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A subjetividade coletiva e a coordenação da economia

O INDIVIDUALISMO E SEUS CRÍTICOS

A subjetividade coletiva e a coordenação da economia

José Maurício Domingues

Professor do Departamento de Ciências Sociais do Instituto de Filosofía e Ciências Sociais da UFRJ

"Não há dúvida de que o socialismo soviético 'stalinista' (e na verdade Lenin também) deu uma ênfase por demais exclusiva ao chamado coletivo, negligenciando os direitos e interesses dos indivíduos. Não há dúvida para mim que Friedman e os 'individualistas metodológicos' vão longe demais na outra direção. A despeito de Mrs. Thatcher, existe essa coisa que se chama de sociedade e dentro dela existem sub-unidades que são mais que os indivíduos que as compõem: essas podem ser a cidade de Glasgow, os Guardas de Grenadier, o justamente famoso conjunto arquitetônico dos terraços de Bath, a Orquestra Sinfônica de Chicago, o sistema de transporte público de Munique, um jardim botânico, Marks and Spencer's, Sony, o Hospital de Santa Maria e daí por diante" (Nove, 1991, p. xii).

A história das ciências sociais em geral e a da Sociologia em particular têm-se caracterizado por uma forte polarização entre os conceitos de indivíduo e sociedade - ou, mais contemporaneamente, sistema ou estrutura. A citação de Alec Nove acima coloca em cheque precisamente esse postulado, pois que claramente elementos de mediação fazem-se presentes em seu argumento, em contraste com o que se vê proposto por individualistas metodológicos e mesmo, até certo ponto, por autores que trabalham com visões mais totalistas da vida social. No entanto, é preciso explorar mais profundamente essa questão teórica; sobretudo, é necessário clarificar a noção de coletividade que permitiria fazer efetivo esse tipo de postulado.

O objetivo deste artigo é enfrentar esta última questão. Para isso se introduzirá o conceito de subjetividade coletiva. Com isso, organizações e o espectro mais amplo de coletividades que se referem à economia e à administração poderão ser focalizados, com acesso também a conceituações produzidas nessas áreas específicas. A formulação aqui apresentada evita, ademais, a reificação de coletividades, freqüentemente denunciada na Sociologia e nas ciências sociais em geral, sem renunciar, em compensação, a seu reconhecimento e teorização.

Primeiramente, é necessário tratar das origens teóricas dessa fixação no indivíduo e na sociedade e das alternativas a ela. Em seguida, analisarei algumas questões empíricas relativas à economia, às organizações, ao papel do Estado e às classes sociais. Um novo conceito de subjetividade coletiva será então introduzido para lidar de modo mais flexível com esses temas. Enfim, teremos ocasião de refletir sobre a relação entre Estado e economia, Estado e bem-estar social.

Antes de passar a isso, todavia, é necessário especificar os princípios de organização da vida econômica vigentes no mundo contemporâneo, e explicitar a terminologia que será daqui em diante utilizada. A conceituação de Berger (1990, p. 10) nos oferece um ponto de partida:

"Por mercado se quer usualmente caracterizar um mecanismo alocativo e distributivo, a contraparte do qual não é o Estado, mas hierarquia e planejamento. Enquanto o ato unidade dos mercados é a troca voluntária, o ato unidade das hierarquias é comando. Pode-se ainda sugerir que o "ato unidade" das "redes" é a "colaboração voluntária"1 1 Desenvolvo aqui este conceito buscando articulá-lo a questões econômicas e organizacionais. Exposição mais detalhada de sua base filosófica e sociológica geral encontra-se em Domingues, 1995 e 1996a. .

Enquanto a hierarquia necessariamente pressupõe posições desiguais - ao menos dentro de contextos específicos -, troca e colaboração podem ou não se dar em bases igualitárias, embora diferenciais de poder possam também se fazer presentes. Acresce que "mercados" não devem ser vistos como o encontro quase aleatório de agentes regulados meramente pela oferta e pela procura; são antes múltiplos e desenhados pelas interfaces que, de modo mais ou menos estável, articulam atores e coletividades no processo de troca (veja White, 1988 e 1993). Além disso, deve-se ter em mente que há arranjos específicos em que mercados, redes e hierarquias, cada qual em si também concretamente articulados de formas diversas, encontram-se imbricados nos processos sócio-econômicos (como demonstram, no que se refere ao entrelaçamento organizacional e de propriedade dos grandes conglomerados, sobretudo nos casos da Alemanha e da Inglaterra, mas também do Japão e dos Estados Unidos, Windolf e Beyer, 1995). Essas três formas de coordenação da vida econômica, se bem que possam por vezes ser encontradas em sistemas concretos de modo quase puro, têm sobretudo caráter analítico, e, portanto, em geral acham-se combinadas na realidade. Ademais, apontam para o caráter interativo da vida social, uma vez que implicam sempre relações entre indivíduos e grupos, antes que somente a ação do indivíduo isolado. A estas três formas de coordenação deve-se acrescentar outros princípios de organização da vida econômica, que, presidindo a incorporação da força de trabalho no processo produtivo e combinando-se de formas variadas ao longo da história, em si mesmos resumem-se a uns poucos (conforme sugestão de Hobsbawn, 1964, p. 59): escravidão e servidão (coletiva ou individual) - com um continuum entre as duas, que possuem ademais caráter hierárquico; trabalho assalariado - caracterizado pelo princípio de mercado; ou comunitário - que conforma redes, que podem, contudo, possuir ainda um elemento de hierarquia. Tantos estas formas de incorporação da força de trabalho quanto aquelas formas gerais de coordenação, enquanto categorias analíticas, podem ser vistas, quando abstraídas dos contextos específicos em que efetivamente têm vigência, como contexto-independentes, pois encontram-se ao longo da história humana como os princípios mais gerais que organizam a vida econômica. Suas combinações específicas e, nestas combinações, outros elementos que não possuem aquele nível de ubiqüidade e generalidade, devem ser vistas, por outro lado, como contexto- dependentes.

CLASSES E ATORES COLETIVOS

A teoria social que emergiu com a Ilustração consubstanciou uma visão atomística da vida social. O subjetivismo que emergiu com a Reforma Protestante, implicando um ego coeso, cristalino e fortemente delimitado e autônomo face a outros egos, mais o ativismo transformador que se dissemina no Ocidente a partir do ascetismo orientado para o mundo que aquela religião impulsionou, encontram-se na base desse tipo de subjetividade. Descartes, produzindo um indivíduo isolado e transparente em relação a si mesmo, deu passo crucial na mesma direção (Nelson, 1969). Hobbes, derivando suas pressuposições desse tipo de subjetivismo e da Física, concebeu a sociedade como conjunto de indivíduos dispersos. Sua visão teve enorme impacto nas discussões subseqüentes (Cassirer, 1931; Domingues 1995, cap. 1). Como a ordem social se constitui tornou-se, desde então, questão essencial para o pensamento social. Locke e Adam Smith optaram, então, pela idéia da identidade natural de interesses individuais em princípio desconexos. Daí adviria a perspectiva da "mão invisível" do mercado, que possibilitaria uma coordenação precisa da ação de sujeitos livres, os quais agiriam de acordo com suas inclinações e desejos, o resultado geral - independentemente das intenções dos agentes -consistindo em proveito coletivo (Halévy, 1934, cap. 1; Parsons, 1937, pp. 90ss). Os conservadores românticos introduziram, por seu turno, a idéia de organismo social que preexiste e se sobrepõe aos indivíduos (Mannheim, 1925). Embora se inverta a preeminência dos indivíduos em face da sociedade nesse movimento de reação à Ilustração, nem por isso aqueles dois conceitos básicos perdem a centralidade que haviam recebido dos philosophes iluministas e dos utilitaristas.

