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Um entre outros: a emergência da rasura na aquisição da escrita

Un entre otros: la emergencia de la tachadura en la adquisición de la escritura

One among others: the emergence of erasure in writing acquisition

Resumos

Este artigo apresenta resultados de pesquisa cujo objetivo foi analisar rasuras (apagamentos, inserções, sobreposições etc.) ligadas à segmentação de palavras por espaços em branco, presentes em enunciados escritos produzidos por crianças do Ensino Fundamental I. Com base em pressupostos teórico-metodológicos do Paradigma Indiciário, foram identificadas, num corpus constituído de 708 enunciados escritos, 198 rasuras. Essas rasuras foram interpretadas como pistas de um momento particular da relação sujeito/linguagem que sinalizam um deslocamento do sujeito escrevente em relação à (sua) escrita e à do outro. Como resultado, pôde-se observar, dentre outros fatos, a existência de lugares preferenciais para o aparecimento de rasuras ligadas à segmentação e, portanto, de lugares mais propícios para o deslocamento do sujeito escrevente. Embora, por princípio, rasuras pudessem ocorrer em inúmeros pontos dos enunciados infantis, ocorreram de forma significativa em pontos nos quais se localiza a presença de clíticos e de monossílabos acentuados.

Aquisição da escrita; Rasura; Ortografia; Segmentação gráfica


Este artículo presenta resultados de investigación cuyo objetivo fue analizar tachaduras (borraduras, inserciones, sobre posiciones etc.) ligadas a la segmentación de palabras por espacios en blanco, presentes en enunciados escritos producidos por niños de la Enseñanza Primaria I. Con base en supuestos teórico-metodológicos del Paradigma Indiciário, fueron identificadas, en un corpus constituido de 708 enunciados escritos, 198 tachaduras. Esas tachaduras fueron interpretadas como pistas de un momento particular de la relación sujeto/lenguaje que señalan un desplazamiento del sujeto escribiente en relación a (su) escritura y a la del otro. Como resultado, se puede observar, entre otros hechos, la existencia de lugares preferenciales para el aparecimiento de tachaduras ligadas a la segmentación y, por lo tanto, de lugares más proclives para el desplazamiento del sujeto escribiente. Aunque, por principio, tachaduras pudiesen ocurrir en innúmeros puntos de los enunciados infantiles, ocurrieron de forma significativa en puntos en los cuales se localiza la presencia de clíticos y de monosílabos acentuados.

Adquisición de la escritura; Tachadura; Ortografía; Segmentación gráfica


The aim of this paper is to investigate and discuss erasures (deletion, blot, obliteration, insertion) connected to word segmentation, by blanks observed in written statements, produced by level one elementary school children. Based on the theoretical assumptions of the Indiciary Paradigm, one hundred and ninety-eight erasures from a corpus of seven hundred and eight written statements were identified. We interpreted these erasures as traces of a particular subject/language relation, signaling a displacement of the writing subject, concerning his/her writing and that of others. Results showed, among other facts, the existence of favorite spots for the emergency of segmentation erasures as being more propitious for the writing subject's displacement. Although, on principle, erasures would occur in different children's statements spots, they were significantly observed in clitics and tonic monosyllables.

Writing acquisition; Erasure; Orthography; Graphical segmentation


ARTIGOS DE PESQUISA RESEARCH ARTICLES

Um entre outros: a emergência da rasura na aquisição da escrita

One among others: the emergence of erasure in writing acquisition

Un entre otros: la emergencia de la tachadura en la adquisición de la escritura

Cristiane Carneiro Capristano

Universidade Estadual de Maringá. Maringá, Paraná, Brasil. Professor Adjunto da UEM. Doutora em Linguística Aplicada pela Universidade Estadual de Campinas. Email: capristano1@yahoo.com.br

RESUMO

Este artigo apresenta resultados de pesquisa cujo objetivo foi analisar rasuras (apagamentos, inserções, sobreposições etc.) ligadas à segmentação de palavras por espaços em branco, presentes em enunciados escritos produzidos por crianças do Ensino Fundamental I. Com base em pressupostos teórico-metodológicos do Paradigma Indiciário, foram identificadas, num corpus constituído de 708 enunciados escritos, 198 rasuras. Essas rasuras foram interpretadas como pistas de um momento particular da relação sujeito/linguagem que sinalizam um deslocamento do sujeito escrevente em relação à (sua) escrita e à do outro. Como resultado, pôde-se observar, dentre outros fatos, a existência de lugares preferenciais para o aparecimento de rasuras ligadas à segmentação e, portanto, de lugares mais propícios para o deslocamento do sujeito escrevente. Embora, por princípio, rasuras pudessem ocorrer em inúmeros pontos dos enunciados infantis, ocorreram de forma significativa em pontos nos quais se localiza a presença de clíticos e de monossílabos acentuados.

Palavras-chave: Aquisição da escrita. Rasura. Ortografia. Segmentação gráfica.

ABSTRACT

The aim of this paper is to investigate and discuss erasures (deletion, blot, obliteration, insertion) connected to word segmentation, by blanks observed in written statements, produced by level one elementary school children. Based on the theoretical assumptions of the Indiciary Paradigm, one hundred and ninety-eight erasures from a corpus of seven hundred and eight written statements were identified. We interpreted these erasures as traces of a particular subject/language relation, signaling a displacement of the writing subject, concerning his/her writing and that of others. Results showed, among other facts, the existence of favorite spots for the emergency of segmentation erasures as being more propitious for the writing subject's displacement. Although, on principle, erasures would occur in different children's statements spots, they were significantly observed in clitics and tonic monosyllables.

Keywords: Writing acquisition. Erasure. Orthography. Graphical segmentation.

RESUMEN

Este artículo presenta resultados de investigación cuyo objetivo fue analizar tachaduras (borraduras, inserciones, sobre posiciones etc.) ligadas a la segmentación de palabras por espacios en blanco, presentes en enunciados escritos producidos por niños de la Enseñanza Primaria I. Con base en supuestos teórico-metodológicos del Paradigma Indiciário, fueron identificadas, en un corpus constituido de 708 enunciados escritos, 198 tachaduras. Esas tachaduras fueron interpretadas como pistas de un momento particular de la relación sujeto/lenguaje que señalan un desplazamiento del sujeto escribiente en relación a (su) escritura y a la del otro. Como resultado, se puede observar, entre otros hechos, la existencia de lugares preferenciales para el aparecimiento de tachaduras ligadas a la segmentación y, por lo tanto, de lugares más proclives para el desplazamiento del sujeto escribiente. Aunque, por principio, tachaduras pudiesen ocurrir en innúmeros puntos de los enunciados infantiles, ocurrieron de forma significativa en puntos en los cuales se localiza la presencia de clíticos y de monosílabos acentuados.

