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Fatores associados ao risco de ingestão insuficiente de folato entre adolescentes

Resumos

OBJETIVO: Avaliar os fatores associados com risco para ingestão deficiente de folato entre adolescentes. MÉTODOS: O processo amostral deu-se por conglomerados através de sorteio sistemático de 40 setores censitários e dos domicílios, incluindo todos os indivíduos com idade entre 10 e 19 anos. Foram obtidos as medidas de peso, estatura, dobras cutâneas dos adolescentes e dados sociodemográficos da família. Utilizou-se o inquérito recordatório de 24 horas e inquérito de freqüência alimentar. A determinação do folato presente nos alimentos foi realizada por meio do programa Nutwin. Foi considerado risco para ingestão insuficiente quando a ingestão de folato era menor que a estimativa de requerimento médio. A análise estatística foi realizada por meio de regressão logística, utilizando modelo hierárquico. RESULTADOS: Os resultados foram obtidos com 722 adolescentes, com média de ingestão de folato de 145±117 µg e freqüência de adolescentes com risco de ingestão de folato abaixo da recomendação de 89%. Observou-se que os adolescentes com índice de massa corporal > ao percentil 85, aqueles com a circunferência da cintura > ao percentil 80 e com antecedentes familiares de doenças cardiovasculares, além do consumo não habitual de feijão e de vegetais verde-escuros, foram associados positivamente com a maior chance de risco para consumo insuficiente. CONCLUSÕES: Os adolescentes apresentaram risco elevado para ingestão insuficiente de folato, o que foi associado à maior faixa etária, circunferência de cintura maior que percentil 80, consumo não habitual de feijão e de vegetais verde-escuros.

Adolescente; ácido fólico; hábitos alimentares; obesidade


OBJECTIVE: To evaluate factors associated with the risk of low folate intake among adolescents. METHODS: We employed cluster sampling, using a random selection of 40 representative census sectors and households within those sectors, including all individuals between 10 and 19 years of age. The weight, height and skin folds of subjects were measured and socioeconomic data on their families were collected. A 24-hour dietary recall and frequency questionnaire were used to estimate the quantity and frequency of folate intake. Folate consumption was quantified using Nutwin software. Risk of low folate intake was defined as Folate consumption below the estimated average requirement. The statistical analysis employed hierarchical logistic regression. RESULTS: A total of 722 adolescents were investigated and their mean folate intake was 145±117 µg. The frequency of subjects at risk of having a lower than recommended folate intake was 89%. Adolescents had a greater risk of inadequate folate intake if their body mass index was at or above the 85th percentile, their waist circumference was at or above the 80th percentile or they had a family history of cardiovascular disease. Adolescents who ate beans and dark green vegetables less than four times a week also exhibited an increased chance of having folate intake below recommended levels. CONCLUSIONS: These adolescents present a high risk of low folate intake and this risk is linked with increasing age, waist circumference above the 80th percentile and low frequency of beans and dark green vegetables consumption.

Adolescent; folic acid; food habits; obesity


ARTIGO ORIGINAL

Fatores associados ao risco de ingestão insuficiente de folato entre adolescentes

Márcia R. VitoloI; Queli CanalII; Paula D. B. CampagnoloIII; Cíntia M. GamaIV

IDoutora, Centro de Ciências da Saúde, Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), São Leopoldo, RS

IINutricionista, Centro de Ciências da Saúde, UNISINOS, São Leopoldo, RS

IIINutricionista. Aluna, Pós-Graduação em Ciências Médicas (Mestrado), Departamento de Medicina Preventiva, Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre (FFFCMPA), Porto Alegre, RS

IVDoutora, Departamento de Medicina Preventiva, FFFCMPA, Porto Alegre, RS

Correspondência Correspondência: Márcia Regina Vitolo Caixa Postal 551, Agência Unisinos CEP 93022-970 - São Leopoldo, RS E-mail: vitolo@unisinos.br, marciavitolo@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar os fatores associados com risco para ingestão deficiente de folato entre adolescentes.