Autores contemporâneos como Habermas ou Giddens reproduzem a mesma polarização entre indivíduo e sociedade. Habermas (1981) fala de ação individual - comunicativa, estratégica e instrumental -, com a contrapartida de "mundos da vida" (a esfera da cultura) e sistemas (econômicos e político-administrativos) passivos no que se refere ao tema da ação. Giddens (1976, p. 121; 1979, p. 64) teoriza a "dualidade da estrutura", a qual implica uma relação dialética entre atores individuais e estruturas (passivas), com sistemas consistindo em meros padrões de relações entre os atores. Se Habermas (ao longo de todos os seus trabalhos) parece incerto quanto ao papel de coletividades, Giddens (1984, pp. 220-1) claramente recusa a idéia de coletividades enquanto agentes. Ademais, a economia e o sistema político-administrativo aparecem em Habermas como meros organismos funcionais; as organizações que os compõem são claramente delimitadas de seus meios (incluindo a personalidade de seus membros individuais) (Habermas, 1981, B. II, pp. 226, 240ss, 453-60 e 478). Ele entra assim em contradição com idéias básicas das teorias contemporâneas da organização (Mouzelis, 1991, pp. 178-80; veja, mais genericamente, Fleury e Fischer, 1992) e com as pesquisas desenvolvidas pela tradição das "redes de interação social", pois que aquelas delimitações e lógica instrumentais puras não ocorrem na prática: relações pessoais são decisivas mesmo para os tipos de sistema social mais formais (Francis et a/., 1991 e Swedberg, 1993). Giddens, que de modo geral põe grande ênfase na reflexibilidade da ação individual, mas também em conseqüências não intencionais da ação, evidencia as inclinações individualistas que marcam seu pensamento ao discutir teorias econômicas contemporâneas. Embora não se deva afiar em excesso o gume da crítica, pois ele menciona suas limitações em relação ao tópico e refere-se a elementos institucionais, seu raciocínio aponta fundamentalmente para a reflexibilidade de atores que constituem o centro da análise nas "teorias das expectativas racionais", e para os limites dessa reflexibilidade (Giddens, 1987).2 2 Esses atores são, ao que parece, sempre indivíduos. A não ser que, como de hábito ad hoc, ele tenha em mente também coletividades enquanto atores, aí, contudo, sem teorização; mesmo porque não enfrenta as contribuições teóricas contemporâneas que, nesse campo, lidam com a constituição de coletividades

Marx e Parsons propuseram duas alternativas importantes a essas idéias. O conceito de classe social cumpria precisamente esse papel. Enquanto subjetividades coletivas, as classes fazem a mediação entre indivíduos e sociedades; a mais-valia, por exemplo, é uma relação social entre coletividades - trabalhadores e burgueses (Marx, 1867, pp. 198ss). Por sua vez, Parsons (1951, p. 4; com Shils, 1951, pp. 56, 61 e 192-3) propôs a idéia de ator coletivo. Para ele, atores individuais seriam de grande importância, mas coletividades forneceriam mais um elemento analítico de sua segunda fase de elaboração teórica. Uma série de problemas se apresenta nessas formulações. Não apenas Parsons no fim das contas dissolve seus atores coletivos nos indivíduos que os compõem; tanto ele quanto Marx assumem o sujeito individual da Ilustração como o modelo de seus conceitos de subjetividade coletiva - classes sociais e atores coletivos.

Descartes propôs um sujeito do conhecimento auto-centrado e transparente a si mesmo, o qual seria transformado em ser social ativo por Hobbes (Parsons, 1968). Marx (1847, p. 135) fala, seguindo essa idéia, de classes "em si" que se transformam em "para si". Em O Dezoito Brumârio de Louis Bonaparte (1852, p. 199), o problema do campesinato francês é, precisamente, ser incapaz de operar essa transição, natural e inevitável na classe operária fabril, segundo ele. Parsons, tomando o modelo das organizações, envereda pelo mesmo caminho. Em O Sistema Social, coletividades - sempre atores coletivos - e sistemas sociais constituem um mesmo e único conceito, apesar de problemas futuros já se anunciarem neste momento (Parsons e Shils, 1951, p. 61). Em sua terceira fase, mais funcionalista, organizações formais se apresentam como o modelo de coletividades, que se distinguem agora de outros sistemas sociais.

Na verdade, a posição de Parsons, evidente ao discorrer sobre a economia, é significativa da questão que quero assinalar. Sua conceituação é emblemática das teorias ortodoxas das organizações:

"Um sistema social...é qualquer sistema gerado pela interação de duas ou mais unidades comportamentais".

Em compensação,

"Uma coletividade, por outro lado, é um tipo especial de sistema social, o qual é caracterizado pela capacidade de ação concertada'. Isso implica a mobilização dos recursos da coletividade para atingir metas específicas e usualmente explícitas; isso implica também a formalização de processos de tomada de decisão em nome da coletividade como um todo...A organização formal (especificamente a burocracia em sentido lato) é o protótipo de tal sistema (Parsons e Smelser, 1956, 14-5)3 3 Para a posição de Parsons face a questões econômicas, veja Holton, 1986; para sua visão de organizações, veja Parsons, 1960, e as discussões que se desdobram em Black, 1976. .

Com isso, entretanto, comete-se um duplo erro. Não apenas se distorce a natureza real das organizações, jamais tão centradas e sob controle como no modelo proposto por Parsons. Mais que isso, a conceituação dos sistemas sociais em geral deixa de lado um fenômeno fundamental, qual seja, sua causalidade coletiva - a qual não deve ser, em contrapartida, pensada de acordo com aquela do ator individual proposto por Descartes e Hobbes.

Examinemos agora algumas questões de conteúdo mais diretamente empírico, de modo a deixar clara a referência concreta desse tipo de conceito, para passar, em seguida, a uma noção de subjetividade coletiva mais ampla e flexível.

