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Espironolactona melhora a vasodilatação fluxo mediada em indivíduos com síndrome metabólica

Resumos

INTRODUÇÃO: O papel da aldosterona na fisiopatologia da disfunção endotelial relacionada à síndrome metabólica (SM) tem sido objeto de estudos. OBJETIVO: Avaliar o bloqueio da aldosterona sobre a vasodilatação fluxo mediada (VDFM) e sobre parâmetros renais e metabólicos em indivíduos com SM. MÉTODOS: Dezenove indivíduos com SM foram submetidos a exame clínico; exames complementares: glicose, insulina, lipidograma, depuração da creatinina, microalbuminúria e a monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA) e análise da VDFM antes e após 16 semanas do uso de espironolactona. RESULTADOS: Após o tratamento, observou-se aumento da VDFM, de 7,6 ± 5,63% para 15,0 ± 6,10% (p < 0,001), com redução não significante da pressão sistólica e diastólica (142,2 ± 16,37 mmHg para 138,8 ± 16,67 mmHg e 84,3 ± 10,91 mmHg para 82,7 ± 9,90 mmHg, respectivamente). O colesterol HDL (High-density lipoprotein - lipoproteína de alta densidade) aumento de modo significante, a microalbuminúria apresentou tendência à redução, enquanto a depuração da creatinina não variou significativamente com o tratamento. CONCLUSÃO: O bloqueio da aldosterona em pacientes com SM melhorou a VDFM, sem induzir alterações no perfil metabólico e em parâmetros renais.

Aldosterona; Endotélio; Permeabilidade Vascular; Síndrome X Metabólica


INTRODUCTION: The role of aldosterone in the pathophysiology of the metabolic syndrome (MS)-related endothelial dysfunction has been the subject of recent research. OBJECTIVE: To evaluate the effects of aldosterone blockade on flow-mediated vasodilation (FMD) and on renal and metabolic parameters of patients with the MS. METHODS: 19 MS subjects underwent clinical examination, laboratory work-up (serum lipid profile, glucose and insulin; creatinine clearance; microalbuminuria investigation), ambulatory blood pressure monitoring (ABPM), and FMD analysis before and after 16 weeks of aldosterone blockade with spironolactone. RESULTS: After the treatment period, FMD increased from 7.6 ± 5.63% to 15.0 ± 6.10% (p < 0.001), associated with a non-significant decrease of blood pressure (from 142.2 ± 16.37 mmHg to 138.8 ± 16.67 mmHg, and from 84.3 ± 10.91 mmHg to 82.7 ± 9.90 mmHg, respectively). HDL-cholesterol significantly increased, microalbuminuria showed a decreasing trend and creatinine clearance did not change after treatment. CONCLUSION: Aldosterone blockade in patients with the MS improved FMD without interfering with metabolic and renal parameters.

Aldosterone; Endothelium; Vascular Permeability; Metabolic Syndrome X


ARTIGO ORIGINAL

Espironolactona melhora a vasodilatação fluxo mediada em indivíduos com síndrome metabólica

Espironolactone improves flow-mediated vasodilatation in subjects with the metabolic syndrome

Julio Cesar Moraes Lovisi; Daniele Andrade Guedes Ezequiel; Monica Barros Costa; Thaís Chehuen Bicalho; Fernanda Castro Barros; Gustavo do Carmo e Souza; Rogério Baumgratz de Paula

Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF

Correspondência para Correspondência para: Júlio César Moraes Lovisi Rua José Lourenço Kelmer, 1300 (sobreloja) - São Pedro Juiz de Fora - MG - Brasil CEP 36036-330 E-mail: jclovisi@cardiol.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: O papel da aldosterona na fisiopatologia da disfunção endotelial relacionada à síndrome metabólica (SM) tem sido objeto de estudos.

OBJETIVO: Avaliar o bloqueio da aldosterona sobre a vasodilatação fluxo mediada (VDFM) e sobre parâmetros renais e metabólicos em indivíduos com SM.

MÉTODOS: Dezenove indivíduos com SM foram submetidos a exame clínico; exames complementares: glicose, insulina, lipidograma, depuração da creatinina, microalbuminúria e a monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA) e análise da VDFM antes e após 16 semanas do uso de espironolactona.

RESULTADOS: Após o tratamento, observou-se aumento da VDFM, de 7,6 ± 5,63% para 15,0 ± 6,10% (p < 0,001), com redução não significante da pressão sistólica e diastólica (142,2 ± 16,37 mmHg para 138,8 ± 16,67 mmHg e 84,3 ± 10,91 mmHg para 82,7 ± 9,90 mmHg, respectivamente). O colesterol HDL (High-density lipoprotein - lipoproteína de alta densidade) aumento de modo significante, a microalbuminúria apresentou tendência à redução, enquanto a depuração da creatinina não variou significativamente com o tratamento.

