Acessibilidade / Reportar erro

Estudo morfológico e histológico dos ovos de seis espécies do gênero Triatoma (Hemiptera: Reduviidae)

Morphological and histological study of eggs of six species of the Triatoma genus (Hemiptera: Reduviidae)

Resumos

O objetivo deste trabalho foi analisar as características morfológicas e histológicas dos ovos de seis espécies de triatomíneos, buscando a caracterização específica e genérica desses grupo de vetores do Trypanosoma cruzi e a melhor compreensão seus aspectos filogenéticos e taxonômicos. Os ovos das espécies estudadas foram obtidos no acervo do Laboratório de Triatomíneos e Culicídeos da Faculdade de Saúde Pública/USP, do Insetário do Serviço Especial de Saúde de Araraquara - SESA e do insetário de triatomíneos do Laboratório Nacional e Internacional de Referência em Taxonomia de Triatomíneos da FIOCRUZ, RJ. Estudos morfológicos foram realizados por meio de microscopia óptica e microscopia eletrônica de varredura. Nos estudos histológicos, utilizou-se microscopia óptica. Todas as espécies analisadas apresentaram predominância de células hexagonais. O exocório de Triatoma breyeri Del Ponte, T. costalimai Verano & Galvão e T. tibiamaculata (Pinto) é constituído por células sem ornamentações, justapostas ou levemente separadas, de aspecto liso e acolchoado. Por outro lado, em T. matogrossensis Leite & Barbosa, T. sherlocki Papa, Juberg, Carcavallo, Cerqueira & Barata e T. williami Galvão, Souza & Lima, as células do exocório apresentam ornamentações, tais como, perfurações e fraturas distribuídas em toda a superfície. Na histologia dos ovos observou-se a presença de ondulações, poros e orifícios. O estudo contribui para a ampliação do reconhecimento genérico e específico da subfamília Triatominae. As características identificadas no exocório das cascas dos ovos podem auxiliar na correta determinação de espécies próximas. Esses novos parâmetros poderão subsidiar a elaboração de futuras chaves dicotômicas e auxiliar na determinação do papel de cada espécie vetora.

Doença de Chagas; Triatominae; microscopia eletrônica de varredura


The objective of this study was to analyze the morphological and histological characteristics of eggs from six triatomine species in order to obtain a generic and specific characterization of this group of Trypanosoma cruzi vectors and better understand their phylogenetic and taxonomic aspects. The eggs of the respective species came from the collection of the Laboratório de Triatomíneos e Culicídeos da Faculdade de Saúde Pública/USP, from the Insetário do Serviço Especial de Saúde de Araraquara - SESA and from the Triatomine insectary of the Laboratório Nacional e Internacional de Referência em Taxonomia de Triatomíneos (FIOCRUZ), in Rio de Janeiro. Morphological studies were done with optical microscopy and scanning electron microscopy. Histological analyses used only optical microscopy. All of the species analyzed showed a predominance of hexagonal cells. The exchorion of Triatoma breyeri Del Ponte, T. costalimai Verano & Galvão, and T. tibiamaculata (Pinto) consists of unornamented cells, overlapping or slightly separated, with a smooth, padded appearance. Meanwhile, in T. matogrossensis Leite & Barbosa, T. sherlocki Papa, Juberg, Carcavallo, Cerqueira & Barata, and T. williami Galvão, Souza & Lima, the exchorion cells are ornamented on their entire surface with perforations and fissures. Egg histology showed undulations, pores, and orifices. The study helps to expand the generic and specific knowledge of the Triatominae subfamily. The characteristics identified in the exchorion of the eggshells can help separate close species. These new parameters will back the elaboration of future dichotomous keys, help to determine each vector species’ role and expand knowledge of the various species.