MERCADO E ESTADO

Podemos começar focalizando o comportamento de consumidores no mercado. Segundo Offe (1981a), a dispersão dos consumidores face às empresas nas economias capitalistas faz com que sua organização seja no mínimo improvável. Não há nada a objetar em tal caracterização, embora quando se passa de consumidores individuais para empresas como consumidoras a situação se altera e a probabilidade de organização e ação conjunta se multiplica, a despeito dos problemas que isso em contrapartida cria. Mas, para facilitar o argumento, fiquemos com a primeira e extrema opção, que implica, no limite, consumidores dispersos em um mercado ideal. Pode-se dizer que a dispersão dos consumidores impede sua eficácia frente aos produtores? De modo algum. Em que medida consumidores continuam fiéis a um produto qualquer ou decidem trocá-lo por um produto de outro fabricante tem um impacto decisivo sobre a situação desses produtores e sobre o mercado como um todo. Isso pode, e na situação ideal considerada deve, acontecer evidentemente como um resultado não intencional da ação destes atores, que seguem meramente seus interesses individuais. É claro, a potencial oligopolização da produção, contrapondo-se a consumidores dispersos, favorece - via o maior centramento dos produtores - seu poder sobre o mercado e o consumo, levando a problemas de "oportunismo" e "pequenos números", bloqueando racionalidade e transações, e levando firmas a internalizar a produção de insumos (Williamson, 1975).

Podemos daí extrapolar para a economia como um todo. Quando se considera a economia como um sistema de relações sociais, interna e externamente, entre atores individuais e coletividades - como fazem, por exemplo, Marx e Polanyi -, o raciocínio acima desenvolvido assume grande importância.

Internamente, pode-se dizer que as relações entre indivíduos e coletividades, e não a causalidade abstrata de sistemas passivos, estabelecem o tecido e a dinâmica da economia. Indivíduos e firmas, pequenas e de grande porte, interagem e exercem um impacto causal, mais ou menos disperso ou concentrado - ou seja, variavelmente (des)centrado -, uns sobre os outros. Nesse sentido é que a citação de Nove com a qual esse artigo se inicia assume total relevância. A economia não é nem um sistema compacto e indiferenciado nem a mera soma da ação de indivíduos. O próprio valor-trabalho das mercadorias é fruto de relações sociais, enquanto derivado da distribuição do tempo de trabalho socialmente necessário para produzi-las (Marx, 1865, cap. 1). Classes sociais têm um papel fundamental a cumprir nesse sentido, em particular face ao mercado de trabalho, mas de modo mais genérico, estruturando relações de poder e padrões de consumo que cruzam a economia e a sociedade como um todo. Marx (1845-6, p. 61; 1848, p. 474) originalmente criticou o individualismo economicista e analisou o papel da ideologia e da coerção econômica para a organização da classe operária em suas lutas contra a burguesia: opções individualistas ou coletivistas poderiam advir dessa situação.4 4 Olson (1965) retomou esse tipo de questão; de um ângulo excessivamente individualista, contudo. Para ele, um número grande de indivíduos dificilmente chega a se organizar para a ação coletiva, visto que a possibilidade de assegurar benefícios independentemente da participação opera como um desestímulo. Hardin (1982), mostrando que certos indivíduos poderiam de fato assumir o esforço e o custo da organização coletiva - desde que eles se beneficiassem com isso -, já introduziu uma visão mais complexa dentro mesmo desta tradição individualista utilitária. As relações entre capitalistas coletivamente tomados (Gesammtkapitalist) e a classe trabalhadora coletivamente considerada (Gesammtarbeiter) respondem, em grande medida, pela dinâmica da economia. Nesse sentido, ele e Engels referem-se ao capital como o equivalente direto, em termos de categorias econômicas, da burguesia (Marx e Engels, 1848, p. 468; Marx, 1865, pp. 147ss; 1867, pp. 268-9, 644ss e 681-3); o capital não é, portanto, de uma coisa, ao contrário da visão comum às ideologias burguesas, mas de uma coletividade em relação de exploração com uma outra classe:

"Ser um capitalista não significa apenas assumir uma posição pessoal, mas uma posição social na produção. O capital é um produto social geral e pode ser compreendido somente através da generalidade de seus diversos membros, ou seja, em última instância somente através da generalidade de todos os membros da sociedade pode ser ele posto em movimento (Marx e Engels, 1848, p. 475)".

Esse é o caso também quando Marx (1894, pp. 822ss) analisa a estrutura de classe das sociedades capitalistas: à "fórmula trinitária" - trabalho, capital e solo - correspondem três classes sociais. Movimento (classes) e estrutura (categorias econômicas) são, deste modo, uma e a mesma coisa, com expressões distintas apenas, de acordo com o objetivo da investigação - mais histórica ou mais categorial-analítica.

Ao discutir a atipicidade da economia capitalista de mercado, a qual contrasta com outros sistemas econômicos baseados em reciprocidade, solidariedade e hierarquia - suas referências são sobretudo comunidades "arcaicas" e sociedades feudais -, Polanyi (1944) chamou a atenção para o impacto da ecomonia - enquanto subsistema de relações sociais -sobre o conjunto da sociedade. O "moinho satânico" do mercado capitalista, na verdade criado pelo Estado, mostrou-se particularmente nocivo e destrutivo das solidariedades sociais mais gerais; ademais, a dinâmica do mercado tende a entrar em choque, de acordo com ele, com o bem-estar social e com a democracia5 5 Para uma discussão original das idéias de Polanyi, veja Santos, 1988, caps. 1-2. O contexto de seu debate com os neoclássicos (formalistas) é reconstituído por Granovetter, 1993. . Parsons (1961, pp. 34ss; com Smelser, 1956, caps. 1-2) pôs também grande ênfase na economia enquanto sistema social. De um lado, fala ele da economia como elemento analítico, presente em todos os sistemas sociais, responsável pela adaptação do sistema ao meio ambiente. Mas ele fala da economia também como sistema social concreto, ao qual nega, no entanto, como vimos acima, a qualidade de ator coletivo. É verdade que seria equivocado tratar sistemas econômicos como sujeitos semelhantes a indivíduos e organizações. Isso não implica que, enquanto coletividades, eles não exerçam um poderoso impacto sobre outros sistemas sociais - famílias, sistemas políticos, etc. - ou uns sobre os outros, como, por exemplo, no mercado mundial. O problema não se encontra na caracterização da economia como subjetividade coletiva, mas na estreiteza do conceito de ator coletivo proposto por Parsons.

Como observei acima, organizações, teorizadas de forma bastante ortodoxa, forneceram o modelo para o conceito de ator coletivo em Parsons. Contudo, a despeito de sua profunda influência de retorno nesse campo, a revisão daquele tipo de teoria se fez aceleradamente e com grande alcance logo após haver ele lançado suas idéias.

É verdade que, ainda hoje, "senso de propósito e especificidade de metas parecem ser os dois critérios cruciais para diferenciar organizações de outros tipos de unidades sociais" (Mouzelis, 1967, p. 4). Mas um grande número de outros problemas tem sido levantado. Dentro de uma perspectiva funcionalista, a questão das áreas de "incerteza" interna às organizações e às burocracias de forma mais geral tem recebido atenção (Crozier, 1963) e a positividade de laços entre subordinados, contra regras formais, tem sido igualmente assinalada (Blau, 1955, especialmente cap. 7). A coerência e o consenso face a metas, assim como seu deslocamento, com o que meios para alcançá-las se transformam em fins em si mesmos, são fenômenos que têm sido apontados, em parte sob a influência de Weber. Na verdade, metas podem tornar-se meramente símbolos de legitimação, com os fins de certos grupos assumindo, de fato, preeminência (Silverman, 1970, pp. 8-9, 14). Alternativas relativas a sistemas abertos, como "teorias da contingência", se apresentaram aos impasses do funcionalismo, embora hoje não haja claro paradigma dominante na área. Enquanto o funcionalismo e a teoria dos sistemas se baseiam nas metáforas românticas e biológicas que interpretam organizações como organismos com propósito e racionalidade, necessidades e unidade funcional, aquelas alternativas recusam esse universalismo e centramento e afirmam o caráter contexto-dependente das organizações e de sua direção (Hassard, 1993, pp. 45-51; e, sobretudo, Perrow, 1970).

