Acessibilidade / Reportar erro

Associação da frequência de alimentação com índices antropométricos e pressão arterial em crianças e adolescentes: o Estudo CASPIAN-IV Como citar este artigo: Kelishadi R, Qorbani M, Motlagh ME, Heshmat R, Ardalan G, Bahreynian M. Association of eating frequency with anthropometric indices and blood pressure in children and adolescents: the CASPIAN-IV Study. J Pediatr (Rio J). 2016;92:156-67.

Resumo

Objetivos:

Este estudo foi feito para explorar a associação da frequência de alimentação (FA) com índices antropométricos e pressão arterial (PA) em crianças e adolescentes.

Métodos:

Este estudo transversal nacional foi feito em uma amostra de várias etapas de 14.880 estudantes entre seis e 18 anos de 30 províncias do Irã. Foi pedido que os pais relatassem o consumo alimentar das crianças, como a frequência de grupos e/ou itens alimentares. A FA foi definida como a soma da frequência de consumo diária das principais refeições e lanches. A associação entre FA e disfunções do peso, obesidade abdominal e PA elevada foi avaliada com diferentes modelos de regressão logística ajustados pelos possíveis fatores de confusão.

Resultados:

Foi constatada uma alimentação mais frequente (≥ 6 em comparação com ≤ 3) entre estudantes mais novos (11,91 em comparação com 3,29 anos) (P < 0,001). Estudantes que relataram quatro [razão de chance (RC): 0,67; intervalo de confiança (IC): 0,57-0,79], cinco (RC: 0,74; IC: 0,62-0,87) e seis (RC: 0,54; IC: 0,44-0.65) refeições apresentaram menores chances de se tornar obesos em comparação com os que apresentaram FAs ≤ 3. FA de quatro (RC: 0,82; IC: 0,71-0,94), cinco (RC: 0,86; IC: 0,74-0,99) e ≥ sei (RC: 0,73; IC: 0,63-0,85) foi associada a menor prevalência de adiposidade abdominal.

Conclusão:

A FA mais alta foi associada à redução nos valores médios das medidas antropométricas e de PA, bem como à menor prevalência de obesidade generalizada e abdominal em crianças e adolescentes. São necessários estudos longitudinais para avaliar os efeitos de longo prazo da FA sobre a composição corporal na faixa etária pediátrica.

Palavras-chave
Frequência de alimentação; Pressão arterial; Índices antropométricos; Obesidade; Crianças e adolescentes

Abstract

Objectives:

This study was conducted to explore the association of eating frequency (EF) with anthropometric indices and blood pressure (BP) in children and adolescents.

Methods:

This nationwide cross-sectional study was performed on a multi-stage sample of 14,880 students, aged 6–18 years, living in 30 provinces in Iran. Parents were asked to report dietary intake of children as frequency of food groups and/or items. EF was defined as the sum of the daily consumption frequency of main meals and snacks. Association of EF with weight disorders, abdominal obesity, and elevated BP was assessed using different logistic regression models adjusted for potential confounding factors.

Results:

Eating more frequently (≥6 vs. ≤3) was found among students who were at younger age (11.91 vs. 13.29 years) (p < 0.001). Students who reported an EF of 4 (OR: 0.67, CI: 0.57–0.79), 5 (OR: 0.74, CI: 0.62–0.87), and 6 (OR: 0.54, CI: 0.44–0.65) had lower odds of being obese compared to those who had EF ≤ 3. Having EF of 4 (OR: 0.82, CI: 0.71–0.94), 5 (OR: 0.86, CI: 0.74–0.99), and ≥6 (OR: 0.73, CI: 0.63–0.85) was related to lower prevalence of abdominal adiposity.

Conclusion:

Higher EF was associated with lower mean values of anthropometric and BP measures, as well as with lower prevalence of generalized and abdominal obesity in children and adolescents. Longitudinal studies are needed to assess the long-term effects of EF on body composition in the pediatric age group.

Keywords
Eating frequency; Blood pressure; Anthropometric indices; Obesity; Children and adolescents

Introdução

Está bem documentado que doenças não transmissíveis se originam na infância11 Kelishadi R, Poursafa P. A review on the genetic, environmental, and lifestyle aspects of the early-life origins of cardiovascular disease. Curr Probl Pediatr Adolesc Health Care. 2014;44:54-72. e seus principais fatores de risco, como pressão arterial (PA) elevada e excesso de peso, estão presentes da infância à vida adulta.

