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Estimando risco em estudos clínicos: razão de chances e razão de risco

CENÁRIO PRÁTICO

Um estudo de coorte retrospectivo avaliou a associação entre o tipo de suporte ventilatório e a mortalidade em pacientes adultos com doença pulmonar intersticial e insuficiência respiratória aguda.11 Güngör G, Tatar D, Saltürk C, Çimen P, Karakurt Z, Kirakli C, et al. Why do patients with interstitial lung diseases fail in the ICU? a 2-center cohort study. Respir Care. 2013;58(3):525-531. https://doi.org/10.4187/respcare.01734
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Em comparação à ventilação não invasiva (VNI), a ventilação mecânica invasiva (VMI) aumentou a mortalidade, com um OR de 26,0 (IC95%: 5,9-116,6) e uma razão de risco (RR) de 2,2 (IC95%: 1,7-2,9), conforme detalhado na Tabela 1.

Tabela 1
Cálculo de ORs e razões de risco para o nosso exemplo de ventilação não invasiva vs. ventilação mecânica invasiva na doença pulmonar intersticial.

No nosso exemplo, calculamos OR e RR para responder à pergunta do estudo. É importante entender a diferença entre esses dois métodos estatísticos para o cálculo de risco, qual é o mais aplicável para responder à pergunta de estudo e como eles são interpretados.

O OR é definido como a razão de chances de um evento ocorrer, estimado calculando-se a razão entre o número de vezes que o evento de interesse ocorre e o número de vezes que esse não ocorre (razão de eventos por não eventos) entre o grupo exposto e o não exposto.22 Sistrom CL, Garvan CW. Proportions, odds, and risk. Radiology. 2004;230(1):12-19. https://doi.org/10.1148/radiol.2301031028
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O RR é definido como a razão de probabilidades de um evento ocorrer (razão de eventos por indivíduos) entre o grupo exposto e o não exposto (Tabela 1). Uma associação positiva (risco aumentado) entre exposição e desfecho implica que o OR ou o RR é > 1,0, e uma associação negativa (risco diminuído) implica que o OR ou o RR é < 1,0.

COMO RR E OR DEVEM SER INTERPRETADOS

O RR é expresso como “o risco do evento (por exemplo, mortalidade) é X vezes maior/menor no grupo exposto do que no grupo não exposto”. Essa afirmação é facilmente interpretada porque lida com probabilidades (que variam de 0 a 1). No entanto, o OR é expresso como a razão entre as chances do evento X no grupo exposto e as chances do mesmo evento no grupo não exposto. Embora utilizemos frequentemente ORs para estimar RRs, eles são diferentes e ORs não são tão intuitivos de entender e, portanto, são comumente mal interpretados.

O RR é comumente (e mais corretamente) usado para estimar o risco de um evento em ensaios clínicos randomizados, estudos de coorte e estudos transversais, porque todos esses desenhos de estudo calculam o risco absoluto e, portanto, o RR pode ser estimado. O OR é utilizado para estimar o risco em estudos de caso-controle, nos quais a prevalência/incidência do desfecho não pode ser estimada, uma vez que os números de indivíduos com e sem o desfecho (casos e controles, respectivamente) são fixados pelos investigadores. O OR é também comumente usado para calcular o risco em estudos de coorte e ensaios clínicos randomizados quando um modelo estatístico de regressão logística é empregado para ajustar fatores de confusão ou testar a modificação de efeito. No entanto, devemos ter em mente que ORs e RRs não são equivalentes.

Em comparação com o RR, o OR tende a superestimar a força da associação entre exposição e desfecho. No entanto, o grau de superestimação é insignificante em estudos em que o desfecho de interesse ocorre raramente (geralmente em < 10% dos indivíduos). Em nosso exemplo, a razão entre as chances de morte no grupo VMI e a do grupo VNI é de 26 para 1 (OR = 26,0). Por outro lado, o risco de morte em pacientes em VMI é de 95%, comparado com 43% nos pacientes em VNI (RR = 2,2). Esse RR é interpretado como o risco de morte sendo 2,2 vezes maior no grupo VMI do que no grupo VNI. Essa grande diferença entre OR e RR é explicada pela alta proporção de participantes que morreram em nosso exemplo (41%). O OR estima o RR com mais precisão quando o desfecho do estudo é raro.

REFERENCES

  • 1
    Güngör G, Tatar D, Saltürk C, Çimen P, Karakurt Z, Kirakli C, et al. Why do patients with interstitial lung diseases fail in the ICU? a 2-center cohort study. Respir Care. 2013;58(3):525-531. https://doi.org/10.4187/respcare.01734
    » https://doi.org/10.4187/respcare.01734
  • 2
    Sistrom CL, Garvan CW. Proportions, odds, and risk. Radiology. 2004;230(1):12-19. https://doi.org/10.1148/radiol.2301031028
    » https://doi.org/10.1148/radiol.2301031028

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    2020
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