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Nível de informação e adesão à terapia de anticoagulação oral com varfarina em pacientes acompanhados em ambulatório de atenção primária à saúde

Resumo

Contexto

A anticoagulação oral com varfarina é usada por milhões de pacientes em todo o mundo, apresentando segurança e eficácia bem estabelecidas. Ainda assim, na atenção primária à saúde, os anticoagulantes estão entre as classes de medicamentos mais associadas a erros de medicação fatais.

Objetivo

Verificar o nível de informação e a adesão ao tratamento com varfarina em pacientes acompanhados em ambulatório de atenção primária à saúde.

Método

Foi realizado um estudo transversal de uma coorte prospectiva com 60 pacientes em uso de varfarina no município de Ijuí, Rio Grande do Sul. Utilizou-se questionário para verificar o nível de informações dos usuários quanto à prescrição e o nível das informações prestadas pela equipe de saúde aos usuários. A Escala de Adesão Terapêutica de Morisky de Oito Itens (MMAS-8) e o coeficiente internacional normatizado (international normalized ratio, INR) foram usados para verificar a adesão ao tratamento.

Resultados

Os resultados foram expressos em valores absolutos e relativos e razão de prevalência, com seu respectivo intervalo de confiança de 95%. Verificou-se que 83,3% dos participantes tiveram nível de informação insuficiente prestada pela equipe de saúde, 50,0% não souberam informar sobre o uso correto do medicamento, 86,7% foram não aderentes ao tratamento segundo a MMAS-8, e 63,3% estavam fora do intervalo terapêutico adequado.

Conclusão

Neste estudo, observou-se a necessidade de melhorar a qualidade das informações prestadas aos usuários e criar estratégias para adesão ao tratamento, visando à segurança do paciente em tratamento com varfarina na atenção primária à saúde.

Palavras-chave:
varfarina; atenção primária à saúde; informação; adesão à medicação; coeficiente internacional normatizado

Abstract

Background

Oral anticoagulation therapy with warfarin is widely used around the world and its safety and efficacy are well-established. Nevertheless, anticoagulants are among the drug classes most associated with fatal medication errors in primary health care.

Objective

To investigate patient knowledge, the level of information provided, and medication adherence in patients treated with warfarin at a primary health care service.

Method

A cross-sectional study of a prospective cohort of 60 patients on warfarin treatment in the town of Ijuí, Rio Grande do Sul, Brazil. A questionnaire was administered to test patients’ knowledge about their prescriptions and the level of information provided by the health team. The 8-item Morisky Medication Adherence Scale (MMAS-8) and International Normalized Ratio (INR) were used to verify adherence to treatment.

Results

The results were expressed in absolute and relative values and prevalence ratios were calculated, with respective 95% confidence intervals. It was found that 83.3% of the participants had been given insufficient information by the health team, 50% did not know how to use the medication correctly, 86.7% were not adherent to the treatment according to MMAS-8 and 63.3% were outside of the correct INR range.

Conclusion

In this study, we observed a need to improve the quality of information provided to users and to develop strategies to improve adherence to treatment, to ensure the safety of patients treated with warfarin in primary health care services.

Keywords:
warfarin; primary health care; information; medication adherence; international normalized ratio

INTRODUÇÃO

A anticoagulação oral com varfarina é usada por milhões de pessoas em todo o mundo e tem segurança e eficácia bem estabelecidas 11 Ageno W, Gallus AS, Wittkowsky A, Crowther M, Hylek EM, Palareti G. Oral anticoagulant therapy: antithrombotic therapy and prevention of thrombosis. 9th ed: American College of Chest Physicians evidence-based clinical practice guidelines. Chest. 2012;141(2, Supl):e44S-88S. http://dx.doi.org/10.1378/chest.11-2292. PMid:22315269.
http://dx.doi.org/10.1378/chest.11-2292...
,22 Ansell J, Hirsh J, Hylek E, Jacobson A, Crowther M, Palareti G. Pharmacology and management of the vitamin K antagonists: American College of Chest Physicians evidence-based clinical practice guidelines (8th edition). Chest. 2008;133(6, Supl):160S-98S. http://dx.doi.org/10.1378/chest.08-0670. PMid:18574265.
http://dx.doi.org/10.1378/chest.08-0670...
. No entanto, seu uso exige acompanhamento clínico e laboratorial rigoroso, com avaliação da equipe multidisciplinar 33 Esmerio FG, Souza EN, Leiria TL, Lunelli R, Moraes MA. Uso crônico de anticoagulante oral: implicações para o controle de níveis adequados. Arq Bras Cardiol. 2009;93(5):549-54. http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009001100017. PMid:20084318.
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. Os pacientes devem monitorar regularmente os níveis de coagulação sanguínea, por meio do exame do tempo de protrombina (TP), expresso pelo coeficiente internacional normatizado (International Normalized Ratio, INR) 44 Pelegrino FM, Dantas RA, Corbi IS, Carvalho AR. Perfil sócio demográfico e clínico de pacientes em uso de anticoagulantes orais. Rev Gaúcha Enferm. 2010;31(1):123-8. http://dx.doi.org/10.1590/S1983-14472010000100017. PMid:20839546.
http://dx.doi.org/10.1590/S1983-1447201...
, o qual deve permanecer dentro do intervalo terapêutico estabelecido para reduzir o risco de complicações tromboembólicas ou hemorrágicas 44 Pelegrino FM, Dantas RA, Corbi IS, Carvalho AR. Perfil sócio demográfico e clínico de pacientes em uso de anticoagulantes orais. Rev Gaúcha Enferm. 2010;31(1):123-8. http://dx.doi.org/10.1590/S1983-14472010000100017. PMid:20839546.
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.

