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Buchanan e a análise econômica da Política

O INDIVIDUALISMO E SEUS CRÍTICOS

Buchanan e a análise econômica da Política* * Agradeço a Diana, cuja leitura e comentários foram de extrema importância, e as observações feitas por Amaury Patrick Gremaud, Paulo Furquim e Marcos Gonçalves, além do professor Gabriel Cohn, que ministrou um curso que motivou este trabalho. Os erros que persistirem são de minha inteira responsabilidade.

Rudinei Toneto Jr.

Professor do Departamento de Economia da Faculdade de Economia e Administração da USP - campus de Riberão Preto

A partir da análise desenvolvida por James Buchanan, mostrarei a tentativa de extensão dos métodos da Economia a outras áreas do conhecimento: o chamado "imperialismo da Economia". Para tal, discutirei a concepção do processo político, com base no individualismo metodológico, embutida na obra do autor, no tocante à constituição do Estado como no que se refere à dinâmica do "mercado político".

O objetivo do artigo é o de proceder a uma reconstrução da perspectiva de Buchanan sobre o Estado, sem adotar uma posição crítica frente às concepções examinadas. A primeira parte descreve de forma sucinta o modelo de equilíbrio geral, tendo em vista os pressupostos e os limites do individualismo metodológico na Economia. Na segunda parte, apresentam-se algumas posições de Buchanan, especialmente sua análise da política com base na metodologia econômica mainstream, e as conclusões a que chega.

O MODELO DO EQUILÍBRIO GERAL

O modelo do equilíbrio geral é a formalização mais completa da "mão invisível" de Adam Smith. Procura mostrar como é possível engendrar-se a ordem social por meio do mercado, a partir das decisões de agentes descentralizados. Em primeiro lugar, caracteriza-se o chamado "homem econômico", uma construção teórica que define o indivíduo a partir de duas características básicas: a busca do auto interesse e a escolha racional dos meios para atingir os fins1 1 A respeito da definição de homem econômico, do seu papel na teoria, e as alternativas a esta categoria; ver Fonseca, E. G. (1988). .

"O 'homem econômico' é um agente dotado de preferências completas e bem-ordenadas, amplo acesso à informação e poderes computacionais (ou de processamento de informações) irrestritos para processá-las. Após o cálculo do retorno associado às diferentes possibilidades de ação, o 'homem econômico1 1 A respeito da definição de homem econômico, do seu papel na teoria, e as alternativas a esta categoria; ver Fonseca, E. G. (1988). escolhe aquela que satisfaz suas preferências melhor do que qualquer outra alternativa. O agente é racional no sentido de que ele maximiza de modo consistente uma função objetiva sujeita a restrições (i.e, dotação inicial de recursos, custo de obter informação, risco associado à incerteza sobre as conseqüências de suas ações, etc)." (Fonseca, E.G.; 1988, p. 2-3).

Semelhante indivíduo, o homem econômico, está livre de qualquer restrição de tipo ética, religiosa, política, etc2 2 O homem econômico é uma construção que se refere a atuação do indivíduo no mercado, na esfera econômica. Para tratar a atuação deste em outros campos, faz-se necessário (dentro desta lógica), a construção de um outro conceito, o de homem ético", por exemplo. . Estes elementos podem influir na formação de seu mapa de preferências mas, uma vez que este mapa (a função utilidade de cada indivíduo) é tomado como dado na análise econômica, esses outros fatores perdem importância e a questão se restringe à maximização da função de utilidade individual3 3 É interessante observar, como salienta Gianetti da Fonseca, que a evolução do conceito de homem econômico passa por duas fases, a primeira que ele denomina de homem econômico tipo psicológico, onde existe uma preocupação com a questão da motivação, isto é, o que leva ao comportamento auto-interessado. Esta é a fase da chamada Economia política, tanto é assim que temos como uma das principais obras de Smith, paralela à Riqueza das Nações, a The Theory of Moral Sentiments; e na mesma época, os trabalhos de David Hume, A Treatise of Human Nature e An Inquiry Concerning the Principles of Morals. E a segunda fase, que corresponde ao avanço propriamente dito da Economia, enquanto campo isolado de conhecimento - "ciência" - que corresponde ao homem econômico tipo lógico, onde a questão da motivação perde importância, e o que importa é a racionalidade. Esta mudança se dá principalmente a partir do trabalho de Jevons. .

O vínculo entre os indivíduos dá-se através das relações de troca, onde cada qual busca maximizar sua utilidade; ou seja, a troca é uma ação auto-interessada. Como dizia Smith, "não é da benevolência do açougueiro que devemos esperar nosso jantar, mas sim do seu auto-interesse". O mercado é o palco da interação entre os indivíduos. Para que tal relação ocorra, é necessário que os indivíduos se reconheçam como proprietários de mercadorias4 4 Para poder considerar-se mercadorias, os objetos devem ser passíveis de serem demandados e ofertados. , assim, a relação assume a forma de uma relação entre mercadorias, onde o que importa são os termos de troca (preços relativos)5 5 Não existe a necessidade de se buscar uma fundamentação última para o valor. Quando se assume-se que apenas os preços relativos importam, aumenta-se a simplicidade da teoria. .

Somando-se a essas caracterizações, a hipótese de um mercado de concorrência perfeita -- sem barreiras e/ou coalizões, com um grande número de agentes econômicos, etc - - garante que cada indivíduo isoladamente é incapaz de alterar as condições do mercado, ou seja, o nível de preços prevalecente. Os agentes econômicos são tomadores de preço nesse modelo.

A partir disso é possível mostrar a existência de um vetor de preços de equilíbrio que compatibiliza os planos dos diversos agentes econômicos. Este vetor de preços (que é um dado para os agentes, uma vez que eles não influem isoladamente no mercado) é o ambiente no qual os agentes tomam as decisões (racionalidade paramétrica dos indivíduos). Nesta situação, em que há um tal vetor de preços, os diversos mercados específicos da Economia estão em equilíbrio. Não existem excessos de demanda nem de oferta, isto é, tudo que os consumidores desejam comprar está à disposição, e tudo que os produtores desejam vender encontra compradores. Assim, todos os agentes econômicos estão maximizando suas utilidades, sujeitos a dadas restrições. A esta situação, onde todos os mercados estão em equilíbrio, denominamos equilíbrio geral.

Considerando-se uma hipótese adicional sobre a natureza dos bens econômicos, a substitutibilidade bruta da Economia (o aumento no preço de determinado bem implica o aumento da demanda dos demais bens), é possível demonstrar que o equilíbrio é único. Temos então a unicidade do equilíbrio geral. E, acrescentando-se um padrão de ajustamento da Economia, por exemplo de tipo walrasiano, segundo o qual os mercados com excesso de demanda positivo terão aumento de preços e os com excesso de demanda negativo terão queda, mostra-se a estabilidade do equilíbrio6 6 Entende-se por unicidade do equilíbrio que, a partir de uma dada situação inicial (dotação), existirá um único vetor de preços de equilíbrio. E, por estabilidade, que, uma vez fora do equilíbrio, existem forças internas ao sistema que levam a Economia de volta ao equilíbrio. .

O modelo de equilíbrio geral (Arrow-Debreu) mostrou a possibilidade lógica de, a partir de uma sociedade descentralizada, tomando-se como dada a dotação inicial dos indivíduos, atingir-se uma situação de equilíbrio (existência), único e estável. Em outros termos, a partir de decisões independentes dos indivíduos, o mercado engendra a ordem e não o caos. Por meio da concorrência perfeita a sociedade atinge um ponto de eficiência alocativa -- Ótimo de Pareto7 7 Diz-se que uma dada situação é Ótimo de Pareto, Pareto-ótima, etc, quando é impossível melhorar a situação de um indivíduo permanecendo igual ou melhor a dos demais. Para melhorar a situação de um, a de outro tem de piorar. -- no qual os agentes não têm estímulos à mudança de comportamento (uma vez que estão maximizando suas utilidades). Ou seja, se não se altera a situação inicial, o sistema tende a permanecer em repouso.