Palabras-clave: Adquisición de la escritura. Tachadura. Ortografía. Segmentación gráfica.

1 INTRODUÇÃO

No exame de enunciados escritos produzidos em momentos iniciais do processo de aquisição da escrita verifica-se, com certa frequência, a presença de rasuras, representadas por apagamentos, escritas sobrepostas, inserções, riscos etc., como as sublinhadas no enunciado a seguir (Figura 1), elaborado por uma criança quando cursava a (antiga) primeira série do Ensino Fundamental I:


De modo geral, essas rasuras correspondem a momentos nos quais os escreventes suspendem o gesto de escrever para voltar-se sobre aquilo que escreveram, ora acrescentando traços, letras, sílabas, palavras ou trechos inteiros, ora substituindo, suprimindo ou alterando a configuração e a disposição de letras, sílabas, palavras ou trechos inteiros. Rasuras podem resultar, também, de um movimento de retorno ulterior: terminada a tarefa de escrever, a criança pode voltar ao seu enunciado para "ajustar" suas "escolhas" à imagem que tem do que é correto para a (sua) escrita.

Neste artigo, apresentam-se resultados de pesquisa centrada na investigação do papel e do funcionamento de rasuras ligadas, de diferentes formas, à segmentação de palavras por espaços em branco, no decurso da aquisição da escrita. Trata-se de pesquisa na qual foram examinadas rasuras como a que segue (Figura 2)1 1 Resultados parciais desta pesquisa foram apresentados em Capristano (2010b).


Aqui, o apagamento malsucedido da letra F em "conf[irimentos]" sugere o registro hipossegmentado de "comfirimentos". A criança recusa esse primeiro registro, apagando a letra F, alterando a letra N, transformando-a em M, e registrando "firimentos" mais distante de "com", formando, assim, "com firimentos".

A investigação desse tipo específico de rasura justifica-se pela constatação de que a inserção das crianças no funcionamento simbólico e convencional da escrita depende, dentre outros fatos, da "descoberta" de como estabelecer limites gráficos para as palavras, como definidas pelas convenções ortográficas. A presença assídua dos chamados "erros de segmentação" em enunciados produzidos no período de aquisição da escrita2 2 Para um aprofundamento dessa discussão cf., por exemplo, Abaurre (1991), Abaurre e Silva (1993), Chacon (2004, 2005, 2010), Cunha (2004, 2010), Cunha e Miranda (2007, 2009), Silva (1993), Tenani (2004, 2008, 2010, 2011), dentre outros. e, eventualmente, de rasuras ligadas à segmentação, são fortes indícios de que é um desafio para o escrevente delimitar palavras seguindo as convenções estabelecidas para isso.

Em trabalhos anteriores3 3 Cf. Capristano (2004, 2007a). , com base na concepção do modo heterogêneo de constituição da escrita, como formulada por Corrêa (1997, 2001, 2004), pressupus que, quando presentes na escrita em aquisição, erros de segmentação seriam índices da circulação imaginária dos escreventes por práticas orais e letradas e, ao mesmo tempo, pistas da relação sujeito/linguagem. Mais recentemente4 4 Cf. Capristano (2007b, 2010b) e Capristano e Chacon (2013). , tenho investigado a possibilidade de as rasuras ligadas à segmentação também serem indícios dessa circulação e dessa relação.

No entanto, tendo como ponto de partida a proposta geral de trabalhos voltados para a investigação do funcionamento de rasuras – como, por exemplo, Abaurre et al. (1997), Calil (1998, 1999, 2004), Calil e Felipeto (2000, 2001), Felipeto (2008), Fiad (2009), Serra, Chacon e Tenani (2006)5 5 Nesses trabalhos, rasuras também são nomeadas como reelaborações, reescritas e/ou marcas de correção. –– tenho assumido que a circulação imaginária dos escreventes por práticas orais e letradas e a relação sujeito/linguagem que se deixam ver em rasuras ligadas à segmentação têm contornos diferentes daqueles observados em erros de segmentação. Na seção seguinte, apresento o quadro teórico que tem permitido postular diferenças entre erros e rasuras vinculadas à segmentação.

2 FUNDAMENTOS TEÓRICOS

2.1 A AQUISIÇÃO DA ESCRITA 6 6 As reflexões que desenvolvo nesta seção retomam, algumas vezes quase sem alterações, parte das discussões feitas em minha pesquisa de doutoramento, intitulada Mudanças na trajetória da criança em direção à palavra escrita, defendida no IEL/Unicamp em 2007 (cf. CAPRISTANO, 2007b).

Quando se observa a escrita de crianças ao longo do processo de escolarização – em especial, no período correspondente a primeira etapa do Ensino Fundamental I –, verifica-se que erros de segmentação são bem mais frequentes em enunciados escritos produzidos no início desse processo e, em geral, salvaguardadas algumas exceções, praticamente desaparecem em enunciados finais. Ainda no que se refere à segmentação, observa-se, também, uma grande flutuação em enunciados produzidos nesse processo: diferentes erros, acertos e rasuras vinculados à segmentação, muitas vezes, convivem em um mesmo enunciado. Como essa escrita instável chega a responder ao que preveem as convenções escritas que determinam como devem ser feitas delimitações por espaços em branco?

Uma resposta a essa questão exige a definição de um ponto de vista a respeito de como se dá a aquisição da escrita. Assumo que esse processo é marcado por diferentes posições da criança na língua em seu modo de enunciação escrito. A utilização deliberada da palavra "posições" tem o fito de propor uma analogia com o modo como Lemos (1999, 2002) interpreta o funcionamento da aquisição da fala pela criança.

Sem a pretensão de fazer uma apresentação detalhada, pode-se afirmar que, para Lemos (1999, 2002), as mudanças verificadas na fala da criança no período de aquisição da linguagem não poderiam ser qualificadas como acúmulo ou como construção de conhecimento. Com a preocupação de assumir uma postura teórica alternativa à noção de desenvolvimento, bastante forte em estudos sobre aquisição da linguagem e fundada em seus próprios estudos sobre a aquisição da fala e em encontros com obras de Lacan e de Jakobson, Lemos propõe que essas mudanças decorreriam

de mudanças consequentes à captura da criança, enquanto organismo, pelo funcionamento da língua em que é significada como sujeito falante, captura esta que a coloca em uma estrutura a qual, enquanto estrutura, é incompatível com a interpretação de que há um desenvolvimento, isto é, mudanças de um estado de conhecimento conceituado como individual (LEMOS, 1999, p. 1).