Na atenção primária à saúde (APS), os anticoagulantes orais (ACOs), em especial a varfarina, estão entre as classes de medicamentos mais associadas a erros de medicação fatais, muitas vezes resultantes de monitorização laboratorial inadequada, interações medicamentosas significativas, falhas no conhecimento técnico dos profissionais envolvidos e orientação insuficiente aos pacientes 55 Baglin TP, Cousins D, Keeling DM, Perry DJ, Watson HG. Recommendations from the British Committee for Standards in Haematology and National Patient Safety Agency. Br J Haematol. 2007;136(1):26-9. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2141.2006.06379.x. PMid:17116128.
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.

O sucesso e a segurança dos ACOs dependem da educação do paciente, da boa adesão ao tratamento e da comunicação entre o paciente e a equipe responsável pelo seu atendimento clínico 22 Ansell J, Hirsh J, Hylek E, Jacobson A, Crowther M, Palareti G. Pharmacology and management of the vitamin K antagonists: American College of Chest Physicians evidence-based clinical practice guidelines (8th edition). Chest. 2008;133(6, Supl):160S-98S. http://dx.doi.org/10.1378/chest.08-0670. PMid:18574265.
http://dx.doi.org/10.1378/chest.08-0670...
,55 Baglin TP, Cousins D, Keeling DM, Perry DJ, Watson HG. Recommendations from the British Committee for Standards in Haematology and National Patient Safety Agency. Br J Haematol. 2007;136(1):26-9. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2141.2006.06379.x. PMid:17116128.
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. No entanto, as publicações sobre ACOs enfatizam principalmente eventos adversos, como hemorragia e eventos tromboembólicos, sem mencionar a qualidade do atendimento 55 Baglin TP, Cousins D, Keeling DM, Perry DJ, Watson HG. Recommendations from the British Committee for Standards in Haematology and National Patient Safety Agency. Br J Haematol. 2007;136(1):26-9. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2141.2006.06379.x. PMid:17116128.
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. No Brasil, os estudos que tratam sobre o nível de informação ou sobre a adesão à terapia de anticoagulação oral estão centrados em pacientes acompanhados em ambulatórios especializados 33 Esmerio FG, Souza EN, Leiria TL, Lunelli R, Moraes MA. Uso crônico de anticoagulante oral: implicações para o controle de níveis adequados. Arq Bras Cardiol. 2009;93(5):549-54. http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009001100017. PMid:20084318.
http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X200...
,44 Pelegrino FM, Dantas RA, Corbi IS, Carvalho AR. Perfil sócio demográfico e clínico de pacientes em uso de anticoagulantes orais. Rev Gaúcha Enferm. 2010;31(1):123-8. http://dx.doi.org/10.1590/S1983-14472010000100017. PMid:20839546.
http://dx.doi.org/10.1590/S1983-1447201...
,66 Henn CB, Rabelo ER, Boaz M, Souza EN. Conhecimento dos pacientes sobre anticoagulação oral crônica acompanhados em ambulatório especializado. Rev Gaúcha Enferm. 2008;29(2):207-13. PMid:18822752.

7 Rocha HT, Rabelo ER, Aliti G, Souza EN. Conhecimento de pacientes portadores de prótese valvar mecânica sobre a terapia com anticoagulação oral crônica. Rev Latino-Am Enfer. 2010;18(4):696-702. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692010000400006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-1169201...
-88 Ávila CW, Aliti GB, Feijó MKF, Rabelo ER. Adesão farmacológica ao anticoagulante oral e os fatores que influenciam na estabilidade do índice de normatização internacional. Rev Latino-Am Enfer. 2011;19(1):18-25. .

Nesse contexto, o presente estudo foi realizado com pacientes em terapia de anticoagulação oral com varfarina, sem acompanhamento em ambulatório especializado, atendidos na APS do município de Ijuí (RS), com o objetivo de verificar o nível de informações dos usuários quanto à prescrição de varfarina e o nível das informações prestadas pela equipe de saúde a esses usuários sobre cuidados no tratamento, além de determinar a adesão ao tratamento com varfarina.

MÉTODOS

Foi realizado um estudo transversal de uma coorte prospectiva, com dados coletados entre abril e julho de 2014. Os pacientes da coorte foram acompanhados mensalmente, pelo período de 18 meses, de abril de 2014 a outubro de 2015. Procurou-se incluir todos os pacientes que retiraram o medicamento varfarina nas unidades de saúde do município de Ijuí. O município tem população de 79.396 habitantes 99 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [site na Internet]. IBGE Cidades. Rio de Janeiro: IBGE; 2014. [citado 2014 abr 21]. http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/home.php
http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/ho...
e a APS municipal conta com 15 unidades de atendimento, sendo sete Unidades Básicas de Saúde e oito Unidades de Estratégia de Saúde da Família, nas quais se realiza a dispensação de medicamentos.

Os pacientes em uso de varfarina foram identificados a partir de um levantamento das receitas atendidas nas unidades de saúde do município. Para isso, realizou-se a busca e a análise das prescrições arquivadas na Farmácia Central do município para identificar prescrições de varfarina.

