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As fosfatases alcalinas, transaminases e gama-glutamil-transferase séricas em pacientes epilépticos tratados com carbamazepina

The serum alkaline phosphatases, transaminases, and gamma-glutamil transferases in epileptic patients treated with carbamazepine

Resumos

INTRODUÇÃO: A carbamazepina é a droga utilizada no tratamento de pacientes com epilepsia parcial (ou focal) secundariamente generalizada. Apesar do uso terapêutico, este fármaco tem sido implicado no aumento das atividades séricas de algumas enzimas. Alguns autores descreveram valores de prevalência de 7,7%, 13% e 22% para aumento de atividade das fosfatases alcalinas séricas (FA ou EC 3.1.3.1). A divergência de resultados também foi encontrada para as atividades da gama-glutamil-transferase sérica (gama-glutamil transferase ou GGT ou EC 2.3.2.2). OBJETIVO: Assim, a meta desta pesquisa é determinar, dentre outros objetivos, a freqüência de alterações nas atividades das FA, GGT e transaminases (AST, aspartato-amino-transferase, EC 2.6.1.1; e ALT, alanina-amino-transferase, EC 2.6.1.2) de uma amostra de pacientes do ambulatório de epilepsia em Salvador, Bahia. MATERIAL E MÉTODOS: O desenho do estudo é descritivo do tipo série de casos, aprovado pelo Comitê de Ética local, no qual uma amostra de conveniência de 52 pacientes epilépticos de acompanhamento ambulatorial foi obtida sem interferência dos pesquisadores. Estes pacientes foram organizados por faixa etária de 12 a 30 e de 31 a 90 anos e, subdivididos por tempo de monoterapia com carbamazepina. As atividades séricas das enzimas GGT, FA, AST e ALT foram determinadas. RESULTADOS: As proporções de alterações por variáveis foram descritas: 42% para as FA, 18% para as GGT, 2% para as ALT e 12% para as AST, respectivamente. A faixa etária de 12 a 30 anos apresentou 56% de alterações nas FA enquanto que aquela de 31 a 90 anos, apenas 18%. CONCLUSÃO: Nós concluímos que as enzimas FA, GGT, AST e ALT apresentaram maiores freqüências de alterações de suas atividades naqueles pacientes com idade igual ou inferior a 30 anos, sendo que as FA apresentaram maiores valores.

fosfatases alcalinas; gama-glutamil-transferase; transaminases; epilepsia; carbamazepina


INTRODUCTION: Carbamazepine is the drug of choice used in the treatment of patients with partial (or focal) epilepsy with secondary generalization. Despite its therapeutical use, this drug has been implicated in the increase of serum activities in some enzymes. Some authors have described prevalence values of 7.7%, 13%, and 22% for the increase of activity of serum alkaline phosphatases (AF or EC 3.1.3.1). A divergence in the results was also found for the activities of the serum g-glutamil transferase (gamma-glutamil transferase or GGT, or EC 2.3.2.2). OBJECTIVE: Hence, among other objectives, the aim of this research is to determine the frequency of sample alterations in serum enzymatic activities of AF, GGT and transaminases (AST, aspartate amino-transferase, EC 2.6.1.1; and ALT, alanine-amino-transferase, EC 2.6.1.2) in epilepsy ward patients in Salvador, Bahia. MATERIAL AND METHODS: The design of the study is descriptive and it is a case series type. It has been approved by the local Ethics Committee. In this study, a convenience sample of 52 epileptic patients who receive ambulatory care was obtained without interference by the researchers. These patients were divided according to age groups of 12 to 30 years and 31 to 90 years, which were then subdivided according to the period of monotherapy with carbamazepine. The serum activities of the enzymes GGT, AF, AST and ALT were determined. RESULTS: The ratios of alterations per variables were described: 42% for the FA, 18% for the GGT, 2% for the ALT, and 12% for the AST respectively. The age group of 12 to 30 years presented 56% of alterations in the AF while the group of 31 to 90 years presented only 18% of alterations. CONCLUSION: We conclude that the enzymes AF, GGT, AST, and ALT presented higher frequencies of alterations of their activities in those patients with age equal to or below 30 years, while the AF presented higher values.