Chagas disease; Triatominae; scanning electronic microscopy


PUBLIC HEALTH

Estudo morfológico e histológico dos ovos de seis espécies do gênero Triatoma (Hemiptera: Reduviidae)

Morphological and histological study of eggs of six species of the Triatoma genus (Hemiptera: Reduviidae)

Marcos T. ObaraI; João A. da RosaII; Nilza N. da SilvaI; Walter Ceretti Jr.I; Paulo R. UrbinattiI; José M.S. BarataI; José JurbergIII; Cleber GalvãoIII

IDepto. Epidemiologia, Faculdade de Saúde Pública, Univ. São Paulo, Av. Dr. Arnaldo, 715, Pinheiros, 01246-904, São Paulo, SP, jmsbarat@usp.br ou obara@usp.br

IIDepto. Ciências Biológicas, Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Univ. Estadual Paulista (UNESP), Rod. Araraquara-Jaú, km 1, C. postal 502, 14801-902 Araraquara SP, rosaja@fcfar.unesp.br

IIILab. Nacional e Internacional de Referência em Taxonomia de Triatomíneos, Depto. Protozoologia, Instituto Oswaldo Cruz, Av. Brasil 4365, Rio de Janeiro, RJ, clebergalvao@gmail.com

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi analisar as características morfológicas e histológicas dos ovos de seis espécies de triatomíneos, buscando a caracterização específica e genérica desses grupo de vetores do Trypanosoma cruzi e a melhor compreensão seus aspectos filogenéticos e taxonômicos. Os ovos das espécies estudadas foram obtidos no acervo do Laboratório de Triatomíneos e Culicídeos da Faculdade de Saúde Pública/USP, do Insetário do Serviço Especial de Saúde de Araraquara - SESA e do insetário de triatomíneos do Laboratório Nacional e Internacional de Referência em Taxonomia de Triatomíneos da FIOCRUZ, RJ. Estudos morfológicos foram realizados por meio de microscopia óptica e microscopia eletrônica de varredura. Nos estudos histológicos, utilizou-se microscopia óptica. Todas as espécies analisadas apresentaram predominância de células hexagonais. O exocório de Triatoma breyeri Del Ponte, T. costalimai Verano & Galvão e T. tibiamaculata (Pinto) é constituído por células sem ornamentações, justapostas ou levemente separadas, de aspecto liso e acolchoado. Por outro lado, em T. matogrossensis Leite & Barbosa, T. sherlocki Papa, Juberg, Carcavallo, Cerqueira & Barata e T. williami Galvão, Souza & Lima, as células do exocório apresentam ornamentações, tais como, perfurações e fraturas distribuídas em toda a superfície. Na histologia dos ovos observou-se a presença de ondulações, poros e orifícios. O estudo contribui para a ampliação do reconhecimento genérico e específico da subfamília Triatominae. As características identificadas no exocório das cascas dos ovos podem auxiliar na correta determinação de espécies próximas. Esses novos parâmetros poderão subsidiar a elaboração de futuras chaves dicotômicas e auxiliar na determinação do papel de cada espécie vetora.

Palavras-chave: Doença de Chagas, Triatominae, microscopia eletrônica de varredura

ABSTRACT

The objective of this study was to analyze the morphological and histological characteristics of eggs from six triatomine species in order to obtain a generic and specific characterization of this group of Trypanosoma cruzi vectors and better understand their phylogenetic and taxonomic aspects. The eggs of the respective species came from the collection of the Laboratório de Triatomíneos e Culicídeos da Faculdade de Saúde Pública/USP, from the Insetário do Serviço Especial de Saúde de Araraquara - SESA and from the Triatomine insectary of the Laboratório Nacional e Internacional de Referência em Taxonomia de Triatomíneos (FIOCRUZ), in Rio de Janeiro. Morphological studies were done with optical microscopy and scanning electron microscopy. Histological analyses used only optical microscopy. All of the species analyzed showed a predominance of hexagonal cells. The exchorion of Triatoma breyeri Del Ponte, T. costalimai Verano & Galvão, and T. tibiamaculata (Pinto) consists of unornamented cells, overlapping or slightly separated, with a smooth, padded appearance. Meanwhile, in T. matogrossensis Leite & Barbosa, T. sherlocki Papa, Juberg, Carcavallo, Cerqueira & Barata, and T. williami Galvão, Souza & Lima, the exchorion cells are ornamented on their entire surface with perforations and fissures. Egg histology showed undulations, pores, and orifices. The study helps to expand the generic and specific knowledge of the Triatominae subfamily. The characteristics identified in the exchorion of the eggshells can help separate close species. These new parameters will back the elaboration of future dichotomous keys, help to determine each vector species’ role and expand knowledge of the various species.