MÉTODOS: O processo amostral deu-se por conglomerados através de sorteio sistemático de 40 setores censitários e dos domicílios, incluindo todos os indivíduos com idade entre 10 e 19 anos. Foram obtidos as medidas de peso, estatura, dobras cutâneas dos adolescentes e dados sociodemográficos da família. Utilizou-se o inquérito recordatório de 24 horas e inquérito de freqüência alimentar. A determinação do folato presente nos alimentos foi realizada por meio do programa Nutwin. Foi considerado risco para ingestão insuficiente quando a ingestão de folato era menor que a estimativa de requerimento médio. A análise estatística foi realizada por meio de regressão logística, utilizando modelo hierárquico.

RESULTADOS: Os resultados foram obtidos com 722 adolescentes, com média de ingestão de folato de 145±117 µg e freqüência de adolescentes com risco de ingestão de folato abaixo da recomendação de 89%. Observou-se que os adolescentes com índice de massa corporal > ao percentil 85, aqueles com a circunferência da cintura > ao percentil 80 e com antecedentes familiares de doenças cardiovasculares, além do consumo não habitual de feijão e de vegetais verde-escuros, foram associados positivamente com a maior chance de risco para consumo insuficiente.

CONCLUSÕES: Os adolescentes apresentaram risco elevado para ingestão insuficiente de folato, o que foi associado à maior faixa etária, circunferência de cintura maior que percentil 80, consumo não habitual de feijão e de vegetais verde-escuros.

Palavras-chave: Adolescente, ácido fólico, hábitos alimentares, obesidade.

Introdução

O Instituto de Medicina1, órgão ligado ao governo norte-americano responsável por temas ligados à saúde, pesquisa e educação, estabeleceu que a prevenção de doenças cardiovasculares (DCV) e a prevenção do defeito do tubo neural (DTN) fossem parâmetros prioritários na determinação da recomendação dietética de folato, inclusive no estágio da adolescência. A ingestão desse nutriente depende de hábitos alimentares que incluam quantidades adequadas de vegetais verde-escuros, feijão, frutas, fígado de boi e alimentos enriquecidos ou fortificados1.

A adolescência vem sendo destacada como um período de risco para dietas deficientes em micronutrientes e ricas em energia e gorduras saturadas2,3, comprometendo a saúde na vida adulta e elevando as taxas de doenças crônicas. A análise de alguns estudos internacionais com adolescentes aponta média de ingestão de folato abaixo da estimativa de requerimento médio (estimated average requirement - EAR) das novas recomendações1 e que, nos últimos estudos comparativos, a prevalência de adolescentes com esse comportamento aumentou, sugerindo que o risco para ingestão insuficiente de folato inicia nesse ciclo da vida. Estudos que investigaram os fatores determinantes com o consumo deficiente de folato mostraram associação com o nível socioeconômico e sexo3-7.

Diante dessas considerações e da inexistência de estudos no Brasil que tenham investigado a ingestão de folato entre adolescentes, o presente estudo objetivou avaliar os fatores associados com risco para ingestão insuficiente de folato nesse ciclo da vida.

Métodos

Estudo transversal, com amostra representativa de adolescentes da cidade de São Leopoldo (RS). O tamanho da amostra foi calculado considerando prevalência de excesso de peso de 18%8-10, nível de confiança de 95% e poder estatístico de 80%, adicionado de 10% para as possíveis perdas, e 15% relativo à análise multivariada, o que determinou número amostral de 807 adolescentes. Foram excluídos: adolescentes gestantes, nutrizes ou mães, adolescentes com deficiência física ou mental, ou com patologias crônicas.

O município de São Leopoldo fica situado no Vale do Rio dos Sinos, a 30 km de Porto Alegre, no estado do Rio Grande do Sul. Apresenta aproximadamente 193.547 habitantes, sendo 36.607 indivíduos com idade entre 10 e 19 anos, índice de alfabetização de 95,6%1.

O processo amostral deu-se por conglomerados, em três estágios de seleção: sorteio sistemático de 40 setores censitários, posterior sorteio aleatório das quadras e esquinas pelas quais se iniciaria a coleta e, finalmente, amostragem sistemática (um em cada três) de domicílios. Todos os indivíduos entre 10 e 19 anos morando nesses domicílios foram identificados e convidados a participar do projeto.

Foi elaborado questionário pré-codificado abordando fatores socioeconômicos, biológicos, familiares, antropométricos e de ingestão alimentar. Os dados foram coletados por estudantes do curso de graduação em nutrição da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS), especificamente treinados para as entrevistas e mensurações, além do recebimento de manual. Foi realizado estudo piloto com 60 adolescentes em setores não sorteados no processo de amostragem.

