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CARTA AO EDITOR

Prezada Editora:

O objetivo desta carta é apresentar à comunidade médico-científica brasileira um biocida à base de brometo de lauril dimetil benzil amônio (BLDBA) a 0,16%, em solução aquosa. Seu princípio ativo é uma molécula orgânica polar, cuja estrutura espacial é caracterizada pela presença do halogênio bromo ligado a um radical amônio, através de uma cadeia laurílica. Esta configuração lhe confere poder bactericida, estabilidade química e o distingue dos clássicos compostos amônio quaternários. É classificado na categoria dos tensoativos catiônicos, agentes de superfície que promovem morte celular por descompensação osmótica. Dentre suas principais características, destacam-se as atividades: bactericida (gram-positivos, negativos, bacilos álcool-acidorresistentes e esporulados), fungicida e viricida, como também a de não ser tóxico para células de mamíferos na concentração indicada para uso, além da manutenção do pH neutro(1).

Nos últimos anos, uma das nossas principais preocupações tem sido a identificação de uma substância química capaz de eliminar as bactérias patogênicas do Complexo M. tuberculosis, possivelmente presentes nos equipamentos médico-hospitalares e instrumentos cirúrgicos, os quais mantêm restrições no que se refere ao uso da autoclave em função da sua constituição ser baseada em elementos termossensíveis. A capacidade de manutenção da viabilidade das micobactérias no meio ambiente(2,3) reforça a indicação da aplicação da substância ora proposta nas superfícies do ambiente hospitalar, com o intuito de propiciar a interrupção do ciclo epidemiológico da tuberculose, promovido tanto pela inalação da micobactéria veiculada por gotículas de aerossol eliminadas por um doente durante o exercício da fala, tosse ou espirro, quanto pela possibilidade da quebra da cadeia asséptica no ambiente nosocomial(4).

Para a avaliação do poder micobactericida do referido sal de bromo, foram realizados testes microbiológicos a partir da suspensão bacilar (Mycobacterium tuberculosis ¾ Mtb) constituída por uma cepa fornecida pela American Type Collection Culture (ATCC 25177) e por duas outras (92-ICB e 111-ICB) recém-isoladas no Brasil, com a finalidade de reproduzir uma estimada concentração bacilar semelhante à do meio ambiente. Para isso, suspensões de M. tuberculosis foram diluídas em água destilada estéril até a sua razão de 1/100 a partir do homogeneizado inicial com turbidez semelhante à do tubo no 2 da escala de MacFarland, que correspondeu a 3 x 104 UFC, em meio Löweinstein-Jensen (L-J) (DIFCO). O sedimento bacteriano obtido por centrifugação (10.000 RPM/5min) foi ressuspenso em água destilada (V/V) e 0,5mL desta suspensão foi adicionado a 4,5mL de BLDBA, na concentração indicada para uso apresentada pelo fabricante e nas diluições de 1/10, 1/100 e 1/1.000, em água destilada, sendo posteriormente incubadas a 22ºC até duas horas. Para interpretação dos resultados, foram utilizadas amostras constituídas por alíquotas de 10ml a cada cinco minutos, lavadas em água destilada para remoção residual do produto desinfetante e ressemeadas em meio L-J, seguidas de incubação a 33ºC.

Em relação ao inóculo controle (10ml), o produto não diluído revelou a melhor atividade micobactericida nas condições testadas, obtendo-se um efeito germicida (EG) correspondente a uma redução de 4 logaritmos (EG-4) de microrganismos viáveis após 20 minutos de contato, de 3 logaritmos (EG-3) após 10 minutos e de 2 logaritmos (EG-2) após 5 minutos. Os resultados obtidos quando do uso deste desinfetante diluído na razão 1:10 revelaram EG-3 após uma hora de contato e EG-2 após 25 minutos. A atividade antimicrobiana mais rápida é sempre a mais desejável, pois minimiza os efeitos dos fatores interferentes na eficácia dos desinfetantes químicos nos processos de descontaminação.

Analisando os resultados obtidos (Tabela 1), os quais demonstraram a atividade micobactericida do BLDBA in vitro na concentração indicada pelo fabricante após tempo de contato superior a 20 minutos à temperatura ambiente, aliados à ausência de atividade tóxica para as células eucariotas, ao baixo custo, à não corrosão de metais e plásticos, além de ser inodoro e incolor, concluímos favoravelmente sobre a adoção desta nova solução como candidata a agente auxiliar na minimização do risco da contaminação cruzada no ambiente hospitalar (médico, veterinário, odontológico, etc.), tanto sobre as superfícies, quanto nos processos de descontaminação de instrumentos ou peças de equipamentos utilizados nos procedimentos cirúrgicos, colaborando desta forma com a interceptação da cadeia epidemiológica na transmissão da tuberculose.

MANOEL ARMANDO AZEVEDO DOS SANTOS

Prof. Dr. Chefe do Laboratório de Micobactérias Departamento de Microbiologia ¾ ICB-USP

JORGE TIMENETSKY

Prof. Dr. Chefe do Laboratório de Bactérias Oportunistas Departamento de Microbiologia ¾ ICB-USP

MARIA JACINTA DE FARIA

Técnica do Laboratório de Micobactérias Departamento de Microbiologia ¾ ICB-USP

CRISTINA BATISTA PENTEADO

Estagiária do Laboratório de Micobactérias Departamento de Microbiologia ¾ ICB-USP

REFERÊNCIAS

1. Patarca R, Fletcher MA. Effects of benzalkonium salts on eucaryotic and microbial G-proteins-mediated processes and surface membranes. Crit Rev Oncog 1995;6:327-356.

2. Riley RL, The J. Burns Amberson lecture: Aerial dissemination of pulmonary tuberculosis. Am Rev Tuberc 1957;76:931-941.

3. Riley RL, O'Grady F. Airborne infection. New York: MacMillan, 1961.

4. Salyers AA, Whitt D. Tuberculosis. In: Bacterial pathogenesis: a molecular approach. Washington: ASM Press, 1994;307-321.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Ago 2003
  • Data do Fascículo
    Ago 2000
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