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Complicações cardíacas em cirurgia vascular

Resumo

Contexto

Aproximadamente 60% dos pacientes portadores de doença arterial oclusiva crônica periférica têm doença coronariana grave, sendo que a principal causa de morte no pós-operatório de cirurgia vascular de grande porte é o infarto agudo do miocárdio.

Objetivos

Determinar a prevalência da doença coronariana em pacientes submetidos a cirurgia vascular eletiva de grande porte e sua relação com as complicações cardiológicas pós-operatórias.

Métodos

Foram analisados 200 pacientes submetidos a cirurgia vascular arterial eletiva: doença obstrutiva carotídea, aortoilíaca e femoropoplítea distal e doença aneurismática de aorta abdominal e de artérias ilíacas. Os pacientes constituíram três grupos: grupo I, sem doença coronariana; grupo II, com doença coronariana assintomática; e grupo III, com doença coronariana sintomática. As complicações cardiológicas consideradas foram infarto agudo do miocárdio fatal e não fatal, insuficiência cardíaca congestiva, choque cardiogênico, fibrilação atrial aguda e outras arritmias.

Resultados

Complicações cardíacas ocorreram em 11 pacientes (5,5%): três infartos agudos do miocárdio não fatais (1,5%) sempre em pacientes do grupo III. A complicação cardíaca mais frequente foi arritmia (exceto fibrilação atrial) ocorrida em cinco (2,5%) pacientes, sendo três do grupo II. A mortalidade precoce foi de nove pacientes (4,5%). Apenas uma morte foi decorrente de problema cardíaco: choque cardiogênico em paciente do grupo III.

Conclusões

A doença coronariana não foi preditora de óbito nos pacientes submetidos a cirurgia vascular periférica de grande porte. A sobrevida dos pacientes com ou sem doença coronariana não mostrou diferenças estatísticas.

Palavras-chave:
doenças vasculares periféricas; coronariopatia; cirurgia vascular; complicações pós-cirúrgicas

Abstract

Background

Approximately 60% of patients with chronic occlusive peripheral arterial disease have severe coronary disease and the principal cause of death during the postoperative period after major vascular surgery is acute myocardial infarction.

Objectives

To determine the prevalence of coronary disease among patients scheduled for elective major vascular surgery and its relationship with postoperative cardiological complications.

Methods

A total of 200 patients who underwent elective vascular arterial surgery for obstructive carotid disease, aortoiliac and distal femoropopliteal disease and aneurysmal disease of the abdominal aorta and iliac arteries were analyzed. These patients were allocated to three groups: group I, free from coronary disease; group II, asymptomatic coronary disease; and group III, symptomatic coronary disease. The cardiological complications analyzed were fatal and nonfatal acute myocardial infarction, congestive heart failure, cardiogenic shock, acute atrial fibrillation and other arrhythmias.

Results

Cardiac complications occurred in 11 patients (5.5%): three nonfatal acute myocardial infarctions (1.5%), all in patients from group III. The most common cardiac complication was arrhythmia (excluding atrial fibrillation) in five (2.5%) patients, three from group II. Early mortality was nine patients (4.5%). Just one death was caused by a cardiac problem: cardiogenic shock in a patient from group III.

Conclusions

Coronary disease was not predictive of death among patients who underwent major peripheral vascular surgery. There were no statistical differences in survival between patients with or without coronary disease.