A hipertensão é reconhecida como uma das principais possíveis causas de diversos danos graves em órgãos-alvo.22 Spagnolo A, Giussani M, Ambruzzi AM, Bianchetti M, Maringhini S, Matteucci MC, et al. Focus on prevention, diagnosis and treat-ment of hypertension in children and adolescents. Ital J Pediatr. 2013;39:20. A prevalência e nova incidência de PA elevada estão aumentando entre crianças e adolescentes.33 Sorof JM, Lai D, Turner J, Poffenbarger T Portman RJ. Overweight, ethnicity, and the prevalence of hypertension in school-aged children Pediatrics. 2004;113:475-82. Contudo, foi demonstrado que a PA elevada na infância aumenta o risco de pré-hipertensão e vida adulta hipertensa.44 Chen X, Wang Y.Tracking of blood pressure from childhood to adulthood: a systematic review and meta-regression analysis. Circulation. 2008;117:3171-80.

A situação do peso corporal é um dos fortes fatores de risco atribuídos à hipertensão.33 Sorof JM, Lai D, Turner J, Poffenbarger T Portman RJ. Overweight, ethnicity, and the prevalence of hypertension in school-aged children Pediatrics. 2004;113:475-82. A taxa alarmante da prevalência de sobrepeso e obesidade está se tornando agora um problema sério de saúde pública em todo o mundo.55 Kelishadi R, Haghdoost AA, Sadeghirad B, Khajehkazemi R. Trend in the prevalence of obesity and overweight among Iranian children and adolescents: a systematic review and meta--analysis. Nutrition. 2014;30:393-400.,66 Cavaco S, Eriksson T, Skalli A. Life cycle development of obesity and its determinants in six European countries. Econ Hum Biol. 2014;14:62-78.

Vários fatores subjacentes, como a elevada interação entre genética e meio ambiente, incluindo componentes da dieta, podem afetar a situação do peso corporal.77 Receveur O, Morou K, Gray-Donald K, Macaulay AC. Consump-tion of key food items is associated with excess weight among elementary-school-aged children in a Canadian first nations community. J Am Diet Assoc. 2008;108:362-6. Abordagens dietéticas com foco em nutrientes e alimentos específicos não puderam explicar completamente o estabelecimento da obesidade infantil e suas complicações correspondentes. Assim, é de grande importância se concentrar em padrões dietéticos e comportamentos alimentares como frequência de alimentação (FA).88 Rodríguez G, Moreno LA. Is dietary intake able to explain diffe-rences in body fatness in children and adolescents? Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2006;16:294-301.

Estudos anteriores indicaram que uma FA mais alta está associada ao peso corporal mais saudável e a menor probabilidade de hipertensão entre a população adulta.99 Berg C, Lappas G, Wolk A, Strandhagen E, Torén K, Rosengren A, et al. Eating patterns and portion size associated with obesity in a Swedish population. Appetite. 2009;52:21-6.,1010 Kim S, Park GH, Yang JH, Chun SH, Yoon HJ, Park MS. Eating frequency is inversely associated with blood pressure and hypertension in Korean adults: analysis of the Third Korean National Health and Nutrition Examination Survey. Eur J Clin Nutr. 2014;68:481-9. Contudo, evidências atuais sobre a relação de FA e adiposidade entre crianças e adolescentes não são conclusivas.1111 Chinapaw MJ, Yildirim M, Altenburg TM, Singh AS, Kovács E, Molnár D, et al. Objective and self-rated sedentary time and indicators of metabolic health in Dutch and Hungarian 10-12 year olds: the Energy-Project. PLoS ONE. 2012;7:e36657.,1212 PayabM, Kelishadi R, Qorbani M, Motlagh ME, Ranjbar SH, Arda-lan G, et al. Association of junk food consumption with high blood pressure and obesity in Iranian children and adolescents: the Caspian-IV Study. J Pediatr (Rio J). 2015;91:196-205. São relatadas algumas associações entre supressão de refeições e aumento do risco de obesidade na juventude,1313 Koletzko B, Toschke AM. Meal patterns and frequencies: do they affect body weight in children and adolescents? Crit Rev Food Sci Nutr. 2010;50:100-5. ao passo que alguns outros estudos não confirmaram essa relação.1414 Siega-Riz AM, Carson T, Popkin B. Three squares or mostly snacks - what do teens really eat? A sociodemographic study of meal patterns. J Adolesc Health. 1998;22:29-36. Portanto, este estudo pretende explorar a associação da FA com índices antropométricos e PA em uma população pediátrica.

Material e métodos

Esta pesquisa transversal multicêntrica foi feita entre 2011-2012 como a quarta fase de um programa de vigilância de âmbito nacional intitulado Estudo de Vigilância e Prevenção na Infância e Adolescência de Doenças da Vida Adulta Não Transmissíveis (Caspian-IV).