Alkaline phosphatases; gamma-glutamil transferase; transaminases epilepsy; carbamazepine


ORIGINAL ARTICLES

As fosfatases alcalinas, transaminases e g-glutamil-transferase séricas em pacientes epilépticos tratados com carbamazepina

The serum alkaline phosphatases, transaminases, and g-glutamil transferases in epileptic patients treated with carbamazepine

Helder Jacobina SantosI; Antonio de Souza Andrade FilhoII; Olivia Lordelo SanchesIII; Tiago SpoladorIV; Luís Erlon Araújo RodriguesV

IMestre e Professor Assistente de Bioquímica da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/FBDC, Salvador, BA

IIProfessor Titular de Neurologia Clínica da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/FBDC e Professor Adjunto Nível IV de Neuropsiquiatria da UFBa

IIIAluna do 5º ano de Medicina da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/FBDC

IVAluno do 6º de Medicina da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/FBDC

VProfessor Titular-Doutor em Bioquímica da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/FBDC e de Patologia Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Helder Jacobina Santos Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública Fundação Bahiana para Desenvolvimento das Ciências Rua Frei Henrique, 8 – Nazaré CEP 40050-420, Salvador, BA, Brasil Fone: (71) 2101-2900 E-mail: helderjs@terra.com.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: A carbamazepina é a droga utilizada no tratamento de pacientes com epilepsia parcial (ou focal) secundariamente generalizada. Apesar do uso terapêutico, este fármaco tem sido implicado no aumento das atividades séricas de algumas enzimas. Alguns autores descreveram valores de prevalência de 7,7%, 13% e 22% para aumento de atividade das fosfatases alcalinas séricas (FA ou EC 3.1.3.1). A divergência de resultados também foi encontrada para as atividades da g-glutamil-transferase sérica (gama-glutamil transferase ou GGT ou EC 2.3.2.2).

OBJETIVO: Assim, a meta desta pesquisa é determinar, dentre outros objetivos, a freqüência de alterações nas atividades das FA, GGT e transaminases (AST, aspartato-amino-transferase, EC 2.6.1.1; e ALT, alanina-amino-transferase, EC 2.6.1.2) de uma amostra de pacientes do ambulatório de epilepsia em Salvador, Bahia.

MATERIAL E MÉTODOS: O desenho do estudo é descritivo do tipo série de casos, aprovado pelo Comitê de Ética local, no qual uma amostra de conveniência de 52 pacientes epilépticos de acompanhamento ambulatorial foi obtida sem interferência dos pesquisadores. Estes pacientes foram organizados por faixa etária de 12 a 30 e de 31 a 90 anos e, subdivididos por tempo de monoterapia com carbamazepina. As atividades séricas das enzimas GGT, FA, AST e ALT foram determinadas.

RESULTADOS: As proporções de alterações por variáveis foram descritas: 42% para as FA, 18% para as GGT, 2% para as ALT e 12% para as AST, respectivamente. A faixa etária de 12 a 30 anos apresentou 56% de alterações nas FA enquanto que aquela de 31 a 90 anos, apenas 18%.

CONCLUSÃO: Nós concluímos que as enzimas FA, GGT, AST e ALT apresentaram maiores freqüências de alterações de suas atividades naqueles pacientes com idade igual ou inferior a 30 anos, sendo que as FA apresentaram maiores valores.

Unitermos: fosfatases alcalinas, gama-glutamil-transferase, transaminases, epilepsia, carbamazepina.

ABSTRACT

INTRODUCTION: Carbamazepine is the drug of choice used in the treatment of patients with partial (or focal) epilepsy with secondary generalization. Despite its therapeutical use, this drug has been implicated in the increase of serum activities in some enzymes. Some authors have described prevalence values of 7.7%, 13%, and 22% for the increase of activity of serum alkaline phosphatases (AF or EC 3.1.3.1). A divergence in the results was also found for the activities of the serum g-glutamil transferase (gamma-glutamil transferase or GGT, or EC 2.3.2.2).

