewell! Farewell! (WOOLF, 1923, p. 83). Ao mesmo tempo que a Sra. Cameron dá para Ellen — que está a fugir para Bloosmbury com John Craig — a sua câmera fora de foco, ela avisa que se trata de um presente para os seus descendentes, para artistas futuros. Logo, Woolf parece sugerir, com a sua peça, que comunga da força criativa e interventiva de sua tia-avó, especialmente se pensarmos que o destino futuro de Ellen Terry é o presente de Woolf em Bloomsbury. Responder e reagir aos paradigmas do passado não significa venerá-los, mas entender que os tempos não são fixos e, consequentemente, podem ser revisitados e rearticulados. Do mesmo modo que a crítica contemporânea revelou que há vários “modernismos” que merecem ser ressignificados (WHITWORTH, 2010WHITWORTH, Michael H. Virginia Woolf, modernism and modernity. In: SELLERS, Susan (Org.). The Cambridge Companion to Virginia Woolf. New York: Cambridge University Press, 2010. p. 107-123., p. 108), podemos afirmar também que há várias eras Vitorianas que merecem a nossa atenção. Se pensarmos com T. S. Eliot e o seu manifesto modernista “Tradition and the Individual Talent” (1919) e a sua teoria impessoal, podemos afirmar que o passado e o presente são esferas que se interrelacionam simultaneamente na mente da artista (do poeta, para Eliot), e essa junção cria apenas uma presença que é conjurada na obra de arte. A mente da poeta-artista captura e filtra inúmeros sentimentos, sentenças e imagens e as reelabora e rearticula.

A crítica contemporânea vem revelando que os modernistas não estavam alheios às dinâmicas sociais e políticas e, desse modo, não deixavam de responder à modernidade e suas questões. Considerando o trabalho de Goldman, pode-se dizer que as intervenções modernistas são, por vezes, avant-garde em seu sentido originário, ou seja, estão à frente em um campo de batalha, visto que conseguem criticar e quebrar com velhos modos de ser e pensar. Vale observar que as tropas modernistas estão à frente, mas não sozinhas no campo de batalha. Para que o novo possa ser conquistado, as tropas auxiliares que vêm atrás também lutam. Ser avant-garde, revolucionário e transgressor significa ser a ponta da lança da arte, engendrando uma nova estética para o pensamento. Como afirma Goldman, textos avant-garde são “no mínimo transgressivos, quando não dissidentes”, podendo interromper, irromper e transformar os contextos sociais e políticos nos quais se inserem com violência (GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., 9).

Por esses motivos, a farsa Freshwater pode e deve ser entendida como uma obra pós-vitoriana (modernista e vanguardista), pois empreende tanto uma quebra quanto uma resposta à tradição vitoriana. Ela está estética e politicamente entrelaçada com a obra de Woolf e responde ao formalismo herdado de Bloomsbury, que Woolf irá radicalmente transformar com contornos feministas (GOLDMAN, 2004GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse. Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004., p. 40). Como debatido ao longo deste artigo, há vários “modernismos”, e os aspectos dramáticos desse movimento plural precisa ser melhor compreendido. O experimento teatral de Woolf não se destacou popularmente no debate modernista, mas os próprios apontamentos dos críticos aqui citados permitem vislumbrar novas formas de se olhar não apenas para Freshwater, mas também para o teatro, performances e brincadeiras nas cenas modernistas que, como apontam os críticos Penny Farfan (2004)FARFAN, Penny. Women, Modernism, and Performance. Cambridge: Cambridge University Press, 2004. e Christopher Innes (1999)INNES, Christopher. Modernism in Drama. In: LEVENSON, Michael (Org.). The Cambridge Companion to Modernism. Cambridge: The Cambridge University Press, 1999. p. 130-155., são dificilmente incluídos nos debates concernentes à estética modernista.