Os detalhes e protocolos do estudo foram descritos anteriormente.1515 Kelishadi R, Ardalan G, Qorbani M, Ataie-Jafari A, Bahreynian M, Taslimi M, et al. Methodology and early findings of the Fourth Survey of Childhood and Adolescence Surveillance and Prevention of Adult Non-Communicable Disease in Iran: the Caspian-IV Study. Int J Prev Med. 2013;4:1451-60. Em resumo, a pesquisa Caspian-IV foi feita em uma amostra probabilística estratificada de várias etapas com 14.880 crianças e adolescentes entre 6-18 anos que vivem em áreas urbanas e rurais de 30 províncias no Irã. Os comitês de ética de organizações nacionais relevantes aprovaram este estudo (código do comitê de ética: 188092). Foram obtidos o consentimento informado escrito e o consentimento verbal dos pais e participantes.

Prestadores de serviços de saúde treinados mediram índices antropométricos, incluindo estatura (E), peso (P), circunferência da cintura (CC), circunferências do punho e quadril (CQ), segundo os protocolos convencionais, com equipamentos calibrados. A estatura em pé foi medida com um estadiômetro de parede e aproximada para o 0,1 cm mais próximo e o peso foi medido com uma balança portátil e aproximado para o 0,1 kg mais próximo. A medida da CC foi registrada na circunferência mínima entre a crista ilíaca e a caixa torácica com uma fita não elástica. O índice de massa corporal (IMC) foi então calculado por meio da razão entre P (Kg) e E ao quadrado (m2). As curvas padrão da Organização Mundial de Saúde (OMS) foram usadas para definir o peso abaixo da média, o sobrepeso e a obesidade. A definição de peso abaixo da média teve como base o IMC inferior ao quinto percentil por idade e sexo. Os indivíduos com sobrepeso foram classificados com IMC entre o 85° e 95° percentis e a obesidade foi considerada com IMC superior ao 95° centil por idade e sexo. A razão cintura/quadril (RCQ) e a razão cintura/estatura (RCE) foram calculadas pela divisão da CC pela CQ e pela E, respectivamente. A RCE maior do que 0,5 foi considerada um indicador de obesidade abdominal.1616 Li C, Ford ES, Mokdad AH, Cook S. Recent trends in waist circumference and waist-height ratio among US children and adolescents. Pediatrics. 2006;118:e1390-8. A avaliação do consumo alimentar de crianças e adolescentes teve como base o relato dos pais como frequência de grupos e/ou itens alimentares. As escolas no Irã funcionam em meio período; portanto, o programa de refeição escolar não é habitual e, assim, os estudantes fazem quase todas as suas refeições em casa; perguntamos aos pais a frequência de consumo das três principais refeições (café da manhã/almoço/jantar) de seus filhos e aos estudantes, perguntamos sobre os lanches.1717 Kelishadi R, Majdzadeh R, Motlagh ME, Heshmat R, Aminaee T, Ardalan G, et al. Development and evaluation of a questionnaire for assessment of determinants of weight disorders among children and adolescents: the Caspian-IV Study. Int J Prev Med. 2012;3:699-705. Os itens a seguir foram considerados lanches: a) bolos, bolachas, biscoitos, chocolates, doces; b) salgadinhos, chips, pretzels; c) refrigerantes e bebidas açucaradas; d) frutas, sucos naturais, frutas secas; e) leite e laticínios; f) salsichas, pizza e hambúrguer. A FA foi definida como a soma do consumo das principais refeições e de lanches, que ficou entre um e nove e foi categorizada em quatro grupos: FA ≤ 3, FA = 4, FA = 5 e FA ≥ 6 de acordo com sua distribuição. Os dados sociodemográficos, de atividade física, sono, tempo de tela e hábitos de fumo foram coletados por meio de uma entrevista com os estudantes. A atividade física e o tempo de tela (inclusive assistir TV e usar computador e internet no horário de lazer) foram categorizados como leve, moderado e intenso, com limites de > 2 h ou ≤ 2 h por dia, respectivamente. O escore da situação socioeconômica (SSE) dos participantes foi construído com o método de análise do componente principal e incluiu as variáveis "escolaridade dos pais, trabalho dos pais, posse de carro particular, tipo de escola (pública/particular), tipo de residência (própria/alugada) e posse de computador pessoal em casa. O escore SSE foi categorizado em tercis para formar três níveis de SSE. O primeiro nível foi considerado "SSE baixa", o segundo, "SSE moderada" e o terceiro, "SSE alta".

Todas as entrevistas foram feitas em uma atmosfera calma e amigável; os questionários foram preenchidos anonimamente.