OBJECTIVE: Hence, among other objectives, the aim of this research is to determine the frequency of sample alterations in serum enzymatic activities of AF, GGT and transaminases (AST, aspartate amino-transferase, EC 2.6.1.1; and ALT, alanine-amino-transferase, EC 2.6.1.2) in epilepsy ward patients in Salvador, Bahia.

MATERIAL AND METHODS: The design of the study is descriptive and it is a case series type. It has been approved by the local Ethics Committee. In this study, a convenience sample of 52 epileptic patients who receive ambulatory care was obtained without interference by the researchers. These patients were divided according to age groups of 12 to 30 years and 31 to 90 years, which were then subdivided according to the period of monotherapy with carbamazepine. The serum activities of the enzymes GGT, AF, AST and ALT were determined.

RESULTS: The ratios of alterations per variables were described: 42% for the FA, 18% for the GGT, 2% for the ALT, and 12% for the AST respectively. The age group of 12 to 30 years presented 56% of alterations in the AF while the group of 31 to 90 years presented only 18% of alterations.

CONCLUSION: We conclude that the enzymes AF, GGT, AST, and ALT presented higher frequencies of alterations of their activities in those patients with age equal to or below 30 years, while the AF presented higher values.

Key words: Alkaline phosphatases, gamma-glutamil transferase, transaminases epilepsy, carbamazepine.

INTRODUÇÃO

A epilepsia é uma síndrome caracterizada por manifestações clínicas presumida de uma descarga anormal ou excessiva, sincrônica, transitória e recorrente de um grupo de neurônios cerebrais. Os seus tipos são a parcial simples, a parcial complexa, a parcial com evolução para generalizada secundariamente, a generalizada e a epiléptica não-classificada(7). A prevalência (casos/habitantes) é igual a 11,9/1000 em São Paulo(18). Seu diagnóstico é principalmente obtido pela anamnese e o seu tratamento pode se constituir de mono ou politerapia em função do tipo de epilepsia ou da resposta terapêutica(2).

A carbamazepina é um composto tricíclico utilizado para controlar as crises parciais e as tônico-clônico generalizadas(17,20). Esta droga é metabolizada nos compostos 9-hidroximetil-10-carbamoilacridan, 2-hidroxicarbamazepina, 3-hidroxicarbamazepina, 10,11-epoxicarbamazepina e a trans-10,11-dihidroxi-10,11-dihidrocarbamazepina. O penúltimo metabólito tem ação sinérgica à carbamazepina e o último metabólito é um composto inativo que será eliminado na urina(12,13,20,23,26).

Tem-se observado os efeitos da carbamazepina sobre as atividades de enzimas séricas de perfil hepático como as g-glutamil-transferase (GGT ou gama-glutamil-transferase ou EC 2.3.2.2), aspartato-amino-transferase (AST ou EC 2.6.1.1), alanina-amino-tranferase (ALT ou EC 2.6.1.2) e fosfatases alcalinas (FA ou EC 3.1.3.1)(34). As GGT apresentaram resultados diferentes para amostras de faixa etária e tempo de monoterapia semelhantes(1,4,14,19,27). Inclusive, foram descritas freqüências iguais a 19,2%(14) e 67%(27) referentes ao aumento das atividades para as GGT em pacientes com a média de idade em 30 anos. Alguns autores relataram aumentos das atividades das fosfatases alcalinas como 7,7%(14), 13%(4), 14%(1) e 22%(24), principalmente da isoenzima óssea, mas sem diferenças significativas com seus controles(24,30), enquanto que outros apresentaram diferenças(3).

Por conta dos resultados aparentemente controversos, os autores deste trabalho pretendem descrever as características socioeconômicas dos pacientes, medir as concentrações séricas da carbamazepina, conhecer as proporções de atividades alteradas para as FA, GGT, AST e ALT em pacientes epilépticos sob monoterapia por carbamazepina do ambulatório filantrópico de epilepsia da Fundação de Neurologia e Neurocirurgia – Instituto do Cérebro (FNN/ IC) em Salvador-BA.