Key words: Chagas disease, Triatominae, scanning electronic microscopy

A doença de Chagas é transmitida principalmente por insetos hematófagos da subfamília Triatominae, que eliminam as formas infectantes do Trypanosoma cruzi pelas fezes ou urina após a alimentação. Estes, por sua vez, podem penetrar através da pele ou das mucosas dos hospedeiros humanos, ou de outros vertebrados (Moncayo 1999, Schumunis 2000).

A subfamília Triatominae atualmente é composta de 137 espécies, sendo que o gênero Triatoma é o mais numeroso, com cerca de 82 espécies (Galvão et al. 2003, Galvão & Ângulo 2006). A identificação e a caracterização específica desses vetores, como de muitos grupos de insetos, está apoiada principalmente nos estudos morfológicos, embora tentativas de reconstrução da filogenia da subfamília venham sendo baseadas num conjunto mais amplo de informações, incluindo ferramentas bioquímicas e genéticas (Carcavallo et al. 2000, Hypša et al. 2002, Galvão 2003).

O primeiro estudo morfológico comparado de ovos da subfamília Triatominae foi realizado por Pinto, em 1924. Abalos & Wygodzinsky (1951) em trabalho monográfico intitulado "Las Triatominae Argentinas", estudaram e ilustraram o cório dos ovos de onze espécies. Barth & Muth (1958) apresentaram a descrição da superfície exocorial de ovos de Triatoma sordida (Stål), T. infestans (Klug), T. brasiliensis Neiva, T. vitticeps (Stål), Panstrongylus megistus (Burmeister), Rhodnius prolixus Stål e R. neglectus Lent.

A partir da presença de "colarinho" na margem apical dos ovos, Forattini & Barata (1974) distinguiram R. neglectus de R. prolixus. Esses autores verificaram que o "colarinho" estava presente na primeira e ausente na segunda espécie.

Analisando a esculturação exocorial e aspectos macroscópicos dos ovos com microscopia ótica (MO) e microscopia eletrônica de varredura (MEV), Barata (1981) estabeleceu o diagnóstico diferencial de 10 espécies do gênero Rhodnius Stål e elaborou uma chave dicotômica. Em 1998, o mesmo autor ampliou o estudo da morfologia dos ovos de Triatominae, incluindo informações de mais oito gêneros (Barata 1998).

Rosa et al. (1992), estudando seis espécies de triatomíneos com o auxílio de MEV, encontraram diferenças significativas na morfologia do oitavo e nono segmentos abdominais ventrais. Em 1999, Rosa et al. apontaram diferenças estruturais morfológicas na cabeça entre as ninfas de 1° e 5° estádios de Triatoma circummaculata (Stål) e T. rubrovaria (Blanchard) vistas através da MEV.

Jurberg et al. (1993), utilizaram MEV e MO na análise de ovos e ninfas de Dipetalogaster maxima (Uhler), complementando o conhecimento da morfologia de todos os estágios de vida dessa espécie. Em trabalhos subseqüentes foram abordados parâmetros morfológicos e morfométricos de ovos de Triatoma lecticularia (Stål), T. vitticeps e T. matogrossensis Leite & Barbosa (Jurberg &Vogel 1994, Jurberg & Campos 1995, Rocha et al. 1996).

Rosa et al. (2000), a partir de estudos morfométricos e morfológicos dos ovos de T. rubrovaria e T. circummaculata por MEV, evidenciaram a distinção entre essas espécies, uma vez que podem ser encontradas juntas e ocupam ecótopos semelhantes, conforme Carcavallo et al. (2000). Dessa maneira, o estudo dos caracteres de ovos é de fundamental importância na identificação correta e específica dos triatomíneos vetores e no conhecimento da epidemiologia da moléstia.

O estudo do exocório de ovos desenvolvido por meio de MO e MEV fundamenta-se não só no maior aprofundamento do conhecimento da subfamília Triatominae, mas também na exigência da identificação mais precisa dessas espécies. No caso de possível reinfestação, onde é feito o controle, as populações de vetores tornam-se rarefeitas e no ambiente domiciliar passa a ser mais freqüente encontrar ovos, algumas vezes já eclodidos, ou exúvias, do que ninfas e adultos (Barata 1979, Rocha et al. 1996).