Para medir a PA sistólica e diastólica (PAS, PAD), solicitou-se que os participantes se sentassem silenciosamente, relaxados, com movimentos limitados e respiração normal. A PA foi medida duas vezes com o esfigmomanômetro de mercúrio padronizado e calibrado no braço direito. O manguito tinha um tamanho adequado para a parte superior do braço das crianças e a média de valores medidos (em duplicata, com intervalo de 5 minutos) foi usada para determinar os níveis de PA. As leituras no primeiro som de Korotkoff foram consideradas PAS e as no quinto som foram consideradas PAD. A média das medições em duplicata foi registrada e incluída na análise. O diagnóstico de PA elevada em crianças teve como base o 90° percentil da distribuição de PAS e/ou PAD de acordo com sexo, idade e estatura.1818 Fallah Z, Qorbani M, Motlagh ME, Heshmat R, Ardalan G, Kelishadi R. Prevalence of prehypertension and hypertension in a nationally representative sample of Iranian children and adolescents: the Caspian-IV Study. Int J Prev Med. 2014;5: S57-64.

Análise estatística

Os dados foram analisados com o pacote STATA (Release 12. College Station, STATA Corp LP. Package, TX, EUA). Todas as análises foram feitas com o método de análise de pesquisa. A média, os intervalos de confiança (IC de 95%) e os percentuais foram calculados com relação a variáveis contínuas e categóricas, respectivamente. A média e a prevalência de variáveis contínuas e categóricas em todos os grupos de FA foram avaliadas com os testes qui-quadrado e de análise de variância (Anova). A associação entre FA e disfunções do peso, obesidade abdominal e PA elevada foi avaliada com diferentes modelos de regressão logística. No Modelo I, foi avaliada a associação bruta; no Modelo II, a análise foi ajustada por idade, sexo e área de residência; no Modelo III, tempo de tela, atividade física, SSE e horas de sono foram ajustados adicionalmente. As análises de PA foram ajustadas pelo IMC no modelo IV. FA ≤ 3 foi considerado o grupo de referência para todos os modelos estatísticos. O resultado da regressão logística é apresentado como razão de chance (RC) e intervalo de confiança (IC) de 95%. A associação da FA com índices antropométricos e nível de PA foi avaliada com diferentes modelos de regressão linear. Todos os ajustes foram os mesmos dos modelos de regressão logística. O resultado da regressão linear é apresentado como Beta (β) e IC de 95%. O nível significativo foi estabelecido no valor de P inferior a 0,05.

Resultados

Em geral, 13486 estudantes completaram o estudo (taxa de participação: 90,6%). A idade média dos participantes era de 12,47 anos (IC de 95%: 12,29; 12,65), 49,2% eram meninas e 75,6% eram de áreas urbanas. As características demográficas e antropométricas dos participantes são apresentadas na tabela 1. Não existiu diferença significativa entre os sexos na idade média (p = 0,20). A média geral e o IC de 95% para IMC e CC foram 18,85 (18,71; 18,99) kg/m2 e 67,03 (66,57; 67,48) cm, respectivamente. No total, 19,12% dos estudantes apresentavam obesidade abdominal e 11,89% eram obesos. Uma PA elevada foi documentada entre 3,74% dos estudantes. O café da manhã foi determinado como a principal refeição mais suprimida por crianças e adolescentes (32,08% não tomam café da manhã em comparação a 8,90% que não almoçam e 10,90% que não jantam). Os índices antropométricos, as atividades no horário de lazer e a frequência da pressão arterial elevada estão resumidos na tabela 2. Conforme a idade aumentava, a frequência de alimentação apresentava redução; estudantes de 13,29 anos de idade comiam ≤ 3 refeições e/ou lanches, ao passo que participantes de 11,91 anos comiam ≥ 6 refeições e/ou lanches em um dia (p < 0,001). Resultados semelhantes foram observados em meninos e meninas, separadamente. Os índices antropométricos como peso (45,95 em comparação a 39,66 kg), cintura (68,75 em comparação a 65,56 cm) e IMC (19,61 em comparação a 18,17 kg/m2) eram maiores entre aqueles com FA de três ou menos do que três por dia em comparação com estudantes que consumiam seis ou mais de seis refeições e/ou lanches diariamente (todos os valores de p < 0,001). Uma FA mais baixa foi relatada entre indivíduos obesos; no total, a obesidade foi documentada em 14,01% dos estudantes que relataram FA ≤ três e em 9,51% daqueles com FA ≥ seis diariamente (p < 0,001). A probabilidade de apresentar obesidade abdominal era maior entre os meninos que apresentavam FA ≤ três diariamente (22,01%) em comparação com suas contrapartes com FA ≥ seis (18,30%) (p = 0,030). A PAS elevada foi documentada entre participantes com FA mais baixa do que seus pares com FA mais alta (p < 0,001). Os mesmos resultados foram observados em meninos (p < 0,001) e em meninas (p < 0,001) também. Indivíduos com FA ≤ três eram mais suscetíveis a apresentar PAD mais elevada em comparação com aqueles com FA ≥ seis diariamente (p = 0 < 0,001). Chances mais baixas de PA elevada foram observadas entre aqueles que apresentaram FA mais alta (≥ seis) em comparação com aqueles que comiam menos refeições (EF ≤ três) (p = 0,040).