Em 18 de janeiro de 1935, às 21h30, no número 8 da Fitzroy Street, endereço do estúdio de Vanessa Bell, Freshwater foi encenada em uma das festas de Bloomsbury. Como nos informa Ruotolo (1975, p. vi)RUOTOLO, Lucio P. Editor 's Preface [1975] and Notes [1976]. In: WOOLF, Virginia. Freshwater: A Comedy [1923; 1935]. Edição de Lucio P. Ruotolo. Florida: Harcourt, 1976., o estúdio de Bell tinha um formato de L. Os espectadores sentaram-se na parte mais longa do . e na parte mais curta colocaram uma cortina que indicava onde seria o palco. O ambiente não estava muito bem iluminado e parece que em muitos momentos não era possível ver todos os detalhes, mas apenas ouvir. A noite foi de fato um grande sucesso. A casa estava cheia; havia em torno de 80 convidados especiais das senhoras “Clive Bell” e “Leonard Woolf”, o que já indicava uma espécie de deboche às questões que a farsa levantaria naquela noite no que diz respeito aos padrões de casamento e gênero. No dia seguinte, Woolf registrou suas impressões em seus diários: “A peça [Freshwater] estreou ontem à noite, com o resultado de que estou exaurida esta manhã, e só posso usar este livro como travesseiro. Foi, inevitavelmente, um grande sucesso; é bom ter uma noite de riso solto de vez em quando”27 27 No original: “The play cane off last night, with the result that I am dry-brained this morning, and can only use this book as a pillow. It was said, inevitably, to be a great success; it is good to have an unbuttoned laughing evening once in a way”. (WOOLF, 2008WOOLF, Virginia. Selected Diaries. Edição de Anne Olivier Bell. London: Vintage, 2008. , p. 365). Pensar essa noite de riso solto em torno de críticas à cultura boêmia tanto de Freshwater quanto de Bloomsbury nos parece urgente nos debates atuais em torno da multiplicidade das formas modernistas. Este texto termina então com o convite a novas leituras que deem a Freshwater seu lugar na encenação de interferências ao mesmo tempo públicas e privadas de críticas diversas e contraditórias à modernidade.

Notas

  • 1
    Ao longo do presente artigo, faremos referência à peça apenas por Freshwater.Quando for necessário, deixaremos claro se fazemos referência à versão de 1923 ou à versão de 1935.
  • 2
    Como, por exemplo, na tese de doutorado de Nicola Shaughnessy, The Dramatic Writings of Gertrude Stein, Virginia Woolf and Sylvia Plath (1995); no ensaio de Andrea Adolph, “Virginia Woolf’s Revision of a Shavian Tradition” (2001); no livro de Penny Farfan sobre a presença de mulheres no teatro modernista, Women, Modernism and Performance (2004); no livro de R.S. Koppen sobre moda e gênero na obra de Woolf, Virginia Woolf: Fashion and Literary Modernity (2009); em “Hothouse Victorians: Art and Agency in Freshwater” (2017), de Kristine Swenson; em “Bloomsbury At Play”, de E.H. Wright; e em “O anjo e suas asas: a representação da mulher vitoriana em Freshwater de Virginia Woolf” (2019). do pesquisador brasileiro Josenildo Ferreira Teófilo da Silva.
  • 3
    “That is, I will write the play for Xmas: Freshwater a farce—for a joke!”
  • 4
    “The play rather tosh; but I’m not going to bother about making a good impression as a playwright”
  • 5
    No original: I wish I could write The Hours as freely and vigorously as I scribble Freshwater, a Comedy. It’s a strange thing how arduous I find my novels; and yet Freshwater is only spirited fun; and The Hours has some serious merit”.
  • 6
    Em janeiro de 1935, como nos informa o biógrafo e sobrinho de Virginia Woolf Quentin Bell (1972, p. 189)WOOLF, Virginia. Freshwater: A Comedy. Arte de Edward Gorey. Edição e Prefácio de Lucio P. Ruotolo. Nova York: Harcourt, 1976 [1923; 1935]., no estúdio de sua mãe, Vanessa Bell, em uma das muitas festas organizadas pelos intelectuais e artistas de Bloomsbury, Freshwater, uma sátira da era vitoriana, é montada pela primeira vez. Figuras desse período são ficcionalizadas por Woolf e são performadas por amigos e familiares. Leonard Woolf, como o jurista Charles Hay Cameron; Vanessa Bell, como a fotógrafa Julia Margaret Cameron; Duncan Grant, como o pintor George Frederic Watts; Julian Bell, como John Craig (único personagem inteiramente ficcional); Adrien Stephen, como o poeta Alfred Tennyson; Angelica Bell, como a atriz Ellen Terry; Ann Stephen, como Mary, uma das empregadas de Julia Cameron; e Eve Younger (amiga de Angelica), como a Rainha Victoria.