Keywords:
vascular peripheral diseases; coronary disease; vascular surgery; postoperative complications

INTRODUÇÃO

A aterosclerose é responsável por um terço das mortes no Brasil11 Sukhija R, Aronow WS, Yalamanchili K, Sinha N, Babu S. Prevalence of coronary artery disease, lower extremity peripheral arterial disease, and cerebrovascular disease in 110 men with an abdominal aortic aneurysm. Am J Cardiol. 2004;94(10):1358-9. http://dx.doi.org/10.1016/j.amjcard.2004.07.136. PMid:15541269.
http://dx.doi.org/10.1016/j.amjcard.2004...
, sendo a principal causa das doenças arteriais obstrutivas coronarianas, cerebrovasculares e arteriais periféricas, as quais frequentemente coexistem22 Maffei FH. Aterosclerose obliterante periférica: epidemiologia, fisiopatologia, quadro clínico e diagnóstico. In: Maffei FHA, editor. Doenças vasculares periféricas. São Paulo: Guanabara-Koogan; 2008. 1141 p.. A doença cardiovascular lidera as causas de morte no mundo e é responsável por 17 milhões de mortes anualmente33 Goessens BM, Visseren FL, Algra A, Banga JD, van der Graaf Y. Screening for asymptomatic cardiovascular disease with noninvasive imaging in patients at high-risk and low-risk according to the European Guidelines on Cardiovascular Disease Prevention: the SMART study. J Vasc Surg. 2006;43(3):525-32. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.11.050. PMid:16520167.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.11....
. Aproximadamente 80% dos casos ocorrem em países desenvolvidos, sendo uma das consequências do envelhecimento da população33 Goessens BM, Visseren FL, Algra A, Banga JD, van der Graaf Y. Screening for asymptomatic cardiovascular disease with noninvasive imaging in patients at high-risk and low-risk according to the European Guidelines on Cardiovascular Disease Prevention: the SMART study. J Vasc Surg. 2006;43(3):525-32. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.11.050. PMid:16520167.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.11....
.

Estudos comprovam que aproximadamente 60% dos pacientes portadores de doença arterial periférica (DAP) apresentam também doença em território coronariano e cerebrovascular44 Dormandy JA, Rutherford RB. Management of Peripheral Arterial Disease (PAD). TASC Working Group. Transatlantic Inter-Society Consensus (TASC). J Vasc Surg. 2000;31(1-2):13-5. PMid:10666287.. Por outro lado, aproximadamente 40% dos pacientes com doença coronariana (DC) ou doença cerebrovascular (DCV) têm também DAP44 Dormandy JA, Rutherford RB. Management of Peripheral Arterial Disease (PAD). TASC Working Group. Transatlantic Inter-Society Consensus (TASC). J Vasc Surg. 2000;31(1-2):13-5. PMid:10666287..

A principal causa de mortalidade nos pacientes submetidos a cirurgia vascular restauradora é o infarto agudo do miocárdio (IAM). Por esse motivo, é importante uma adequada avaliação cardiológica pré-operatória, particularmente nos portadores de DC assintomática pelo risco de apresentarem doença cardíaca ou coronariana insuspeitada55 Mackey WC, Fleisher LA, Haider S, et al. Perioperative myocardial ischemic injury in high-risk vascular surgery patients: Incidence and clinical significance in a prospective clinical trial. J Vasc Surg. 2006;43(3):533-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.11.013. PMid:16520168.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.11....
.

O objetivo deste estudo foi determinar a prevalência da DC sintomática ou assintomática em pacientes programados para serem submetidos a cirurgia vascular arterial eletiva de grande porte e sua relação com as complicações cardiológicas pós-operatórias.

MÉTODOS

Foram analisados prospectivamente 200 pacientes submetidos a cirurgia vascular arterial eletiva convencional, no período de janeiro de 2004 a agosto de 2006, no Serviço de Cirurgia Vascular Integrada do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo. Esse período foi escolhido por ainda haver número muito pequeno de procedimentos endovasculares, os quais não foram incluídos neste estudo. As doenças vasculares consideradas foram: doença obstrutiva carotídea, aortoilíaca e femoropoplítea distal e doença aneurismática de aorta abdominal (AAA) e de artérias ilíacas.

Todos os pacientes foram submetidos a rotina de avaliação básica pré-operatória, incluindo anamnese, exames laboratoriais (hemograma, coagulograma, função renal, eletrólitos, perfil lipídico, gasometria arterial, proteínas totais e frações, enzimas hepáticas, hormônios tiroidianos e glicemia), eletrocardiograma, radiografia de tórax, ecocardiograma de estresse e cintilografia do miocárdio.