Tabela 1
Características demográficas dos participantes do estudo: o Estudo Caspian-IV
Tabela 2
Índices antropométricos, atividades no horário de lazer e frequência de pressão arterial elevada em participantes de acordo com sua frequência de alimentação (FA): o Estudo Caspian-IV

Conforme mostrado na tabela 3, o consumo de leguminosas e soja foi mais elevado entre os que apresentaram FA ≥ seis em comparação com aqueles com FA ≤ três (p = 0,002). O mesmo padrão foi relatado em meninos (p = 0,08) e meninas (p = 0,01).

Tabela 3
Características nutricionais dos participantes de acordo com sua frequência de alimentação: o Estudo Caspian-IV

A tabela 4 apresenta a relação da FA com obesidade abdominal, distúrbios de peso e PA. Foi observada uma relação significativa entre FA e obesidade; estudantes que relataram quatro [razão de chance (RC): 0,67; IC: 0,57-0,79], cinco (RC: 0,74; IC: 0,62-0,87) e seis (RC: 0,54; IC: 0,44-0,65) refeições apresentaram uma probabilidade mais baixa de ser obesos em comparação com queles que apresentavam FA ≤ três. As chances de obesidade abdominal apresentaram uma associação inversa com a FA diária; FA de quatro (RC: 0,82; IC: 0,71-0,94), cinco (RC: 0,86, IC: 0,74-0,99) e ≥ seis (RC: 0,73; IC: 0,63-0,85) diminuíram a RC da adiposidade abdominal. Alimentar-se cinco vezes por dia foi relacionado a um risco menor de PAD (RC: 0,68; IC: 0,49-0,94). A princípio, porém, depois de controlar as variáveis de confusão, essa associação não era mais significativa (RC: 0,85; IC: 0,60-1,20). As mesmas associações foram observadas para PA elevada e FA = cinco no modelo 1 (RC: 0,71; IC: 0,53-0,95) e no modelo cru da PA elevada e FA ≥ seis (RC: 0,69; IC: 0,51-0,95); essas associações não eram mais significativas depois do ajuste adicional por possíveis covariáveis.

Tabela 4
Associação entre a frequência de alimentação, índice antropométricos e pressão arterial com diferentes modelos de regressão logística: o Estudo Caspian-IV

Discussão

Este estudo nacional, que, no melhor de nosso conhecimento, é o primeiro de seu tipo, constatou que a FA mais elevada por dia estava inversamente associada ao sobrepeso, à obesidade e aos índices antropométricos, bem como a PA média e elevada. Muitos estudos epidemiológicos anteriores entre adultos relataram associações favoráveis de alimentação frequente com PA; contudo, faltam evidências na faixa etária pediátrica.1010 Kim S, Park GH, Yang JH, Chun SH, Yoon HJ, Park MS. Eating frequency is inversely associated with blood pressure and hypertension in Korean adults: analysis of the Third Korean National Health and Nutrition Examination Survey. Eur J Clin Nutr. 2014;68:481-9.

Foi constatada uma alimentação mais frequente (≥ seis em comparação com ≤ três) entre estudantes mais novos. Isso pode ser devido ao maior controle dos pais quanto ao consumo de alimentos de crianças mais novas e, portanto, maior adesão e regularidade de hábitos alimentares saudáveis por crianças jovens.1919 Arcan C, Neumark-Sztainer D, Hannan P. van den Berg P Story M, Larson N. Parental eating behaviours, home food environ-ment and adolescent intakes of fruits, vegetables and dairy foods: longitudinal findings from Project EAT. Public Health Nutr. 2007;10:1257-65.

Aumentando a FA, os valores médios estimados de medidas antropométricas, incluindo P e CC, bem como a prevalência de sobrepeso, obesidade e obesidade abdominal, diminuíram. Uma redução semelhante foi documentada na média de PAS, PAD e na prevalência de PAS e PAD elevadas. A associação entre alimentação frequente e menor prevalência de obesidade também foi proposta em estudos anteriores.2020 Palmer MA, Capra S, Baines SK. Association between eating frequency, weight, and health. Nutr Rev. 2009;67:379-90. Foi pressuposto que uma FA baixa pode promover ganho de peso e consequências desfavoráveis para a saúde que imitam características da síndrome metabólica entre a população adulta. Por outro lado, a FA mais alta poderia levar ao excesso de peso por meio de maior ingestão de calorias durante um dia. Embora controverso, sugeriu-se que a redução na fome proporcionada pela alimentação regular resultante de FAs mais altas pode ser outro possível mecanismo de controle de peso resultante de FA mais alta.2020 Palmer MA, Capra S, Baines SK. Association between eating frequency, weight, and health. Nutr Rev. 2009;67:379-90.,2121 Murakami K, Livingstone MB. Associations of eating frequency with adiposity measures, blood lipid profiles and blood pressure in British children and adolescents. Br J Nutr. 2014;111:2176-83. A proporção do consumo de energia distribuído ao longo de um dia parece ser um fator principal do controle do peso. Também foi proposto que a distribuição do consumo diário de energia padronizado em uma série de FAs pode não levar a uma associação entre FA e peso, ao passo que foi observada uma associação direta com o consumo à vontade.2222 Gregori D, Maffeis C. Snacking and obesity: urgency of a definition to explore such a relationship. J Am Diet Assoc. 2007;107:562-3.