Para coleta de dados, foi utilizado um questionário, o qual abordou características sociodemográficas e questões relacionadas ao tratamento com varfarina. O nível de informação quanto à prescrição médica foi verificado a partir de uma pergunta aberta, na qual os entrevistados explicaram como deveriam usar o medicamento. As respostas dos entrevistados foram confrontadas com a respectiva prescrição, a qual poderia ser usada para consulta. Foram atribuídos níveis de informação conforme as respostas dos entrevistados. O nível de informação foi considerado bom quando houve acerto total, regular quando houve acerto parcial, e ruim em caso de erro ou não resposta. Os níveis de informação regular e ruim foram considerados como nível insuficiente.

Quatorze questões, com respostas fechadas de caráter dicotômico (sim/não), foram aplicadas para verificar quais informações os entrevistados haviam recebido sobre os cuidados necessários durante o tratamento com varfarina. As questões foram formuladas com base nas orientações do Formulário Terapêutico Nacional 1010 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. Formulário terapêutico nacional 2010: Rename 2010. Brasília: Ministério da Saúde; 2010. e do Manual de Rotinas para Atenção ao AVC 1111 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Especializada. Manual de rotinas para atenção ao AVC. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. . Cada resposta positiva contou um ponto, e o escore máximo foi de quatorze pontos. O nível das informações prestadas aos pacientes foi classificado como bom em caso de pontuação igual ou superior a 10 pontos, e como insuficiente em caso de pontuações inferiores. Esse ponto de corte, de aproximadamente 70%, também foi utilizado em outros estudos 1212 Tang EO, Lai CS, Lee KK, Wong RS, Cheng G, Chan TY. Relationship between patients’ warfarin knowledge and anticoagulation control. Ann Pharmacother. 2003;37(1):34-9. http://dx.doi.org/10.1345/aph.1A198. PMid:12503930.
http://dx.doi.org/10.1345/aph.1A198 ...

13 Davis NJ, Billett HH, Cohen HW, Arnsten JH. Impact of adherence, knowledge, and quality of life on anticoagulation control. Ann Pharmacother. 2005;39(4):632-6. http://dx.doi.org/10.1345/aph.1E464. PMid:15713790.
http://dx.doi.org/10.1345/aph.1E464 ...
-1414 Ryals CA, Pierce KL, Baker JW. INR goal attainment and oral anticoagulation knowledge of patients enrolled in an anticoagulation clinic in a Veterans Affairs medical center. J Manag Care Pharm. 2011;17(2):133-42. http://dx.doi.org/10.18553/jmcp.2011.17.2.133. PMid:21348546.
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.

Para determinar a adesão foi utilizada a Escala de Adesão Terapêutica de Morisky de Oito Itens (8-item Morisky Medication Adherence Scale, MMAS-8), que está validada em português 1515 Oliveira-Filho AD, Morisky DE, Neves SJ, Costa FA, Lyra DP Jr. The 8-item Morisky Medication Adherence Scale: validation of a Brazilian-Portuguese version in hypertensive adults. Res Social Adm Pharm. 2014;10(3):554-61. http://dx.doi.org/10.1016/j.sapharm.2013.10.006. PMid:24268603.
http://dx.doi.org/10.1016/j.sapharm.201...
,1616 Morisky DE, Ang A, Krousel-Wood M, Ward HJ. Predictive validity of a medication adherence measure in an outpatient setting. J Clin Hypertens. 2008;10(5):348-54. http://dx.doi.org/10.1111/j.1751-7176.2008.07572.x. PMid:18453793.
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. Originalmente, a MMAS-8 foi elaborada para verificar a adesão ao tratamento em pacientes portadores de hipertensão arterial sistêmica, porém Wang et al. 1717 Wang Y, Kong MC, Ko Y. Comparison of three medication adherence measures in patients taking warfarin. J Thromb Thrombolysis. 2013;36(4):416-21. http://dx.doi.org/10.1007/s11239-013-0872-5. PMid:23345042.
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e Mayet 1818 Mayet AY. Patient adherence to warfarin therapy and its impact on anticoagulation control. Saudi Pharm J. 2016;24(1):29-34. http://dx.doi.org/10.1016/j.jsps.2015.02.005. PMid:26903765.
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a validaram para verificar a adesão ao tratamento em paciente que utilizavam varfarina. Até o momento, não há publicação no Brasil utilizando a MMAS-8 para verificar a adesão à terapia de anticoagulação oral.

A MMAS-8 utiliza oito perguntas relacionadas ao comportamento aderente, com sete perguntas com respostas fechadas de caráter dicotômico (sim/não) e a última respondida segundo uma escala de cinco opções: nunca, quase nunca, às vezes, frequentemente e sempre. Para cada resposta que demonstrasse a adesão, foi atribuído um ponto. Foi considerado alta adesão um escore de oito pontos, adesão moderada um escore de sete ou seis pontos, e baixa adesão um escore de cinco pontos ou menos. O presente estudo considerou como aderentes aqueles pacientes com alta adesão, e calculou a sensibilidade e a especificidade da MMAS-8 utilizando o valor de INR como padrão, seguindo o estudo de Mayet 1818 Mayet AY. Patient adherence to warfarin therapy and its impact on anticoagulation control. Saudi Pharm J. 2016;24(1):29-34. http://dx.doi.org/10.1016/j.jsps.2015.02.005. PMid:26903765.
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.