  • 7
    No original: “Now to tune myself up I am going to shut Mrs Watts upon George Frederick, and open the Antigone of Sophocles. One second - I must note for future use, the superb possibilities of Freshwater for a comedy. Old Cameron dressed in a blue dressing gown and not going beyond his garden for twelve years, suddenly borrows his son’s coat, and walks down to the sea. Then they decide to proceed to Ceylon, taking their coffins with them, and the last sight of Aunt Julia is on board ship, presenting porters with large photographs of Sir Henry Taylor and the Madonna in default of small change”.
  • 8
    Julia Margaret Cameron era casada com o jurista Charles Hay Cameron (1795-1880).
  • 9
    O nome da casa dos Camerons não é aleatório. Dimbola é também o nome de um distrito localizado na Província Central no Ceilão (atual Sri Lanka), colônia do Império Britânico onde os Camerons tinham terras (HERBERT, 2014HERBERT, Eugenia. Julia Margaret Cameron in Ceylon: Idylls of Freshwater vs. Idylls of Rathoongodde, 2014. Disponível em: <https://publicdomainreview.org/essay/julia-margaret-cameron-in-ceylon-idylls-of-freshwater-vs-idylls-of-rathoongodde>. Acesso em 22 de outubro de 2020.
    https://publicdomainreview.org/essay/jul...
    ). O país torna-se independente em 1948.
  • 10
    No original: “[H]ave you ever seen a poet’s skin? — a great poet’s skin? Ah, you should see me in my bath!”
  • 11
    “No original: And you’re a very beautiful wench. Get on my knee”
  • 12
    A qualidade profanadora, desierarquizante, e reorientadora do riso aparecerá diversas vezes na obra de Woolf, desde 1905, quando publica o ensaio “The Value of Laughter” (1905) no The Guardian em 16 de agosto daquele ano.
  • 13
    No original: “If Woolf at times looked back at the Victorian era with ‘passionate hatred’ in Marcus’s phrase, we also frequently find an attitude of admiration, which indicates not a desire to ‘return’ to the past, but the recognition of an inheritance that can be serviceable to modernity in various ways”.
  • 14
    No original: “In this sense, ‘Post’ has more of the value it carries in expressions like post-Impressionism or postmodernism, a complex relationship of difference and debt”.
  • 15
    No original: “[...] on or about December 1910 human character changed”.
  • 16
    “significant form” e “aesthetic emotion”.
  • 17
    No original: “[...] creations and expressions of conscious minds”.
  • 18
    No livro Virginia Woolf and the Theatre (2012), Steven D. Putzel mostra imagens das anotações que Vanessa Bell, irmã de Virginia Woolf, fez para a performance de Freshwater em 1935, o que evidencia que as irmãs trabalharam juntas. Essas anotações dão evidências do cuidado e do profissionalismo que Vanessa Bell teve com os ensaios. Além de interpretar amadoramente Julia Margaret Cameron, Vanessa pode ser considerada também a diretora da peça, levando em consideração tanto as suas notas acerca do elenco e quanto as alterações feitas ao texto. Além disso, Putzel (2012, p. 67)PUTZEL, Steven D. Virginia Woolf and the Theatre. Maryland: Fairleigh Dickinson University Press, 2012. nos informa que Vanessa Bell também havia feito uma lista de fantasias, intitulada “Roupas”, e desenhos que faziam sugestões sobre tipos de penteado. Ver também a tese de doutorado Freshwater: uma comédia de Virginia Woolf – uma farsa modernista em traduação (UERJ, 2022), de Victor Santiago.
  • 19
    Referência a Eminent Victorians (1918), estudo do biógrafo e crítico literário Lytton Strachey (1880-1932) sobre a Era Vitoriana.