A relação entre FA e PA não foi entendida de forma extensa. Neste estudo, a FA mais baixa foi associada a PAS e PAD maiores, em comparação com o grupo com FA mais alta. A mesma associação foi encontrada com relação à PA elevada. Em um exame de manutenção de peso, os indivíduos com uma refeição por dia apresentaram PAS e PAD 6% maior em comparação com aqueles que consumiam três refeições por dia.2323 Stote KS, Baer DJ, Spears K, Paul DR, Harris GK, Rumpler WV, et al. A controlled trial of reduced meal frequency without calo-ric restriction in healthy, normal-weight, middle-aged adults. Am J Clin Nutr. 2007;85:981-8. Não foi encontrada associação entre PA e uma ampla gama de FAs, de um a nove, em estudos anteriores,2424 Bertéus Forslund H, Klingstrom S, Hagberg H, Londahl M, Torger-son JS, Lindroos AK. Should snacks be recommended in obesity treatment? A 1-year randomized clinical trial. Eur J Clin Nutr. 2008;62:1308-17.,2525 Poston WS, Haddock CK, Pinkston MM, Pace P Karakoc ND, Ree-ves RS, et al. Weight loss with meal replacement and meal replacement plus snacks: a randomized trial. Int J Obes (Lond). 2005;29:1107-14. ao passo que um estudo indicou que a relação da FA diária, principalmente a frequência de lanches, com a PA em crianças de idade escolar dependia inversamente das massas magra e gorda dos participantes.2626 Barba G, Troiano E, Russo P Siani A, ARCA Project Study group. Total fat, fat distribution and blood pressure according to eating frequency in children living in southern Italy: the ARCA project. Int J Obes (Lond). 2006;30: 1166-9. Contudo, em nosso estudo, as relações entre FA e PA foram ajustadas pelo IMC e pela CC.

Os mecanismos subjacentes responsáveis pela associação entre FA e PA ainda devem ser determinados, porém podem ser parcialmente explicados pela associação existente entre FA e a adiposidade geral ou central. Algumas evidências sugerem que a FA baixa está associada à obesidade, principalmente a obesidade abdominal.2727 Bachman JL, Phelan S, Wing RR, Raynor HA. Eating fre-quency is higher in weight loss maintainers and normal-weight individuals than in overweight individuals. J Am Diet Assoc. 2011;111:1730-4. Nossos resultados são compatíveis com os achados de um estudo recente que mostrou que a FA mais baixa estava relacionada com o aumento maior nas variações de IMC e CC de 10 anos de meninas adolescentes.2828 Ritchie LD. Less frequent eating predicts greater BMI and waist circumference in female adolescents. Am J Clin Nutr. 2012;95:290-6. A obesidade é reconhecida como um fator de contribuição para a morbidez por hipertensão.2929 Frisoli TM, Schmieder RE, Grodzicki T, Messerli FH. Beyond salt: lifestyle modifications and blood pressure. Eur Heart J. 2011;32:3081-7. Em nosso estudo, encontramos associações significativas entre FA e obesidade generalizada e abdominal. Além disso, a relação entre FA e PA foi atenuada após o controle do IMC e da CC. Esses achados sugerem que a obesidade abdominal pode ser uma causa subjacente da associação entre FA e PA elevada. Constatamos que indivíduos com FAs mais altas relataram maior ingestão de leguminosas e proteína de soja, aves e peixe, arroz, pão, frutas e sucos naturais. Da mesma forma, os achados anteriores indicaram que indivíduos com FA mais alta eram mais propensos a escolher alimentos saudáveis, o que leva a maior qualidade de sua dieta3030 Smith KJ, Blizzard L, McNaughton SA, Gall SL, Dwyer T, Venn AJ. Daily eating frequency and cardiometabolic risk factors in young Australian adults: cross-sectional analyses. Br J Nutr. 2012;108:1086-94. e maior ingestão diária de micronutrientes, incluindo vitamina A, C, E e betacaroteno.1010 Kim S, Park GH, Yang JH, Chun SH, Yoon HJ, Park MS. Eating frequency is inversely associated with blood pressure and hypertension in Korean adults: analysis of the Third Korean National Health and Nutrition Examination Survey. Eur J Clin Nutr. 2014;68:481-9.