As mudanças na fala da criança são definidas, então, como dependentes de três diferentes posições da criança na língua, posições "relativamente à fala do outro, à língua e, em consequência, em relação à sua [da criança] própria fala" (LEMOS, 2002, p. 56).

Na primeira posição, a fala da criança estaria circunscrita à fala do outro, ou seja, não só seria constituída de fragmentos da fala do adulto como dependeria do reconhecimento que a interpretação do adulto conferiria a esses fragmentos para continuar a se fazer presente no diálogo (cf. LEMOS, 2002). Na segunda posição, a fala da criança estaria submetida ao movimento da língua: característica dessa posição seria o aparecimento de erros e, concomitantemente, da impermeabilidade da criança à correção do erro pelo adulto, ou melhor, com a impossibilidade de a criança reconhecer o que na fala do adulto, em resposta a seu enunciado, apontaria para uma diferença em relação ao seu próprio enunciado. A terceira posição, por sua vez, refere-se a um deslocamento do falante em relação à sua própria fala e à fala do outro. Nela, a criança se dividiria "entre aquele que fala e aquele que escuta sua própria fala"7 7 Fundada na psicanálise, Lemos (2002) propõe que escutar não é o mesmo que ouvir, portanto, não tem relação com a atividade sensorial e fisiológica pressuposta no ato de ouvir. Refere-se, antes, à divisão enunciativa do sujeito e, portanto, à não coincidência entre a instância subjetiva que fala (e escreve!) e a instância subjetiva que escuta (e vê!) de um lugar outro. , momento em que se tornaria capaz de "retomá-la, reformulá-la e reconhecer a diferença entre sua fala e a fala do outro", ou seja, seria capaz de reconhecer a diferença entre "a instância subjetiva que fala e a instância subjetiva que escuta de um lugar outro" (LEMOS, 2002, p. 56).

Lemos (1999, 2002) é enfática ao afirmar que essas posições, eleitas como formas de interpretar como se daria a estruturação da criança como falante, não podem ser ordenadas segundo uma teleologia definidora de um processo de desenvolvimento. Nessas três posições não existiria, pois, superação, mas uma relação que "se manifesta, na primeira posição, pela dominância da fala do outro, na segunda posição, pela dominância do funcionamento da língua e, na terceira posição, pela dominância da relação do sujeito com sua própria fala" (LEMOS, 2002, p. 56).

Interpretação semelhante à de Lemos (1999, 2002) para a aquisição da fala pode ser feita para a aquisição da escrita, em especial, quando se pretende entender a segmentação gráfica que se deixa ver nesse processo. Explicando melhor: o modo como a criança segmenta seus enunciados no decurso de sua inserção no funcionamento simbólico da escrita, flutuante e heterogêneo, impõe obstáculos para entender o processo que leva a escrita da criança a estar em convergência com representações tidas como canônicas da língua (em seu modo de enunciação escrito) como um percurso de superação de etapas, tampouco como um percurso de exploração ou de tentativas malsucedidas de adequação às convenções escritas.

Parece, em vez disso, que mudanças observadas na escrita da criança quanto à segmentação resultam de movimentos de subjetivação, marcados por diferentes posições da criança na língua em sua estruturação como escrevente. Dizer isso significa assumir que a segmentação gráfica que se deixa ver em enunciados escritos infantis decorre do fato de a escrita da criança se apresentar ora predominantemente submetida à escrita do outro (primeira posição), ora predominantemente submetida ao funcionamento da língua em seu modo de enunciação escrito (segunda posição) e, por fim, predominantemente submetida à observação do próprio sujeito escrevente (terceira posição).

Essas posições podem ser detectadas pelo exame da flutuação que permeia e caracteriza a segmentação gráfica na escrita das crianças. É, pois, no convívio e no contraste entre "erros", "acertos" e "rasuras" ligadas à segmentação que se encontra a empiria que permite observar esses movimentos de subjetivação no processo de aquisição da escrita.

No exame dessa empiria, verifica-se, nos enunciados da criança, flutuação entre registros aparentemente convencionais e registros refratários a uma interpretação. Essas flutuações são espaço onde ocorrem incorporações de "palavras" e de "espaços em branco" do outro sem que, no entanto, compareçam indícios de que essa escrita seja provocada pela atuação de parâmetros convencionais. Esses momentos equivaleriam à primeira posição.

Nos enunciados infantis vê-se, também, flutuação entre "acertos" e "erros" que incidem sobre possibilidades da língua em seu modo de enunciação escrito. São momentos em que a escrita da criança desliza no compasso de possibilidades da escrita instituída – ora em convergência com as convenções ortográficas, ora em divergência com essas mesmas convenções –, embora a escrita da criança seja, ainda, impermeável ao que nela se distancia da escrita do outro. Essa flutuação parece corresponder à segunda posição.

Por fim, observam-se flutuações evidenciadas pela presença de apagamentos, escritas sobrepostas etc. Nesses momentos, a escrita da criança é efeito da possibilidade da criança "ver" a sua escrita, ou seja, de momentos em que criança reconhece diferenças entre sua escrita e a escrita do outro. A flutuação que se marca por rasuras equivaleria à terceira posição.

Em síntese, em analogia ao proposto em Lemos (1999, 2002), postula-se que o processo que leva a escrita de uma criança a modificar-se ao longo do tempo, em especial no que toca à segmentação gráfica e, em consequência, à trajetória da criança em direção à palavra escrita convencional, constitui um complexo processo que envolve o outro como instância representativa da língua (e da escrita em particular), a escrita na complexidade de seu funcionamento e a criança enquanto sujeito escrevente.

Em se tratando do modo de enunciação escrito, a simetria com a proposta de Lemos (1999, 2002) não pode, porém, ser integral. É preciso considerar, dentre outros fatos, que os movimentos de subjetivação por meio dos quais a criança, enquanto organismo, seria capturada pelo funcionamento da língua em que é significada como sujeito escrevente dependeriam, também, da inserção não sistemática do sujeito escrevente em práticas linguísticas orais e letradas historicamente determinadas (TFOUNI, 2000) e da consequente singularidade histórica desse sujeito e da " imagem que ele faz da (sua) escrita" (CORRÊA, 1997, p. 181).