Duas questões ficam, entretanto, sem explicação. A primeira, interna ao próprio modelo, é sobre quem determina o vetor de preços, uma vez que se supõe que as trocas só são efetuadas no equilíbrio. Tem-se a seguinte situação: o mercado determina os preços a partir das decisões dos agentes, mas os agentes tomam suas decisões ("efetivas") a partir do vetor de preços. Dentro dos modelos tipo walrasiano, a resposta vem através do processo de tatônnement ("tateio"). Supõe-se a existência de um "leiloeiro" que joga um vetor de preços, avalia as ofertas e demandas "virtuais" dos agentes, computa os excessos de demanda nos diversos mercados e os corrige, aumentando o preço quando há excessos positivos e baixando quando negativos. Esse processo prossegue até se atingir o equilíbrio. Excluindo-se a possibilidade de trocas falsas, estas só ocorrem em equilíbrio. Ou seja, apenas quando o vetor de preços está dado é que começam as trocas. A questão que se coloca é que, partindo-se do individualismo metodológico, tem-se a necessidade de uma instância supra-individual, um deus ex-machina - o leiloeiro - para garantir a ordem, e a compatibilização dos planos individuais8 8 Esta própria incapacidade do modelo de equilíbrio geral abre a possibilidade de se pensar em uma sociedade centralmente planejada e eficiente. Um supercomputador do Estado poderia fazer o mesmo papel que o leiloeiro, a partir do cálculo de "preços-sombra", isto é, virtuais. . O mercado aparece como uma abstração e não como um processo. A coordenação, portanto, não aparece como resultado do modelo, mas já vem definida a priori9 9 A este respeito ver Gremaud, A. P. e Portela, A. (1992). Os autores discutem no texto as tentativas de se conceber a emergência da ordem social tanto a partir do individualismo metodológico como a partir do estruturalismo. Mostram os limites destas duas abordagens e tentam avaliar até que ponto a teoria francesa da Regulação é uma resposta a esta questão. Conclui-se que o problema continua em aberto. .

Uma segunda questão reporta-se à dotação inicial - o ambiente. A cada situação inicial corresponde um determinado equilíbrio. O modelo mostra, estritamente, que dada uma situação inicial atinge-se via equilíbrio competitivo - concorrência perfeita ~ uma situação Pareto-ótima. É um modelo que se restringe, portanto, à eficiência alocativa. Esta é uma questão positiva, não permitindo comparar as diferentes situações que podem ser atingidas a partir das diferentes dotações iniciais. Assim, o "distributivismo" é considerado uma questão normativa, que tem a ver com juízos de valor. Logo, está fora do escopo da "ciência econômica".

Esta última questão está no cerne do que se convencionou chamar de Economia do Bem-Estar, e da busca da chamada Função de Bem-Estar Social (BES). O modelo de equilíbrio geral permite a dedução de dois teoremas (básicos para a Economia do Bem-Estar): Teorema I - Todo equilibrio competitivo é Pareto-Ótimo; Teorema II - Todo Pareto-Ótimo pode ser atingido por equilibrio competitivo. Este segundo teorema diz que é possível alterar as dotações iniciais sem perda na eficiência alocativa. Altera-se o equilíbrio, mas este permanece eficiente (no sentido de Pareto). Justifica-se assim em caráter normativo o modelo de equilíbrio geral - e a concorrência perfeita. Por outro lado, também justifica-se normativamente o papel distributivista do Estado (desde que tais alterações sejam consideradas socialmente "justas" - desejáveis). Aqui começa o problema: como avaliar essas mudanças sociais? Existe uma regra de Pareto para comparar diferentes estados sociais? Como partir de preferências individuais e chegar a preferências sociais? Este é o problema que a BES busca resolver.

Se tivéssemos funções utilidades para cada indivíduo em relação aos diferentes estados sociais, e se estas "utilidades" fossem aditivas e sujeitas a comparações interpessoais, o problema da agregação, da construção da BES restringir-se-ia à soma das utilidades individuais. E, a partir da existência de tal função, o problema da escolha do "melhor" estado social seria um mero problema de maximização. Como não é possível fazer comparações interpessoais, a questão torna-se mais complexa.

As preferências sociais, representadas pela BES, devem refletir as preferências individuais e, além disso, precisam ser coerentes e completas. Os indivíduos devem ser capazes de comparar todos os estados sociais, logo, a BES deve ser um mapeamento completo das alternativas. A BES deve satisfazer também um critério de transitividade: se o estado A é preferível ao estado B e se B é preferível a C, então A deve ser preferível a C. E a função não deve ser nem impositiva nem ditatorial, isto é, deve ser democrática.

Arrow (1950) mostrou que quando existem apenas duas alternativas, o sistema de votação por maioria simples permite que se constitua uma função tipo BES. Mas, se existirem ao menos três alternativas, e os membros da sociedade são livres para ordená-las de qualquer forma, qualquer função BES que gere um ordenamento social que satisfaça os critérios de completividade e transitividade necessariamente será ou impositiva ou ditatorial. Isto ficou conhecido como Teorema da Impossibilidade de Arrow, segundo o qual não se consegue achar uma função bem-estar social que baseie seu ordenamento de alternativas na agregação das ordenações individuais. Não existe sistema de votação que elimine o Paradoxo de Condorcet10 10 Entende-se por paradoxo de Condorcet, uma situação de indeterminação das escolhas. Tomemos um exemplo com três alternativas - A,B e C - e três indivíduos - 1,2 e 3. Cada qual possui a seguinte escala de preferências:(P = preferível à; o número superescrito refere-se ao individuo e a letra s superescrita refere-se ao social.) A PI B PI C ; B P2 C P2 A; C P3 A P3 B. Percebe-se que A P B para dois indivíduos (maioria - socialmente preferível) e que B P C também para dois indivíduos, logo, mantendo-se a coerência: A Ps C. Mas olhando-se as preferências individuais vemos que C P A também para dois indivíduos, logo, C Ps A. Tem-se uma contradição, uma circularidade: A P B P C P A. Esta indeterminação é o chamado Paradoxo de Condorcet ou paradoxo do voto. . Sendo assim, dada a impossibilidade de se construir urna função BES, não se consegue resolver de forma positiva a questão de qual é a "sociedade justa", i.e., a questão da dotação inicial11 11 Outras tentativas de resolver a questão da distribuição com base em critérios positivos referem-se à idéia do "princípio da compensação". Segundo este, se os indivíduos beneficiados por determinada alteração tivessem condições de "indenizar" a perda de bem-estar daqueles prejudicados, a mudança seria considerada socialmente desejável. .

De acordo com essa questão, além da questão distributiva (normativa), o Estado pode ter um papel na correção de certas imperfeições alocativas do mercado. Estas podem dar-se tanto na provisão de determinados bens como na correção de resultados não previstos a partir das ações dos indivíduos. As chamadas "falhas do mercado" são: a existência dos chamados bens públicos12 12 Definem-se os bens públicos como aqueles cujo consumo é não-rival e não-excludente. Uma vez que os indivíduos não revelam quanto estão dispostos a pagara por eles, a provisão desses bens pelo mercado seria insuficiente. , a presença de externalidades13 13 Externalidade refere-se ao caso em que a ação de um dado agente econômico repercute sobre os demais sem que se consiga estabelecer um preço por isso. , a existência de agentes inaptos a tomar decisões, a presença de economias de escala em determinados setores, que leva aos chamados monopólios naturais14 14 Monopólio é considerada uma situação ineficiente pois o monopolista pode oferecer uma menor quantidade e cobrar um preço mais elevado do que um ambiente competitivo, podendo extrair um excedente dos consumidores, denominado renda de monopólio. . A atuação do Estado deveria ser no sentido de diminuir estas falhas, de modo a permitir que a economia se aproxime o máximo possível da solução de equilíbrio geral, permitindo ganhos de bem-estar para todos, ao contrário da política distributiva.