O exame do TP, expresso pelo valor de INR, foi feito em laboratório contratado, sendo a coleta realizada em domicílio. Segundo as diretrizes para anticoagulação, em nível nacional 1919 Lorga AM Fo, Azmus AD, Soeiro AM, et al. Diretrizes brasileiras de antiagregantes plaquetários e anticoagulantes em cardiologia. Arq Bras Cardiol. 2013;101(3, Supl 3):1-95. http://dx.doi.org/10.5935/abc.2013S009.
http://dx.doi.org/10.5935/abc.2013S009 ...
e internacional 11 Ageno W, Gallus AS, Wittkowsky A, Crowther M, Hylek EM, Palareti G. Oral anticoagulant therapy: antithrombotic therapy and prevention of thrombosis. 9th ed: American College of Chest Physicians evidence-based clinical practice guidelines. Chest. 2012;141(2, Supl):e44S-88S. http://dx.doi.org/10.1378/chest.11-2292. PMid:22315269.
http://dx.doi.org/10.1378/chest.11-2292...
,22 Ansell J, Hirsh J, Hylek E, Jacobson A, Crowther M, Palareti G. Pharmacology and management of the vitamin K antagonists: American College of Chest Physicians evidence-based clinical practice guidelines (8th edition). Chest. 2008;133(6, Supl):160S-98S. http://dx.doi.org/10.1378/chest.08-0670. PMid:18574265.
http://dx.doi.org/10.1378/chest.08-0670...
,55 Baglin TP, Cousins D, Keeling DM, Perry DJ, Watson HG. Recommendations from the British Committee for Standards in Haematology and National Patient Safety Agency. Br J Haematol. 2007;136(1):26-9. http://dx.doi.org/10.1111/j.1365-2141.2006.06379.x. PMid:17116128.
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, o intervalo terapêutico recomendado de INR está entre 2,0 e 3,0 para a maioria das indicações. Porém, exceções ocorrem para alguns pacientes portadores de prótese valvar ou pacientes com eventos tromboembólicos frequentes, que podem necessitar um valor de INR entre 2,5 e 3,5 22 Ansell J, Hirsh J, Hylek E, Jacobson A, Crowther M, Palareti G. Pharmacology and management of the vitamin K antagonists: American College of Chest Physicians evidence-based clinical practice guidelines (8th edition). Chest. 2008;133(6, Supl):160S-98S. http://dx.doi.org/10.1378/chest.08-0670. PMid:18574265.
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,2020 Lavítola PL, Spina GS, Sampaio RO, Tarasoutchi F, Grinberg M. Bleeding during oral anticoagulant therapy: warning against a greater hazard. Arq Bras Cardiol. 2009;93(2):174-9. PMid:19838496. ,2121 Spina GS. Manual prático de anticoagulação oral. São Paulo: Versos; 2014. p. 23. .

No presente estudo, foram considerados dentro do intervalo terapêutico adequado pacientes cujo valor de INR ficou entre 2,0 e 3,5. Esse mesmo intervalo foi usado em um estudo que incluiu tanto pacientes com prótese valvar como pacientes sem prótese 2020 Lavítola PL, Spina GS, Sampaio RO, Tarasoutchi F, Grinberg M. Bleeding during oral anticoagulant therapy: warning against a greater hazard. Arq Bras Cardiol. 2009;93(2):174-9. PMid:19838496. , uma vez que o valor INR até 3,5 pode ser tolerado sem alteração da dose de varfarina, mesmo que a meta de anticoagulação do paciente seja o intervalo entre 2,0 e 3,0 2121 Spina GS. Manual prático de anticoagulação oral. São Paulo: Versos; 2014. p. 23.

22 Holbrook A, Schulman S, Witt DM, et al. Evidence-based management of anticoagulant therapy: antithrombotic therapy and prevention of thrombosis, 9th ed: American College of Chest Physicians evidence-based clinical practice guidelines. Chest. 2012;141(2, Supl):e152S-84S. http://dx.doi.org/10.1378/chest.11-2295. PMid:22315259.
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-2323 Schulman S, Melinyshyn A, Ennis D, Rudd-Scott L. Single-dose adjustment versus no adjustment of warfarin in stably anticoagulated patients with an occasional international normalized ratio (INR) out of range. Thromb Res. 2010;125(5):393-7. http://dx.doi.org/10.1016/j.thromres.2009.07.006. PMid:19640572.
http://dx.doi.org/10.1016/j.thromres.20...
. Os pacientes cujo valor de INR foi inferior a 2,0 foram considerados não aderentes ao tratamento com varfarina.

As variáveis preditoras foram sexo, idade (até 64 anos, acima de 64 anos), escolaridade (até 5 anos de estudo, acima de 5 anos de estudo), tempo de uso de varfarina (até 24 meses, acima de 24 meses), indicação para o uso de varfarina (prótese valvar, doenças tromboembólicas e outros motivos), frequência de realização do TP (intervalo máximo de 3 meses, intervalo superior a 3 meses), nível de informação quanto à prescrição (bom, insuficiente), nível das informações prestadas pela equipe de saúde (bom, insuficiente), adesão ao tratamento (aderente, não aderente).