Originariamente, as teorias da firma de corte neoclássico trataram organizações econômicas como uma caixa preta, em sua simplicidade e unidade. Nesse modelo - dedutivo - a firma aparecia como um dado simples, constrangida pelo mercado em sua busca da maximização do lucro; o único conteúdo empírico do modelo resumia-se, assim, à descrição do mercado (Cyert e Hedrik, 1988). Essa situação, a exemplo do que ocorreu na teoria das organizações, se alterou significativamente. O tema da "racionalidade limitada" pôs em evidência problemas de organização e centramento. Não apenas o meio coloca limites à racionalidade das organizações econômicas; a organização ela mesma - enquanto "processadora de informações" - tem problemas para operar racionalmente (Simon, 1982, pp. 409-11, e também March e Simon, 1958, cap. 6)6 6 Pode-se observar ainda que, ao acentuar as consequências não-intencionais da ação, fruto em parte da ignorância dos agentes sobre as condições completas de sua ação, e a transformação da economia em uma ciência "agônica", uma vez que manipulada pelos agentes e assim manifestando eficácia reduzida, Santos (1990) aponta para um outro aspecto da "racionalidade limitada" e, de modo geral, para o descentramento do sujeito no que se refere aos sistemas econômicos. . Além disso, a idéia de que centralização em si é produtiva para a organização foi posta em dúvida: como Simon (1982, p. 449) observou, a centralização tem custos e desvantagens - sobrecarga em supervisão, restrição da ação de subordinados - do mesmo modo que a descentralização - que pode levar à divergência das metas dos subordinados face à organização, por exemplo. Por seu turno, Williamson (1975, pp. 8-9, 25, 248, 257) enfatizou que mercados e hierarquias são de fato formas alternativas de organização econômica, cuja eficiência específica varia de caso para caso de acordo com variáveis como racionalidade limitada, número de participantes, etc. Deste modo, a estrutura interna das organizações demanda análise detalhada, no que se refere a organizações diretamente relacionadas ao mercado ou a outras, públicas, como hospitais, sistemas de ensino, etc.

Nesse contexto, as reflexões de Thompson (1982, pp. 236-7), em sua crítica às teorias ortodoxas da firma, são mais que apropriadas:

"A gerência, ou a agência de direção, tem sempre de encarar uma série de obstáculos e limites contra os quais coloca suas próprias tarefas e objetivos...Competências e interesses organizados em torno a esses centros parciais de conhecimento e influência são ciumentamente defendidos dentro de qualquer organização. O papel da agência de direção é tentar reconciliar essas concepções e interesses conflitantes. Isso é sempre um processo de negociação com respeito ao que ela concebe serem os limites e obstáculos que ela encara. O resultado provavelmente constitui uma série de compromissos e alianças; o momento em que eles são assegurados sendo também o momento em que estão em processo de dissolução, reformulação e renegociação,..".

De fato, organizações constantemente lutam contra essa dispersão sempre possível, a qual ameaça sua eficiência e mesmo, no limite, existência. Outros sistemas sociais, como mercados, por exemplo, são caracterizados precisamente por baixo nível de centramento e intencionalidade. Isso não quer dizer, todavia, que não consistam em subjetividades coletivas. Por isso, por exemplo, firmas japonesas fazem enorme esforço para garantir a socialização de seus empregados de acordo com os valores e objetivos da empresa, o que se combina, por outro lado, com uma aceitação apenas parcial do fordismo - tanto no que se refere ao controle da força de trabalho quanto ao processo de tomada de decisões -, o que propicia centralização desassociada de rigidez. Valores comuns e alto grau de intimidade entre os funcionários se somam aos fatores que levam ao questionamento, com base no caso japonês, do modelo weberiano de burocracia, ao que parece verdadeiro somente para o Ocidente (Ouchi, 1981). Mais uma vez esse tipo de reflexão nos coloca frente a problemas relativos ao tema do (des)centramento das subjetividades coletivas e da variação de seu nível. Parece claro que a noção de que sistemas sociais podem ser vistos em termos do molde de indivíduos cartesiano-Hobbesianos não se sustenta. De forma a abarcar o conjunto dos sistemas sociais, sem apagar, por outro lado, as diferenças entre eles, é preciso que uma conceituação mais ampla e menos comprometida com e por aquela herança da Ilustração seja avançada. A próxima seção se ocupará dessa tarefa.

Antes de passar a ela, entretanto, observemos que se Hayek (1945), com grande acuidade, apontou para o saber econômico tácito que não pode ser substituído por uma administração centralizada, ele se equivocou inteiramente ao contemplar apenas o empreendedor capitalista individual como capaz de produzir esse saber e ao reservar ao mercado o papel de mecanismo exclusivo de articulação desse conhecimento. Na verdade, coletividades mais provavelmente produzem e detêm esse saber (como experiências cooperativas em Modena, Itália, e Mondragón, no País Basco demonstram) de forma potencializada; ademais, o mercado, a despeito de sua eficiência em muitos sentidos, não é a forma única de articulação externa desse saber: "redes", igualitárias (ou não), em parceria com o Estado (ou não), podem ainda mais potencializar, ao generalizá-lo, o saber tácito dos produtores, combinando-o por vezes com um saber técnico-científico produzido por especialistas (veja Elson, 1988, e Wainwright, 1994 - mas para uma visão mais pró-capitalista, veja Lazerson, 1993). Não apenas indivíduos, portanto, mas múltiplas subjetividades coletivas devem ocupar o centro da cena ao discutir-se o Estado e a economia.

UM CONCEITO DE SUBJETIVIDADE COLETIVA

Contemporaneamente, teorias que lidam com atores coletivos têm proposto conceitos em tudo semelhantes ao de Parsons. Hindess (1988, 1989) - com a noção de ator social -, Coleman (1990) - falando de atores coletivos -, Mouzelis (1991) - que, ao lado de atores coletivos, menciona classes sociais, as quais são, no entanto, reduzidas a um instrumento conceituai nominalista, expressando-se através de organizações - e White (1992) - um dos principais teóricos da tradição das "redes", que fala igualmente de atores coletivos -, todos apresentam uma visão de subjetividades coletivas como entidades extremamente delimitadas de seu meio e centradas7 7 Evidentemente, teóricos do corporativismo e do neo-corporativismo têm prestado atenção a esta questão, assim como autores neo-pluralistas, que apontam para a constituição de grupos de interesse e diferenciais de poder entre eles. Essas abordagens, no entanto, não se contrapõem - freqüentemente se afiliam, embora em menor medida que o pluralismo tradicional - a um individualismo metodológico abstratamente concebido, conquanto na prática inaplicável; ao mesmo tempo, no entanto, frequentemete tratam esses grupos como se fossem extremamente homogêneos e centrados. . Ainda que se deva reconhecer que esses autores demonstram a virtude de perceber a importância de coletividades que exercitam impacto umas sobre as outras na vida social, esse tipo de perspectiva deve ser reformulado de forma radical: nem as teorias da subjetividade são de fato compatíveis com essa visão nem ela se ajusta ao conjunto de fenômenos empíricos acima delineados.