  • 20
    No original: “The Utmost for the Highest! The Utmost for the Highest. At last my prayer has been heard; my request granted. The toe, the big toe, is now in drawing”.
  • 21
    No original: “You are right, Alfred. You have recalled me from my momentary exaltation. You remind me that even if I have succeeded, humanly speaking, with the great toe, I have not solved the problem of the drapery. [He goes to the picture and takes a mahlstick.] That indeed is a profoundly difficult problem. For by my treatment of the drapery I wish to express two important but utterly contradictory ideas. In the first place I wish to convey to the onlooker the idea that Modesty is absolutely naked. For a long time I have pondered at a loss. At last I have attempted a solution. I am wrapping her in a fine substance which has the appearance of a veil; but if you examine it closely it is seen to consist of innumerable stars. It is in short the Milky Way. I will tell you. For if you consult the mythology of the ancient Egyptians, you will find that the Milky Way was held to symbolise – let me see, what did it symbolise – [He opens his book.]”
  • 22
    No original: “[...] ancient Egypt was of absorbing interest to Signer. The more remote the dynasty, the greater the claim made on his attention”.
  • 23
    No original: “[…] an epitome of all Egyptian art, its solemnity, mystery – infinity!” (Ibidem, 1912, p. 66)
  • 24
    No original: “[TENNYSON becomes absorbed in his reading and does not notice that [illegible], MR. CAMERON falls asleep and snores gently. TENNYSON goes on reading. The door opens and ELLEN TERRY comes in, dressed in white veils which are wrapped about her arms, head, etc. TENNYSON reads on to himself in rather a low voice, without noticing her. MR. CAMERON snores very quietly.]”
  • 25
    No original: “O how usual it all is. Nothing ever changes in this house. Somebody’s always asleep. Lord Tennyson is always reading Maud. The cook is always being photographed. The Camerons are always starting for India. I’m always sitting to Signor. I’m Modesty today — Modesty crouching at the feet of Mammon. If it weren’t for Mammon, I should be there still. But Mammon’s big toe is out of drawing. Of course, Signor with all his high ideals couldn’t pass that. So, I slipped down and escaped”.
  • 26
    No original: “It is my wedding gift, Ellen. Take my lens. I bequeath it to my descendents. See that it is always slightly out of focus. Farewell! Farewell!
  • 27
    No original: “The play cane off last night, with the result that I am dry-brained this morning, and can only use this book as a pillow. It was said, inevitably, to be a great success; it is good to have an unbuttoned laughing evening once in a way”.

Referências

  • BANFIELD, Ann. The Phantom Table Cambridge: Cambridge University, 2000.
  • BELL, Clive. The Artistic Problem. In: ROSENBAUM, S.P. (Org.) A Bloomsbury Group Reader Cambridge: Blackwell Publishers, 1993 [1919]. p. 102-106.
  • DELL, Marion. Virginia Woolf’s Influential Forebears: Julia Margaret Cameron, Anny Thackeray Ritchie and Julia Prinsep Stephen. London: Palgrave Macmillan, 2015.
  • ELIOT, T. S. Tradition and the Individual Talent. In: ELIOT, T. S. Selected Essays, 1917-1932. Nova York: Harcourt, Brace and Company, 1932 [1919]. p. 3-11.
  • ELLIS, Steve. Virginia Woolf and the Victorians New York: Cambridge University Press, 2007.
  • FARFAN, Penny. Women, Modernism, and Performance Cambridge: Cambridge University Press, 2004.
  • FORD, Colin. Geniuses, Poets and Painters: the World of Julia Margaret Cameron. In: COX, Julian; FORD, Colin (Orgs.). Julia Margaret Cameron: the complete photographs. Los Angeles: The J. Paul Getty Museum, 2003. p. 11-40.
  • GOLDMAN, Jane. Modernism, 1910-1945, Image to Apocalypse Basingstoke: Palgrave MacMillan, 2004.
  • HERBERT, Eugenia. Julia Margaret Cameron in Ceylon: Idylls of Freshwater vs. Idylls of Rathoongodde, 2014. Disponível em: <https://publicdomainreview.org/essay/julia-margaret-cameron-in-ceylon-idylls-of-freshwater-vs-idylls-of-rathoongodde>. Acesso em 22 de outubro de 2020.