CONCLUSÃO: O bloqueio da aldosterona em pacientes com SM melhorou a VDFM, sem induzir alterações no perfil metabólico e em parâmetros renais.

Palavras-chave: Aldosterona. Endotélio. Permeabilidade Vascular. Síndrome X Metabólica.

ABSTRACT

INTRODUCTION: The role of aldosterone in the pathophysiology of the metabolic syndrome (MS)-related endothelial dysfunction has been the subject of recent research.

OBJECTIVE: To evaluate the effects of aldosterone blockade on flow-mediated vasodilation (FMD) and on renal and metabolic parameters of patients with the MS.

METHODS: 19 MS subjects underwent clinical examination, laboratory work-up (serum lipid profile, glucose and insulin; creatinine clearance; microalbuminuria investigation), ambulatory blood pressure monitoring (ABPM), and FMD analysis before and after 16 weeks of aldosterone blockade with spironolactone.

RESULTS: After the treatment period, FMD increased from 7.6 ± 5.63% to 15.0 ± 6.10% (p < 0.001), associated with a non-significant decrease of blood pressure (from 142.2 ± 16.37 mmHg to 138.8 ± 16.67 mmHg, and from 84.3 ± 10.91 mmHg to 82.7 ± 9.90 mmHg, respectively). HDL-cholesterol significantly increased, microalbuminuria showed a decreasing trend and creatinine clearance did not change after treatment.

CONCLUSION: Aldosterone blockade in patients with the MS improved FMD without interfering with metabolic and renal parameters.

Keywords: Aldosterone. Endothelium. Vascular Permeability. Metabolic Syndrome X.

INTRODUÇÃO

A epidemia de obesidade observada nas últimas décadas se acompanhou de incremento na prevalência da SM e de suas complicações, destacadamente das doenças cardiovasculares.1 O tecido adiposo abdominal produz mediadores inflamatórios que interferem na estrutura e na função vascular, aumentando desse modo o risco de eventos cardiovasculares.2,3 Neste contexto, tem sido demonstrado que indivíduos obesos apresentam ativação de componentes do sistema renina-angiotensina-aldosterona.4,5 Além disso, o tecido adiposo disfuncional é capaz de secretar aldosterona independentemente da estimulação pela renina.6 Nos últimos anos, os efeitos deletérios da aldosterona sobre o endotélio vascular têm sido sugeridos em humanos.7 Todavia, o impacto do uso de um antagonista da aldosterona sobre a função endotelial em indivíduos com SM ainda não foi bem avaliado.

MÉTODOS

Em estudo prospectivo, foram avaliados portadores de SM segundo os critérios modificados do Programa Nacional de Educação do Colesterol - Tratamento de Colesterol em Adulto (NCEP-ATPIII) National Cholesterol Education Program - Adult Treatment Panel III.8 Foram incluídos indivíduos de ambos os sexos, com idade entre 18 e 60 anos; hipertensão arterial estágio I, índice de massa corporal (IMC) entre 25 kg/m2 e 40 kg/m2 e potássio sérico entre 3,5 mEq/L e 5,0 mEq/L. O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).

Após assinarem o termo de consentimento livre e esclarecido, os indivíduos foram submetidos à avaliação clínica e à realização dos seguintes exames complementares: cálculo do Homeostasis Model Assessment of Insulin Resistance (índice de avaliação homeostática de resistência à insulina) (HOMA-IR), cálculo do Homeostasis Model Assessment of Beta-cell function (índice de avaliação homeostática da função das células beta) (HOMA-ß), perfil lipídico, potássio, aldosterona e atividade plasmática da renina. Além desses, foram avaliadas, em duplicata, a depuração da creatinina e a microalbumina em urina de 24 horas. Foram, ainda, realizados a MAPA e a VDFM conforme preconizado pela American College of Cardiology.9 Nessa técnica, coloca-se um manguito no braço não dominante e insufla-se até um nível de 50 mmHg acima da pressão arterial (PA) sistólica, mantendo-se durante cinco minutos. Em seguida, libera-se o manguito para indução de hiperemia reativa, medindo-se o calibre da artéria braquial. Para o cálculo da VDFM, adota-se a diferença percentual do calibre da artéria antes e após sua oclusão.