MATERIAL E MÉTODO

Este é um estudo descritivo do tipo série de casos, não controlado, que é parte de um estudo aprovado pelo comitê de ética local. Os critérios de inclusão se resumem na idade igual ou maior de 12 anos, na assinatura do termo de consentimento livre e informado, na monoterapia com carbamazepina por um mínimo de 5 dias e na existência de epilepsia como único diagnóstico de morbidade. Os pacientes sob monoterapia com carbamazepina foram previamente agendados pela FNN/IC sem interferência dos pesquisadores. Cinqüenta e dois pacientes foram identificados em função dos critérios de inclusão no dia da consulta através de pesquisa de prontuários, entrevista ou anamnese no período de junho e novembro de 2004 e convidados a participarem após assinatura do termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Dessa maneira, estes pacientes constituíram a amostra de conveniência desta pesquisa. As amostras de soro foram oriundas da centrifugação a 900G das alíquotas de sangue venoso obtidas dos pacientes em até 6 horas da dose matinal da carbamazepina. Os pacientes não estavam em jejum. As atividades séricas das GGT, FA, AST e ALT foram determinadas(8,9,10) no Laboratório de Pesquisas Básicas da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/Fundação para Desenvolvimento das Ciências (LPB-EBMSP/FBDC). A carbamazepina foi identificada e determinada sua concentração pelo método imunoensaio fluorimétrico e pelo método imunoenzimático por um laboratório particular. Os pacientes foram estratificados em 4 grupos: aquele de faixa etária de 12 a 30 anos com menos de 1 ano de uso de carbamazepina (A), o de faixa etária de 12 a 30 anos com mais de 1 ano de uso de carbamazepina (B), o de faixa etária de 31 a 90 anos com menos de 1 ano de uso de carbamazepina (C) e, finalmente, aquele de faixa etária de 31 a 90 anos com mais de 1 ano de uso de carbamazepina (D). Por conta das características metodológicas deste estudo, a estatística descritiva sobre os dados foi sistematizada nas médias, desvios-padrão, medianas e quartis sobre as variáveis contínuas e nas proporções de atividades alteradas das enzimas estudadas(5).

RESULTADOS

O total de participantes foi 52 pacientes. As variáveis mais freqüentes foram o sexo masculino com 62%, o estado cível solteiro com 76% e a renda salarial abaixo de 2 salários-mínimos com 73% (Tabela 1). O sexo masculino apresentou maiores taxas de alterações nas atividades enzimáticas (Tabela 5). A média das idades na faixa etária de 12 a 30 anos foi de aproximadamente 20 anos e entre os 52 pacientes foi de 32 anos (Tabela 2).

A concentração sérica da carbamazepina apresentou médias maiores entre os pacientes com mais de um ano de monoterapia em relação àqueles com menos de 1 ano de uso de carbamazepina, sendo que a maior delas foi entre os pacientes de 12 a 30 anos de idade com mais de 1 ano desta terapia (Tabela 3).

O tempo de monoterapia apresentou medianas iguais há 7,0 meses entre aqueles que tinham menos de um ano de monoterapia. Entre os que fizeram esta terapia por mais de 1 ano, os pacientes de 12 a 30 anos de idade tiveram o maior tempo também (Tabela 4).

Vinte e sete do total de 52 pacientes (52%) tiveram atividade sérica acima dos níveis fisiológicos em pelo menos uma enzima durante o uso de carbamazepina (Gráfico 1). Destas alterações, houve 12% para AST, 2% para ALT, 18% para GGT e 42% para fosfatases alcalinas (Gráfico 2).



Todas estas enzimas tiveram maiores freqüências de alterações entre aqueles de faixa de 12 a 30 anos de idade (Gráfico 3). Estes tiveram maiores proporções para as enzimas AST e FA no substrato com mais de 1 ano de monoterapia, diferentemente daqueles de 31 a 90 anos de idade (Gráficos 4 e 5).