No presente trabalho, amplia-se o conhecimento dos aspectos morfológicos e histológicos de ovos do gênero Triatoma por meio de MEV e cortes histológicos, descrevendo as variações encontradas em seis espécies ainda não estudadas neste estágio de desenvolvimento.

Material e Métodos

Estudaram-se os ovos das seguintes espécies e procedências: Triatoma breyeri Del Ponte (Córdoba, Argentina); T. costalimai Verano & Galvão (Luís Veloso, GO, Brasil); T. matogrossensis (Aquidauana, MT, Brasil); T. sherlocki Papa, Jurberg, Carcavallo, Cerqueira e Barata (Santo Inácio, BA, Brasil); T. tibiamaculata (Pinto) (Cananéia, SP, Brasil); T. tibiamaculata (Iguape, SP, Brasil) T. tibiamaculata (SP, Brasil); e T. williami Galvão, Souza & Lima (Fazenda Nova, GO, Brasil). Os ovos das espécies estudadas foram obtidos no acervo do Laboratório de Triatomíneos e Culicídeos da Faculdade de Saúde Pública/USP, do Insetário do Serviço Especial de Saúde de Araraquara - SESA e do insetário de triatomíneos do Laboratório Nacional e Internacional de Referência em Taxonomia de Triatomíneos da FIOCRUZ/RJ.

Os desenhos dos aspectos gerais, tanto do opérculo quanto do corpo do ovo, foram realizados em lupa estereoscópica ZEISS®-Semi SV6 com dispositivo de câmara clara acoplado. Nos desenhos dos detalhes exocoriais dos ovos utilizou-se também microscópio bacteriológico binocular LEICA® com dispositivo de câmara clara acoplado.

Para a realização das fotografias em MEV, cinco exocórios de ovos eclodidos e cinco opérculos de cada localidade foram aderidos, por meio de esmalte de unha incolor, em toros de latão de 10 mm de diâmetro e 5 mm de altura e metalizados com ouro carbono em metalizador "Sputter SCD 004". As amostras foram analisadas e fotografadas em microscópio eletrônico de varredura JEOL® JSM T-330A.

Para as análises histológicas foram selecionadas cinco exocórios de ovos eclodidos de cada espécie, colocados em pequenas placas de Petri contendo acetona, lavados em aparelho ultra-som, secos em estufa a 40C° durante 30 min. Depois de secos, os exocórios foram transferidos para o interior de pequenos cassetes de plásticos e submetidos ao processamento histológico em solução descalcificadora de "MORSE" (ácido fórmico + citrato de sódio) para o amolecimento (15 min). Com auxílio de bisturi, as cascas foram partidas ao meio sob lupa cirúrgica. Os fragmentos resultantes foram lavados em água corrente por 1h, desidratados em série alcoólica (2h), diafanizados em xilol por 1h e incluídos em parafina líquida no interior de estufa (2h). Em seqüência, as amostras foram cortadas em micrótomo LEICA RM2145® com espessuras de 5 µm, e coradas com Hematoxilina de Harris (10 min) e Eosina de Lison (5 min). As observações foram feitas em microscópio de luz (Optiphot-2, NIKON, Japão) e fotografadas com câmera NIKON FDX 35 mm acoplada. Para as fotografias, utilizou-se filme KODAK Proimage ASA 100.

Resultados

Aspectos Morfológicos por Meio de MO e MEV

T. breyeri. Exocório do corpo e opérculo com células poligonais que variam de pentagonais a heptagonais, com maior predominância de células hexagonais, justapostas, de aspecto liso e com linhas limitantes evidentes, sendo as do opérculo menores, ambos sem ornamentações e de aspecto liso (Figs. 1a, b, 2a , 3a , 4a , 5a ).


Opérculo do ovo circular, convexo, simétrico e com borda opercular estreita. Exocório com áreas poligonais que variam de pentagonais a hexagonais, raramente quadrangulares, justapostas, com aspecto acolchoado, sem estruturas presentes no interior (Figs. 5a , 6a).



Borda corial formada por uma pequena faixa estreita, com aerópilas em sua parte superior (Fig. 7a).