As análises envolveram a apresentação de valores absolutos e relativos das variáveis em estudo, sendo utilizados a média e o desvio padrão para as variáveis contínuas. Os dados foram analisados estimando-se a prevalência, a razão de prevalência (RP) e o intervalo de confiança de 95% (IC95%). O teste qui-quadrado foi usado para verificar a associação entre as variáveis independentes e o valor de INR, sendo as variáveis contínuas dicotomizadas. As análises foram realizadas no programa SPSS versão 18.0, considerando um nível de significância de 0,05.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição, a participação dos entrevistados foi voluntária, podendo ser interrompida a qualquer momento, e foi assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A pesquisa seguiu preconizados princípios éticos preconizados pela Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

RESULTADOS

Foram encontrados 96 usuários com prescrição de varfarina, dos quais cinco recusaram-se a participar do estudo, treze não foram localizados, sete não estavam mais utilizando varfarina e três haviam falecido. O estudo foi iniciado com 68 participantes, dos quais oito não o concluíram.

Foram estudadas 60 pessoas, com idade média de 65,3±13,7 anos, sendo 31 mulheres (51,7%). O nível de escolaridade foi de 5,8±4,4 anos de estudo, o tempo médio em uso de varfarina foi de 5,8±5,0 anos, e as principais indicações para o uso de varfarina foram doenças tromboembólicas, em 25 participantes (41,7%); uso de prótese valvar cardíaca, em 23 (38,3%); e outros motivos (arritmia, infarto agudo do miocárdio ou acidente vascular cerebral isquêmico), em 10 (16,7%). Além disso, duas pessoas (3,3%) não souberam informar a indicação de uso.

A Tabela 1 apresenta as características sociodemográficas e a frequência com que o valor de INR ficou fora do intervalo terapêutico estabelecido em cada categoria das variáveis. Os dados apresentados na Tabela 1 demonstram que, entre as variáveis analisadas, houve maior prevalência para o valor de INR fora da faixa terapêutica, porém não houve associação estatisticamente significativa entre as variáveis e o valor de INR. O teste qui-quadrado também não demonstrou associação entre as variáveis e o valor de INR (p > 0,05).

Tabela 1
Características sociodemográficas e valor de INR fora da faixa terapêutica entre usuários de varfarina na atenção primária à saúde no município de Ijuí (RS).

Quanto ao nível de informação sobre a prescrição, 30 participantes (50%) demonstraram bom nível de informação e os outros 30 foram classificados com nível de informação insuficiente, sendo que 16 (26,7%) apresentaram nível de informação regular e 14 (23,3%) apresentarem nível de informação ruim. Quanto ao nível das informações prestadas aos pacientes pela equipe de saúde, 50 (83,3%) tiveram nível de informação insuficiente e apenas 10 (16,7%) atingiram nível de informação suficiente. A Tabela 2 apresenta as informações e a frequência com que as informações teriam sido prestadas aos pacientes.

Tabela 2
Nível das informações prestada aos usuários de varfarina pela equipe de saúde no município de Ijuí (RS) (n = 60).

Questionados se haviam recebido informação sobre o valor de INR, 26 participantes (43,3%) responderam afirmativamente, mas apenas 19 (31,7%) souberam informar corretamente qual o intervalo terapêutico esperado. Quando questionados sobre a frequência com que realizavam o exame de TP para controle do valor de INR, 33 participantes (55,0%) relataram fazer o exame pelo menos uma vez a cada 3 meses, 16 (26,7%) afirmaram fazer o exame com um intervalo superior a 3 meses, e outros 11 (18,3%) afirmaram que não realizavam o exame.

No entanto, quando foi solicitada a apresentação dos últimos resultados de TP, para verificação do valor de INR, apenas 15 participantes (25,0%) apresentaram o resultado atualizado do exame, 22 (36,7%) apresentaram resultado de exame realizado há mais de 3 meses, 11 (18,3%) que afirmaram realizar o exame não apresentaram o resultado, e outros 12 (20,0%) disseram não realizar o exame. Dessa forma, para verificar o valor de INR, optou-se por realizar o exame de TP em todos os participantes, mediante coleta domiciliar.

Realizado o TP, verificou-se que apenas 22 participantes (36,7%) estavam dentro do intervalo terapêutico, com valor de INR entre 2,0 e 3,5. Entre os 38 participantes (63,3%) que estavam fora do intervalo terapêutico esperado, nove (15,0%) tiveram valor de INR superior a 3,5, e os outros 29 (48,3%) tiveram valor de INR inferior a 2,0, sendo considerados não aderentes ao tratamento com varfarina.

Aplicada a MMAS-8, verificou-se que apenas oito participantes (13,3%) apresentaram alta adesão. Foram considerados não aderentes 37 participantes (61,7%) com adesão moderada e 15 (25,0%) com baixa adesão A pontuação média da MMAS-8 foi de 6,1±1,7 pontos em uma escala de zero a oito pontos. Utilizando o valor de INR como padrão, a MMAS-8 apresentou boa sensibilidade, pois 84,2% dos participantes que estavam fora do intervalo terapêutico não foram aderentes ao tratamento. O valor preditivo positivo demonstrou que 61,5% dos participantes não aderentes estavam fora do intervalo terapêutico. Entretanto, a MMAS-8 apresentou baixa especificidade, pois apenas 9,1% dos participantes que estavam dentro do intervalo terapêutico demonstraram-se aderentes ao tratamento de acordo com a MMAS-8. O valor preditivo negativo demonstrou que 25,0% dos participantes aderentes de acordo com a MMAS-8 estavam dentro do intervalo terapêutico. A Tabela 3 apresenta as questões da MMAS-8 para avaliar a adesão ao tratamento com varfarina e o número de participantes com respostas indicativas de adesão.

