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Lesão renal aguda em pacientes obstétricas gravemente doentes: um estudo transversal em uma unidade de terapia intensiva do nordeste do Brasil

Resumo

Introdução:

A lesão renal aguda (LRA) é uma complicação ainda pouco estudada no contexto das pacientes obstétricas, que está associada com aumento da mortalidade.

Objetivo:

Investigar a frequência e os fatores de risco da LRA entre pacientes obstétricas. Métodos: Foi realizado estudo transversal com todas as pacientes admitidas em uma unidade de terapia intensiva (UTI) devido a complicações obstétricas em Fortaleza, Brasil, no período de janeiro de 2012 a dezembro de 2014. LRA foi definida de acordo com o critério AKIN.

Resultados:

Foram incluídas 389 pacientes, com idade entre 13 e 45 anos. As principais causas de admissão na UTI foram síndromes hipertensivas da gestação (54,5%), hemorragia e choque hemorrágico (12,3%), cardiopatias (9,0%), insuficiência respiratória (8,2%) e sepse (5,4%). LRA foi encontrada em 92 casos (24%), e esta foi a complicação mais frequente. A mortalidade geral foi de 7,5%, e a mortalidade por LRA foi de 21% (p = 0,0007). Na análise multivariada, os fatores de risco para LRA foram parto cesariano (IC 95% = 0,23-0,85, p = 0,01) e plaquetopenia (IC 95% = 1,50-4,36, p = 0,001). LRA foi um fator de risco independente para óbito (OR = 6,64, IC 95% = 3,11-14,15, p < 0,001).

Conclusão:

LRA foi a complicação mais frequente em pacientes obstétricas gravemente doentes e esteve associada com aumento da mortalidade. A maioria dos casos esteve associada às síndromes hipertensivas da gravidez, que são complicações passíveis de tratamento durante o pré-natal.

Palavras-chave:
gravidez; Insuficiência renal; mortalidade; unidades de terapia intensiva

Abstract

Introduction:

Acute kidney injury (AKI) is a complication still poorly studied in the setting of obstetric patients, which is associated with increased mortality. Objective: The aim of this study was to investigate the frequency and risk factors of AKI among critically ill obstetric patients.

Methods:

A cross-sectional study was conducted with all patients admitted to an intensive care unit (ICU) due to obstetric complications, in Fortaleza, Brazil, in the period between January 2012 and December 2014. AKI was defined according to AKIN criteria.

Results:

A total of 389 patients were included, aged between 13 and 45 years. The main causes of ICU admission were pregnancy-related hypertensive syndromes (54.5%), hemorrhage and hemorrhagic shock (12.3%), heart diseases (9.0%), respiratory insufficiency (8.2%) and sepsis (5.4%). AKI was found in 92 cases (24%), and this was the most frequent complication. General mortality was 7.5%, and mortality due to AKI was 21% (p = 0.0007). In the multivariate analysis, risk factors for AKI were cesarian delivery (95% CI = 0.23-0.85, p = 0.01) and thrombocythopenia (95% CI = 1.50-4.36, p = 0.001). AKI was an independent risk factor for death (OR = 6.64, 95% CI = 3.11-14.15, p < 0.001).

Conclusion:

AKI was the main complication among critically ill obstetric patients and it was associated with increased mortality. Most cases were associated with pregnancy-related hypertensive disorders, which are complications that can be easily identified and treated during prenatal care.