T. costalimai. Exocório do opérculo ornamentado com células poligonais irregulares separadas, a maioria pentagonais, e com pequenas perfurações distribuídas aleatoriamente (Fig. 5b ). No interior de cada célula há pequenas pontuações (Fig. 8a). O corpo do ovo é constituído por áreas poligonais, a maioria delas hexagonais, justapostas e sem ornamentações (Fig. 2b ), com áreas poligonais hexagonais, justapostas, levemente rugosas e sem a superfície central ornamentada por perfurações (Figs. 3b e 4b ).


Opérculo do ovo com a forma circular convexa, levemente plana, simples e com borda opercular estreita (Figs. 6b).

Borda corial constituída por faixa estreita em forma de anel, apresenta aerópilas em sua parte superior e, logo abaixo, pequenas perfurações (Fig. 7b).

T. matogrossensis. Superfície do exocório, tanto do opérculo quanto do corpo do ovo, formada por áreas poligonais pentagonais, basicamente hexagonais, ligeiramente acolchoadas, com algumas perfurações e fraturas distribuídas aleatoriamente em toda a extensão (Figs. 9a, b, 3c , 4c , 5c ). No opérculo, os polígonos são menores e ligeiramente separados entre si (Fig. 9a). As linhas que dividem ás áreas poligonais apresentam aspecto reto formando evidente faixa clara e estreita de separação (Fig. 4c ).


Opérculo do ovo com forma circular ligeiramente convexa, quase plana, simétrica e com borda opercular estreita (Fig. 6c).

Borda corial estreita com aerópilas em sua parte superior, logo abaixo estão as goteiras espermáticas (responsáveis pela entrada do espermatozóide dentro do ovo) (Fig. 7c).

T. sherlocki.Estrutura exocorial do ovo e do opérculo com áreas poligonais irregulares, que variam de pentagonais a heptagonais, em sua maioria hexagonais, levemente justapostas e "estofadas". No interior de cada célula são encontradas ornamentações formadas por linhas curvilíneas, sendo que no opérculo, além das linhas, há pequenas pontuações, pouco visíveis. Os polígonos do opérculo são menores que os do corpo (Figs. 10a, b, 4d, 5d).


Opérculo do ovo com forma circular, convexa, quase plana, simétrica e com borda opercular estreita (Fig. 6d).

Borda corial estreita, com aerópilas na parte superior, logo abaixo, estão as goteiras espermáticas (Fig. 7d).

T. tibiamaculata. Corpo e opérculo formados por áreas poligonais em toda sua extensão, a maioria hexagonais, de aspecto liso, acolchoado e levemente separadas, ausência de ornamentações (Figs. 11a, b, 3e, 4e, 5e).


Nas linhas que dividem as células poligonais observa-se um par de estruturas paralelas que formam uma estreita faixa de separação (Fig. 4e).

Opérculo simples, assimétrico com borda opercular larga (Fig. 6e). Borda corial formada por pequena faixa estreita (Fig. 7e).

T. williami.Corpo e opérculo com exocório com áreas pentagonais e hexagonais, sendo as do opérculo menores (Figs. 12a, b, 3f, 4f, 5f). As linhas que percorrem o contorno das células do opérculo não formam polígonos definidos (Fig. 5f). O opérculo, bem como o corpo do ovo, apresentam numerosas perfurações distribuídas aleatoriamente em toda sua extensão (Fig. 12a, b, 3f, 4f, 5f). Corpo do ovo com exocório constituído por áreas poligonais hexagonais, justapostas, com numerosas perfurações no interior das células; nos bordos, as linhas limitantes que dividem as áreas poligonais são pouco evidentes (Figs. 2f, 3f, 4f). O opérculo do ovo possui áreas poligonais irregulares, raramente quadrangulares e pequenas perfurações, pouco visíveis, distribuídas aleatoriamente na superfície e nos bordos (Fig. 5f).


Opérculo do ovo circular, convexo, assimétrico com borda opercular estreita (Fig. 6f).

Borda corial com aspecto estreito com aerópilas na parte superior (Fig. 7f).