    » https://publicdomainreview.org/essay/julia-margaret-cameron-in-ceylon-idylls-of-freshwater-vs-idylls-of-rathoongodde
  • INNES, Christopher. Modernism in Drama. In: LEVENSON, Michael (Org.). The Cambridge Companion to Modernism Cambridge: The Cambridge University Press, 1999. p. 130-155.
  • MCLOUGHLIN, Kate. Introduction: A Welcome from the Host. In: MCLOUGHLIN, Kate (Org.). The Modernist Party Edinburgh: Edinburgh University Press, 2013. p. 1-24.
  • PINHO, Davi. Imagens do feminino na obra e vida de Virginia Woolf. Curitiba: Appris, 2015.
  • PUTZEL, Steven D. Virginia Woolf and the Theatre. Maryland: Fairleigh Dickinson University Press, 2012.
  • ROSENBAUM, S. P. (Org.) A Bloomsbury Group Reader Cambridge: Blackwell Publishers, 1993.
  • RUOTOLO, Lucio P. Editor 's Preface [1975] and Notes [1976]. In: WOOLF, Virginia. Freshwater: A Comedy [1923; 1935]. Edição de Lucio P. Ruotolo. Florida: Harcourt, 1976.
  • SHAUGHNESSY, Nicola. The Dramatic Writings of Gertrude Stein, Virginia Woolf and Sylvia Plath, 1913 -1962: Theatre of Identity 374p. Doctoral Dissertation, Centre of Women’s Studies. The University of York, London, 1995.
  • SWENSON, Kristine. Hothouse Victorians: Art and Agency in Freshwater. In: Open Cultural Studies California, vol.1, n. 1, p. 183-193, Oct./Nov. 2017.
  • WATTS, Mary S. George Frederic Watts: the Annals of an Artist’s Life. vol. 2. London: MacMillan & Co. Limited, 1912.
  • WHITWORTH, Michael H. Virginia Woolf, modernism and modernity. In: SELLERS, Susan (Org.). The Cambridge Companion to Virginia Woolf New York: Cambridge University Press, 2010. p. 107-123.
  • WOOLF, Virginia. A Room of One’s Own. London: Grafton, 1977 [1929].
  • WOOLF, Virginia. Between the Acts. Nova York: Harcourt, 1941.
  • WOOLF, Virginia. Freshwater: A Comedy Arte de Edward Gorey. Edição e Prefácio de Lucio P. Ruotolo. Nova York: Harcourt, 1976 [1923; 1935].
  • WOOLF, Virginia. Mr. Bennett and Mrs. Brown. In: ROSENBAUM, S.P. (Org.) A Bloomsbury Group Reader Cambridge: Blackwell Publishers, 1993 [1924]. p. 233-249.
  • WOOLF, Virginia. Mrs. Dalloway Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012 [1925].
  • WOOLF, Virginia. Orlando: A Biography. Londres: Penguin Classics, 1993 [1928].
  • WOOLF, Virginia. Selected Diaries Edição de Anne Olivier Bell. London: Vintage, 2008.
  • WOOLF, Virginia. The Diary of Virginia Woolf: 1915-1919. vol. 1. Edição de Olivier Bell. New York: Harcourt Brace Jovanovich, 1977.
  • WOOLF, Virginia The Diary of Virginia Woolf: 1931-1935. Vol. 4. Edição de Olivier Bell. New York: Harcourt Brace Jovanovich, 1982.
  • WRIGHT, E. H. Bloomsbury at Play. In: Woolf Studies Annual v. 17, p. 77–107, 2011. Disponível em: <www.jstor.org/stable/24906873>. Acesso em 07/08/2021.
    » www.jstor.org/stable/24906873

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Set 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    18 Dez 2022
  • Aceito
    07 Jun 2023
Universidade Federal de Santa Catarina Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Bloco B- 405, CEP: 88040-900, Florianópolis, SC, Brasil, Tel.: (48) 37219455 / (48) 3721-9819 - Florianópolis - SC - Brazil
E-mail: ilha@cce.ufsc.br