Os pacientes foram agrupados da seguinte forma:

  • − Grupo I: sem DC.

  • − Grupo II: com DC assintomática, detectada na avaliação pré-operatória, através de eletrocardiograma sugestivo de área de necrose (onda Q maior ou igual a 0,03s e/ou amputação da onda R em pelo menos duas derivações), cintilografia do miocárdio, teste de esforço ou ecocardiograma de estresse.

  • − Grupo III: com DC sintomática, ou seja, com história de angina do peito típica, IAM, revascularização do miocárdio e/ou angioplastia coronariana prévia.

O protocolo utilizado para avaliação do risco cirúrgico foi baseado na avaliação dos preditores clínicos (maior, intermediário e menor), na capacidade funcional expressa em equivalentes metabólicos (> 4 METS e & 4 METS), analisada através de uma adaptação da escala de atividades de Duke pela American Heart Association (AHA) e pelo tipo de cirurgia, de acordo com o algoritmo da força tarefa do American College of Cardiology (ACC)/AHA66 Eagle KA, Brundage BH, Chaitman BR, et al. Guidelines for perioperative cardiovascular evaluation for noncardiac surgery: report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. Committee on Perioperative Cardiovascular Evaluation for Noncardiac Surgery. Circulation. 1996;93(6):1278-317. PMid:8653858.. As complicações pós-operatórias cardiológicas consideradas foram: IAM fatal e não fatal, insuficiência cardíaca congestiva, choque cardiogênico, fibrilação atrial aguda (FAA) e outras arritmias.

A análise estatística foi feita pelo teste t de Student, para a comparação entre duas médias, e pelo teste qui-quadrado ou exato de Fischer, para comparação entre duas proporções. Foi considerado significativo p & 0,05.

RESULTADOS

Dos 200 pacientes analisados, 152 (76%) pacientes eram do sexo masculino e 48 (24%) do sexo feminino. A idade média foi de 67 anos, variando de 44 a 97 anos. Os pacientes com DC eram 91 (45,5%), sendo que 28 (14%) eram assintomáticos (grupo II) e 63 (31,5%) eram sintomáticos (grupo III). Os demais 109 pacientes (54,5%) não tinham DC (grupo I).

A doença vascular predominante foi AAA e aneurisma das artérias ilíacas (31,5%), seguida, respectivamente, de DAP (28,5%), doença obstrutiva carotídea (27%) e doença obstrutiva aortoilíaca (13%). Quando comparamos os grupos (I, II e III) em relação às doenças vasculares, não houve diferença estatística quanto à sua distribuição relativa (Tabela 1).

Tabela 1
Distribuição das doenças vasculares entre os três grupos de pacientes.

Com relação aos antecedentes mórbidos, o acidente vascular cerebral isquêmico (AVCi) prevaleceu no grupo II com cinco casos (20%) e ocorrência estatisticamente significativa em relação aos demais grupos (p & 0,001). A insuficiência coronariana foi mais prevalente no grupo II em relação aos demais: 25 (12,5%) pacientes (p & 0,001), e a insuficiência cardíaca prevaleceu no grupo III: cinco (7,9%) pacientes (p = 0,030) (Tabela 2).

Tabela 2
Distribuição dos antecedentes mórbidos vasculares cerebrais e antecedentes cardíacos entre os pacientes dos três grupos.

Houve um total de 206 procedimentos, pois seis pacientes foram submetidos a cirurgia em dois territórios concomitantes: quatro apresentavam doença oclusiva aortoilíaca e infrainguinal associadas e dois pacientes apresentavam AAA e doença infrainguinal associadas.

Complicações pós-operatórias ocorreram em 46 pacientes (23%), sendo que houve complicações cardíacas em 11 pacientes (5,5%). Quanto às complicações não cardíacas, ocorreram 55 em 35 pacientes (17,5%), pois alguns apresentaram mais de uma complicação (Tabela 3).