Parte dessa assimetria está, assim, ligada à especificidade da escrita, que, neste artigo, ganha os matizes de como ela é definida em Corrêa (1997, 2001, 2004, dentre outros). Aqui e lá se busca um distanciamento da "visão puramente formal da escrita – que concebe a escrita como um produto acabado, com ênfase em seu papel instrumental de registro" (CORRÊA, 1997, p. 171) e das avaliações estereotipadas sobre a escrita, em especial, quando essas avaliações são feitas a partir de um modelo abstrato e idealizado do que seria a "boa escrita" (CORRÊA, 2004). Correlativamente, busca-se uma aproximação com uma concepção de escrita tomada "como um tipo particular de enunciação: a escrita em seu processo de produção, com ênfase na relação sujeito/linguagem" (CORRÊA, 1997, p. 171-2).

Vista desta perspectiva, a escrita passa a ser marcada pela diversidade linguística e histórica dos escreventes e dependente de representações que, no processo de escrever, o escrevente constrói sobre a (sua) escrita, sobre o outro e sobre si mesmo (CORRÊA, 2001). Nesse jogo de representações entre outro, escrita e sujeito, a escrita da criança constitui um momento particular do encontro das práticas orais/faladas e letradas/escritas e, portanto, é heterogeneamente constituída. Considerar a heterogeneidade da escrita permite, por exemplo, avaliar aspectos da "fala" que, em geral, estão na base da segmentação gráfica feita pela criança não como uma intervenção danosa da fala na escrita, mas, sim, como constitutiva e determinante dela.

Esse modo de entender a escrita e o processo de aquisição da escrita tem, como anunciado, efeitos sobre a maneira como se interpretam os "erros", os "acertos" e as "rasuras" quanto à segmentação observados na escrita infantil. Para os propósitos deste artigo, expõem-se, a seguir, maiores detalhes quanto à interpretação possível para o papel que as rasuras desempenhariam na aquisição da escrita.

2.2 A RASURA NO PROCESSO DE AQUISIÇÃO

O quadro teórico esboçado até aqui permite entender rasuras ligadas à segmentação presentes na escrita em aquisição como índices de uma posição da criança na língua em seu modo de enunciação escrito – a "terceira posição". Essas rasuras seriam, então, sinais de um deslocamento da criança em relação à (sua) escrita e à escrita do outro e, portanto, indícios de divisão enunciativa do sujeito escrevente. Apontariam, nesse sentido, "para a emergência de um sujeito em outro intervalo: naquele que se abre entre a instância que fala [escreve] e a instância que escuta [vê], instâncias não-coincidentes" (LEMOS, 1999, p. 12).

Não seriam, portanto, evidências de conhecimento ou de uma capacidade metalinguística e/ou metacognitiva. Colabora para essa interpretação o fato de as rasuras constituírem palco para a manifestação de grande instabilidade, uma vez que, à semelhança das pausas, reformulações e correções na fala infantil (LEMOS, 1999, 2002), não ocorrem sempre onde se fariam necessárias e, eventualmente, ocorrem quando não parecem necessárias "não sendo, portanto, previsíveis" (LEMOS, 2002, p. 62), como demonstra a Figura 3:


Na primeira "versão" deste trecho, reconhecida pelo apagamento malsucedido, a criança registrou "hora macada" (hora marcada), segmentando de acordo com o previsto pelas convenções ortográficas. Em seguida, apaga a sílaba final da palavra "marcada", registrando essa sílaba um pouco mais distante de "maca" e formando "maca da" (marca da), registro em desacordo com o esperado pelas convenções ortográficas.

Ocorrências de apagamento como essas convidam a considerar que rasuras presentes no processo de aquisição não podem ser interpretadas como provas de um escrevente atento para conter e prevenir falhas do processo de escrever ou como marcas de insucessos ou ajustamentos desse mesmo processo – a exemplo do que ocorre com as paradas-sobre-palavras estudadas por Authier-Revuz (2011, p. 658) –, já que essa interpretação suporia um ajustamento ao "correto", ao adequado às convenções ortográficas.

Assim, se é verdade que rasuras verificadas no processo de aquisição podem constituir evidências de um aparente reconhecimento, pela criança, de uma discrepância entre o que escreveu e o que supõe que deveria escrever, não há como negar que o que ela deveria escrever nem sempre corresponde à forma "correta". No quadro teórico ao qual se vincula este trabalho, "o que ela deveria escrever" é essencialmente fruto da imagem – no sentido de Pêcheux (1990) – que o escrevente mobiliza sobre a sua escrita e a escrita do outro.8 8 Imagem que pode, por sua vez, derivar dos eixos que, segundo Corrêa (2001 e 2004), os escreventes circulam no momento de sua produção escrita: (1) o da representação que o escrevente faz sobre o que imagina ser a gênese da (sua) escrita; (2) o da representação que o escrevente faz sobre o que imagina ser o código escrito institucionalizado; e (3) o da representação que o escrevente faz da escrita em sua dialogia com o já falado/escrito e com o já ouvido/lido.

Não sendo evidência de conhecimento, nem de "monitoramento" do processo de escrever, as rasuras ligadas à segmentação parecem funcionar como uma "abertura – o escapado – fora do desenrolar sintático regular da cadeia", um lugar de escuta, "de recepção e de resposta" ao que vem das palavras do outro (AUTHIER-REVUZ, 2011, p. 659). Representam, pois, momentos de conflito, de encontro e de uma aparente negociação do "um" com os outros (outros modos de segmentar, outras letras, outros dizeres, outros registros, outros significantes, outros interlocutores...) que o constituem e determinam a emergência dos enunciados escritos que produz (cf. AUTHIER-REVUZ, 1982, 1990, 2011; CAPRISTANO; CHACON, 2013)9 9 Neste artigo, as palavras outro e outros se equivalem e vinculam-se à noção de outro apresentada nos trabalhos de Authier-Revuz (1982, 1990, 2011). .

As proposições de Lemos (1999, 2002), Authier-Revuz (1982, 1990, 2011) e, também, reflexões presentes em trabalhos sobre rasura e reelaboração (supracitados) permitem afirmar, enfim, que rasuras podem ser pistas de um momento particular da relação sujeito/linguagem, com uma ordem diversa daquela observada em "erros" ortográficos e em "acertos". Nos "acertos", sobretudo naqueles que convivem com registros refratários à interpretação, a escrita da criança parece uma "colagem" de espaços em branco do outro. Nos "erros", ao menos no que diz respeito à segmentação, a escrita da criança parece fluir e deslizar "simplesmente" pelo funcionamento da língua em seu modo de enunciação escrito, refém do esquecimento de pontos sensíveis e de obstáculos com os quais, às vezes, o escrevente se depara. A rasura, ao contrário, é indício do encontro e da negociação do escrevente com esses pontos sensíveis, com esses obstáculos.