BUCHANAN E A ESCOLHA PÚBLICA

Buchanan é sem dúvida, entre os economistas modernos, um dos que tiveram maior influência na modificação da maneira de pensar não somente assuntos econômicos mas também de outras áreas do conhecimento. A sua teoria da escolha pública é uma extensão dos métodos da teoria econômica tradicional à análise do processo político. Nesta seção discutiremos as críticas de Buchanan à Economia do Bem-Estar, a sua forma de conceber o Estado e o processo político.

O ambiente intelectual em que tem início as obras deste autor é, segundo ele próprio, dominado pelos economistas que não têm a liberdade individual como principal valor para a constituição da sociedade, aqueles que não atribuem ao mercado um valor positivo e que acreditam na superioridade do controle de uma instância reguladora sobre as liberdades individuais. É o mundo do pós-guerra, dominado pelos economistas keynesianos15 15 Basicamente os Keynesianos "bastardos" da síntese neoclássica - IS/LM. (que ele chama de "socialistas anti-libertários"), no qual se assistia um grande crescimento do Estado - o Welfare State. É contra esta corrente então hegemônica que vem o projeto intelectual de Buchanan16 16 Segundo Sandmo (1990) em artigo sobre a obra de Buchanan, até se transferir para Chicago ele concordava com esta visão, que passou a criticar. O ponto de inflexão na sua maneira de pensar parece ter sido o curso de Frank Knight, na Universidade de Chicago. . Em 1957, junto com Warren Nutter, fundou o Centro de Economia Política na Universidade de Virgínia, e é a partir deste marco que começa se desenvolver a public choice (escolha pública). "O objetivo inicial era criar uma comunidade de acadêmicos que desejavam defender uma sociedade baseada na liberdade individual. (...) O objetivo principal era estudar os fundamentos básicos da sociedade livre para fornecer uma fundamentação intelectual mais elaborada para aqueles que desejavam advogar a favor da sociedade calcada na ordem do mercado." (Silva, M. F. G., 1990, p.3). Em seu projeto buscam mostrar os perigos associados à intervenção pública e com isso a necessidade de limitar o papel do Estado. "Enquanto a Economia convencional explorou como objeto as falhas de mercado em contextos comerciais, a teoria da escolha pública desenvolveu-se para demonstrar que os 'mercados' políticos também tem suas falhas. (...) em termos de bem-estar 'falhas do Estado' podem ser um problema tanto quanto as falhas de mercado" (Dunleavy, P. e O'Leary, B., p.77).

Foi com esse objetivo que Buchanan dedicou-se ao estudo do Estado e do processo político, uma vez que, para ele, "a experiência nos mostrou que o entendimento do processo de mercado era uma condição necessária mas não suficiente para assegurar os fundamentos intelectuais-analíticos de uma sociedade livre."17 17 Buchanan,J., Liberty, Market and the State: Political Economy in the 1980s . New York, New York University Press, 1986, p. 13. Com isso, rompe inclusive com a teoria econômica ortodoxa, que para ele estava demasiado preocupada com as propriedades puramente formais de seus modelos, com a prova de "proposições relevantes para seus mundos de fantasia", esquecendo-se de entender o próprio objeto da Economia: o processo de troca, "o processo de mercado e a relação deste processo com o conjunto institucional no qual as pessoas fazem suas escolhas."

De acordo com Buchanam, a teoria econômica possuia duas limitações principais: (i) ao tomar como um dado o quadro institucional em que opera o mercado, não permitia avaliar diferentes instituições; os contratos que emergem na Economia de trocas variam com o quadro institucional e, quando se pretende ganhos de eficiência deve-se melhorar os contratos, aperfeiçoando as instituições, (ii) a falta de análise do processo político, por considerar o Estado um agente exógeno, neutro, que age de forma altruísta, buscando ampliar o bem-estar geral. Para Buchanan, o entendimento do Estado passa pela concepção da política como um processo de troca e dos políticos como agentes auto-interessados, tal como na esfera econômica. A incorporação destes tópicos diferencia Buchanan da teoria tradicional.

Neste sentido, a escolha pública é uma volta à Economia política clássica. A preocupação não está simplesmente na racionalidade dos agentes, mas no que leva a determinado tipo de ação, quais as restrições que se colocam, qual a importância do quadro institucional e do ambiente nas decisões dos agentes. Enfim, o objetivo da Economia seria estudar as origens, propriedades e instituições do sistema de trocas (acordo, comércio e estabelecimento de contratos). Por isso, é chamada de "A Nova Economia Política". Quatro são os pilares dessa teoria: a Economia neoclássica, a aplicação da matemática a modelos políticos (teoria dos jogos), a idéia do contrato social e as idéias da administração democrática jeffersoniana. Veremos como esses fundamentos interagem.

Buchanan divide a análise do Estado em dois momentos. O primeiro refere-se ao que ele denominou contrato "constitucional", e o segundo ao contrato "pós-constitucional". O primeiro, como o próprio nome diz, refere-se ao momento de constituição da sociedade; o segundo, basicamente, à definição da provisão dos bens públicos. Podemos denominá-los estágio constitucional e parlamentar respectivamente.

Para explicar o primeiro tipo, o autor supõe inicialmente dois indivíduos, cada qual vivendo isoladamente em suas respectivas ilhas. Cada um tem suas preferências e as maximizam a partir das condições possibilitadas pela natureza: transformando os insumos oferecidos em produtos de acordo com seus interesses. São indivíduos auto-interessados, maximizadores, cujo bem-estar vai aumentando conforme aumentam os respectivos conhecimentos sobre o meio-ambiente. "Não existem leis e não há necessidade da definição de direitos individuais, tanto direitos de propriedade como direitos humanos. Não há nenhuma sociedade como tal." (Buchanan, 1975, p. 55).

Suponhamos agora que os dois indivíduos passem a dividir a mesma ilha. Cada qual considerará o outro como parte integrante do seu meio-ambiente e, como tal, procurará conhecer o máximo do "oponente" para o maior proveito próprio. É sabido que quanto maior o conhecimento em relação ao meio natural maior será o bem-estar individual. Mas considerando-se a interação entre indivíduos, nada garante que o maior conhecimento de cada qual em relação aos outros convergirá para um maior bem-estar. Por exemplo, supondo a existência de recursos escassos - tempo, trabalho, insumos - para fins ilimitados, cada qual procurará usar o conhecimento que possui do outro em busca de um maior bem-estar individual; quer através da escravização do outro, quer pelo roubo de seus produtos, etc. Nesta situação de conflito, ambos deverão despender esforços tanto para defender o que julgam ser seu, como para atacar o outro. Pode-se chegar a uma situação de equilíbrio anárquico, onde nenhum tem incentivo a mudar seu comportamento, pois, dado o ambiente, estão maximizando suas preferências. Mas nesta situação tem-se um desperdício de recursos, tanto com a defesa como com o ataque, o que leva a uma perda de eficiência. Estes recursos poderiam ser utilizados para a produção de bens, bastando para isso mudar o quadro institucional18 18 Na realidade ainda não há instituições a serem mudadas, estamos em um mundo anárquico. .