Utilizou-se o inquérito alimentar recordatório de 24 horas com o auxílio de um álbum com fotos coloridas de utensílios e alimentos, elaborado especificamente para a pesquisa, para melhor precisão das quantidades ingeridas. Para realização do cálculo de folato e do percentual de lipídeo da dieta, foi utilizado o Programa de Apoio à Nutrição Nutwin. Os resultados de ingestão foram comparados com as recomendações do Instituto de Medicina1, o qual determinou como valores mínimos de consumo os valores de EAR de acordo com a faixa etária e o sexo. Considerou-se risco para ingestão insuficiente de folato os adolescentes que não atingiram a EAR, a qual é 250 µg para ambos os sexos na faixa etária de 9-13 anos e 330 µg para a faixa etária de 14-18 anos. O inquérito de freqüência foi realizado com perguntas objetivas de acordo com o alimento ou grupo de alimentos, selecionados previamente com o objetivo de identificar as fontes de folato. Se o consumo ocorria diariamente ou quatro vezes ou mais na semana, considerava-se que essa prática fazia parte do hábito alimentar do adolescente, considerando-a como consumo habitual. O consumo não habitual foi determinado quando a freqüência do consumo era menor que quatro vezes na semana.

Os dados de antecedentes familiares de DCV, como enfarto, cirurgias cardíacas e insuficiência cardíaca, foram obtidos com os pais ou responsáveis pelos adolescentes.

A medida de peso foi obtida com os adolescentes descalços, vestindo shorts e camiseta, em balanças eletrônicas portáteis da marca Techline®. Para a verificação da estatura, foi utilizado um estadiômetro com fita métrica embutida da marca Secca® Ltda. Para a classificação do estado nutricional, foi utilizado o índice de massa corporal (IMC) baseado na curva de referência do National Center for Health and Statistics e nos critérios da Organização Mundial da Saúde11, a qual considera excesso de peso aqueles adolescentes com percentil de IMC > 85 e obesidade para aqueles com percentil de IMC > 95.

Foram aferidas as dobras cutâneas tricipital e subescapular (ambas do lado direito) por meio de adipômetros da marca Lange®. O percentual de gordura corporal foi calculado utilizando a fórmula de Slaughter12. Considerou-se como excesso de gordura corporal os meninos que apresentaram percentual acima de 25% e as meninas, acima de 30%. O percentil acima de 80 para circunferência da cintura proposto por Taylor et al.13 representou o excesso de gordura localizada na região abdominal.

Os dados foram compilados no Programa Epi-Info versão 6.0 com dupla digitação e posterior validate. As análises foram realizadas no Programa SPSS versão 11.0. Foi realizado o teste de Mann-Whitney para comparar as médias de ingestão de folato entre os sexos e faixas etárias. A análise bivariada foi expressa como odds ratio (OR), e a multivariada foi realizada por meio da regressão logística, conforme o modelo hierárquico elaborado (Figura 1). Utilizou-se OR como medida de efeito, sabendo que esta é ligeiramente superior à razão de prevalências quando fator de risco, e inferior quando fator de proteção. As variáveis foram mantidas no modelo quando alcançavam nível de significância de 20%, e a associação foi considerada significante quando atingia 5%.


Este trabalho foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Resultados

Do total de 810 adolescentes identificados nos domicílios e elegíveis para o estudo, houve recusa por parte dos pais, ou do próprio adolescente, representada por 8,6% (n = 70) dos convidados a participar, 1,8% (n = 15) não foram encontrados nos domicílios para a realização da entrevista após três tentativas e 0,3% (n = 3) mudaram de endereço. As perdas foram maiores para o sexo masculino, considerando que, das recusas, 60 corresponderam a esse sexo. Nos setores com prevalência de analfabetismo menor do que 5%, o percentual de perdas foi de 24,5%, enquanto que nos setores com mais do que 5% de analfabetos, o percentual de perdas foi de 17,5%.

Foram estudados, então, 722 adolescentes, 40,6% (n = 293) do sexo masculino e 59,4% (n = 429) do sexo feminino. A média de idade foi 14,4 (±2,7) anos, com 50% dos adolescentes na faixa etária entre 10 e 13 anos. Houve predomínio da raça branca (80,8%), e a renda mensal de 47,6% das famílias era menor ou igual a três salários mínimos (SM). A maior parte dos pais (59%) e das mães (65,6%) tinha 8 anos de escolaridade ou menos. Quanto aos adolescentes, 90% estudavam, sendo que 88,6% freqüentavam escolas públicas.