As limitações deste estudo devem ser abordadas. Primeiro, sua natureza transversal impede suposições sobre as relações de causa e efeito. Além disso, pode ter ocorrido um possível viés de memória das ingestões alimentares devido à coleta de dados retrospectivos. Terceiro, como principal limitação de estudos sobre FA, ainda inexiste uma definição padrão dos principais termos, como ocasiões de alimentação, FA, refeições e lanches. Devido às diferenças substanciais nas definições, pode ser difícil comparar os resultados dos estudos.2121 Murakami K, Livingstone MB. Associations of eating frequency with adiposity measures, blood lipid profiles and blood pressure in British children and adolescents. Br J Nutr. 2014;111:2176-83. Adicionalmente, não determinamos o consumo e o gasto de energia exatos dos participantes. Contudo, no melhor de nosso conhecimento, este é o primeiro estudo a explorar a associação entre FA, PA e índices antropométricos em uma grande população pediátrica nacional representativa.

Em nosso estudo, a FA mais alta foi associada à redução nos valores médios das medidas antropométricas e na prevalência de obesidade generalizada e abdominal, bem como à redução nas medidas de PA em crianças e adolescentes. São necessários estudos longitudinais para identificar os efeitos da FA sobre a composição corporal, a condição de saúde, o sentimento de fome e saciedade, bem como sobre o equilíbrio hormonal, principalmente em crianças e adolescentes obesos.

  • Como citar este artigo: Kelishadi R, Qorbani M, Motlagh ME, Heshmat R, Ardalan G, Bahreynian M. Association of eating frequency with anthropometric indices and blood pressure in children and adolescents: the CASPIAN-IV Study. J Pediatr (Rio J). 2016;92:156-67.
  • Financiamento
    Este estudo foi feito como parte de um programa nacional de vigilância.

Agradecimentos

À grande equipe que trabalhou neste projeto, bem como aos estudantes, seus pais e diretores da escola que participaram voluntariamente.