A percepção desta situação pelos indivíduos leva-os à busca de acordos (contratos) que impeçam esta perda de bem-estar. Na busca destes contratos, cada indivíduo considera o outro como equivalente, como self-seeking (auto-interessado). Assim, o contrato só emergirá se trouxer ganhos mútuos. O contrato é sempre uma troca, só ocorrerá se ambas as partes sentirem que estão levando vantagem. Assim, mediante acordos voluntários, estabelecem-se algumas regras, tais como o desarmamento, o não-roubo, a propriedade privada de parcela dos recursos naturais, os direitos individuais como a liberdade (não-escravização), a propriedade privada dos frutos do trabalho, e assim por diante. Como diz Buchanan: "o acordo constitucional básico entre pessoas deve, portanto, ser a aceitação mútua de algum desarmamento" (1975, p. 59). Permite-se um ganho para ambos uma vez que não teriam mais que despender esforços contra o "oponente". Este seria, em princípio, o ato fundante da sociedade19 19 "A existência desses direitos" (propriedade privada e restrições ao comportamento de cada indivíduo) "é indubitavelmente uma pré-condição necessária para a criação dos contratos pós-constitucionais, que é um sistema de trocas voluntárias" (Mueller, 1979, p. 12). .

É importante ressaltar que este contrato inicial - acordo, constituição, etc - atingido de forma voluntária e unânime possui um alto grau de "justiça" para essa concepção. Esta "justiça" e unanimidade são asseguradas pela incerteza, ou o "véu de ignorância", que cercam os indivíduos no estágio constitucional. "Dada a natureza muito geral das informações que os indivíduos possuem," (incerteza quanto às suas posições futuras) "é plausível assumir que os princípios sobre os'quais eles concordarão são imparciais com respeito as vantagens que eles propiciam, não apenas para os indivíduos específicos, os indivíduos em posições bem definidas, mas também os indivíduos em gerações diferentes e vivendo sob diferentes sistemas econômicos e políticos" (Mueller, 1979, p. 230).

Assim, a noção de justiça emerge da igualdade de informações e da incerteza sobre o futuro na posição original. Se, neste ponto, "um acordo unânime puder ser atingido sob o véu da incerteza que cerca o estágio constitucional, então um conjunto de regras pode ser escrito nesse estágio, que permitem aos indivíduos prosseguir seus próprios interesses no estágio parlamentar com pleno conhecimento de seus próprios gostos e posições. Isto obviamente requer que qualquer redistribuição que se tenha que fazer seja feita no estágio constitucional, em que vigora a incerteza quanto às posições futuras" (Mueller, 1979, p. 258).

Percebe-se a semelhança deste estágio com um jogo de cartas, que é o exemplo geralmente utilizado. Antes de se iniciar o jogo, sem saber as cartas que possuirão - a posição futura depende da sorte -, os jogadores concordarão com as regras mais justas e imparciais possíveis, tal que na fase seguinte, tomando a sorte como um dado, o resultado do jogo dependerá da habilidade dos jogadores20 20 Neste ponto, sobre as condições que vigoram no momento do surgimento do contrato inicial, e sobre a possibilidade da unanimidade e da "justiça" deste, a análise dos autores da public choice é muito semelhante à de Rawls quanto à emergência do contrato e dos dois princípios de justiça. .

Mas ainda há um problema. Apesar de serem acordos voluntários, que garantia há de que estes acordos serão cumpridos: a ética, a boa vontade, a confiança, o auto-interesse, ou o quê?

Buchanan nos dá um exemplo da teoria dos jogos, do tipo "Dilema do Prisioneiro", no qual há uma tendência ao descumprimento das regras (1975, p. 65). Vejamos:

O exemplo nos diz o seguinte: cada um dos indivíduos tem duas estratégias: respeitar ou não-respeitar as regras. O ganho auferido em cada uma destas depende da estratégia escolhida pelo oponente. Os primeiros números dentro dos parênteses referem-se às utilidades do indivíduo A; e os segundos, às do indivíduo B21 21 Não podemos fazer comparações inter-pessoais de utilidades. Assim, atribuir o número 22 à A e 11 à B, não quer dizer que a utilidade de A seja maior do que a de B. Só podemos fazer estas relações para o mesmo indivíduo, assim, A prefere uma situação a que ele atribui utilidade 22 à outra a que ele atribui 3, por exemplo. . Percebe-se pelo exemplo, que a estratégia "não respeitar" é dominante para os dois indivíduos. Se o indivíduo B respeita, para A é melhor não respeitar, uma vez que ele ganharia 22 contra os 19 de respeitar. Se o indivíduo B não respeita, o melhor para A é também não respeitar, uma vez que ele auferirá 9 ao invés de 3. O mesmo é válido para o indivíduo B. Assim, percebe-se que, a partir da ação auto-interessada dos indivíduos, nada há que garanta que as regras serão respeitadas. "A maximização da utilidade, exclusivamente, levará cada pessoa a desrespeitar a sua obrigação contratual se esperar que seja possível fazer isso unilateralmente" (1975, p. 64). Neste exemplo, com cada qual seguindo a sua estratégia dominante, não chegaríamos a uma situação eficiente, Pareto-Ótima, pois (respeita-respeita) é superior a (não-respeita-não respeita).

Esta situação, num jogo duas pessoas, ainda pode ser corrigida pela racionalidade individual, principalmente se supormos que este acordo é para ser duradouro, isto é, o jogo será repetido várias vezes. Cada indivíduo ao pensar em desrespeitar o contrato espera no instante seguinte uma retaliação do oponente, que seria também o descumprimento do contrato. Assim, para pequenos grupos é possível pensar na estabilidade do contrato a partir da racionalidade individual. O problema aparece com o crescimento dos grupos. Em grupos maiores, a expectativa dos indivíduos é de que o seu comportamento isoladamente não afetará o dos demais membros. Assim há uma tendência no nível individual para se desrespeitar o acordo (por exemplo roubar). "Mas se este se torna o padrão geral de comportamento, o sistema degenera rapidamente para a situação pré-contratual de equilíbrio anárquico" (1975, p. 67).

Para cada indivíduo isoladamente não há estímulos para punir o infrator, a não ser que a infração seja cometida contra ele mesmo; só há um interesse indireto no sentido de que torne seus direitos mais seguros. Assim, para que os contratos (regras) sejam cumpridos, e não se retorne à situação pré-contratual, há a necessidade de uma instância coercitiva, externa às partes contratantes, que obrigue o seu cumprimento. Juntamente com o próprio contrato constitucional surge o Estado, o qual seria este órgão coercitivo e que faz parte do próprio contrato. Funciona como um árbitro, que recebe as regras do jogo e "força a aderência a estas regras designadas. Este é precisamente o papel funcional destinado ao Estado no seu objetivo de impor a lei. (...) seu único papel é o de garantir que os termos do contrato sejam honrados" (1975, p. 67). É o que Buchanan denominou "Estado protetor". É interessante observar que este Estado surge como uma demanda dos próprios indivíduos, para limitar suas liberdades e garantir que os acordos que surgiram de forma voluntária entre eles sejam cumpridos. Assim, a coerção aparece com o próprio acordo, sem ela não há contrato. É ela que dá confiança aos contratos. Completa-se, assim, o ato fundante da sociedade.