As prevalências de excesso de peso de acordo com os percentis do IMC foram de 19% entre os meninos e 17% entre as meninas, as prevalências de obesidade foram de 8,9 e 7,5% entre meninos e meninas, respectivamente. Quanto à circunferência da cintura, 19,2% dos meninos e 18,5% das meninas apresentaram percentis maiores que 80, e as prevalências de excesso de gordura corporal foram de 17,5% no sexo masculino e 20,8% no sexo feminino.

A Tabela 1 compara a média de ingestão de ácido fólico entre os sexos e faixa etária e apresenta o percentual de ingestão abaixo da recomendação. A média de ingestão de ácido fólico de todos os adolescentes foi de 145±117 µg, sendo 162±137 µg para os meninos e 133±100 µg para as meninas (p = 0,006). A freqüência de adolescentes com risco de ingestão insuficiente de folato (< EAR) foi de 89%.

A Tabela 2 apresenta a análise bruta e ajustada das variáveis preditoras quanto à ingestão de folato abaixo da EAR, a qual foi mais prevalente entre os adolescentes que possuíam pai e mãe com escolaridade maior que 8 anos, porém sem significância estatística. Renda familiar mensal, número de pessoas na casa e turno em que os adolescentes estudavam não apresentaram associação com a variável dependente. Os adolescentes que apresentaram história familiar de DCV apresentaram tendência para consumo de ácido fólico abaixo do recomendado. A análise ajustada mostrou que os adolescentes entre 14 e 19 anos apresentaram mais chances de consumir menos ácido fólico do que o recomendado, e não houve diferença entre os sexos.

Entre as variáveis antropométricas, o percentual de gordura corporal e o IMC não foram associados ao risco de ingestão insuficiente de folato. Após ajuste das variáveis do mesmo nível e do nível anterior, aqueles com a circunferência da cintura > ao percentil 80 foram associados positivamente com a maior chance de risco para ingestão insuficiente.

A ingestão de lipídeo perdeu associação com o desfecho após análise multivariável. Com relação ao inquérito de freqüência alimentar, observou-se que os adolescentes que consumiam feijão e vegetais verde-escuros com freqüência menor do que quatro vezes na semana apresentaram mais chance de ingestão de folato abaixo da EAR. A ingestão de feijão quatro vezes ou mais na semana foi 1,7 vezes mais prevalente nos adolescentes cujas famílias recebiam menos do que três SM mensais (dado não apresentado em tabela).

Discussão

Este estudo é o primeiro a analisar o nível de ingestão de folato entre adolescentes no Brasil. É importante ressaltar que o mesmo foi realizado antes da implementação da Resolução de nº 344, de 13 de dezembro de 2002 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que obriga o enriquecimento das farinhas com ácido fólico. Conhecer a situação de ingestão desse nutriente entre adolescentes, anteriormente à efetivação dessa política pública, possibilita estabelecer bases comparativas com estudos futuros e suas repercussões. A freqüência de adolescentes com risco de ingestão insuficiente foi elevada (89%). A comparação com estudos realizados em outros países é limitada, uma vez que foram utilizados valores de recomendações diferentes e também há divergências quanto aos critérios para adequação de ingestão. Entretanto, é nítido observar que o nível de ingestão apresenta situação muito aquém do encontrado em estudos com adolescentes norte-americanos3,6. Enquanto que, neste estudo, 11% dos adolescentes apresentaram ingestão acima da EAR, no estudo com norte-americanos de 15 anos, 30% apresentaram ingestão acima das recommended dietary alowances (RDA), que é a EAR mais dois desvios padrão7.

Já há evidências, em nosso meio, de relevante prevalência de obesidade entre adolescentes8-10 , porém não há estudo sobre ingestão de folato nessa faixa etária. A tendência de ingestão alimentar entre os indivíduos adultos observada nas duas últimas pesquisas nacionais foi o aumento na ingestão de gorduras saturadas e menor ingestão de carboidratos complexos, legumes e verduras8. As menores freqüências na ingestão de feijão e verduras verde-escuras entre os adolescentes neste estudo foram associadas com o risco de ingestão abaixo da EAR. A presença concomitante de obesidade, adiposidade abdominal e antecedentes familiares com DCV, associada à ingestão insuficiente de folato, sugere forte risco à saúde do adolescente no grupo populacional investigado.