Assinala-se, como já feito em outros trabalhos (cf. CAPRISTANO, 2010b; CAPRISTANO; CHACON, 2013), que esse encontro e essa negociação podem ser examinados de forma privilegiada a partir da identificação de rasuras. Entretanto, a ausência de rasuras não equivale à ausência desses movimentos. É provável que a criança possa deparar-se com uma disparidade entre a sua escrita e a escrita do outro sem deixar marcas desse movimento. De forma semelhante, podem existir rasuras que não foram mobilizadas pelo movimento de retorno da criança, mas, sim, por intervenção de um interlocutor direto: adultos ou outras crianças com os quais, eventualmente, o escrevente interage durante o processo de escrever10 10 Os enunciados constituintes do corpus desta pesquisa, apresentados com mais detalhes na seção "Método e corpus", foram produzidos a partir de atividades realizadas em sala de aula, com o acompanhamento da(s) professora(s) responsável(is) pelas turmas das quais as crianças participavam e/ou pelo pesquisador responsável pela coleta desses enunciados. Cada criança redigia seu enunciado individualmente. Durante as coletas, o pesquisador e as professoras buscavam não intervir no processo de produção dos enunciados, deixando sob a responsabilidade das crianças as escolhas sobre "como" escrever. Nesse sentido, as rasuras presentes nesses enunciados são, provavelmente, fruto de decisões das crianças e não resultado da intervenção direta de um interlocutor. . Disso, pode-se concluir que não há relação unívoca entre a marca e o processo que ela indicia, nem entre ausência de marca e ausência de processo.

Considerando a diferença no estatuto teórico de erros, acertos e rasuras presentes na escrita das crianças, passo, nas seções seguintes, a apresentar e a examinar rasuras identificadas em enunciados escritos elaborados por crianças das séries iniciais do Ensino Fundamental I.

3 MÉTODO E CORPUS

A partir da perspectiva teórico-metodológica aberta pelo Paradigma Indiciário –como apresentado em Ginzburg (1989, 2002), Abaurre et al. (1997) e Corrêa (1997) –, foram identificadas, num corpus constituído de 708 enunciados escritos, 198 rasuras ligadas à segmentação de palavras por espaços em branco. No processo de identificação buscaram-se pistas, nos enunciados produzidos pelas crianças, que justificassem a eleição de um apagamento, de uma inserção, de uma sobreposição como uma rasura ligada à segmentação, ou seja, como um dado representativo para a pesquisa. Em situações de dúvida, nas quais inexistiam pistas que pudessem sustentar a interpretação do registro da criança como um dado, os apagamentos, inserções etc. não foram selecionados. Para exemplificar essas decisões metodológicas, apresenta-se o enunciado a seguir (Figura 4):


Nesse enunciado, verifica-se a presença de quatro momentos de rasura (sublinhados) que, em princípio, poderiam ser avaliados como dados para a pesquisa. Em todas elas, a criança parece ter se deparado com um obstáculo: o registro de "o ovo" e/ou "ovo". No entanto, apenas a terceira e a quarta rasuras foram selecionadas. Nelas, reconhece-se, por meio do apagamento malsucedido e da sobreposição, "escolhas" e "recusas" gráficas feitas pela criança quanto à segmentação. Na sobreposição, vê-se a escolha de "o ovo" e a recusa de "o v". No apagamento, observa-se a escolha de "o ovo" e a recusa de "u vo".

As duas primeiras rasuras não foram incluídas na análise pela inexistência de pistas de que nelas o conflito com o registro de "o ovo" e/ou "ovo" esteja entrelaçado, de alguma forma, com a segmentação, ou seja, com escolhas e recusas ligadas à distribuição de espaços em branco. A primeira dessas rasuras parece assinalar não propriamente um conflito com a segmentação, mas, sim, com a seleção do complemento para o verbo fazer: "ovo" ou "omelete". Nela, a criança registra, primeiro, "uvo" e, depois, "ou melête". Na segunda rasura, não é possível detectar nenhuma pista das "escolhas" e das "recusas" gráficas feitas pela criança.

Ainda com relação ao processo de identificação das rasuras, destaca-se que ele foi feito nos enunciados originais e não nas cópias digitalizadas como as que foram e serão apresentadas neste artigo. Infelizmente, há diferenças entre enunciados digitalizados e os originais: os primeiros nem sempre são cópias fieis dos últimos. No processo de digitalização, perde-se, com alguma frequência, nitidez e, por isso, em alguns momentos, torna-se difícil visualizar certas propriedades desses enunciados, como, por exemplo, rasuras representadas por apagamentos.

Os 708 enunciados escritos selecionados como corpus foram elaborados por 14 crianças que, no período de abril de 2001 a dezembro de 2004, cursaram as (antigas) primeira, segunda, terceira e quarta séries do Ensino Fundamental I, em duas escolas públicas da rede municipal de ensino de São José do Rio Preto (SP). Cada criança produziu, em média, 50 enunciados escritos, distribuídos nesses quatro anos e a partir de diversas propostas de produção textual – relatos, listas, narrativas etc. Esses enunciados foram recolhidos de um dos Bancos de Produções Textuais organizado pelo Grupo de Pesquisa Estudos sobre a linguagem (CNPq).

As 198 rasuras identificadas apresentam-se sob diferentes formas, dentre as quais a mais recorrente é o apagamento (164/198), como exemplifica a Figura 5:


O maior número de apagamento justifica-se pelo tipo de material analisado que consiste em produções textuais manuscritas registradas, em sua maioria, com lápis. Outras formas de rasura, menos recorrentes, são as inserções (23/198) e os falsos inícios (08/198), como exemplificam as figuras 6, 7, 8 e 9:





As inserções correspondem a momentos de retorno nos quais o sujeito introduz um traço ou sinal, ora para propor uma união (Figura 6) ora para propor uma ruptura (Figura 7). O falso início, por sua vez, refere-se a momentos nos quais o sujeito deixa de apagar uma letra ou uma sílaba de uma palavra e, em seguida, repete essa letra ou essa sílaba, como na Figura 8. Foram categorizados como "falsos inícios" também os momentos nos quais o escrevente insinua o registro de uma letra, deixando evidências dessa insinuação, como ocorre na Figura 9.