Uma última menção deve ser feita a este "Estado protetor". "No estágio constitucional, o Estado emerge como a agência ou instituição da força, conceitualmente externo às partes contratantes e incumbido com a única responsabilidade de forçar o acordo sobre direitos e deveres de contratos que envolvem negociação voluntária destes deveres. (...) Este Estado legal ou protetor, as instituições da 'lei' interpretadas estritamente, não é um corpo de tomada de decisões. Ele não tem função legislativa e não é apropriadamente representado por instituições legislativas. Este Estado não incorpora o processo pelo qual as pessoas na comunidade escolhem coletivamente ao invés de privadamente, ou independentemente. Este último caracteriza o funcionamento do Estado produtivo conceitualmente separado, a agência pela qual os indivíduos se provisionam com bens públicos no contrato pós-constitucional. Neste último contexto, a ação coletiva é melhor vista como um processo de troca complexa que envolve todos os membros da comunidade. Este processo é apropriadamente representado pelos órgãos legislativos, e a tomada de decisão, o processo de escolha, é apropriadamente denominada 'legislação'. Em contraste, o Estado protetor leva a cabo o papel da força que lhe foi atribuído no contrato constitucional, não faz escolhas no sentido estrito do termo. Idealmente ou conceitualmente, a imposição deve ser programada mecanicamente à frente da violação da lei. Os participantes concordam com um estrutura de direitos e deveres individuais que deve ser imposta, e violações requerem apenas a constatação do fato e a automática administração das sanções. Um contrato ou um direito é ou não violado, esta é a determinação a ser feita pela lei. Tal determinação não é uma escolha no sentido clássico, onde os benefícios de uma alternativa são ponderados contra os custos de oportunidade. A 'lei', imposta pelo Estado, não é necessariamente o conjunto de resultados que melhor representa o balanço de interesses opostos, algum compromisso, algum julgamento médio. Propriamente interpretada, 'a lei' que é imposta é aquela especificada para ser imposta no contrato inicial, qualquer que seja." (Buchanan, 1975, p. 68-69).

Difícil de imaginar é como surge o contrato inicial em uma sociedade com muitas pessoas. No caso de duas pessoas, isto é relativamente fácil. "Este 'pacto' deve se calcar nos limites que garantam ganho mútuo. Ao aderirem ao contrato, ambas as partes devem aceitar a imposição de limites à ação privada de cada uma, o que ocorre é um acordo consciente entre as duas partes interessadas. O ganho mútuo para ambos é condição sine qua non para a ordem civil estável. Deve haver respeito e confiança e se este acordo é feito para garantir a coesão social, mesmo com o custo individual de imposição de um aparato institucional jurídico restritivo, ele é racional." (Silva, 1990, p.24).

No caso de uma sociedade complexa, ou seja, de múltiplos indivíduos, devemos fazer a hipótese de que todos os indivíduos são capazes de "fazer escolhas informadas e sofisticadas entre restrições formais alternativas. Estas restrições serão aceitas e conhecidas pelas partes e serão externamente impostas pelo soberano. Os modelos indicariam quais seriam os limites mínimos de conservação da ordem. A partir daí, caberia à sociedade a escolha entre arranjos institucionais alternativos. (...) Uma lei seria instituída e a sociedade como um todo a respeitaria. Contudo, falamos aqui de uma democracia representativa moderna e, portanto, a autoridade do Estado está calcada na manutenção dos direitos individuais e da ordem, o Estado deve fazer cumprir as leis que são feitas pelos cidadãos que representam a sociedade." (Silva, 1990, p. 25). Assim, a escolha, a montagem do quadro institucional, dá-se via escolha dos indivíduos, através de uma decisão política.

A dificuldade é saber, numa sociedade com vários indivíduos que elegem delegados para a tomada de decisões, se "cada grupo de delegados pode abstrair suficientemente de suas próprias posições e ideologias para produzir o tipo de contrato coletivo visualizado por Buchanan e Tul-lock" (Mueller, 1979, p. 259). Buchanan não tratou muito deste caso: como se chega à constituição e como se elegem os delegados em uma sociedade complexa.

Com base neste contrato constitucional começam a desenvolver-se os demais contratos pós-constitucionais. Dentro destes encontram-se todos os contratos comerciais, que nada mais são do que o funcionamento do mercado. A Economia política enfatizou muito este ponto: as escolhas dos indivíduos se dão em um quadro institucional que não pode ser violado, isto é, os indivíduos fazem suas escolhas dentro de regras que podem ser alteradas. Este fato foi negligenciado pela teoria econômica moderna, para qual as regras são algo dado. A Economia Política tem toda uma análise sobre o surgimento do mercado como uma instituição formada pela interação dos indivíduos, a partir da divisão do trabalho. O que, como vimos, para a Economia moderna não importa; o próprio mercado deixa de ser um processo para ser uma abstração. Segundo Buchanan, faltou aos economistas clássicos uma mesma análise para o desenvolvimento de outras instituições, dentre as quais o Estado. Isto levou, segundo o autor, a alguns erros de concepção, entre os quais pensar o Estado, e os homens públicos, como voltados para o bem-comum, enquanto no setor privado tinha-se o mundo do egoísmo e do auto-interesse. É neste sentido, que como dissemos antes, Buchanan representa uma volta à Economia Política, ao inserir as instituições e, em especial, o Estado (as leis) na análise do processo de troca.

Esta análise adequa-se, principalmente, à fase legislativa, isto é, pós-constitucional. Nesta, cabe ao Estado não apenas a garantia do contrato mas também a provisão de bens públicos que não são adequadamente oferecidos no sistema de mercado. Temos aqui, de acordo com Buchanan, o "Estado produtor". O tipo de bens e a quantidade a ser oferecida é uma decisão política, que está limitada pelo contrato constitucional.

Dentro deste quadro, para entender-se como acontece a provisão dos bens públicos e como se altera o contrato inicial, é preciso estudar a tomada de decisões políticas e, para tal, o comportamento dos políticos. É neste ponto que está a principal diferença de Buchanan em relação aos demais economistas, e é aqui que reside a chave do sucesso da Escolha Pública.

Para Buchanan, a política deve ser encarada como uma troca, devendo portanto ser analisada como um mercado: o mercado político. Portanto, não há razões para supor que o político tenha um comportamento diferente dos demais indivíduos. A Economia do Bem-Estar como vimos, supunha o Estado preocupado exclusivamente com o bem-geral. Dentro disto, atribui-se aos homens públicos um comportamento altruísta, em oposição ao egoísmo do homem na esfera privada. Para Buchanan esta distinção não procede, porque é ilógico supor que o indivíduo em uma esfera da vida tem suas preferências próprias enquanto em outra tem suas preferências pautada pela dos outros. Pensemos na situação de um mesmo indivíduo que hoje é diretor de um banco qualquer e amanhã vira presidente do Banco Central: por que deveria alterar o seu comportamento? Assim, a análise de Buchanan sobre o processo político parte desta premissa básica: o político é um indivíduo auto-interessado como outro qualquer.

Sendo a política um processo de troca, o político é visto como um vendedor de programas políticos e os indivíduos -- os eleitores -- como compradores destes programas políticos. Os eleitores ao votarem tentam maximizar sua utilidade, votando naqueles candidatos que ofereçam programas condizentes com suas preferências em termos de provisão de bens públicos e de mudanças institucionais. Já o político tenta, num primeiro plano, maximizar o número de votos para ser eleito. Assim, seu programa deve conter aquilo que ele julga corresponder às preferências de um segmento significativo da sociedade22 22 Existem vários estudos neste sentido: como os partidos se comportam e sobre qual deve ser o comportamento (programa) ótimo destes de forma a maximizar o número de eleitores. Este depende do número de partidos existentes e do formato das distribuições de preferências dos eleitores. Mostra-se que em uma situação bipartidária com distribuição normal das preferências, os programas dos partidos tendem a ser muito semelhantes, em torno das preferências do eleitor médio. A este respeito ver Muller (1979), Cap. 6 .