Keywords:
intensive care units; mortality; pregnancy; renal insufficiency

Introdução

A injúria renal aguda (IRA) é uma complicação frequente entre os pacientes hospitalizados, que afeta cerca de 5% dos pacientes em ambulatórios clínicos, e 10-30% daqueles em unidades de terapia intensiva (UTI).11 Okamoto TY, Dias JCY, Taguti P, Sacon MF, Kauss IAM, Carrilho CMDM, et al. Acute renal injury in patients with severe sepsis: prognostic factors. Sci Med (Porto Alegre) 2012;22:138-41. Entre os pacientes obstétricos, a IRA não é frequente, e ainda é pouco estudada.22 Silva GB Jr, Monteiro FA, Mota RM, Paiva JG, Correia JW, Bezerra Filho JG, et al. Acute kidney injury requiring dialysis in obstetric patients: a series of 55 cases in Brazil. Arch Gynecol Obstet 2009;279:131-7. PMID: 18506463 DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00404-008-0682-8
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,33 Vázquez-Rodríguez JG. Diálisis peritoneal y embarazo. Cir Cir 2010;78:181-7. As principais condições associadas à IRA no período gestacional-puerperal são: pré-eclâmpsia, eclampsia, hemorragia pós-parto, síndrome HELLP, sepse puerperal e coagulação disseminada intravascular, e em casos graves também pode exigir diálise.44 Pahwa N, Bharani R, Kumar R. Post-partum acute kidney injury. Saudi J Kidney Dis Transpl 2014;25:1244-7. DOI: http://dx.doi.org/10.4103/1319-2442.144259
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Em um estudo anterior, menor, em nossa região, entre 55 pacientes obstétricos com IRA que necessitavam de diálise, as principais causas de IRA foram: hipertensão associada à gravidez, incluindo síndrome HELLP (41,8%), sepse puerperal (14,5%), placenta prévia (9,1%), síndrome urêmica hemolítica (9,1%) e púrpura trombocitopênica trombótica (5,5%).22 Silva GB Jr, Monteiro FA, Mota RM, Paiva JG, Correia JW, Bezerra Filho JG, et al. Acute kidney injury requiring dialysis in obstetric patients: a series of 55 cases in Brazil. Arch Gynecol Obstet 2009;279:131-7. PMID: 18506463 DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00404-008-0682-8
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Nos últimos 50 anos, há uma redução significativa na incidência de IRA associada à obstetrícia, mas ainda é um problema atual de saúde pública nos países em desenvolvimento, uma vez que a IRA está associada ao aumento da mortalidade, e a morte não é um evento esperado para ocorrer durante o período gestacional-puerperal.55 Mehrabadi A, Liu S, Bartholomew S, Hutcheon JA, Magee LA, Kramer MS, et al.; Canadian Perinatal Surveillance System Public Health Agency of Canada. Hypertensive disorders of pregnancy and the recent increase in obstetric acute renal failure in Canada: population based retrospective cohort study. BMJ 2014;349:g731. DOI: http://dx.doi.org/10.1136/bmj.g4731
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O objetivo deste estudo foi investigar a frequência e os fatores de risco da IRA entre pacientes obstétricos críticos.

Métodos

Este foi um estudo transversal, realizado com todos os pacientes com complicações obstétricas admitidos na unidade de terapia intensiva (UTI) da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand, em Fortaleza, no Nordeste do Brasil, no período de janeiro de 2012 a dezembro de 2014. Esta UTI é um serviço obstétrico de referência na região, e o protocolo do estudo foi revisado e aprovado pelo Comitê de Ética da instituição (protocolo nº 875.394/2014).

Os critérios de inclusão foram: pacientes admitidos devido a complicações obstétricas no período de estudo. Os registros médicos foram revisados para coletar dados e informações sobre a idade dos pacientes, causa de admissão na UTI, tipo de parto, manifestações clínicas e complicações durante a internação na UTI, e os resultados foram recuperados.

Fizemos uma comparação entre pacientes com e sem IRA, e os fatores de risco para a IRA foram investigados. A IRA foi definida de acordo com os critérios da AKIN.66 Mehta RL, Kellum JA, Shah SV, Molitoris BA, Ronco C, Warnock DG, et al.; Acute Kidney Injury Network. Acute Kidney Injury Network: report of an initiative to improve outcomes in acute kidney injury. Crit Care 2007;11:R31.