Tabela 3
Questões realizadas para verificar a adesão ao tratamento e número de participantes com respostas indicativas de adesão ao tratamento com varfarina (n = 60).

DISCUSSÃO

Os resultados do presente estudo indicam uma carência de informações prestadas pela equipe de saúde aos pacientes em uso de varfarina. Dentre as 14 orientações recomendadas pelo Formulário Terapêutico Nacional 1010 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos. Formulário terapêutico nacional 2010: Rename 2010. Brasília: Ministério da Saúde; 2010. e pelo Manual de Rotinas para Atenção ao AVC 1111 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Especializada. Manual de rotinas para atenção ao AVC. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. , uma média de 4,7±3,8 teriam sido prestadas aos pacientes. Apenas 10 participantes (16,7%) afirmaram ter recebido pelo menos 70% das informações, os quais foram considerados com bom nível de informação. Outros estudos, realizados em ambulatório de anticoagulação, tiveram entre 13,3% e 74,1% 66 Henn CB, Rabelo ER, Boaz M, Souza EN. Conhecimento dos pacientes sobre anticoagulação oral crônica acompanhados em ambulatório especializado. Rev Gaúcha Enferm. 2008;29(2):207-13. PMid:18822752. ,77 Rocha HT, Rabelo ER, Aliti G, Souza EN. Conhecimento de pacientes portadores de prótese valvar mecânica sobre a terapia com anticoagulação oral crônica. Rev Latino-Am Enfer. 2010;18(4):696-702. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692010000400006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-1169201...
,1212 Tang EO, Lai CS, Lee KK, Wong RS, Cheng G, Chan TY. Relationship between patients’ warfarin knowledge and anticoagulation control. Ann Pharmacother. 2003;37(1):34-9. http://dx.doi.org/10.1345/aph.1A198. PMid:12503930.
http://dx.doi.org/10.1345/aph.1A198 ...

13 Davis NJ, Billett HH, Cohen HW, Arnsten JH. Impact of adherence, knowledge, and quality of life on anticoagulation control. Ann Pharmacother. 2005;39(4):632-6. http://dx.doi.org/10.1345/aph.1E464. PMid:15713790.
http://dx.doi.org/10.1345/aph.1E464 ...
-1414 Ryals CA, Pierce KL, Baker JW. INR goal attainment and oral anticoagulation knowledge of patients enrolled in an anticoagulation clinic in a Veterans Affairs medical center. J Manag Care Pharm. 2011;17(2):133-42. http://dx.doi.org/10.18553/jmcp.2011.17.2.133. PMid:21348546.
http://dx.doi.org/10.18553/jmcp.2011.17...
,2424 Alphonsa A, Sharma KK, Sharma G, Bhatia R. Knowledge regarding oral anticoagulation therapy among patients with stroke and those at high risk of thromboembolic events. J Stroke Cerebrovasc Dis. 2015;24(3):668-72. http://dx.doi.org/10.1016/j.jstrokecerebrovasdis.2014.11.007. PMid:25577429.
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dos participantes classificados com bom nível de informação quanto à terapia de anticoagulação oral. Os estudos de Henn et al. 66 Henn CB, Rabelo ER, Boaz M, Souza EN. Conhecimento dos pacientes sobre anticoagulação oral crônica acompanhados em ambulatório especializado. Rev Gaúcha Enferm. 2008;29(2):207-13. PMid:18822752. e de Rocha et al. 77 Rocha HT, Rabelo ER, Aliti G, Souza EN. Conhecimento de pacientes portadores de prótese valvar mecânica sobre a terapia com anticoagulação oral crônica. Rev Latino-Am Enfer. 2010;18(4):696-702. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692010000400006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-1169201...
tiveram características como sexo, idade, escolaridade e tempo de uso de varfarina semelhantes às do presente estudo, porém avaliaram amostras de 120 e 110 pacientes respectivamente, em que 64,1% e 36,4% foram classificados com bom nível de informação, considerando um ponto de corte maior (80%) para essa classificação. As variações entre os estudos podem estar relacionadas a diferenças metodológicas e ao fato de o presente estudo ter sido realizado na APS, ou seja, fora de um serviço especializado em anticoagulação.

Os resultados indicam que todas as informações recomendadas teriam sido prestadas com baixa frequência pela equipe de saúde, pois o máximo de 50% dos participantes afirmou ter recebido cada uma das informações. Metade dos participantes sequer sabia que não deveria usar medicamentos por conta própria, nem mesmo anti-inflamatórios, uma das classes mais usadas na automedicação e que pode aumentar o efeito anticoagulante de varfarina. O desconhecimento dessas informações, essenciais para a segurança do tratamento, expõe os usuários a eventos adversos. Pode-se considerar também uma carência de informação quanto à prescrição médica, pois, mesmo com a possibilidade de consultar a prescrição no momento da pesquisa, apenas 50% souberam informar o uso correto de varfarina conforme o prescrito.