Dentre as 198 rasuras identificadas, verificou-se, por fim, a presença de três casos de sobreposição (Figuras 10, 11 e 12):




Na seção seguinte, passo a examinar o comportamento dessas diferentes rasuras.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Quanto aos resultados, observou-se, primeiramente, que as 198 rasuras identificadas estavam distribuídas de modo desigual ao longo dos quatro anos, como demonstra o Gráfico 1:


No corpus examinado, rasuras ligadas à segmentação são mais frequentes no período correspondente às antigas primeira e segunda séries do Ensino Fundamental I. Na primeira série (2001), foram encontradas 64 (32,3%) rasuras e, na segunda (2002), 73 (36,9%). Juntas essas rasuras somam 137 (69,2%) ocorrências. Em contrapartida, encontram-se 61 (30,8%) rasuras no período correspondente às terceira (2003) e quarta séries (2004): respectivamente, 39 (19,7%) e 22 (11,2%).

Esse mesmo comportamento é constatado em estudos longitudinais sobre erros ortográficos ligados à segmentação – cf., por exemplo, Cunha (2004), Capristano (2007b) e Cangussú (2012). Como mencionado no início deste artigo, com raras exceções, quando se observa a trajetória da criança via erros ortográficos ligados à segmentação, vê-se que enunciados produzidos em séries mais iniciais constituem lugar fecundo para o aparecimento de grande número de erros de segmentação, enquanto que séries mais finais do Ensino Fundamental I são cenários para a diminuição e o eventual desaparecimento desses erros.

Esse contraste verificado tanto em erros quanto em rasuras ligadas à segmentação deriva, sobretudo, da inserção das crianças em práticas letradas, em especial, as escolarizadas, que as colocam em contato maior e mais frequente com convenções ortográficas. Esse contato tem como decorrência a aproximação da escrita da criança com a escrita convencional.

O contraste observado na quantidade de rasuras quando se compara os dados dos primeiros e últimos anos do Ensino Fundamental I também sinaliza mudanças na relação sujeito/linguagem, já que coloca em evidência a diminuição de momentos de conflito que afetam a relação entre o sujeito e a dimensão ortográfica da (sua) escrita, no tocante à segmentação.

Um segundo resultado refere-se ao funcionamento das rasuras identificadas no corpus de análise. Todas as 198 rasuras encontradas são resultado de uma circulação complexa das crianças por práticas letradas e orais, circulação da qual emerge, de forma constante, um sujeito dividido entre duas possibilidades de segmentação, como exemplificam as três rasuras sublinhadas na figura 13, mais adiante.


Essas rasuras mostram o deslocamento do sujeito em relação à (sua) escrita, deslocamento provocado, possivelmente, pelo o encontro e o conflito do sujeito escrevente com as formas dependentes (cf. Câmara, 1970) ou com os clíticos prosódicos (cf. Bisol, 2000) na, um e do. Nelas, a proposta inicial da criança, recuperada por apagamentos malsucedidos, é a de unir esses clíticos aos substantivos aos quais eles estão relacionados, formando as hipossegmentações nacidade, umcaminhão e docaminhão. É provável que essas hipossegmentações derivem da circulação imaginária das crianças por aspectos prosódicos da língua. De forma mais específica, a ausência de espaço em branco entre o clítico e a palavra de conteúdo sugere que a criança, fundada em sua circulação por práticas orais, interpretou nacidade, docaminhão e nocaminhão como palavras prosódicas (cf. NESPOR; VOGEL, 1986; BISOL, 2000)11 11 Na proposta de Nespor e Vogel (1986), também apresentada em Bisol (1996), a palavra prosódica é um constituinte cuja principal característica é a de possuir acento primário. Ela é, também, o constituinte no qual interagem as dimensões fonológica e morfológica da gramática, embora nem sempre uma palavra prosódica coincida com uma palavra morfológica. e estabeleceu limites gráficos a partir dessa interpretação. Os clíticos, nesses episódios de rasura, funcionariam, gráfica e prosodicamente, como sílabas pretônicas das palavras prosódicas nacidade, docaminhão, nocaminhão.

A recusa dessas hipossegmentações e a consequente alteração gráfica, por sua vez, parece decorrer da atuação de aspectos convencionais do modo de enunciação escrito, em especial, da atuação de uma memória que sinaliza a autonomia gráfica desses clíticos e das palavras caminhão e cidade, memória entendida como circulação imaginária do escrevente pela constituição heterogênea da escrita e, nesses casos, em particular, pela constituição heterogênea do material significante da escrita (cf. CORRÊA, 2004).

É necessário notar que o encontro e o conflito do sujeito escrevente com os clíticos prosódicos na, um e do não ocorre em todo o enunciado e, sim, apenas em alguns pontos específicos dele. Veja-se, por exemplo, o que ocorre com o clítico um no enunciado acima (Figura 13). Esse clítico aparece quatro vezes: um acidente (duas vezes), um caminhão e um chama. No entanto, o conflito com esse clítico mostra-se apenas no momento em que ele é combinado com a palavra caminhão.

Uma hipótese explicativa para isso é a de que o clítico, aliado ao contexto sintagmático, nesse enunciado, é fator determinante para o aparecimento, ou não, de um "lugar de escuta" (AUTHIER-REVUZ, 2011, p. 659). Em um chama, o fato de haver elipse da palavra motorista, interpondo-se entre um e chama, provavelmente impediu o aparecimento de conflito, já que a elipse supõe uma nítida ruptura (semântica, sintática e prosódica) entre esses dois elementos. Em um acidente, parece ser a impossibilidade da organização prosódica suposta pela organização gráfica "umacidente" que impede o conflito. Nessa rasura, se o artigo "um" tivesse se mantido unido a acidente, geraria, umacidente, ou seja, a letra final de "um" se tornaria, graficamente, a letra inicial de uma sílaba sem correspondência na produção oral de um acidente. É, pois, a organização gráfica não correspondente a uma organização prosódica o fator que, aqui, impede o aparecimento da rasura. A rasura em um caminhão, por fim, pode ter sido favorecida pelo contexto em que ocorre: não há impedimentos sintáticos, nem prosódicos para a junção entre um e caminhão.

Com isso, fica evidente que a presença do clítico não é único fator determinante para o aparecimento ou não do movimento de retorno deste escrevente sobre o já escrito. Assim como no restante das rasuras identificadas e examinadas, parece ser uma conjunção de fatores e/ou um entrelaçamento de memórias que faz surgir esse sujeito capaz de ver a sua escrita de um lugar outro, ou, ainda, que mostra esse sujeito negociando com outros (outros modos de segmentar, outros significantes...) que o constituem e determinam a emergência dos enunciados escritos que produz.