Os resultados foram expressos por meio de tabelas e estatísticas descritivas de medidas resumidas (média ± desvio padrão ou frequências) nos casos de variáveis quantitativas. A análise estatística consistiu em análise univariada e multivariada de dados clínicos e laboratoriais, que foi realizada usando o software SPSS 20.0. A comparação dos parâmetros para os dois grupos (AKI versus não-AKI) foi realizada por meio do teste-t de Student e do teste exato de Fisher. A análise das correlações entre a IRA e os fatores de risco categorizados foi feita por meio do teste exato de Fisher empregado, teste de qui-quadrado de Pearson e teste de taxa de verossimilhança. Um modelo de regressão logística foi utilizado para variáveis quantitativas.

Os odds-ratio ajustados e os intervalos de confiança de 95% foram calculados. A regressão logística multivariada foi realizada para analisar os possíveis fatores de risco para a IRA. Os fatores incluídos no modelo multivariável foram aqueles que mostraram um nível de significância < 20% na análise univariada (teste de Mann-Whitney e teste de qui-quadrado). Os valores descritivos inferiores a 5% (valor p < 0,05) foram considerados estatisticamente significativos.

Resultados

Um total de 389 pacientes foram incluídos, e a IRA foi encontrada em 92 casos (24%). A idade média dos pacientes foi de 27,1 ± 7,1 anos (faixa 13-45) e a faixa etária mais afetada foi de 35-45 anos. As principais causas de admissão na UTI foram: síndromes hipertensivas relacionadas à gravidez (54,5%), hemorragia e choque hemorrágico (12,3%), doenças cardíacas (9,0%), insuficiência respiratória (8,2%), sepse (5,4%) e outras comorbidades menos frequentes (10,6%).

A comparação dos dados clínicos e laboratoriais entre pacientes com e sem IRA está mostrada nas Tabelas 1 e 2. As principais comorbidades associadas à IRA foram: HIV (66,6%), pielonefrite (60%), doença hepática (60%), distúrbios da coagulação (54,5%), diabetes mellitus (38,4%) e hipertensão crônica (30,9%). O uso de drogas vasoativas e antibióticos foi feito em 40,2% e 29% dos casos, respectivamente. Entre todas as complicações observadas durante a internação na UTI, a IRA foi a mais frequente (24%), seguida de hipotensão (15,5%), hemorragia (10,2%) e sepse (6,7%).

Tabela 1
Comparação das características clínicas dos pacientes obstétricos admitidos em uma unidade de terapia intensiva de acordo com a ocorrência de injúria renal aguda
Tabela 2
Comparação de dados laboratoriais de pacientes obstétricos admitidos em unidade de terapia intensiva de acordo com a ocorrência de injúria renal aguda

Na análise multivariada, os fatores associados à IRA foram: parto cesariano (OR = 0,45, IC 95% = 0,23-0,85, p = 0,01) e trombocitopenia (OR = 2,56; IC 95% = 1,50-4,36; p = 0,001).

Um total de 28 óbitos foram observados (7,5%), e as principais causas foram: sepse/insuficiência de múltiplos órgãos (32%), morte encefálica (25%) e choque hemorrágico (21%); 19 desses óbitos ocorreram em pacientes com IRA (20,6%). A IRA foi um fator de risco independente para o óbito (OR = 6,64, IC 95% = 3,11-14,15, p < 0,001).

Discussão

O presente estudo investigou a ocorrência de IRA entre os pacientes internados em UTI devido a complicações de obstetrícia em uma única unidade de referência do Brasil. Observou-se alta incidência de IRA, e esta foi associada a alta mortalidade (> 20%). A IRA é uma das principais condições associadas ao mau prognóstico na UTI. As causas obstétricas da IRA não são comuns nos países desenvolvidos, mas ainda são um importante problema de saúde pública no mundo em desenvolvimento, que reflete o precário cuidado pré-natal.