Os baixos níveis de informação encontrados neste estudo podem indicar falhas no sistema de saúde no que diz respeito à atenção prestada ao usuário e à comunicação das informações. Problemas estruturais e de funcionamento podem prejudicar a disponibilidade de um atendimento mais racional e humanizado nos serviços de APS 2525 Arrais PS, Barreto ML, Coelho HL. Aspectos dos processos de prescrição e dispensação de medicamentos na percepção do paciente: estudo de base populacional em Fortaleza, Ceará, Brasil. Cad Saude Publica. 2007;23(4):927-37. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2007000400020. PMid:17435890.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X200...
, bem como a qualidade das informações prestadas pela equipe de saúde aos usuários.

Estudos realizados em ambulatório especializado em anticoagulação e que utilizaram a MMAS-8 apresentaram um percentual maior de pacientes com adesão ao tratamento (entre 34,5% 1717 Wang Y, Kong MC, Ko Y. Comparison of three medication adherence measures in patients taking warfarin. J Thromb Thrombolysis. 2013;36(4):416-21. http://dx.doi.org/10.1007/s11239-013-0872-5. PMid:23345042.
http://dx.doi.org/10.1007/s11239-013-08...
e 46,4% 1818 Mayet AY. Patient adherence to warfarin therapy and its impact on anticoagulation control. Saudi Pharm J. 2016;24(1):29-34. http://dx.doi.org/10.1016/j.jsps.2015.02.005. PMid:26903765.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jsps.2015.0...
). Outros estudos, também realizados em serviço especializado, porém utilizando a Escala de Adesão Terapêutica de Morisky de Quatro Itens ( 4-item Morisky Medication Adherence Scale MMAS-4) 2626 Morisky DE, Green LW, Levine DM. Concurrent and predictive validity of a self reported measure of medication adherence. Med Care. 1986;24(1):67-74. http://dx.doi.org/10.1097/00005650-198601000-00007. PMid:3945130.
http://dx.doi.org/10.1097/00005650-1986...
, encontraram taxas de adesão ao tratamento entre 39% e 50% 33 Esmerio FG, Souza EN, Leiria TL, Lunelli R, Moraes MA. Uso crônico de anticoagulante oral: implicações para o controle de níveis adequados. Arq Bras Cardiol. 2009;93(5):549-54. http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009001100017. PMid:20084318.
http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X200...
,77 Rocha HT, Rabelo ER, Aliti G, Souza EN. Conhecimento de pacientes portadores de prótese valvar mecânica sobre a terapia com anticoagulação oral crônica. Rev Latino-Am Enfer. 2010;18(4):696-702. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692010000400006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-1169201...
,2727 Castellucci LA, Shaw J, van der Salm K, et al. Self-reported adherence to anticoagulation and its determinants using the Morisky medication adherence scale. Thromb Res. 2015;136(4):727-31. http://dx.doi.org/10.1016/j.thromres.2015.07.007. PMid:26272305.
http://dx.doi.org/10.1016/j.thromres.20...
.

A MMAS-8 é um método de baixo custo, de fácil aplicação e apresentou boa sensibilidade mas baixa especificidade, ou seja, baixa proporção de indivíduos dentro da faixa terapêutica aderentes ao tratamento. Dentre os 22 participantes que estavam dentro da faixa terapêutica adequada, apenas dois demonstraram adesão de acordo com a MMAS-8 (9,1%). Uma das razões pode ser o alto ponto de corte da MMAS-8, pois, ao considerar aderentes apenas aqueles que demonstrem comportamento aderente para as oito questões da escala, reduz o percentual de indivíduos que poderiam ser classificados como aderentes. Dessa forma, no presente estudo a MMAS-8 não demonstrou ser um bom método para verificar a adesão ao tratamento com varfarina.

Observou-se que 67,3% dos entrevistados estavam fora do intervalo terapêutico alvo. Outros estudos realizados em ambulatório de anticoagulação oral identificaram frequências semelhantes, entre 64 e 75% 33 Esmerio FG, Souza EN, Leiria TL, Lunelli R, Moraes MA. Uso crônico de anticoagulante oral: implicações para o controle de níveis adequados. Arq Bras Cardiol. 2009;93(5):549-54. http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009001100017. PMid:20084318.
http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X200...
,66 Henn CB, Rabelo ER, Boaz M, Souza EN. Conhecimento dos pacientes sobre anticoagulação oral crônica acompanhados em ambulatório especializado. Rev Gaúcha Enferm. 2008;29(2):207-13. PMid:18822752. ,88 Ávila CW, Aliti GB, Feijó MKF, Rabelo ER. Adesão farmacológica ao anticoagulante oral e os fatores que influenciam na estabilidade do índice de normatização internacional. Rev Latino-Am Enfer. 2011;19(1):18-25. ,1818 Mayet AY. Patient adherence to warfarin therapy and its impact on anticoagulation control. Saudi Pharm J. 2016;24(1):29-34. http://dx.doi.org/10.1016/j.jsps.2015.02.005. PMid:26903765.
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, contrariando a expectativa de que o acompanhamento em ambulatório especializado poderia resultar em um melhor controle dos níveis de anticoagulação, com menor frequência de pacientes fora do intervalo terapêutico.