Aspectos Histológicos

Nas seis espécies estudadas, é possível observar, por meio de microscopia óptica, as camadas distintas que formam o cório. Em T. breyeri e T. costalimai (Figs. 13a, b) a coloração da casca atinge tanto o endocório, como parte do exocório, o que lhe dá aparência de duas faixas coradas intermediadas por faixa não corada. Em T. matogrossensis, e particularmente, em T. tibiamaculata (Figs. 13c, e), com a metodologia empregada, os corantes utilizados aumentam de intensidade, na medida que se direcionam da periferia para o centro (endocório).


Foi possível, a partir dos cortes histológicos, detectar a presença de poros, orifícios e canalículos em T. matogrossensis, T. sherlocki e T. williami (Figs. 13c, d, f), nesta última, chegando até a atingir parte do endocório mole (Fig. 13f). Possivelmente, tais estruturas são a extensão das "perfurações" e "fraturas" encontradas nessas espécies (Figs. 4c , d, f). Não foi possível visualizar tais estruturas através de cortes histológicos em T. breyeri, T. costalimai e T. tibiamaculata (Figs. 13a, b, e).

Em T. matogrossensis e T. sherlocki (Figs. 13c, d), além dessas estruturas, a linha formadora da parte externa do exocório apresenta-se acentuadamente ondulada, indicando a presença de células hexagonais acolchoadas ou estofadas. Em T. tibiamaculata (Fig. 13e), tais ondulações também podem ser visualizadas, embora com menor evidência do que nas duas espécies acima citadas.

Discussão

Em 1924, Pinto diferenciou os ovos de T. brasiliensis de outras espécies de "barbeiros" existentes no Brasil. Baseando na variação da coloração do ovo durante o desenvolvimento do embrião e na presença de duas manchas vermelhas sob o cório, correspondendo aos dois olhos da ninfa, esse autor chamou a atenção para caracteres de diagnósticos relevantes e ressaltou a importância do conhecimento da morfologia dos ovos dos na sistemática dos triatomíneos.

Todas as espécies aqui observadas apresentaram a forma do ovo de acordo com o padrão descrito para as demais espécies do gênero Triatoma estudadas (Barata 1998): 1) aspecto geral elipsóide, podendo ser mais ou menos alongado nas diferentes espécies; 2) freqüentemente simétrico; 3) colo ausente ou vestigial; 4) ausência de colarinho e 5) ausência de achatamento lateral evidente. O opérculo apresentou-se pouco convexo, quase plano e sem estruturas evidentes, como as demais espécies de Triatoma. No presente trabalho a morfologia e histologia dos ovos das seis espécies são analisadas pela primeira vez, com exceção de T. matogrossensis, cujos dados conhecidos anteriormente referiam-se apenas aos aspectos macroscópicos dos ovos.

As características observadas nos ovos de T. breyeri, T. costalimai e T. tibiamaculata, ou seja, o padrão simples (sem a presença de estruturas complexas) tanto do exocório quanto da forma do ovo é muito semelhante àquelas encontradas por Barata (1998) para as espécies pertencentes ao gênero Panstrongylus Berg.

As seis espécies estudadas apresentaram predominância de células hexagonais, na superfície exocorial dos ovos. Apesar de T. breyeri, T. costalimai e T. tibiamaculata apresentarem, de certa forma, um padrão característico, ou seja, células hexagonais desprovidas de ornamentações, comparativamente em T. tibiamaculata, as células hexagonais são ligeiramente separadas (Fig. 4e), enquanto que T. breyeri e T. costalimai apresentam essas células hexagonais justapostas (Figs. 4a , b ). Além disso, a superfície externa de T. costalimai apresenta-se ligeiramente rugosa (Fig. 4b ), enquanto que T. breyeri e T. tibiamaculata (Figs. 4a , b ) têm aspecto liso.

A arquitetura exocorial dos ovos de T. matogrossensis, T. sherlocki e T. williami, quando estudadas por MO e por MEV, apresentaram as células hexagonais com fraturas e perfurações. Em T. matogrossensis há pequenas fraturas (Fig. 4c ), localizadas no interior de células acolchoadas, ao contrário de T. sherlocki e T. williami, que apresentam células estofadas, com ornamentações de linhas curvilíneas, semelhantes a perfurações (Figs. 4d, f).