Outro resultado importante da pesquisa ora apresentada diz respeito à imprevisibilidade do aparecimento de rasuras e, portanto, de momentos em que os escreventes se deparam com obstáculos na sua relação com a (sua) escrita. Rasuras ligadas à segmentação têm a particularidade de irromperem em "pontos sensíveis", lugares que, para o sujeito escrevente, guardam algo "de ingovernável, de descoberta e de tropeço", enfim, momentos em que, para o escrevente, " aflora a linguagem, a consistência e a resistência da língua no centro do dizer [escrever]" (AUTHIER-REVUZ, 2011, p. 658). No entanto, não há como prever qual conjunção de fatores poderá propiciar condições para o surgimento desses "pontos sensíveis" e, de modo particular, de conflitos sobre como segmentar. Cada enunciado produzido pelo escrevente é sempre um novo acontecimento que o coloca frente a diferentes possibilidades "de recepção e de resposta" ao que vem do outro (AUTHIER-REVUZ, 2011).

Assim, na rasura, o escrevente parece responder localmente "ao que lhe chega" nestes pontos sensíveis de seu dizer/escrever. Aqui, como em Authier-Revuz (2011), a expressão "ao que lhe chega" deve ser entendida em dois sentidos: "de isso que se passa para ele – uma dificuldade, uma surpresa, uma felicidade, uma lamentação... – e disso que lhe chega, que lhe é trazido por suas palavras, sem que ele saiba" (AUTHIER-REVUZ, 2011, p. 658-659).

No entanto, é "de certa forma" que a imprevisibilidade do aparecimento de rasuras deve ser considerada. Um exame dos dados identificados na pesquisa mostra que, apesar de não ser possível prever o surgimento de uma rasura e, por conseguinte, identificar os lugares de irrupção de conflitos sobre como segmentar, é necessário reconhecer que existem zonas privilegiadas para o aparecimento de rasuras, já que, nessa imprevisibilidade, encontram-se, pelo menos, duas tendências. A primeira delas refere-se à grande quantidade de rasuras que, como as examinadas acima, envolvem o conflito dos escreventes com relação à natureza gráfica de formas dependentes (cf. Câmara, 1970) ou de clíticos prosódicos (cf. Bisol, 2000). No corpus investigado, das 198 rasuras encontradas, 118 (59,6%) resultam do conflito sobre a delimitação de clíticos prosódicos quando relacionados a uma palavra de conteúdo ou associados a outros monossílabos (acentuados ou não).

Outra evidência que colabora para essa interpretação pode ser verificada na quantidade significativa de rasuras que envolvem o reconhecimento de uma sílaba no interior do que constituiria uma palavra, como definida pelas convenções ortográficas, sílaba esta que corresponde, de forma homonímica, a um clítico, como exemplifica a Figura 14:


Na primeira "versão" deste trecho, reconhecida pelo apagamento malsucedido, a criança registrou "da cidade", segmentando de acordo com o previsto pelas convenções ortográficas. Depois, a partir de sua circulação por práticas letradas, a criança parece ser afetada por uma memória que lhe indica a possibilidade de "de" ser delimitado por brancos e, por isso, apaga a sílaba final da palavra "cidade", registrando essa sílaba um pouco mais distante de "cida" e formando "cida de", registro em desacordo com o esperado pelas convenções ortográficas. É preciso notar que essa rasura pode, também, resultar da ação simultânea dessa memória com uma outra: a que sinaliza para a criança a possibilidade de "cida" ser delimitado por brancos, já que poderia corresponder, apenas graficamente, à abreviação do nome próprio Aparecida (Cida), abreviação bastante comum com a qual, muito provavelmente, a criança teve contato por meio de sua circulação por práticas orais/letradas.

Das 198 rasuras encontradas, 23 (11,6%) resultam do conflito que envolve, de diferentes formas, a delimitação de sílabas que, graficamente, podem corresponder a clíticos. Somadas as rasuras que, de alguma forma, envolvem clíticos, temos o resultado exposto pelo Gráfico 2:


Outra tendência é o aparecimento de conflitos envolvendo monossílabos acentuados. Dentre os dados categorizados como "Outros conflitos", 19 (33,3%) envolvem esses monossílabos. Essa tendência mostra-se, também, em rasuras que emergem de um conflito que envolve o reconhecimento de um monossílabo acentuado no interior do que convencionalmente constituiria uma palavra, como exemplifica a Figura 15:


No corpus selecionado, foram encontradas 6 (10,5%) rasuras com as mesmas características da apresentada na Figura 15. Somadas as rasuras que envolvem, de alguma forma, conflitos com monossílabos acentuados, chega-se a um total de 25 rasuras, correspondentes a 43,9% da totalidade das rasuras categorizadas como "Outros conflitos".

Dos dados apresentados, conclui-se que não são quaisquer fatos que permitem desencadear uma rasura e, por consequência, não são quaisquer fatos que se tornam obstáculos para o sujeito no processo de escrever. Com relação à segmentação, é possível distinguir a existência de lugares de "escuta" preferenciais, pontos da relação sujeito/linguagem mais propícios para engendrar conflitos sobre como segmentar. No corpus analisado, clíticos (e seus homônimos) e monossílabos acentuados (e seus homônimos) são esses lugares de escuta, esses pontos sensíveis.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo, o objetivo foi o de apresentar resultados de pesquisa centrada na investigação do papel e do funcionamento de rasuras vinculadas, de formas diferentes, à segmentação de palavras por espaços em branco, no processo de aquisição da escrita. Quanto ao papel dessas rasuras, creio poder afirmar que elas constituem, para o sujeito escrevente, um lugar de negociação com os outros (outros modos de segmentar, outras letras, outros dizeres, outros registros, outros significantes, outros interlocutores...) que o constituem e determinam a emergência dos enunciados escritos que produz (cf. AUTHIER-REVUZ, 1982, 1990, 2011; CAPRISTANO; CHACON, 2013). Em outras palavras, as rasuras são lugar de escuta, de recepção e de resposta do um ao que lhe vem das palavras do outro.

Para o pesquisador interessado no processo de aquisição da escrita, por sua vez, a rasura é, também, um lugar onde é possível observar um deslocamento do sujeito escrevente em relação à (sua) escrita e à escrita do outro, momento em que aparentemente reconhece uma diferença entre a instância subjetiva que escreve e a instância subjetiva que vê de um lugar outro, a exemplo do que ocorre com as reformulações, pausas e correções observadas por Lemos (2002) na fala infantil. São, assim, pistas de uma mudança de posição da criança no modo de enunciação escrito, que põem em cena uma das facetas que pode assumir a relação sujeito/linguagem: aquela de um sujeito dividido entre a sua escrita e uma escrita outra.