As últimas décadas têm assistido a um ataque sustentado contra a figura de sujeito da Ilustração (Bodei, 1985). A heterogeneidade interna do sujeito tem sido sublinhada e a ameaça permanente à sua coesão tem recebido grande ênfase. A formação e manutenção do sujeito, em sua identidade e ao menos coerência parcial, mostram-se, então, como contingentes, tanto em termos individuais quanto coletivos. Não há, deste modo, transparência do sujeito para si mesmo. Nem é sua ação necessariamente coerente: a possibilidade de dispersão e mesmo desagregação é permanente. Coesão e coerência não possuem níveis dados a priori; na verdade, variam de acordo com o sistema social em si e com sua situação a cada momento. Com isso, a intencionalidade da ação se faz também variável em grau. Contradições internas e baixo nível de centramento do sujeito podem ocasionar uma ação cuja direcionalidade é baixa. Firmas e organizações encontram-se em um extremo de coesão e direcionalidade; economias de mercado colocam-se no outro extremo do contínuo.

As subjetividades coletivas apresentam, portanto, um número de características contingentes. Um sistema social pode ser centrado ou não; pode ter uma identidade clara e definida ou não] pode ser dirigido por centros de decisão fortes e estáveis ou não; ademais, pode ser claramente demarcado de seu meio ou não. A subjetividade coletiva é algo fluido e encontra-se sob permanente pressão, interna e externa. Essas pressões externas evidenciam que o que Habermas (1985) chamou de "filosofia da consciência" necessita também ser abandonado, ao menos em parte. Eu preferirei falar aqui de filosofia do sujeito, de modo a evitar sua concentração na filosofia lingüística, a qual, a meu ver de modo equivocado, Habermas pretende colocar como substituto a temáticas que precisamente problematizam a questão da subjetividade. O aspecto interativo da ação social, que é tão importante para Habermas, será aqui, no entanto, enfatizado - no plano coletivo -, pois a auto-suficiência do sujeito cartesiano-hobbesiano não resiste ao escrutínio das ciências sociais e da filosofia contemporâneas.

Deve-se acrescentar a isso que se a (des)centralização da organização é um aspecto do (des)centramento do sujeito em geral e da organização em particular, este não se resume àquela. Outros fatores, como, por exemplo, a racionalidade limitada - derivada do processamento de informações, mas que também se pode articular à codificação do conhecimento-, ou o deslocamento de metas e a transformação dos meios em fins em si mesmos impedem que reduzamos o segundo à primeira. O nível de centramento dos sistemas sociais, entre eles as organizações, depende, na verdade, de duas variáveis. De um lado, tem-se a identidade e delimitação dos sistemas; de outro, a existência e força de seus centros decisórios (baseados em hierarquias, redes ou, quando o nível é absolutamente baixo, mercado). A combinação contingente dessas duas variáveis, na mesma direção ou em direções opostas, com valores altos ou baixos, é o que define o (des)centramento das subjetividades coletivas. Assim, essas duas variáveis independentes, e a que delas depende - ou seja, o nível de centramento das subjetividades coletivas -, podem ser vistas como algumas daquelas que, do ponto de vista da teoria sociológica geral8 8 Para a questão das variáveis nesse campo, veja Smelser, 1963, pp. 22ss. , apresentam-se como fundamentais para a articulação de uma sociologia econômica atenta para as subjetividades coletivas. Nesse sentido é que se poderia, inclusive, avaliar - como veremos abaixo mais diretamente com relação ao tema do mercado e da intervenção do Estado como opções de organização da vida econômica - a importância relativa do dinheiro ou do poder como mecanismos de coordenação do intercâmbio social de bens e serviços (veja Parsons, 1975) de acordo com o caráter - ideal ou efetivo - mais ou menos (des)centrado do sistema social em foco, embora outros processos, como negociações intermediadas por mecanismos do tipo "rede", tenham igualmente de ser levados em conta (veja Elson, 1988; e, para o sistema bancário, Singer, 1995).

Se a teoria sociológica tem-se visto polarizada pelos campos magnéticos do indivíduo e da sociedade (ou sistema ou estrutura), as noções de causalidade prevalecentes na disciplina compartilham da mesma problemática. Causalidade ativa, mais ou menos reflexiva, tem sido atribuída a indivíduos; causalidade condicionante, de sistemas sobre si mesmos, abarca a causalidade única que se atribui a coletividades - a não ser quando, implicitamente, coletividades assumem as características de atores individuais. Aqui, trata-se de apontar para a causalidade coletiva de sistemas sociais, de subjetividades coletivas, a qual se exerce sobre outros sistemas sociais, outras subjetividades coletivas. Quero atribuir à causalidade coletiva o estatuto de propriedade específica de sistemas sociais, que não pode ser reduzida à causalidade de seus membros. Evidentemente, isso não implica que os indivíduos, ou outros coletivos, que constituem uma subjetividade coletiva, sejam conscientes dessa propriedade; por vezes, no entanto, o são ainda que parcialmente, como freqüentemente é o caso também com outras propriedades de sistemas sociais - suas relações de poder, sistemas simbólicos, etc. Certamente, deve-se contar com o fato, detectado por Olson (1965), de que certos sistemas necessitam de sistemas menores para atingir um nível maior de centramento. O caso das classes trabalhadoras e de suas relações com sindicatos e partidos é representativo dessa situação. Não se deve todavia presumir a priori que maior nível de centramento eqüivalha necessariamente a maior eficácia, maior impacto sobre o sistema em que uma coletividade se insere. Esse parece, de fato, ser freqüentemente o caso no curto prazo; no longo prazo, em contrapartida, pode ocorrer que coletividades mais dispersas atinjam maior impacto e, portanto, maior eficácia causal.

Concentrei-me acima no aspecto interno da constituição das subjetividades coletivas. É hora de elaborar o aspecto interativo do descentramento do sujeito no plano coletivo. Elas não se constituem de forma isolada; ao contrário, se inserem dentro de um amplo espectro de relações sociais, nas quais se exerce, mutuamente, sua causalidade coletiva. Essa é crucial tanto em termos simbólicos, para a construção de sua identidade e delimitação relativa face a outros sistemas sociais, quanto em termos materiais, e ainda em sua constituição mútua em termos organizacionais. Mercado, rede e hierarquia são mecanismos que articulam coletividades tanto interna como externamente.