A IRA em pacientes críticos tem uma prevalência variando de 20 a 30%, e a diálise é necessária em cerca de 60% dos casos.77 Pinto PS, Carminatti M, Lacet T, Rodrigues DF, Nogueira LO, Bastos MG, et al. Nephrotoxic acute renal failure: prevalence, clinical course and outcome. J Bras Nefrol 2009;31:183-9. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0101-28002009000300003
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,88 Acharya A, Santos J, Linde B, Anis K. Acute kidney injury in pregnancy-current status. Adv Chronic Kidney Dis 2013;20:215-22. DOI: http://dx.doi.org/10.1053/j.ackd.2013.02.002
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No contexto da gravidez, a IRA ainda não é bem estudada, e seus fatores determinantes devem ser melhor investigados. Estima-se que a IRA ocorra em 1 em cada 10.000-20.000 gravidezes em países desenvolvidos.88 Acharya A, Santos J, Linde B, Anis K. Acute kidney injury in pregnancy-current status. Adv Chronic Kidney Dis 2013;20:215-22. DOI: http://dx.doi.org/10.1053/j.ackd.2013.02.002
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,99 Atallah AN, Taborda WC, Bertini AM. Insuficiência Renal Aguda na Gravidez. In: Morais EM, Mauad-Filho F, eds. Medicina Materna e Perinatal. Rio de Janeiro: Revinter; 2000. p. 68-71.

No presente estudo, as principais causas de admissão foram síndromes hipertensivas associadas à gravidez (mais de metade dos casos), o que está de acordo com estudos prévios que mostram que estas são as principais complicações da gravidez. As principais causas de IRA em pacientes obstétricos são distúrbios hipertensivos, hemorragia e sepse,22 Silva GB Jr, Monteiro FA, Mota RM, Paiva JG, Correia JW, Bezerra Filho JG, et al. Acute kidney injury requiring dialysis in obstetric patients: a series of 55 cases in Brazil. Arch Gynecol Obstet 2009;279:131-7. PMID: 18506463 DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00404-008-0682-8
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,1010 Moraes AP, Barreto SM, Passos VM, Golino PS, Costa JA, Vasconcelos MX. Incidence and main causes of severe maternal morbidity in São Luís, Maranhão, Brazil: a longitudinal study. São Paulo Med J 2011;129:146-52. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-31802011000300005
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14 Kale PL, Costa AJ. Maternal Deaths in the City of Rio de Janeiro, Brazil, 2000-2003. J Health Popul Nutr 2009;27:794-801.

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16 Rojas-Suarez J, Paternina-Caicedo AJ, Miranda J, Mendoza R, Dueñas-Castel C, Bourjeily G. Comparison of severity-of-illness scores in critically ill obstetric patients: a 6-year retrospective cohort. Crit Care Med J 2014;20:1-8. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/CCM.0000000000000124
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17 Burcin Kavak S, Celik Kavak E, Demirel I, Turkoglu A, Halil Akkus I, Ilhan R, et al. Evaluation of maternal mortality cases in the province of Elazig, Turkey, 2007-2013: a retrospective study. Glob J Health Sci 2015;7:188-93.
-1818 Oliveira Neto AF, Parpinelli MA, Cecatti JG, Souza JP, Sousa MH. Factors associated with maternal death in women admitted to an intensive care unit with severe maternal morbidity. Int J Gynaecol 2009;105:252-6. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.ijgo.2009.01.025
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como também observado em nosso estudo. A maioria dessas complicações pode ser prevenida com cuidados pré-natais adequados.