Quanto ao funcionamento das rasuras ligadas à segmentação, é possível elencar três características: (a) a complexidade do funcionamento dessas rasuras, sempre produtos de um entrelaçamento de memórias que mostram um sujeito dividido entre, pelo menos, duas possibilidades de segmentação; (b) a imprevisibilidade, ou seja, o fato de emergirem, a cada vez, como parte de um novo acontecimento que coloca o sujeito escrevente frente a diferentes possibilidades de resposta ao que vem do outro; e, por fim, (c) a tendência, apesar da imprevisibilidade, para emergirem quando o sujeito escrevente encontra-se com clíticos e seus homônimos (principalmente) ou com monossílabos acentuados e seus homônimos.

Recebido em: 04/06/13.

Aprovado em: 02/12/13.

Notas

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  • ABAURRE, M. B. M.; SILVA, A. O desenvolvimento de critérios de segmentação na escrita. Temas em psicologia. São Paulo, v. 1, p. 89-102, 1993.
  • ABAURRE, M. B. M. et al. Cenas de aquisição da escrita: o sujeito e o trabalho com o texto. Campinas: Mercado de Letras, 1997.
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  • ______. História inventada: relações entre (im)previsível e a rasura. Manuscrítica. São Paulo, v. 8, p. 209-220, 1999.
  • ______. Rasura oral e autonímia no processo de escritura. Letras de Hoje. Porto Alegre (RS), v. 39, n. 3, p. 207-221, 2004.
  • CALIL, E; FELIPETO, S. Rasuras e operações metalinguísticas: problematizações e avanços teóricos. Cadernos de Estudos Linguísticos. Campinas, v. 39, p. 95-110, 2000.
  • ______. Entre o oral e o escrito: as posições de sujeito nas rasuras. Letras de Hoje. Porto Alegre, n. 125, p. 347-353, 2001.
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  • CAPRISTANO, C. C.; CHACON, L. C. Relações metafóricas e metonímicas: notas sobre a "aquisição" da noção de palavra (no prelo), 2012.
  • CHACON, L. Constituintes prosódicos e letramento em segmentações não-convencionais. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 39, n. 3, p. 223-232, 2004.
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  • ______. Concepções de "palavra" em escolas de educação infantil. Scripta, Belo Horizonte, v. 13, p. 165-178, 2010.
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  • CUNHA, A. P. N.; MIRANDA, A. R. M. A hipo e a hipersegmentação nos dados de aquisição de escrita: a influência da prosódia. Alfa: Revista de Linguística, São José do Rio Preto, v. 53, p. 127-148, 2009.
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  • NESPOR, M.; VOGEL, I. Prosodic phonology. Dordrecht: Foris Publications, 1986.
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  • _____. Letramento e segmentações não-convencionais de palavras. In: TFOUNI, L. (Org.) Letramento, escrita e leitura. Campinas: Mercado de Letras, 2011. p. 229-243.
  • TFOUNI, L. V. Letramento e alfabetização. São Paulo: Cortez, 2000.
  • 1
    Resultados parciais desta pesquisa foram apresentados em Capristano (2010b).
  • 2
    Para um aprofundamento dessa discussão cf., por exemplo, Abaurre (1991), Abaurre e Silva (1993), Chacon (2004, 2005, 2010), Cunha (2004, 2010), Cunha e Miranda (2007, 2009), Silva (1993), Tenani (2004, 2008, 2010, 2011), dentre outros.
  • 3
    Cf. Capristano (2004, 2007a).
  • 4
    Cf. Capristano (2007b, 2010b) e Capristano e Chacon (2013).
  • 5
    Nesses trabalhos, rasuras também são nomeadas como
    reelaborações,
    reescritas e/ou
    marcas de correção.
  • 6
    As reflexões que desenvolvo nesta seção retomam, algumas vezes quase sem alterações, parte das discussões feitas em minha pesquisa de doutoramento, intitulada
    Mudanças na trajetória da criança em direção à palavra escrita, defendida no IEL/Unicamp em 2007 (cf. CAPRISTANO, 2007b).
  • 7
    Fundada na psicanálise, Lemos (2002) propõe que
    escutar não é o mesmo que
    ouvir, portanto, não tem relação com a atividade sensorial e fisiológica pressuposta no ato de ouvir. Refere-se, antes, à divisão enunciativa do sujeito e, portanto, à não coincidência entre a instância subjetiva que fala (e escreve!) e a instância subjetiva que escuta (e vê!) de um lugar outro.
  • 8
    Imagem que pode, por sua vez, derivar dos eixos que, segundo Corrêa (2001 e 2004), os escreventes circulam no momento de sua produção escrita: (1) o da representação que o escrevente faz sobre o que imagina ser a gênese da (sua) escrita; (2) o da representação que o escrevente faz sobre o que imagina ser o código escrito institucionalizado; e (3) o da representação que o escrevente faz da escrita em sua dialogia com o já falado/escrito e com o já ouvido/lido.
  • 9
    Neste artigo, as palavras
    outro e
    outros se equivalem e vinculam-se à noção de
    outro apresentada nos trabalhos de Authier-Revuz (1982, 1990, 2011).
  • 10
    Os enunciados constituintes do
    corpus desta pesquisa, apresentados com mais detalhes na seção "Método e
    corpus", foram produzidos a partir de atividades realizadas em sala de aula, com o acompanhamento da(s) professora(s) responsável(is) pelas turmas das quais as crianças participavam e/ou pelo pesquisador responsável pela coleta desses enunciados. Cada criança redigia seu enunciado individualmente. Durante as coletas, o pesquisador e as professoras buscavam não intervir no processo de produção dos enunciados, deixando sob a responsabilidade das crianças as escolhas sobre "como" escrever. Nesse sentido, as rasuras presentes nesses enunciados são, provavelmente, fruto de decisões das crianças e não resultado da intervenção direta de um interlocutor.
  • 11
    Na proposta de Nespor e Vogel (1986), também apresentada em Bisol (1996), a palavra prosódica é um constituinte cuja principal característica é a de possuir acento primário. Ela é, também, o constituinte no qual interagem as dimensões fonológica e morfológica da gramática, embora nem sempre uma palavra prosódica coincida com uma palavra morfológica.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      04 Jun 2013
    • Aceito
      02 Dez 2013
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