Segundo Buchanan, todos aqueles que se dedicam à política e à carreira pública têm como valores, preferências, um "Estado grande", ou seja com grandes poderes para influir na liberdade dos indivíduos. De acordo com as regras para definir a atuação do Estado que se estipulem entre os representantes do povo, os políticos, fica-se sujeito ao perigo de um grande crescimento do setor público, e em última instância à subordinação das liberdades individuais a esse poder. É o caso, por exemplo, de votar-se cada gasto orçamentário em separado, necessitando para a aprovação apenas maioria simples. A tendência é que, via acordos entre políticos, todos os projetos sejam aprovados. Ou seja, apresenta-se o perigo do Estado entrar em todas as áreas da sociedade; seria o controle do Leviatã sobre os indivíduos. Isto tenderia a acontecer, pois o "prazer" dos homens públicos aumenta conforme aumenta o poder do Estado. O outro perigo é o de que os políticos se utilizem dos bens públicos para fins privados: a corrupção em obras públicas, o favorecimento em termos de política econômica, etc. Então, se o homem público é um ser auto-interessado, o que explicaria a sua razão de ser?

O homem público tem por função administrar a coisa pública, mas, para evitar os perigos acima mencionados, deve-se impor limites à sua atuação e à do Estado. A primeira limitação dos políticos é que eles devem em última instância atender aos interesses de seus eleitores, senão deixam de ser reeleitos. Mas, além deste limite, outros devem constar do próprio contrato constitucional: a demarcação das áreas de atuação do Estado, as formas de financiamento da sua atuação - delimitação da tributação e do endividamento público -, limites à interferência na liberdade individual, e assim por diante. Restringe-se constitucionalmente as fontes de receita do Estado para cercear o poder da burocracia de maximizar o tamanho do orçamento23 23 Sem estes limites constitucionais, o Estado poderia constantemente tentar ampliar sua participação, elevando as fontes de tributação. Com isso, segundo alguns, interfere-se na liberdade do setor privado que fica incerto sobre qual a parcela do seu produto lhe caberá. Assim há um desestímulo à produção e um estímulo à sonegação. A incerteza quanto à tributação é, segundo alguns, um dos grandes problemas do sistema tributário brasileiro e por isso defendem uma "Constituição tributária" que dê certeza aos agentes de quais são as regras do jogo, que lhes permita trabalhar livremente na fase pós-constitucional, sem a ameaça das arbitrariedades do Estado. . Sem estes limites, Buchanan vê o perigo da estatização completa da sociedade. Como salienta ele, o simples rompimento na década de 30 da regra vitoriana do orçamento equilibrado, isto é, do não-endividamento do setor público, e o advento das propostas keynesianas, em defesa do gasto público e do endividamento público, com o apoio (consenso) geral, colaborou muito para se caminhar nesta direção, com um grande crescimento do Estado no pós-guerra.

Desta forma, "o homem público tem sua ação limitada por regras, tal qual o homem privado. O homem público 'representa' o soberano e sua ação é auto-interessada, mas dadas as limitações que lhe são impostas, o poder constitucional garante a sua existência de forma a não comprometer, para fins privados, o bem público. Mas o que é relevante aqui diz respeito ao fato de serem as regras que regulam a ação do homem público qualitativamente distintas daquelas que regulam a ação do homem privado: para o homem público estas regras são tais que devem conduzi-lo a representar, da melhor forma possível, o bem público. É aí que está a razão de ser do homem público, isto é, ele deve gerir a res pública, a coisa pública" (Silva, 1990, 26-27).

Como vimos, a simples concorrência perfeita não garante a eficiência econômica pois existem as "falhas de mercado", basicamente a provisão de bens públicos e a correção de externalidades. Esta seria a grande razão de ser do Estado, de sua intervenção na economia. A correção destas levaria a um ganho de eficiência, a movimentos paretianos onde a situação de todos pode melhorar sem que outros piorem. A forma como isto se dá é via mercado político, onde por intermédio do voto os indivíduos revelam suas preferências pela provisão de bens públicos e pelas mudanças no contrato inicial - a constituição. Mas o problema é que este mercado também é imperfeito, as regras para a tomada de decisões são falhas. Elas implicam custos externos e envolvem custos de transação.

A provisão de bens públicos, ao mesmo tempo que implica aumento dos benefícios, possui um custo, que é o seu financiamento: os impostos. As demandas sociais são as mais variadas possíveis, mas os recursos são escassos. E, como vimos, existe a dificuldade de provisão desses bens pois os indivíduos não revelam o quanto estão dispostos a pagar por eles. Assim, nem sempre é possível cobrar diretamente dos beneficiários.

Tomemos como exemplo,o caso de três proprietários de terra em uma região de seca, decidindo sobre a localização da construção de dois poços artesianos. O benefício de cada poço para o proprietário que o tiver em suas terras é de 2000 enquanto o custo da instalação de cada poço é de 750. O custo total será repartido entre os três proprietários. Neste caso, o custo total é 1500, sendo 500 para cada proprietário, e o benefício total é de 4000, tendo como benefício líquido 2500. O problema aparece pelo fato de que dois proprietários terão um benefício de 1500 enquanto um deles terá um custo de 500. Mediante um acordo entre dois deles a obra será executada e o terceiro sairá prejudicado, mas em termos de benefício social há um incremento. Isto pode acontecer mesmo com prejuízo social em uma situação de maioria simples. Reduzamos o benefício de cada poço para 600. O benefício total se reduz para 1200, gerando um custo social de 300. Apesar disso, dois proprietários votarão pela obra, uma vez que auferirão benefícios líquidos de 100. Assim o proprietário excluído arcará tanto com a perda de bem-estar social como com o ganho dos outros. Deste modo, dada a regra de votação, será imposta a um dos indivíduos um custo externo. A única maneira deste ser eliminado é através de uma regra de unanimidade, que impeça a "tirania da maioria".

Apesar deste ser um resultado indesejável, existe um problema para a obtenção de unanimidade, que é o custo de transação, o tempo gasto até se chegar a um consenso, se é que este seja possível. Pode-se gerar um imobilismo. Este custo será tanto maior quanto maior o tamanho das sociedades, mas por outro lado os custos externos também aumentam neste caso, pois diversifica-se a demanda, além do fato dos indivíduos fazerem-se representar por delegados cuja identificação com os seus interesses é apenas indireta, potencializando-se os custos externos. Assim, a unanimidade é a única forma de se eliminar os custos externos e impedir a "tirania da maioria", mas esta é praticamente impossível de ser atingida, e além disso gera um problema adicional, o poder de veto: sempre algum indivíduo estará na posição de poder barrar as medidas, colocando-se em ótima posição para "barganhar" o apoio, o que amplia ainda mais os custos externos e de transação - favorecimentos políticos, corrupção, etc.

Assinalados estes problemas, torna-se necessário uma regra, a identificação de um número ótimo para determinar-se a maioria relevante para a tomada de decisões. Aplica-se, para tal, a lógica tradicional da minimização de custos da teoria econômica neoclássica. Tem-se duas curvas de custos: os custos externos, que serão tanto maiores quanto menos os indivíduos fizerem-se representar e forem obrigados a acatar as decisões impostas, ou seja, quanto mais longe se estiver da unanimidade; e os custos de transação, que serão tanto maiores quanto maior for o número de indivíduos necessários para se tomar uma decisão. Existe, portanto, um trade-off entre custos externos e custos de transação24 24 Percebe-se que em uma situação ditatorial, os custos de transação são nulos enquanto os custos externos podem elevar-se ao infinito, enquanto no caso da unanimidade o inverso se verifica. .