Tabela 3
Complicações pós-operatórias cardíacas e não cardíacas* * Um ou mais pacientes apresentaram mais de um tipo de complicação. .

Entre as complicações cardíacas, ocorreram três IAM não fatais (1,5%), sempre em pacientes do grupo III. A complicação cardíaca mais frequente foi arritmia (exceto FAA), ocorrida em cinco (2,5%) pacientes, sendo que destes, três eram do grupo II (Tabela 3).

A mortalidade precoce global foi de nove pacientes (4,5%), que faleceram dentro do período de 30 dias do pós-operatório. As principais causas foram tromboembolismo pulmonar e choque séptico, cada qual ocorrido em dois pacientes. Apenas uma morte foi decorrente de problema cardíaco: um paciente do grupo III faleceu por choque cardiogênico (Tabela 4). De todas as variáveis analisadas, a única que se associou de forma significativa com óbito foi insuficiência cardíaca (p = 0,04).

Tabela 4
Causas de morte pós-operatória.

DISCUSSÃO

As complicações cardiovasculares são importantes causas de morbidade em procedimentos não cardíacos de grande porte77 L´ Italien GJ, Paul SD, Hendel RC, et al. Development and validation of a Bayesian model for perioperative cardiac risk assessment in a cohort of 1,081 vascular surgical candidates. J Am Coll Cardiol. 1996;27(4):779-86. http://dx.doi.org/10.1016/0735-1097(95)00566-8. PMid:8613603.
http://dx.doi.org/10.1016/0735-1097(95)0...
,88 Mangano DT, Layug UL, Wallace A, Tateo I. Effect of atenolol on mortality and cardiovascular morbidity after noncardiac surgery. N Engl J Med. 1996;335(23):1713-20. http://dx.doi.org/10.1056/NEJM199612053352301. PMid:8929262.
http://dx.doi.org/10.1056/NEJM1996120533...
. Em nossa série, a taxa de complicações cardiovasculares foi de 5,5%, sendo que o grupo DC assintomática (grupo II) apresentou a maior prevalência (12%). Em recente estudo, Bredahl et al.99 Bredahl K, Jensen LP, Schroeder TV, Sillesen H, Nielsen H, Eiberg JP. Mortality and complications after aortic bifurcated bypass procedures for chronic aortoiliac occlusive disease. J Vasc Surg. 2015;62(1):75-82. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2015.02.025. PMid:26115920.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2015.02....
apresentaram uma taxa de 6% de complicações vasculares no pós-operatório de doença oclusiva aortailíaca. O índice global de complicações foi de 33%, enquanto que as complicações não cardíacas corresponderam a 27,5%, semelhante ao índice encontrado por outros autores1010 Boabaid R, Martorell A, Lisbona C, Lerma R, Mejia S, Callejas JM. Análise dos resultados dos 100 primeiros aneurismas da aorta abdominal operados em um serviço de angiologia e cirurgia vascular. Arq Cat Med. 1996;25:115-21..

Lee et al.1111 Lee TH, Marcantonio ER, Mangione CM, et al. Derivation and prospective validation of a simple index for prediction of cardiac risk of major noncardiac surgery. Circulation. 1999;100(10):1043-9. http://dx.doi.org/10.1161/01.CIR.100.10.1043. PMid:10477528.
http://dx.doi.org/10.1161/01.CIR.100.10....
, cuja taxa de complicações cardíacas foi de 56 (2%) em 2.893 pacientes estáveis submetidos a cirurgia não cardíaca eletiva de grande porte, propuseram classificar os pacientes de acordo com um Índice de Risco Cardíaco Revisado, o qual permitiria identificar os pacientes com alto risco de complicações. Em nossa série, essa identificação correspondeu aos pacientes com DC sintomática: três pacientes (1,5%) tiveram IAM não fatal e pertenciam ao grupo III.