DISCUSSÃO

O agendamento dos pacientes, já previamente organizado pelo serviço do ambulatório filantrópico da FNN/ IC antes da realização desta pesquisa, não foi modificado pelos pesquisadores. Assim, a amostra pode ser representativa dos pacientes do referido ambulatório.

A média de idade encontrada da amostra de 52 pacientes (Tabela 2) foi próxima aos valores de outros trabalhos(1,4,14,19,26).

As fosfatases alcalinas apresentaram maiores alterações entre aqueles pacientes com menos de 30 anos de idade, nos quais em que o processo de renovação ou de regeneração óssea está mais intenso por conta de um aumento no número e da atividade dos osteoblastos(11,20,27), de processos patológicos que facilitam ou promovem a (15,29,35) ou de aumento da atividade celular por conta da carbamazepina(25,33). Isto pode explicar a predominância entre os mais jovens (Gráfico 3). A baixa freqüência de alterações para as GGT em relação às FA (Gráfico 2) permite pensar que, além das isoenzimas hepáticas, há uma possibilidade da contribuição das isoenzimas ósseas para a hegemonia das FA sobre as outras enzimas(24). Outros pesquisadores indicam a determinação das isoenzimas das FA como monitoramento dos efeitos da carbamazepina em seus pacientes epilépticos(34). A dosagem sérica dos marcadores hepáticos como uréia e arginase I e a determinação do tempo de protrombina poderá indicar a magnitude do estresse provocado pela referida droga.

Contudo, os métodos de dosagem para g-GT podem explicar as diferenças entre os resultados encontrados (Gráficos 2, 3 e 4) e Rao et al. (1993)(27). O que há de semelhante entre os primeiros grupos de autores(6,27) é o fato de utilizarem o mesmo kit "Boehringer Mannheim", sem referirem sobre o princípio de dosagem. Quanto ao outro(19), foi usado o método cinético enzimático de Szasz (1969)(31). O princípio de dosagem de g-GT desta dissertação foi baseado no método de Naftalin (1969b)(22) modificado(9) e no fundamento utilizado por Callaghan et al. (1994)(4). O método de Szasz (1969)(31) distingue-se pela temperatura de experimento que é de 25ºC e tendo como valores normais de 3,2 a 13,5 mU/mL para sexo feminino e 4,5 a 24,8 mU/mL para o sexo masculino(31). O método de Doles (2003)(9) trabalha a 37ºC e os valores normais de atividade enzimática incluem 4 a 22 UI/L (4-22 mU/mL) para o sexo feminino e 4 a 26 UI/L (4-26 mU/mL) para o sexo masculino(9).

Comparando os resultados desta dissertação (Gráficos 3 e 4), percebe-se que as atividades das transaminases são maiores entre aqueles com menos de 30 anos de idade(4,6,19,27). As baixas freqüências das transaminases em relação às outras enzimas (Gráfico 3) são explicadas pela localização predominante destas enzimas na região periportal do lobo hepático(32). Não se conhece o motivo da grande diferença do resultado deste trabalho (Gráficos 3 e 4) em relação aos 56% de aumento para AST na faixa etária de 5 a 15 anos com tempo de terapia de 5 a 92 meses(6). Contudo, devem-se investigar as causas destes resultados.

É conhecido que a carbamazepina induz seu próprio metabolismo quando o tratamento é de longa duração, tendo, conseqüentemente, o aumento dos níveis séricos desta droga durante o tratamento(12). Os resultados encontrados (Tabelas 3 e 4) indicam a ocorrência da autoindução da carbamazepina ao longo do tempo, pois o grupo de pacientes que houve maior tempo de monoterapia, também, houve maior concentração sérica desta droga.

A predominância do sexo masculino (Tabela 1) pode se constituir num viés de seleção ou de confusão. As alterações foram predominantes entre os do sexo masculino (Tabela 5). Assim como a influência numérica do sexo masculino, algum fator de proteção na mulher deve ser pesquisado para melhor definir seus poderes de influência sobre os resultados. Além disso, a renda familiar e o estado civil (Tabela 1) podem favorecer a prática de hábitos de vida pouco saudáveis que condicionem a fatores de risco para a elevação das atividades enzimáticas a níveis nãofisiológicos. O peso e a altura do paciente, que não foram mensurados neste trabalho, poderiam indicar a influência do índice de massa corpórea (IMC) ou do sexo sobre os resultados (Tabela 5) agrupando os pacientes por IMC.