References

  • 1
    Kelishadi R, Poursafa P. A review on the genetic, environmental, and lifestyle aspects of the early-life origins of cardiovascular disease. Curr Probl Pediatr Adolesc Health Care. 2014;44:54-72.
  • 2
    Spagnolo A, Giussani M, Ambruzzi AM, Bianchetti M, Maringhini S, Matteucci MC, et al. Focus on prevention, diagnosis and treat-ment of hypertension in children and adolescents. Ital J Pediatr. 2013;39:20.
  • 3
    Sorof JM, Lai D, Turner J, Poffenbarger T Portman RJ. Overweight, ethnicity, and the prevalence of hypertension in school-aged children Pediatrics. 2004;113:475-82.
  • 4
    Chen X, Wang Y.Tracking of blood pressure from childhood to adulthood: a systematic review and meta-regression analysis. Circulation. 2008;117:3171-80.
  • 5
    Kelishadi R, Haghdoost AA, Sadeghirad B, Khajehkazemi R. Trend in the prevalence of obesity and overweight among Iranian children and adolescents: a systematic review and meta--analysis. Nutrition. 2014;30:393-400.
  • 6
    Cavaco S, Eriksson T, Skalli A. Life cycle development of obesity and its determinants in six European countries. Econ Hum Biol. 2014;14:62-78.
  • 7
    Receveur O, Morou K, Gray-Donald K, Macaulay AC. Consump-tion of key food items is associated with excess weight among elementary-school-aged children in a Canadian first nations community. J Am Diet Assoc. 2008;108:362-6.
  • 8
    Rodríguez G, Moreno LA. Is dietary intake able to explain diffe-rences in body fatness in children and adolescents? Nutr Metab Cardiovasc Dis. 2006;16:294-301.
  • 9
    Berg C, Lappas G, Wolk A, Strandhagen E, Torén K, Rosengren A, et al. Eating patterns and portion size associated with obesity in a Swedish population. Appetite. 2009;52:21-6.
  • 10
    Kim S, Park GH, Yang JH, Chun SH, Yoon HJ, Park MS. Eating frequency is inversely associated with blood pressure and hypertension in Korean adults: analysis of the Third Korean National Health and Nutrition Examination Survey. Eur J Clin Nutr. 2014;68:481-9.
  • 11
    Chinapaw MJ, Yildirim M, Altenburg TM, Singh AS, Kovács E, Molnár D, et al. Objective and self-rated sedentary time and indicators of metabolic health in Dutch and Hungarian 10-12 year olds: the Energy-Project. PLoS ONE. 2012;7:e36657.
  • 12
    PayabM, Kelishadi R, Qorbani M, Motlagh ME, Ranjbar SH, Arda-lan G, et al. Association of junk food consumption with high blood pressure and obesity in Iranian children and adolescents: the Caspian-IV Study. J Pediatr (Rio J). 2015;91:196-205.
  • 13
    Koletzko B, Toschke AM. Meal patterns and frequencies: do they affect body weight in children and adolescents? Crit Rev Food Sci Nutr. 2010;50:100-5.
  • 14
    Siega-Riz AM, Carson T, Popkin B. Three squares or mostly snacks - what do teens really eat? A sociodemographic study of meal patterns. J Adolesc Health. 1998;22:29-36.
  • 15
    Kelishadi R, Ardalan G, Qorbani M, Ataie-Jafari A, Bahreynian M, Taslimi M, et al. Methodology and early findings of the Fourth Survey of Childhood and Adolescence Surveillance and Prevention of Adult Non-Communicable Disease in Iran: the Caspian-IV Study. Int J Prev Med. 2013;4:1451-60.
  • 16
    Li C, Ford ES, Mokdad AH, Cook S. Recent trends in waist circumference and waist-height ratio among US children and adolescents. Pediatrics. 2006;118:e1390-8.
  • 17
    Kelishadi R, Majdzadeh R, Motlagh ME, Heshmat R, Aminaee T, Ardalan G, et al. Development and evaluation of a questionnaire for assessment of determinants of weight disorders among children and adolescents: the Caspian-IV Study. Int J Prev Med. 2012;3:699-705.
  • 18
    Fallah Z, Qorbani M, Motlagh ME, Heshmat R, Ardalan G, Kelishadi R. Prevalence of prehypertension and hypertension in a nationally representative sample of Iranian children and adolescents: the Caspian-IV Study. Int J Prev Med. 2014;5: S57-64.
  • 19
    Arcan C, Neumark-Sztainer D, Hannan P. van den Berg P Story M, Larson N. Parental eating behaviours, home food environ-ment and adolescent intakes of fruits, vegetables and dairy foods: longitudinal findings from Project EAT. Public Health Nutr. 2007;10:1257-65.
  • 20
    Palmer MA, Capra S, Baines SK. Association between eating frequency, weight, and health. Nutr Rev. 2009;67:379-90.
  • 21
    Murakami K, Livingstone MB. Associations of eating frequency with adiposity measures, blood lipid profiles and blood pressure in British children and adolescents. Br J Nutr. 2014;111:2176-83.
  • 22
    Gregori D, Maffeis C. Snacking and obesity: urgency of a definition to explore such a relationship. J Am Diet Assoc. 2007;107:562-3.
  • 23
    Stote KS, Baer DJ, Spears K, Paul DR, Harris GK, Rumpler WV, et al. A controlled trial of reduced meal frequency without calo-ric restriction in healthy, normal-weight, middle-aged adults. Am J Clin Nutr. 2007;85:981-8.
  • 24
    Bertéus Forslund H, Klingstrom S, Hagberg H, Londahl M, Torger-son JS, Lindroos AK. Should snacks be recommended in obesity treatment? A 1-year randomized clinical trial. Eur J Clin Nutr. 2008;62:1308-17.
  • 25
    Poston WS, Haddock CK, Pinkston MM, Pace P Karakoc ND, Ree-ves RS, et al. Weight loss with meal replacement and meal replacement plus snacks: a randomized trial. Int J Obes (Lond). 2005;29:1107-14.
  • 26
    Barba G, Troiano E, Russo P Siani A, ARCA Project Study group. Total fat, fat distribution and blood pressure according to eating frequency in children living in southern Italy: the ARCA project. Int J Obes (Lond). 2006;30: 1166-9.
  • 27
    Bachman JL, Phelan S, Wing RR, Raynor HA. Eating fre-quency is higher in weight loss maintainers and normal-weight individuals than in overweight individuals. J Am Diet Assoc. 2011;111:1730-4.
  • 28
    Ritchie LD. Less frequent eating predicts greater BMI and waist circumference in female adolescents. Am J Clin Nutr. 2012;95:290-6.
  • 29
    Frisoli TM, Schmieder RE, Grodzicki T, Messerli FH. Beyond salt: lifestyle modifications and blood pressure. Eur Heart J. 2011;32:3081-7.
  • 30
    Smith KJ, Blizzard L, McNaughton SA, Gall SL, Dwyer T, Venn AJ. Daily eating frequency and cardiometabolic risk factors in young Australian adults: cross-sectional analyses. Br J Nutr. 2012;108:1086-94.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    29 Dez 2014
  • Aceito
    27 Maio 2015
Sociedade Brasileira de Pediatria Av. Carlos Gomes, 328 cj. 304, 90480-000 Porto Alegre RS Brazil, Tel.: +55 51 3328-9520 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: jped@jped.com.br