Em termos diretamente econômicos, e de mercado, externalidades expressam esse tipo de questão de forma bastante evidente, na medida em que produzem impacto direto não apenas sobre sistemas - organizações, firmas, etc. - previamente constituídos, mas de fato afetam intimamente seu próprio processo de constituição (as crianças sem cérebro de Cubatão tristemente exemplificam como externalidades, ecológicas neste caso, afetam o processo de constituição de outros sistemas, a própria classe trabalhadora inclusive). Mesmo os neoclássicos puseram-nas em relevo ao discutir as limitações do mercado, referindo-se a "... suas várias formas - economias e deseconomias externas, divergências entre custo e produto socialmente marginais e privadamente marginais, efeitos de spillover ou de vizinhança, bens públicos ou coletivos..." (Buchanan e Stubblebine, 1962, p. 277). Nas análises econômicas, externalidades retém, contudo, um caráter negativo, distintamente do significado mais neutro assumido pelo conceitos de "conseqüências não-intencionais da ação" nas ciências sociais em geral, que podem resultar negativas ou positivas para os indivíduos e sistemas que as produzem, bem como para aquelas que são pacientes de seu impacto.

William (1969, pp. 4-5 e 14) contemplou essa questão de modo mais amplo e sugeriu, contra os neoclássicos, que a teoria do valor - no caso do marginalismo, subjetivista e basicamente individualista - deveria ser reformulada, pois que o caráter relacionai da economia, em particular da noção de custos, transcende o escopo teórico daquela escola. Precisar-se-ia de uma teoria dos "custos sociais", capaz de evidenciar tanto os efeitos colaterais, não contabilizados, de atividades produtivas quanto seus benefícios difusos igualmente não contabilizados. "Externalidades" seriam, portanto, trazidas para o centro da teoria do valor, e a gama completa de seus efeitos poderia ser avaliada, em seus aspectos positivos e negativos. Com isso se colocaria a interação entre sistemas sociais como essencial para uma reformulação do marginalismo.

A tradição das pequisas de "redes de interação" tem destacado esse elemento relacionai dos sistemas sociais, com grande esforço sendo feito para perceber como as propriedades de determinadas "redes" influenciam suas unidades e como, então, a coletividade mobiliza recursos para influenciar atores externos (Perruci e Potter, 1989, p. 10). A procura de recursos externos, em contrapartida, surge também como uma necessidade imprescindível das organizações, envolvendo laços de dependência e poder entre elas (Galaskiewicz, 1985). Assim, organizações não podem ser pensadas como monadas para cujo funcionamento ótimo apenas a mobilização interna é importante. Seria injusto desconhecer que Parsons (1961, pp. 30-7), sobretudo com seu modelo de "troca" (interchange), connsiderou a questão, via inputs e outputs que circulam entre os diversos subsistemas dos sistemas sociais. Na verdade, de modo geral as teorias das organizações as têm tratado como sistemas abertos, que interagem com seu meio (Hassard, pp. 31ss). No entanto, a teoria sistêmica das organizações tradicionalmente se concentra nos processos internos do sistema, enquanto que uma das virtudes da pesquisa de "redes" tem sido distinguir entre relações míra-organizacionais e inter-organizacionais (Stinchcombe, 1989, p. 123). Do ponto de vista da economia isso é algo de suma importância, para começar porque as teorias da firma, como observado acima, ao tratar de organizações econômicas como dadas, simples e não problemáticas, desconsideravam sua interação com o mercado (em sua grande heterogeneidade, aliás, Cf. White, 1988 e 1993 - ou outras estruturas hierárquicas ou de rede), ou seja, com outras firmas, indivíduos ou estados, o que implica num processo permanente de constituição mútua.

No que toca às classes, Marx sublinhou como suas relações são importantes para a constituição do sistema econômico, como observado acima; mais especificamente, ele assinalou como o capital, isto é, a burguesia, trata a classe operária como "capital variável" no processo de (re)produção do capitalismo (Marx, 1867, cap. 6)9 9 Marx e marxistas, como Braveman, ou Taylor, a escola da "gerência científica" e a "abordagem das relações humanas" têm enfatizado (critica ou pragmática-apologéticamente) esse ponto, que se coloca, do ponto de vista da relação de classes dentro da unidade produtiva, no centro da questão de seu (des)centramento. Problemas relativos à "terceirização" da economia provavelmente emprestam novos contornos ao tema, em particular com a "externalização" de processos de controle e custos produtivos em geral (veja Martins e Ramalho, 1994). De uma forma geral, parece-me ser necessario distinguir aqui duas questões. De um lado, trata-se de problema meramente econômico. Os padrões flexíveis de organização do trabalho e de organização da empresa, inclusive estratégias do tipo "just in time" e "outsourcing", que possibilitam rotação mais acelerada do capital, cumprem um papel importantíssimo nas estratégias de reprodução ampliada do capital no momento. Combinando novos esquemas do tipo "toytismo" com outras estratégias bem menos glamurosas e que já nos séculos XVIII e XIX caracterizavam as fábricas européias, sobretudo inglesas, bem como a manutenção em grande medida de esquemas fordistas, a diversidade que a organização do processo de trabalho e de organização empresarial se apresenta como positiva para o capital, embora decorra sobretudo de conseqüências não- intencionais da ação de empresários e organizações no mundo todo. Assim, enfrenta-se o problema de inserção em mercados crescentemente complexos, diversificados e, ao menos no momento, prenhes de incerteza. Mas essas estratégias, entre as quais a parcial feminização da força de trabalho e a terceirização, bem como a parcialização e a desregulação dos processos de trabalho, possibilitam que, através do descentramento do processo produtivo - ou seja, de sua pulverização - o descentramento da própria classe trabalhadora seja realizado. Em outras palavras, ao pulverizar as agências econômicas no mercado, o capital aumenta o seu diferencial de poder sobre uma classe operária agora mais desorganizada e com menor grau de identidade. Para uma discussão desses temas econômicos e organizacionais, veja Harvey, 1990, e ainda Domingues, 1996c. . Por absurdo que pareça, a sociologia, durante toda sua história - exceção feita aos autores marxistas - concentrou-se em sociedades nacionais, delimitadas pelos Estados-nação modernos. Em contraposição a essa inclinação, economias - locais, regionais, nacionais - precisam ser vistas enquanto sistemas sociais, ou seja, enquanto subjetividades coletivas, que se encontram em permanente processo de interação com outros sistemas econômicos. Neste, como em outros casos, internos às sociedades nacionais, é provavelmente mais interessante pensar os diversos sistemas econômicos como se entrecruzando, compartilhando fronteiras, o que apenas se limita mais drasticamente no momento em que, enquanto organizações, recebem feição jurídica distinta. Mesmo assim, passando por cima de fronteiras nacionais e estatais, organizações "transnacionais", e mesmo classes internacionalizadas, redesenham a paisagem do capitalismo contemporâneo globalizado, se bem que isso não signifique nem o ocaso dos estados nacionais nem a obsolescência de conceitos como centro e periferia (para discussões sobre o tema, à despeito de limitações do tipo acima criticado, veja Sklair, 1991 e Appadurai, 1990). Muito claramente, a idéia geral de sistemas autônomos, embora abertos, com fronteiras claramente delimitadas, erroneamente extrapola para o conjunto dos sistemas sociais, com base na idéia de organismo biológico e de sociedades delimitadas pelo Estado-nação, assim como no indivíduo cartesiano, um modelo de coletividade que, mesmo no caso de organizações formais, somente parcialmente se ajusta à configuração freqüentemente imprecisa das teias de interação social.