Observa-se que, até fins da década de 90, os autores determinaram a freqüência de alterações, mas, a partir do ano 2000, escolheram médias das atividades enzimáticas, que podem não evidenciar os valores alterados(1,11,14,15,27), gerando um viés de confusão.

A maioria dos trabalhos disponíveis à consulta pública e daqueles citados nesta dissertação não apresentou nem o modo de seleção de suas amostras e nem uma descrição do método de dosagem das enzimas citadas, o que pode indicar um viés de aferição assim como um viés de seleção. Outros autores(24) acreditam, entretanto, que os efeitos da carbamazepina na densidade óssea não foram adequadamente esclarecidos.

Limitações

A não referência por todos os pesquisadores sobre a aleatoriedade da mobilização amostral, permite pensar na existência de um viés de seleção, e, por isso, os resultados não serem representativos de seus centros ambulatoriais e, tão pouco, não representarem suas respectivas populações de pacientes epilépticos sob monoterapia por carbamazepina.

Além daquelas dificuldades, também houve as que acompanharam a pesquisa de dados para esta dissertação. Uma parte dos prontuários dos pacientes não tinha o endereço ou telefone para contactos, inviabilizando o sorteio das amostras, e por isso, a representatividade do total de pacientes do ambulatório de onde originou tal amostra; o estudo foi realizado num ambulatório de uma unidade de saúde dificultando a extrapolação para a população; houve estratos que tinham 3 ou 2 pacientes; os pacientes já faziam uso de carbamazepina, impossibilitando a aplicação de um estudo experimental. Além disso, a relação entre politerapia e monoterapia foi em média de 4 para 1.

Mesmo com tais dificuldades e com a possibilidade de influência dos vieses de amostragem e de confusão, inclusive em relação às atividades das FA, acredita-se na importância destes resultados como sinalizadores de uma provável situação de saúde. Assim, os autores sugerem estudos randomizados controlados para se conhecer a magnitude da influência carbamazepina sobre as atividades séricas das fosfatases alcalinas e suas isoenzimas, AST, ALT, GGT e de outros marcadores de função hepática, principalmente a isoenzima arginase tipo I, ou de função óssea. Além disso, pode-se ainda estudar correlações entre as diversas variáveis que indicam o metabolismo ósseo e hepático. Também, os autores sugerem realizar estudos transversais controlados randomizados para conhecer as características dos métodos de dosagens quanto aos valores preditivos, sensibilidade. Os autores ainda propõem que se faça estudos para se conhecer a correlação entre condições socioeconômicas, hábitos de vida e indicadores bioquímicos hepáticos e ósseos em pacientes epilépticos sob uso de anticonvulsivantes.

CONCLUSÃO

As enzimas FA, GGT, AST e ALT apresentaram maiores freqüências de alterações de suas atividades séricas naqueles da amostra com idade igual ou inferior a 30 anos.

As concentrações séricas da carbamazepina estiveram aumentadas naqueles da amostra com mais de um ano de monoterapia.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Fundação de Neurologia e Neurocirurgia/Instituto do Cérebro pela utilização dos pacientes que participaram desta pesquisa e à Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública/Fundação Bahiana para Desenvolvimento das Ciências pelo Laboratório de Pesquisas Básicas e sua infraestrutura no qual as amostras foram analisadas.

Received Dec. 05, 2005; accepted Jan. 20, 2006.

Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública – FBDC

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  • Endereço para correspondência:

    Helder Jacobina Santos
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    Fundação Bahiana para Desenvolvimento das Ciências
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Ago 2006
    • Data do Fascículo
      Mar 2006

    Histórico

    • Recebido
      05 Dez 2005
    • Aceito
      20 Jan 2006
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