A IRA foi a principal complicação observada neste estudo. Em geral, nas UTIs, as IRA ocorrem em torno de 20-401919 Abosaif NY, Tolba YA, Heap M, Russell J, El Nahas AM. The outcome of acute renal failure in the intensive care unit according to RIFLE: model application, sensitivity, and predictability. Am J Kidney Dis 2005;46:1038-48. PMID: 16310569 DOI: http://dx.doi.org/10.1053/j.ajkd.2005.08.033
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de modo que a incidência de IRA em nosso estudo está de acordo com a literatura. Em um estudo anterior em nossa região, a IRA foi encontrada em menos de 1% dos casos, mas apenas a IRA grave foi considerada (IRA que requer diálise).22 Silva GB Jr, Monteiro FA, Mota RM, Paiva JG, Correia JW, Bezerra Filho JG, et al. Acute kidney injury requiring dialysis in obstetric patients: a series of 55 cases in Brazil. Arch Gynecol Obstet 2009;279:131-7. PMID: 18506463 DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00404-008-0682-8
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Entre as comorbidades encontradas em nosso estudo, o HIV foi o mais frequente (66% dos casos de IRA). Sabe-se que o HIV contribui para aumentar a mortalidade materna,1515 Say L, Chou D, Gemmill A, Tunçalp Ö, Moller AB, Daniels J, et al. Global causes of maternal death: a WHO systematic analysis. Lancet Glob Health 2014;2:e323-33. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S2214-109X(14)70227-X
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principalmente nos países africanos,2020 Hogan MC, Foreman KJ, Naghavi M, Ahn SY, Wang M, Makela SM, et al. Maternal mortality for 181 countries, 1980-2008: a systematic analysis of progress towards Millennium Development Goal 5. Lancet 2010;375:1609-23. PMID: 20382417 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(10)60518-1
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porque favorece infecções e desenvolvimento de sepse, o que representa as principais causas da mortalidade materna ao redor do mundo.2121 Acosta CD, Knight M. Sepsis and maternal mortality. Curr Opin Obstet Gynecol 2013;25:109-16. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/GCO.0b013e32835e0e82
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Houve uma maior frequência de parto cesariano entre os pacientes com IRA no presente estudo. É possível que este tipo de desfecho ocorra devido a complicações da gravidez, como pré-eclâmpsia e eclampsia. Também pode estar associado a complicações hemorrágicas, como sugerido por estudos anteriores, em que a IRA no contexto obstétrico foi associada a hemorragia em 31,4% dos casos.2222 Rizwan N, Uddin SF. Obstetrical acute renal failure: a challenging medical complication. J Ayub Med Coll Abbottabad 2011;23:66-8.

O tempo de permanência hospitalar e tempo de ventilação mecânica foi semelhante em ambos os grupos (AKI versus não-AKI). Os níveis de pressão arterial à admissão também foram semelhantes em ambos os grupos, mas a IRA foi associada a hemorragia e hipotensão. Em relação aos exames laboratoriais, as enzimas hepáticas foram maiores entre os pacientes com IRA e os níveis de plaquetas foram menores, o que está de acordo com um estudo prévio que associou esses achados a uma maior incidência de IRA.2323 Prakash J, Niwas SS, Parekh A, Pandey LK, Sharatchandra L, Arora P, et al. Acute kidney injury in late pregnancy in developing countries. Ren Fail 2010;32:309-13. DOI: http://dx.doi.org/10.3109/08860221003606265
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Essas anormalidades laboratoriais estão provavelmente associadas a distúrbios hepáticos, distúrbios da coagulação e síndrome HELLP.22 Silva GB Jr, Monteiro FA, Mota RM, Paiva JG, Correia JW, Bezerra Filho JG, et al. Acute kidney injury requiring dialysis in obstetric patients: a series of 55 cases in Brazil. Arch Gynecol Obstet 2009;279:131-7. PMID: 18506463 DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00404-008-0682-8
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,88 Acharya A, Santos J, Linde B, Anis K. Acute kidney injury in pregnancy-current status. Adv Chronic Kidney Dis 2013;20:215-22. DOI: http://dx.doi.org/10.1053/j.ackd.2013.02.002
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,2424 Neligan PJ, Laffey JG. Clinical review: Special populations-critical illness and pregnancy. Crit Care 2011;15:227. DOI: http://dx.doi.org/10.1186/cc10256
http://dx.doi.org/10.1186/cc10256...