Apesar de Eagle et al.1212 Eagle KA, Rihal CS, Mickel MC, et al. Cardiac risk of noncardiac surgery. influence of coronary disease and type of surgery in 3368 operations. Circulation. 1997;96(6):1882-7. http://dx.doi.org/10.1161/01.CIR.96.6.1882. PMid:9323076.
http://dx.doi.org/10.1161/01.CIR.96.6.18...
e Bodenheimer1313 Bodenheimer MM. Noncardiac surgery in the cardiac patient: what is the question? Ann Intern Med. 1996;124(8):763-6. http://dx.doi.org/10.7326/0003-4819-124-8-199604150-00010. PMid:8633838.
http://dx.doi.org/10.7326/0003-4819-124-...
terem mostrado que a revascularização coronariana reduziu significativamente o número de eventos cardíacos no pós-operatório de cirurgia não cardíaca, na série mais recente de McFalls et al.1414 McFalls EO, Ward HB, Moritz TE, et al. Coronary-artery revascularization before elective major vascular surgery. N Engl J Med. 2004;351(27):2795-804. http://dx.doi.org/10.1056/NEJMoa041905. PMid:15625331.
http://dx.doi.org/10.1056/NEJMoa041905...
, a incidência de IAM pós-operatório não foi reduzida por intervenções coronarianas e não alterou a sobrevida em longo prazo. Esses autores concluíram que a revascularização da artéria coronária antes da cirurgia vascular eletiva em pacientes estáveis não deve ser recomendada. O que pode ser confirmado pela mais recente revisão da AHA que manteve a não realização de exames invasivos e de revascularização do miocárdio rotineiramente1515 Fleisher LA, Fleischmann KE, Auerbach AD, et al. 2014 ACC/AHA guideline on perioperative cardiovascular evaluation and management of patients undergoing noncardiac surgery: executive summary: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. Circulation. 2014;130(24):2215-45. http://dx.doi.org/10.1161/CIR.0000000000000105. PMid:25085962.
http://dx.doi.org/10.1161/CIR.0000000000...
. Com base nesses dados, os pacientes do grupo III, apesar de terem doença sintomática mas estável, não foram previamente submetidos à revascularização coronariana.

Dentre as complicações cardíacas, a mais frequente foi arritmia (2,5%), excetuando FAA, que ocorreu em apenas um paciente (0,5%). Na série de Carvalho et al.1616 Carvalho FC, Brito VP, Tribulatto EC, van Bellen B. Estudo prospectivo da morbi-mortalidade precoce e tardia da cirurgia do aneurisma da aorta abdominal. Arq Bras Cardiol. 2005;84(4):292-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2005000400004. PMid:15880201.
http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2005...
, a complicação cardíaca predominante foi a FAA, que ocorreu em 5,4% dos pacientes submetidos a cirurgia convencional do AAA.

A associação entre nossos pacientes com DC e DAP (38/91 casos) coincidiu com a literatura mundial, ocorrendo em 41,7% dos casos. Dentre os pacientes com DC assintomática, a DAP esteve presente em 39,3% (11/28 casos). Por isso, a importância de identificá-la de maneira agressiva, uma vez que sua incidência é elevada e pode acarretar alta mortalidade cardíaca no pós-operatório de cirurgia vascular de grande porte. Ward et al.1717 Ward RP, Min JK, McDonough KM, Lang RM. High prevalence of important cardiac findings in patients with peripheral arterial disease referred for echocardiography. J Am Soc Echocardiogr. 2005;18(8):844-9. http://dx.doi.org/10.1016/j.echo.2005.01.004. PMid:16084337.
http://dx.doi.org/10.1016/j.echo.2005.01...
, em sua série, mostraram que os pacientes com DAP tinham maior prevalência de alterações clínicas significativas no ecocardiograma, tais como disfunção ventricular esquerda e estenose aórtica, do que os pacientes sem doença infrainguinal.