Evidentemente, a questão do planejamento assume o centro da cena com essa reflexão. Sua eficácia relativa tem sido objeto de intensos debates. Mercado versus dirigismo tem sido uma polarização que, trazendo à tona mais uma vez os extremos do indivíduo e da sociedade, tem posto em evidência não apenas o tema da eficiência mas também a questão do impacto do mercado e do Estado sobre si mesmos, um sobre o outro e sobre a sociedade genericamente considerada.

Desenvolvidas as questões teóricas acima, tanto a contingência interna da subjetividade quanto a razão substantiva de se falar em relações entre coletividades fazem-se cristalinas, para além de um nominalismo que utilizaria esse tipo de procedimento de forma meramente pragmática. O conceito de subjetividade coletiva mostra-se imprescindível para tratar de forma teórica mais rigorosa problemas inevitavelmente presentes em pesquisas empíricas. Contribui para abrir um universo de possibilidades teóricas e empíricas que se camuflavam sob as categorias do indivíduo e da sociedade herdadas da Ilustração, permitindo, ao mesmo tempo, que se evite a reificação de coletividades.

ESTADO, SOCIEDADE E (DES)CENTRAMENTO

No curso deste artigo tratamos das origens históricas da polarização entre indivíduo e sociedade (sistema e estrutura) na sociologia e nas ciências sociais em geral, de sua situação atual e das alternativas de Marx e Parsons; tratamos também de certos temas empíricos relativos às teorias das organizações e da firma. Enfim, foi proposto um conceito abrangente de subjetividade coletiva, capaz de abarcar, em seus diferentes níveis de centramento, intencionalidade e delimitação, assim como em seus variados prazos temporais de impacto, a completa gama de sistemas sociais, concebidos enquanto sistemas de interação. Embora o eixo da discussão seja de fato fornecido por esta teoria geral, procurei mostrar sua relevância e articulá-lo àqueles temas e teorias de caráter mais diretamente empírico. Resta acrescentar que, tanto para a Sociologia quanto para a Economia, esse parece ser um debate frutífero, na verdade essencial, na medida em que não só, evidentemente, a última é parte das ciências sociais, mas também na medida em que uma série de elementos que tem recebido atenção nessa disciplina precisa ser abordado pela Sociologia. Espera-se que as reflexões teóricas aqui propostas ajudem a colocar discussões que se desenvolvem entre economistas, e igualmente entre teóricos das organizações, num quadro mais amplo.

Por fim, ao concluir, ocupemo-nos da questão do Estado, o qual, para começar, enquanto uma grande organização apresenta aspectos diversos de (des)centramento, e que aqui pode ser visto como o setor público da economia e o aparelho da administração governamental (veja Berger, 1990, pp. 104-5). Local da paz social - imposta pelo Leviatã hobbesiano ou alcançado pelo consenso dos cidadãos na esfera pública - o Estado tem sido encarado na tradição liberal como o local da auto-consciência da sociedade, em contraposição ao caos e à fragmentação do mercado (veja Habermas, 1962; Marx, 1844, pp. 354-5 e 363ss). Parsons assumiu precisamente o mesmo modelo e atribuiu ao sistema político o papel de mente da sociedade (Savage, 1981, pp. 191-2). Embora Marx tenha sido extremamente crítico daquelas ilusões liberais, ele abraçou uma concepção do Estado sob o socialismo que reproduz mais ou menos esse tipo de visão, à despeito do desaparecimento prospectivo do Estado sob o comunismo. Este não é o lugar para discutir a concepção de Marx quanto às características do socialismo e do comunismo. Basta assinalar que ele enfatizava a centralização dos meios de produção nas mãos do Estado, ao que parece percebido como transparente em relação a si mesmo e à sociedade (sobretudo em Marx, 1875).

Contudo, esse parece, lógica e historicamente, um projeto extremamente problemático. Não por acaso os debates que foram encetados, a partir dos anos 30, a respeito do papel do Estado no socialismo soviético e mesmo no capitalismo têm sido objeto de revisão, seja de um ponto de vista do socialismo de mercado, imaginado por Polanyi, Lange e outros, seja do ângulo da crítica radical - com o argumento da incapacidade de coordenação pelo Estado cumprindo o papel de uma mente única - desenvolvida por autores como von Mises e Hayek, que se centrava em grande medida na (im)possibilidade de cálculo racional de preços e alocação por parte do planejamento centralizado (veja Blackburn, 1991).11 11 Já March e Simon (1958, pp. 200ss), tratando da teoria das organizações, discutiram o argumento do planejamento do ponto de vista da empresa capitalista, assinalando que, internamente, essa tem de enfrentar problemas que reproduzem condições de monopólio e competição imperfeita, o que amplia e recoloca o próprio problema, qe não pode ser circunscrito à questão do Estado. Evidentemente, a não ser em utopias liberais - e em experimentos malfadados, como o dos últimos quinze anos na Inglaterra -, mesmo em um sistema capitalista essa combinação, à despeito da crise do keynesianismo, sói ser indispensável à boa performance econômica no mundo contemporâneo (veja Berger, 1990). Nove (1991, pp. 45 e, especialmente, 63-4) mais uma vez é preciso ao observar que o "...planejamento central capacita os planejadores a ver a pintura total, mas ao custo da perda do detalhe. Descentralização significa claridade no nível micro, mas ao custo de que efeitos mais amplos podem permanecer desapercebidos". Ele opta então pelo compromisso entre esses dois princípios de organização. Mercado e planejamento fazem-se presentes em seu modelo, pois que estes são os únicos caminhos possíveis em economias complexas para se organizar a produção e a distribuição, sem que se possa, além disso, dispensar hierarquias derivadas da divisão do trabalho nessas e noutras esferas. Mas essa questão tem implicações ainda mais amplas. Como o mesmo autor observa, com centralização extremada - como no caso da URSS - a burocracia se torna uma "necessidade funcional", demonstrando-se uma contradição básica no pensamento de Marx quanto à relação entre descentralização política (democratização) e centralização econômica (Nove, 1991, p. 37). Com isso, o reconhecimento e simultâneo descentramento das subjetividades coletivas, seja com expressão no Estado, seja com referência a outros grupos e organizações na sociedade, demonstra sua relevância no campo da política.