Após a realização dos exames no período basal, os indivíduos foram tratados com espironolactona, na dose de 50 mg/dia, por um período de 16 semanas (tratamento) e, em seguida, foram reavaliados todos os parâmetros clínicos e exames complementares.

Os dados foram analisados por meio do programa SPSS 15.0 for Windows e os valores expressos em média e em desvio padrão, os quais foram comparados aos valores das variáveis antes e depois do tratamento com espironolactona. Para tanto, utilizou-se o teste t de Student pareado, paramétrico, e o teste de Wilcoxon, para dados não paramétricos, sendo aceito como significante um valor p < 0,05.

RESULTADOS

Foram incluídos 19 indivíduos com média de idade igual a 46,3 ± 9,80 anos. A média do IMC foi 33,9 ± 3,79 kg/m2 e da circunferência abdominal, 109,0 ± 8,73 cm, valores que não sofreram modificação com o tratamento. Após o uso da espironolactona, houve aumento da VDFM de 7,7 ± 5,63% (variação: 2,3 - 23,0%) para 15,0 ± 6,10% (variação: 8,0 - 30,8%), com redução discreta e não significante da PA sistólica e diastólica. Considerando como normal um valor da VDFM >/10%, 14/19 (74%), indivíduos apresentavam disfunção endotelial no período basal, ao passo que apenas 3/19 (16%) dos indivíduos permaneceram com valores inferiores à normalidade após o tratamento com espirolactona. Observou-se, ainda, aumento dos níveis de colesterol HDL, enquanto a glicemia, o HOMA-IR, o HOMA-β e a depuração da creatinina não se alteraram de modo significante. A excreção urinária de albumina apresentou tendência à redução após o uso da espironolactona (Tabela 1).

DISCUSSÃO

O reconhecimento do papel da aldosterona na SM e a possível participação do tecido adiposo disfuncional na estimulação da secreção de aldosterona, em pacientes com sobrepeso, trouxe elementos novos para o entendimento da fisiopatogenia da lesão vascular associada à SM.10 Nesse contexto, é descrito que o bloqueio mineralocorticoide se associa à melhora da vasodilatação dependente do endotélio, podendo reduzir a progressão da doença aterosclerótica, em populações de alto risco cardiovascular.11

No presente estudo, a utilização da espironolactona, em indivíduos com SM, se associou à significativa melhora da VDFM, com tendência à diminuição da excreção urinária de albumina, a despeito de discreta redução da pressão arterial. Esses achados guardam relação com estudos prévios que mostraram a propriedade da aldosterona de induzir disfunção endotelial e causar vasculopatia específica.11 Em concordância, pacientes com hiperaldosteronismo primário, tratados cirurgicamente, apresentaram melhora significativa da VDFM.7 Além da melhora da função endotelial, no presente estudo, a elevação significante dos níveis de colesterol HDL e a melhora, ainda que não significante, do HOMA-IR apontam para o perfil metabólico favorável da espironolactona.

Esses achados corroboram estudo prévio realizado por nosso grupo, que demonstrou, pela primeira vez, em pacientes com SM, que o bloqueio da aldosterona melhorou a VDFM e reduziu a PA, sugerindo a associação entre aldosterona e disfunção endotelial na SM.12 No presente estudo, o achado de diminuição da excreção urinária de albumina associado à melhora da VDFM, na ausência de redução significativa da PA, sugere o papel da aldosterona na disfunção endotelial, de modo independente da redução pressórica. A continuidade do estudo, com a inclusão de maior número de indivíduos poderá contribuir para o melhor entendimento de mecanismos relacionados ao dano vascular na SM.

CONCLUSÃO

O bloqueio da aldosterona em pacientes com SM se associou ao aumento da VDFM e à redução da microalbuminúria, sugerindo melhora da função endotelial.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho recebeu apoio da Fundação Instituto Mineiro de Estudos e Pesquisas em Nefrologia - IMEPEN.

Data de submissão: 19/07/2011

Data de aprovação: 03/08/2011

Suporte financeiro: Fundação Instituto Mineiro de Estudos e Pesquisas em Nefrologia - IMEPEN.

O referente estudo foi realizado no Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas em Nefrologia (Niepen) - UFJF.

Os autores declaram a inexistência de conflitos de interesse.

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  • Correspondência para:
    Júlio César Moraes Lovisi
    Rua José Lourenço Kelmer, 1300 (sobreloja) - São Pedro
    Juiz de Fora - MG - Brasil
    CEP 36036-330
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Dez 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      19 Jul 2011
    • Aceito
      03 Ago 2011
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