25 Gopalakrishnan N, Dhanapriya J, Muthukumar P, Sakthirajan R, Dineshkumar T, Thirumurugan S, et al. Acute kidney injury in pregnancy-a single center experience. Ren Fail 2015;37:1476-80. DOI: http://dx.doi.org/10.3109/0886022X.2015.1074493
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26 Bouaziz M, Chaari A, Turki O, Dammak H, Chelly H, Ammar R, et al. Acute renal failure and pregnancy: a seventeen-year experience of a Tunisian intensive care unit. Ren Fail 2013;35:1210-5. DOI: http://dx.doi.org/10.3109/0886022X.2013.819767
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-2727 Hildebrand AM, Liu K, Shariff SZ, Ray JG, Sontrop JM, Clark WF, et al. Characteristics and Outcomes of AKI Treated with Dialysis during Pregnancy and the Postpartum Period. J Am Soc Nephrol 2015;26:3085-91. DOI: http://dx.doi.org/10.1681/ASN.2014100954
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Quanto ao tratamento, o uso de drogas vasoativas, antibióticos, diuréticos e ventilação mecânica foi mais frequente entre os pacientes com IRA, o que reflete a gravidade clínica desses pacientes. A ventilação mecânica e o uso de drogas vasoativas estão associados à mortalidade materna de acordo com estudos prévios.1818 Oliveira Neto AF, Parpinelli MA, Cecatti JG, Souza JP, Sousa MH. Factors associated with maternal death in women admitted to an intensive care unit with severe maternal morbidity. Int J Gynaecol 2009;105:252-6. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.ijgo.2009.01.025
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As taxas de mortalidade na IRA relacionada à obstetrícia podem chegar a 30%22 Silva GB Jr, Monteiro FA, Mota RM, Paiva JG, Correia JW, Bezerra Filho JG, et al. Acute kidney injury requiring dialysis in obstetric patients: a series of 55 cases in Brazil. Arch Gynecol Obstet 2009;279:131-7. PMID: 18506463 DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00404-008-0682-8
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, e as medidas para prevenir isso devem ser implementadas. No presente estudo, a mortalidade entre os pacientes com IRA foi de 20,6%, significativamente maior do que naqueles sem essa complicação. Bouaziz et al.2626 Bouaziz M, Chaari A, Turki O, Dammak H, Chelly H, Ammar R, et al. Acute renal failure and pregnancy: a seventeen-year experience of a Tunisian intensive care unit. Ren Fail 2013;35:1210-5. DOI: http://dx.doi.org/10.3109/0886022X.2013.819767
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também encontraram maior mortalidade entre pacientes críticos com IRA em comparação com aqueles sem IRA (9,3% vs. 1,7%, p < 0,001).

Em resumo, a IRA foi a complicação mais frequente de pacientes obstétricos admitidos na UTI e um importante fator de risco para o óbito. A maioria dos casos foi associada a distúrbios hipertensivos relacionados à gravidez, que são complicações que podem ser facilmente identificadas e tratadas durante o pré-natal.

Limitações do estudo

As principais limitações deste estudo derivam de sua natureza retrospectiva. Alguns dados de registros dos pacientes não estavam disponíveis na admissão. O débito urinário e o exame de urina foram particularmente pouco disponíveis e não foram frequentemente medidos com precisão, portanto não foram incluídos em nossa análise. Sabemos que a gravidez envolve a mãe e o bebê, por isso seria importante ter informações sobre os resultados fetais/neonatais, mas não foi possível incluir neste estudo devido à falta de informação nos prontuários médicos consultados.

Agradecimentos

Agradecemos à equipe médica, residentes, estudantes de medicina e enfermeiros da Maternidade-Escola Assis Chateaubriand pela assistência prestada aos pacientes e pelo suporte técnico fornecido ao desenvolvimento desta pesquisa.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    11 Jan 2017
  • Aceito
    16 Abr 2017
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