A associação entre níveis plasmáticos elevados de homocisteína e ingestão deficiente de folato foi demonstrada por vários estudos1,14,15, em função da necessidade desse nutriente para a conversão de homocisteína em metionina. A partir dos dados da NHANES III (estudo longitudinal de base populacional desenvolvido pelo Departamento de Saúde dos EUA), foi possível constatar que as concentrações de homocisteína plasmática entre os adolescentes e adultos norte-americanos tende a aumentar com a idade em ambos os sexos, sendo que esse aumento é mais acelerado no sexo masculino do que no feminino16. É possível extrapolar esses resultados para o presente estudo, uma vez que os adolescentes do sexo masculino com idade entre 14-19 anos apresentaram maior proporção de ingestão de folato abaixo da EAR. Esse processo é reflexo das mudanças nos hábitos alimentares, em que se está substituindo a alimentação básica de alguns anos atrás, constituída predominantemente pela combinação arroz e feijão, por outras preparações que não contêm fontes importantes de folato. A renda familiar e a escolaridade dos pais não influenciaram o padrão de ingestão de folato entre os adolescentes, contrariando resultados de estudos realizados em outros países, os quais mostraram que adolescentes e adultos de melhores condições socioeconômicas apresentam menores riscos de ingestão insuficiente5,17. Entretanto, nesse estudo, foi demonstrado que os adolescentes pertencentes às famílias com renda familiar menor que três SM ainda estão apresentando o hábito mais freqüente da ingestão de feijão, que é importante fonte de folato. Essa prática os está protegendo da ingestão insuficiente desse nutriente, considerando a dificuldade econômica de terem acesso às outras fontes alimentares de maior custo, incluindo os alimentos enriquecidos.

É importante considerar que a recomendação diária relativa à RDA, e não à EAR, apresenta concepção diferente entre os sexos. A RDA é a mesma (400 µg) para ambos os sexos com idade entre 14-18 anos. Entretanto, existe uma advertência específica para as mulheres, a qual diz que esse valor deve ser alcançado por meio de alimentos enriquecidos ou suplementos em adição ao que se ingere por meio de uma alimentação saudável (250 a 300 µg). Essa especificidade da recomendação teve como objetivo prioritário a prevenção do DTN, o qual atinge todas as mulheres em idade fértil1. A ingestão média das meninas entre 14 e 18 anos foi a mais baixa dos grupos etários estudados (123 µg), fato que deve ser considerado nos programas que enfoquem a saúde da adolescente.

Apesar do delineamento do estudo ter previsto corte transversal de base populacional, essa representatividade amostral não pôde ser totalmente concluída, uma vez que houve maior percentual de recusas e perdas para o sexo masculino e para os segmentos de melhor condição socioeconômica. Esse viés pode limitar as conclusões referentes à influência do gênero e da condição socioeconômica no comportamento de ingestão de folato. A utilização de um inquérito recordatório de 24 horas poderia ser um fator limitante para considerar esses resultados conclusivos. Entretanto, as médias de ingestão de folato de todos os inquéritos analisados estão bem abaixo do valor médio da população de referência (EAR), não deixando dúvidas quanto ao risco de ingestão insuficiente nesse grupo populacional.

Os dados aqui demonstrados sugerem que os adolescentes apresentam risco para ingestão insuficiente de folato, e esse comportamento foi associado a maior faixa etária, circunferência de cintura maior que percentil 80, consumo não habitual de feijão e vegetais verde-escuros.

São necessárias investigações futuras com o objetivo de avaliar a contribuição da política pública nacional de fortificação obrigatória das farinhas nos níveis de ingestão por esse grupo e promover propostas práticas para a inclusão de alimentos fontes de folato em programas de alimentação escolar.

Artigo submetido em 29.08.05, aceito em 09.11.05.

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  • Correspondência:

    Márcia Regina Vitolo
    Caixa Postal 551, Agência Unisinos
    CEP 93022-970 - São Leopoldo, RS
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Jun 2006
    • Data do Fascículo
      Abr 2006

    Histórico

    • Aceito
      09 Nov 2005
    • Recebido
      29 Ago 2005
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