Suponhamos um "comitê" ou comunidade com N membros. Queremos determinar o seu tamanho mínimo para tomar uma decisão. Podemos construir um gráfico, em cujo eixo vertical medimos o custo da ação coletiva e no eixo horizontal o número das pessoas necessárias para a aprovação da medida. Sendo C os custos externos (que é uma função decrescente do número de indivíduos que participam da decisão), e D os custos de transação (que é uma função crescente do número de indivíduos que participam da decisão), o ponto de mínimo custo total (C+D) ocorre no ponto de intersecção das duas curvas (K). A forma e a localização destas curvas depende também do tipo de ação a ser decidida. Em vários casos a regra da maioria simples é ótima, ou seja, K/N = N/2. Em geral são aquelas que envolvem menores custos externos. Grande parte da função alocativa situa-se nesse caso. Já as mudanças constitucionais e as medidas redistributivas implicam em geral maiores custos externos, necessitando uma maioria mais ampla, que deve ser definida também pelo critério acima. Segundo alguns esta maioria deve ser de dois terços.

Percebe-se que a ação coletiva sempre envolverá custos. O "mercado político" possui "falhas" que não são superadas por qualquer critério de votação, e estas tendem a ser tanto maiores quanto maior for o tamanho das comunidades. A partir disso, pode-se tirar uma outra conclusão: os regimes centralizados, em que a participação torna-se mais difícil, e portanto menor, apresentam um maior potencial de elevação dos custos externos. Sendo assim, apesar da necessidade do governo, este deve intervir o mínimo possível nas liberdades individuais, uma vez que também possui falhas. Além disso, sempre é desejável que as decisões sejam tomadas em grupos menores, nos quais é mais fácil chegar-se ao consenso e os indivíduos estarão mais dispostos a revelar suas preferências25 25 Torna-se mais fácil identificar os beneficiários de determinadas ações e com isso imputar-lhes o custo, semelhantemente ao resultado atingido pelo Teorema de Coase. , reduzindo muito o custo externo. Defende-se, portanto, o federalismo ou a descentralização máxima na tomada de decisões26 26 Os custos externos reduzem-se mais ainda pela possibilidade levantada por alguns autores de que os indivíduos que se sentem prejudicados por determinadas medidas em dadas comunidades podem "votar com os pés" mudando-se para comunidades que representem melhor as suas preferências. . Este é o ponto "jeffersoniano" da public choice: o melhor governo é o menor, e se é para haver algum governo que seja um governo local. Como confessou um dos maiores expoentes da public choice: "Uma das minhas fantasias favoritas é o sonho de que Washington possa ser de novo uma calma cidade do Sul, com vários grandes santuários e pequenas universidades, e onde todo mundo, fora os turistas, tenha o bom senso de deixar a cidade no verão"27 27 Niskanen, W., "Competition among governments bureaus" (p. 163), in Buchanan, J. M. (ed) The Economics of Politics, 1978, citado por Dunleavy e Ol-eary (1987), p. 85. .

COMENTÁRIOS FINAIS.

Completada a análise de Buchanan, vimos que, para ele, o Estado tem uma grande relação com a economia. Em primeiro lugar enquanto "Estado protetor", aquele que garante a imposição do contrato inicial, as instituições sob as quais os agentes tomam suas decisões - nessa função, o Estado é o árbitro que garante as regras do jogo. E, em segundo lugar, enquanto "Estado produtor", responsável pela provisão de bens públicos, aquele que visa corrigir as "falhas de mercado".

Mas, para entendê-lo, não devemos distinguir o homem público do homem privado. As motivações são as mesmas, o que muda são as restrições. Esta é a base da teoria da escolha pública. A sua análise da decisão política tem a mesma lógica da teoria econômica neoclássica, ou seja, busca explicá-la como um processo de escolha. Para tal, utiliza-se das quatro entidades básicas: os indivíduos (base do modelo), as preferências, as restrições e as decisões. Constrói-se um mercado político onde os indivíduos revelam suas preferências através do voto, segundo um comportamento racional, maximizador; e os políticos também atuam segundo o mesmo princípio mas com diferentes restrições. A essa extensão do método da Economia para a análise do processo político (e de outras áreas), chama-se de "imperialismo da Economia". Buchanan busca mostrar as "falhas de governo", para desta forma sair em defesa do governo mínimo. Por isso, é um expoente da "nova direita", orientação cuja importância como corrente de pensamento vem aumentado no período recente.

Um último comentário a ser feito diz respeito ao caráter reformista implícito na obra de Buchanan. Os liberais radicais não acreditam na capacidade do Estado de alterar as instituições, pois estas apenas refletem as escolhas individuais. Os revolucionários só acreditam em transformações totais. Já para Buchanan, tem-se um processo de "seleção natural" das regras e instituições. O Estado pode propor novas regras: se elas forem julgadas "boas" pelos indivíduos sobrevivem, se não desaparecem. A determinação em última instância é dos indivíduos, mas o Estado (os políticos) pode propor arranjos que não surgiriam de forma espontânea da interação dos indivíduos. Neste sentido podemos classificá-lo como um reformista, que acredita no aperfeiçoamento das instituições28 28 Este aperfeiçoamento, como vimos ao longo do trabalho, significa sempre para o autor uma menor interferência nas liberdades individuais. Podemos colocar como exemplos: uma constituição tributária, a independência do Banco Central, uma maior abertura ao exterior, etc. Segundo Buchanan, existem certas regras que devem ser invioláveis, a propriedade privada e a liberdade individual, por exemplo. , como forma de se aumentar o bem-estar social. A peculiaridade do seu reformismo está em que este também emerge do "mercado político", através da compra e venda de programas, que depois devem ser submetidos a uma regra de tomada de decisões. O julgamento das regras pelos indivíduos se dá através do voto. O redistributivismo, se tiver que ocorrer, dá-se da mesma forma. Os indivíduos que defendem uma reforma agrária, por exemplo, devem votar nos candidatos que a apresentam em seu programas, e se a participação destes for suficiente para garantir a maioria requerida tem-se a alteração. Assim, via mercado político pode-se chegar a mudanças desejadas no contrato inicial.

É mister notar, porém, que dada a justiça existente no contrato fundante da sociedade e sendo suas principais atribuições garantir a propriedade e a liberdade individual (valores fundamentais para esta corrente) essas alterações devem exigir um elevado grau de aceitação devido aos elevados custos externos envolvidos. Nessa mesma linha de argumentação a questão da igualdade não precisa ser discutida, pois todos são igualmente livres frente ao contrato, possuindo os mesmos direitos e oportunidades.