Não por acaso, esse tipo de reflexão se conecta com problemas levantados por Held (1987, p. 288), que nos propõe pensar em uma rea bsorção parcial do Estado - que se descentralizaria - pela sociedade. Se existe de fato, nos países do capitalismo avançado (e talvez prospectivamente na periferia), uma sobrecarga de demanda sobre o Estado de Bem-Estar Social (Offe, 1981b) e novas possibilidades de articulação reflexiva dos modos de vida (Giddens, 1994) - em que pese o Brasil não primar nisto -, de novo o tema do (des)centramento do sujeito se apresenta. Ao contrário de se continuar a ver o Estado como um organizador todopoderoso da sociedade, poder-se-ia possivelmente apostar em seu "descentramento", com as funções da burocracia estatal reassumidas por uma cidadania ativa e organizada, contando com financiamento do Estado (veja Wainwright, 1994, para experiências importantes nesse sentido), embora se deva interrogar em que bases de motivação indivíduos e coletividades assumiriam essas tarefas e que outras modificações na sociedade se fariam necessárias para possibilitar esse comprometimento. O conceito de subjetividade coletiva, aqui referido à economia e às organizações em geral, pode ajudar no entendimento das transformações recentes do capitalismo e do papel possível do Estado e do dirigismo estatal em termos econômicos e sociais nesse quadro, para muito além dos dogmas do neoliberalismo contemporâneo (mesmo quando se pretendem, como a doutrina hegemônica por exemplo no Banco Mundial, mera e eufesmisticamente "market friendly", reservando ao Estado o papel de gerado de ambiente propício aos negócios) (veja Domingues, 1996b). Ademais, a construção de um tipo de socialismo renovado, com uma perspectiva bastante diferente da do marxismo pode ser facilitada por esse tipo de conceituação. Socialismo implica reorganização profunda das formas de propriedade, para além do planejamento estatal; as quais, entretanto, devem ser compreendidas em sua heterogeneidade, em termos dos princípios de organização que podem vir a presidir seu funcionamento concreto. É o desconhecimento desta heterogeneidade que limita o alcance de propostas puras de socialismo de mercado, como, por exemplo, a de Roemer (1994).

Que tipo de experimento nesse sentido se poderia imaginar para o Brasil contemporâneo é questão em aberto, que envolve. de todo modo, mudanças profundas no modo de vida de homens e mulheres, e aponta, sob o ângulo dos movimentos sociais, mais uma vez para o tema da subjetividade coletiva.

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  • Windolf, P. e Beyer, J. "Kooperativer Kapitalismus. Unternehmensverflechtung im internationalen Vergleich". Kölner Zeitschrift fur Soziologie und Sozialpsychologie,vol. 47, 1995.
  • 1
    Desenvolvo aqui este conceito buscando articulá-lo a questões econômicas e organizacionais. Exposição mais detalhada de sua base filosófica e sociológica geral encontra-se em Domingues, 1995 e 1996a.
  • 2
    Esses atores são, ao que parece, sempre indivíduos. A não ser que, como de hábito
    ad hoc, ele tenha em mente também coletividades enquanto atores, aí, contudo, sem teorização; mesmo porque não enfrenta as contribuições teóricas contemporâneas que, nesse campo, lidam com a constituição de coletividades
  • 3
    Para a posição de Parsons face a questões econômicas, veja Holton, 1986; para sua visão de organizações, veja Parsons, 1960, e as discussões que se desdobram em Black, 1976.
  • 4
    Olson (1965) retomou esse tipo de questão; de um ângulo excessivamente individualista, contudo. Para ele, um número grande de indivíduos dificilmente chega a se organizar para a ação coletiva, visto que a possibilidade de assegurar benefícios independentemente da participação opera como um desestímulo. Hardin (1982), mostrando que certos indivíduos poderiam de fato assumir o esforço e o custo da organização coletiva - desde que eles se beneficiassem com isso -, já introduziu uma visão mais complexa dentro mesmo desta tradição individualista utilitária.
  • 5
    Para uma discussão original das idéias de Polanyi, veja Santos, 1988, caps. 1-2. O contexto de seu debate com os neoclássicos (formalistas) é reconstituído por Granovetter, 1993.
  • 6
    Pode-se observar ainda que, ao acentuar as consequências não-intencionais da ação, fruto em parte da ignorância dos agentes sobre as condições completas de sua ação, e a transformação da economia em uma ciência "agônica", uma vez que manipulada pelos agentes e assim manifestando eficácia reduzida, Santos (1990) aponta para um outro aspecto da "racionalidade limitada" e, de modo geral, para o descentramento do sujeito no que se refere aos sistemas econômicos.
  • 7
    Evidentemente, teóricos do corporativismo e do neo-corporativismo têm prestado atenção a esta questão, assim como autores neo-pluralistas, que apontam para a constituição de grupos de interesse e diferenciais de poder entre eles. Essas abordagens, no entanto, não se contrapõem - freqüentemente se afiliam, embora em menor medida que o pluralismo tradicional - a um individualismo metodológico abstratamente concebido, conquanto na prática inaplicável; ao mesmo tempo, no entanto, frequentemete tratam esses grupos como se fossem extremamente homogêneos e centrados.
  • 8
    Para a questão das variáveis nesse campo, veja Smelser, 1963, pp. 22ss.
  • 9
    Marx e marxistas, como Braveman, ou Taylor, a escola da "gerência científica" e a "abordagem das relações humanas" têm enfatizado (critica ou pragmática-apologéticamente) esse ponto, que se coloca, do ponto de vista da relação de classes dentro da unidade produtiva, no centro da questão de seu (des)centramento. Problemas relativos à "terceirização" da economia provavelmente emprestam novos contornos ao tema, em particular com a "externalização" de processos de controle e custos produtivos em geral (veja Martins e Ramalho, 1994). De uma forma geral, parece-me ser necessario distinguir aqui duas questões. De um lado, trata-se de problema meramente econômico. Os padrões flexíveis de organização do trabalho e de organização da empresa, inclusive estratégias do tipo "just in time" e "outsourcing", que possibilitam rotação mais acelerada do capital, cumprem um papel importantíssimo nas estratégias de reprodução ampliada do capital no momento. Combinando novos esquemas do tipo "toytismo" com outras estratégias bem menos glamurosas e que já nos séculos XVIII e XIX caracterizavam as fábricas européias, sobretudo inglesas, bem como a manutenção em grande medida de esquemas fordistas, a diversidade que a organização do processo de trabalho e de organização empresarial se apresenta como positiva para o capital, embora decorra sobretudo de conseqüências não- intencionais da ação de empresários e organizações no mundo todo. Assim, enfrenta-se o problema de inserção em mercados crescentemente complexos, diversificados e, ao menos no momento, prenhes de incerteza. Mas essas estratégias, entre as quais a parcial feminização da força de trabalho e a terceirização, bem como a parcialização e a desregulação dos processos de trabalho, possibilitam que, através do descentramento do processo produtivo - ou seja, de sua pulverização - o descentramento da própria classe trabalhadora seja realizado. Em outras palavras, ao pulverizar as agências econômicas no mercado, o capital aumenta o seu diferencial de poder sobre uma classe operária agora mais desorganizada e com menor grau de identidade. Para uma discussão desses temas econômicos e organizacionais, veja Harvey, 1990, e ainda Domingues, 1996c.
  • 11
    Já March e Simon (1958, pp. 200ss), tratando da teoria das organizações, discutiram o argumento do planejamento do ponto de vista da empresa capitalista, assinalando que, internamente, essa tem de enfrentar problemas que reproduzem condições de monopólio e competição imperfeita, o que amplia e recoloca o próprio problema, qe não pode ser circunscrito à questão do Estado. Evidentemente, a não ser em utopias liberais - e em experimentos malfadados, como o dos últimos quinze anos na Inglaterra -, mesmo em um sistema capitalista essa combinação, à despeito da crise do keynesianismo, sói ser indispensável à boa performance econômica no mundo contemporâneo (veja Berger, 1990).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 1996
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