A mortalidade precoce em nossos pacientes foi de 4,5%, semelhante à encontrada por Mackey et al.55 Mackey WC, Fleisher LA, Haider S, et al. Perioperative myocardial ischemic injury in high-risk vascular surgery patients: Incidence and clinical significance in a prospective clinical trial. J Vasc Surg. 2006;43(3):533-8. http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.11.013. PMid:16520168.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jvs.2005.11....
(3,4%), exceto com relação ao fato de que a isquemia cardíaca não foi a causa mais frequente do óbito. O risco cardíaco continua sendo um problema importante para os pacientes submetidos a cirurgia não cardíaca e é frequentemente o maior responsável pelos resultados no perioperatório66 Eagle KA, Brundage BH, Chaitman BR, et al. Guidelines for perioperative cardiovascular evaluation for noncardiac surgery: report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. Committee on Perioperative Cardiovascular Evaluation for Noncardiac Surgery. Circulation. 1996;93(6):1278-317. PMid:8653858.. Recentes diretrizes sugeriram que o risco médio de IAM no perioperatório ou morte cardíaca está relacionado com o reconhecimento prioritário dos fatores clínicos, tais como: insuficiência cardíaca, angina, IAM, idade avançada, capacidade funcional e, para os pacientes submetidos a exames não invasivos, que tenham os territórios isquêmicos do miocárdio demonstrados através de testes provocativos. O grau de risco conferido por um procedimento cirúrgico não cardíaco em acréscimo aos fatores de risco paciente-específico tem apresentado dificuldade na sua elucidação. Por maior que seja a experiência da cirurgia vascular até o momento, acredita-se que, para explicar o maior risco, senão todos os riscos cirúrgicos específicos, seja necessário ter conhecimento da associação entre a DAP e a DC1818 Krupski WC, Layug EL, Reilly LM, Rapp JH, Mangano DT. Comparison of cardiac morbidity rates between aortic and infrainguinal operations: two-year follow-up: study of Perioperative Ischemia Research Group. J Vasc Surg. 1993;18(4):609-15, discussion 615-7. http://dx.doi.org/10.1016/0741-5214(93)90070-3. PMid:8411468.
http://dx.doi.org/10.1016/0741-5214(93)9...

19 L’Italien GJ, Cambria RP, Cutler BS, et al. Comparative early and late morbidity among patients requiring different vascular surgery procedures. J Vasc Surg. 1995;21(6):935-44. http://dx.doi.org/10.1016/S0741-5214(95)70221-0. PMid:7776473.
http://dx.doi.org/10.1016/S0741-5214(95)...
-2020 Hertzer NR, Beven EG, Young JR, et al. Coronary artery disease in peripheral vascular patients: a classification of 1000 coronary angiograms and results of surgical management. Ann Surg. 1984;199(2):223-33. http://dx.doi.org/10.1097/00000658-198402000-00016. PMid:6696538.
http://dx.doi.org/10.1097/00000658-19840...
.

Em nossa série, podemos observar que os pacientes com DC assintomática, apesar de somente representarem 5,5% dos pacientes com DCV, foram os que mais tiveram AVCi pregressa (20%) e eram também os principais portadores de insuficiência coronariana pregressa (12,5%). Apesar de a DC não ter sido preditora de óbito e a sobrevida dos pacientes com ou sem DC não mostrar diferenças estatísticas, podemos observar a importância da avaliação pré-operatória no sentido de detectar os pacientes com DC assintomática precocemente, o que pode contribuir para a diminuição das taxas de complicações pós-operatórias.

  • Fonte de financiamento: Nenhuma.
  • O estudo foi realizado no Serviço de Cirurgia Vascular Integrada do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil, e visou especificamente os pacientes submetidos a cirurgia arterial de grande porte antes do predomínio da cirurgia endovascular.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Mar 2016
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    06 Jul 2015
  • Aceito
    11 Dez 2015
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