A baixa frequência de valores de INR dentro do intervalo terapêutico sugere a dificuldade de manter níveis adequados de anticoagulação, sendo os pacientes acompanhados em ambulatório especializado ou não. Essa dificuldade pode ocorrer devido aos diversos fatores que podem influenciar no valor de INR, tais como horário irregular de tomada dos comprimidos, ajustes inadequados de doses, variações entre os fabricantes, fatores individuais relacionados com a genética, dieta, massa corporal, função hepática e metabolismo do fármaco 66 Henn CB, Rabelo ER, Boaz M, Souza EN. Conhecimento dos pacientes sobre anticoagulação oral crônica acompanhados em ambulatório especializado. Rev Gaúcha Enferm. 2008;29(2):207-13. PMid:18822752. ,2121 Spina GS. Manual prático de anticoagulação oral. São Paulo: Versos; 2014. p. 23. .

No presente estudo, 50% dos participantes afirmaram ter sido informados que deveriam fazer o TP a cada 3 meses, mas apenas 25,0% apresentaram um resultado atualizado do TP e 68,3% não souberam nem mesmo informar o seu intervalo terapêutico alvo. É possível que a baixa frequência dessa informação esteja relacionada com a frequência de realização do exame de TP e de consultas médicas. Em ambulatórios especializados, há acompanhamento periódico; assim, os pacientes têm mais chances de tomar conhecimento a respeito do exame de TP e do alvo terapêutico, conforme pode ser observado no estudo de Rocha et al., em que 62,7% dos pacientes acompanhados em ambulatório de anticoagulação souberam informar o seu alvo terapêutico 77 Rocha HT, Rabelo ER, Aliti G, Souza EN. Conhecimento de pacientes portadores de prótese valvar mecânica sobre a terapia com anticoagulação oral crônica. Rev Latino-Am Enfer. 2010;18(4):696-702. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692010000400006.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-1169201...
.

Não houve associação entre o valor de INR e as variáveis analisadas Esse resultado está de acordo com outros estudos, que também não demonstraram associação significativa nem mesmo com as variáveis relacionadas ao conhecimento 33 Esmerio FG, Souza EN, Leiria TL, Lunelli R, Moraes MA. Uso crônico de anticoagulante oral: implicações para o controle de níveis adequados. Arq Bras Cardiol. 2009;93(5):549-54. http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009001100017. PMid:20084318.
http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X200...
,66 Henn CB, Rabelo ER, Boaz M, Souza EN. Conhecimento dos pacientes sobre anticoagulação oral crônica acompanhados em ambulatório especializado. Rev Gaúcha Enferm. 2008;29(2):207-13. PMid:18822752. ,1414 Ryals CA, Pierce KL, Baker JW. INR goal attainment and oral anticoagulation knowledge of patients enrolled in an anticoagulation clinic in a Veterans Affairs medical center. J Manag Care Pharm. 2011;17(2):133-42. http://dx.doi.org/10.18553/jmcp.2011.17.2.133. PMid:21348546.
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ou à adesão ao tratamento 33 Esmerio FG, Souza EN, Leiria TL, Lunelli R, Moraes MA. Uso crônico de anticoagulante oral: implicações para o controle de níveis adequados. Arq Bras Cardiol. 2009;93(5):549-54. http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009001100017. PMid:20084318.
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,1818 Mayet AY. Patient adherence to warfarin therapy and its impact on anticoagulation control. Saudi Pharm J. 2016;24(1):29-34. http://dx.doi.org/10.1016/j.jsps.2015.02.005. PMid:26903765.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jsps.2015.0...
.

As limitações deste estudo estiveram relacionadas à realização do TP uma única vez. O número de participantes foi baixo; no entanto, procurou-se incluir todos os pacientes atendidos na APS que estariam em uso de varfarina no município de Ijuí. Viés de memória e o uso de informações autorreferidas podem ter influenciado os resultados do nível de informação prestada aos usuários e da adesão ao tratamento. É possível que alguns usuários não tenham recordado, durante a aplicação do questionário, informações que tivessem sido prestadas pela equipe de saúde.

CONCLUSÃO

A varfarina é considerada um medicamento potencialmente perigoso, em âmbito hospitalar e ambulatorial, embora tenha eficácia e segurança estabelecidas. Dessa forma, informações sobre como utilizar o medicamento e sobre a importância de cumprir o tratamento são imprescindíveis 2525 Arrais PS, Barreto ML, Coelho HL. Aspectos dos processos de prescrição e dispensação de medicamentos na percepção do paciente: estudo de base populacional em Fortaleza, Ceará, Brasil. Cad Saude Publica. 2007;23(4):927-37. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2007000400020. PMid:17435890.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X200...
. Da mesma forma, orientações sobre cuidados são especialmente necessárias no tratamento com varfarina, visando à segurança do paciente e à prevenção de complicações.

Verifica-se a necessidade de melhoria na qualidade das informações prestadas pela equipe de saúde aos pacientes em tratamento com varfarina, bem como de incentivo à adesão ao tratamento e melhor monitoramento da anticoagulação, especialmente naqueles acompanhados na APS, ou seja, fora de ambulatórios especializados, visando ao atendimento qualificado, que deve ser prestado de forma integral, multidisciplinar, humanizada e com frequência regular, para segurança do paciente.

  • Fonte de financiamento: Nenhuma.
  • O estudo foi realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Ijuí, RS, Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Jun 2018
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    05 Dez 2017
  • Aceito
    13 Mar 2018
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