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  • SILVA, M.F.G. James Buchanan e a Nova Economia Política', Texto de Discussão, n. 12/90, mímeo, FEA/USP, 1990.
  • *
    Agradeço a Diana, cuja leitura e comentários foram de extrema importância, e as observações feitas por Amaury Patrick Gremaud, Paulo Furquim e Marcos Gonçalves, além do professor Gabriel Cohn, que ministrou um curso que motivou este trabalho. Os erros que persistirem são de minha inteira responsabilidade.
  • 1
    A respeito da definição de homem econômico, do seu papel na teoria, e as alternativas a esta categoria; ver Fonseca, E. G. (1988).
  • 2
    O homem econômico é uma construção que se refere a atuação do indivíduo no mercado, na esfera econômica. Para tratar a atuação deste em outros campos, faz-se necessário (dentro desta lógica), a construção de um outro conceito, o de homem ético", por exemplo.
  • 3
    É interessante observar, como salienta Gianetti da Fonseca, que a evolução do conceito de homem econômico passa por duas fases, a primeira que ele denomina de homem econômico tipo psicológico, onde existe uma preocupação com a questão da motivação, isto é, o que leva ao comportamento auto-interessado. Esta é a fase da chamada Economia política, tanto é assim que temos como uma das principais obras de Smith, paralela à
    Riqueza das Nações, a
    The Theory of Moral Sentiments; e na mesma época, os trabalhos de David Hume,
    A Treatise of Human Nature e An Inquiry Concerning the Principles of Morals. E a segunda fase, que corresponde ao avanço propriamente dito da Economia, enquanto campo isolado de conhecimento - "ciência" - que corresponde ao homem econômico tipo lógico, onde a questão da motivação perde importância, e o que importa é a racionalidade. Esta mudança se dá principalmente a partir do trabalho de Jevons.
  • 4
    Para poder considerar-se mercadorias, os objetos devem ser passíveis de serem demandados e ofertados.
  • 5
    Não existe a necessidade de se buscar uma fundamentação última para o valor. Quando se assume-se que apenas os preços relativos importam, aumenta-se a simplicidade da teoria.
  • 6
    Entende-se por unicidade do equilíbrio que, a partir de uma dada situação inicial (dotação), existirá um único vetor de preços de equilíbrio. E, por estabilidade, que, uma vez fora do equilíbrio, existem forças internas ao sistema que levam a Economia de volta ao equilíbrio.
  • 7
    Diz-se que uma dada situação é Ótimo de Pareto, Pareto-ótima, etc, quando é impossível melhorar a situação de um indivíduo permanecendo igual ou melhor a dos demais. Para melhorar a situação de um, a de outro tem de piorar.
  • 8
    Esta própria incapacidade do modelo de equilíbrio geral abre a possibilidade de se pensar em uma sociedade centralmente planejada e eficiente. Um supercomputador do Estado poderia fazer o mesmo papel que o leiloeiro, a partir do cálculo de "preços-sombra", isto é, virtuais.
  • 9
    A este respeito ver Gremaud, A. P. e Portela, A. (1992). Os autores discutem no texto as tentativas de se conceber a emergência da ordem social tanto a partir do individualismo metodológico como a partir do estruturalismo. Mostram os limites destas duas abordagens e tentam avaliar até que ponto a teoria francesa da Regulação é uma resposta a esta questão. Conclui-se que o problema continua em aberto.
  • 10
    Entende-se por paradoxo de Condorcet, uma situação de indeterminação das escolhas. Tomemos um exemplo com três alternativas - A,B e C - e três indivíduos - 1,2 e 3. Cada qual possui a seguinte escala de preferências:(P = preferível à; o número superescrito refere-se ao individuo e a letra s superescrita refere-se ao social.) A PI B PI C ; B P2 C P2 A; C P3 A P3 B. Percebe-se que A P B para dois indivíduos (maioria - socialmente preferível) e que B P C também para dois indivíduos, logo, mantendo-se a coerência: A Ps C. Mas olhando-se as preferências individuais vemos que C P A também para dois indivíduos, logo, C Ps A. Tem-se uma contradição, uma circularidade: A P B P C P A. Esta indeterminação é o chamado Paradoxo de Condorcet ou paradoxo do voto.
  • 11
    Outras tentativas de resolver a questão da distribuição com base em critérios positivos referem-se à idéia do "princípio da compensação". Segundo este, se os indivíduos beneficiados por determinada alteração tivessem condições de "indenizar" a perda de bem-estar daqueles prejudicados, a mudança seria considerada socialmente desejável.
  • 12
    Definem-se os bens públicos como aqueles cujo consumo é não-rival e não-excludente. Uma vez que os indivíduos não revelam quanto estão dispostos a pagara por eles, a provisão desses bens pelo mercado seria insuficiente.
  • 13
    Externalidade refere-se ao caso em que a ação de um dado agente econômico repercute sobre os demais sem que se consiga estabelecer um preço por isso.
  • 14
    Monopólio é considerada uma situação ineficiente pois o monopolista pode oferecer uma menor quantidade e cobrar um preço mais elevado do que um ambiente competitivo, podendo extrair um excedente dos consumidores, denominado renda de monopólio.
  • 15
    Basicamente os Keynesianos "bastardos" da síntese neoclássica - IS/LM.
  • 16
    Segundo Sandmo (1990) em artigo sobre a obra de Buchanan, até se transferir para Chicago ele concordava com esta visão, que passou a criticar. O ponto de inflexão na sua maneira de pensar parece ter sido o curso de Frank Knight, na Universidade de Chicago.
  • 17
    Buchanan,J.,
    Liberty, Market and the State: Political Economy in the 1980s . New York, New York University Press, 1986, p. 13.
  • 18
    Na realidade ainda não há instituições a serem mudadas, estamos em um mundo anárquico.
  • 19
    "A existência desses direitos" (propriedade privada e restrições ao comportamento de cada indivíduo) "é indubitavelmente uma pré-condição necessária para a criação dos contratos pós-constitucionais, que é um sistema de trocas voluntárias" (Mueller, 1979, p. 12).
  • 20
    Neste ponto, sobre as condições que vigoram no momento do surgimento do contrato inicial, e sobre a possibilidade da unanimidade e da "justiça" deste, a análise dos autores da
    public choice é muito semelhante à de Rawls quanto à emergência do contrato e dos dois princípios de justiça.
  • 21
    Não podemos fazer comparações inter-pessoais de utilidades. Assim, atribuir o número 22 à A e 11 à B, não quer dizer que a utilidade de A seja maior do que a de B. Só podemos fazer estas relações para o mesmo indivíduo, assim, A prefere uma situação a que ele atribui utilidade 22 à outra a que ele atribui 3, por exemplo.
  • 22
    Existem vários estudos neste sentido: como os partidos se comportam e sobre qual deve ser o comportamento (programa) ótimo destes de forma a maximizar o número de eleitores. Este depende do número de partidos existentes e do formato das distribuições de preferências dos eleitores. Mostra-se que em uma situação bipartidária com distribuição normal das preferências, os programas dos partidos tendem a ser muito semelhantes, em torno das preferências do eleitor médio. A este respeito ver Muller (1979), Cap. 6
  • 23
    Sem estes limites constitucionais, o Estado poderia constantemente tentar ampliar sua participação, elevando as fontes de tributação. Com isso, segundo alguns, interfere-se na liberdade do setor privado que fica incerto sobre qual a parcela do seu produto lhe caberá. Assim há um desestímulo à produção e um estímulo à sonegação. A incerteza quanto à tributação é, segundo alguns, um dos grandes problemas do sistema tributário brasileiro e por isso defendem uma "Constituição tributária" que dê certeza aos agentes de quais são as regras do jogo, que lhes permita trabalhar livremente na fase pós-constitucional, sem a ameaça das arbitrariedades do Estado.
  • 24
    Percebe-se que em uma situação ditatorial, os custos de transação são nulos enquanto os custos externos podem elevar-se ao infinito, enquanto no caso da unanimidade o inverso se verifica.
  • 25
    Torna-se mais fácil identificar os beneficiários de determinadas ações e com isso imputar-lhes o custo, semelhantemente ao resultado atingido pelo Teorema de Coase.
  • 26
    Os custos externos reduzem-se mais ainda pela possibilidade levantada por alguns autores de que os indivíduos que se sentem prejudicados por determinadas medidas em dadas comunidades podem "votar com os pés" mudando-se para comunidades que representem melhor as suas preferências.
  • 27
    Niskanen, W., "Competition among governments bureaus" (p. 163), in Buchanan, J. M. (ed)
    The Economics of Politics, 1978, citado por Dunleavy e Ol-eary (1987), p. 85.
  • 28
    Este aperfeiçoamento, como vimos ao longo do trabalho, significa sempre para o autor uma menor interferência nas liberdades individuais. Podemos colocar como exemplos: uma constituição tributária, a independência do Banco Central, uma maior abertura ao exterior, etc. Segundo Buchanan, existem certas regras que devem ser invioláveis, a propriedade privada e a liberdade individual, por exemplo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 1996
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