Silva et al. (2000), estudando os ovos de T. guazu Lent & Wygodzinsky, descreveram o opérculo e o corpo do ovo como sendo formados por células poligonais justapostas, com pequenas perfurações distribuídas aleatoriamente. Jurberg et al. (2002) relataram que as espécies pertencentes ao complexo T. oliveirai (Neiva, Pinto & Lent), quando observadas por MO, apresentavam características macroscópicas capazes de distinguí-las, conforme a presença de ornamentações específicas distribuídas no exocório. Assim, T. matogrossensis, T. williami, T. jurbergi Carcavallo, Galvão & Lent, T. klugi Carcavallo, Juberg, Lent & Galvão, T. guazu poderiam ser identificadas por estes caracteres.

No presente trabalho observou-se que em T. matogrossensis, tais células são ligeiramente separadas, e as perfurações têm distribuição menos homogênea, inclusive com maior freqüência da distribuição das pequenas fraturas que são mais abundantes, evidentes, separadas e retas (Fig. 4c ). Em T. jurbergi, o opérculo é ornamentado por pequenas fraturas e o corpo, além de pequenas fraturas, contém pontuações distribuídas aleatoriamente (Jurberg et al. 2002). T. williami e T. matogrossensis, espécies estudadas no presente trabalho podem ser distintamente separadas entre si, através da análise da arquitetura exocorial dos ovos por MEV. A diagnose dessas duas espécies em relação às demais incluídas neste complexo pode ser feita por meio dos dados da literatura.

Baseado nos aspectos morfológicos de ovos do gênero Triatoma, Barata (1998) identificou basicamente dois grupos. Um dos grupos seria formado por espécies cujo exocório é formado por áreas hexagonais com perfurações esparsas de tamanho e forma indefinida. T. matogrossensis, T. sherlocki e T. williami, analisadas neste trabalho, estariam inseridas nesse grupo. No outro grupo estariam incluídas as espécies que não têm o exocório com arquitetuta bem definida, por exemplo, a borda corial formada por anel largo e liso, o opérculo com estruturas complexas e a fixação do ovo a um substrato.

Além desses dois padrões descritos por Barata (1998), neste trabalho a análise das características exocoriais mostrou a existência de um terceiro padrão observado em T. breyeri, T. tibiamaculata, e T. costalimai: exocório apresentando células hexagonais lisas, particularmente sem ornamentações e de estrutura semelhante à descrita para o gênero Panstrongylus Berg (Barata 1998). Neste grupo, além dessa característica, algumas espécies podem apresentar superfície externa ligeiramente rugosa como em T. costalimai (Fig. 4b ), de aspecto "estofado" como em T. tibiamaculata (Fig. 4e), ou totalmente lisa como em T. breyeri (Fig. 4a ).

A análise histológica do cório mostrou estruturas como "poros", "orifícios" e "canais" possivelmente extensão das "perfurações" e "fraturas" encontradas no exocório de algumas das espécies analisadas (Figs. 13c, d, f). Além disso, em algumas espécies em corte histológico o exocório apresenta evidente ondulação o que possivelmente se refere ao aspecto "acolchoado" das células hexagonais.

Agradecimentos

Ao Prof. Dr. Jarbas Arruda Bauer e Margareth Arroyo do Laboratório de Neurobiologia do Sistema Trigeminal, do Instituto de Ciências Biológicas da USP, pelo subsídio de equipamento histológico e apoio. Ao técnico Sebastião, do Inst. Química/UNESP-Araraquara pelo manuseio do MEV, e a Daniel Flores, da FSP/USP pela revelação das fotografias. A João Luis Molina Gil e João da Nóbrega, do Insetário de Triatomíneos do Serviço Especial de Saúde de Araraquara-SESA, pelo envio de material entomológico. A CAPES, CNPq e SVS-MS pelo apoio financeiro e bolsas de estudos concedidas.

Received 24/IV/06. Accepted 28/II/07.

  • Abalos, J.W. & P. Wygodzinsky. 1951. Las Triatominae argentinas (Hemiptera, Reduviidae). Tucuman (Argentina), [monografia - Universidade Nacional de Tucuman], 179p.
  • Barata, J.M.S. 1981. Aspectos morfológicos de ovos de triatomíneos. II Características macroscópicas e exocoriais de dez espécies do gênero Rhodnius Stal, 1859 (Hemiptera, Reduviidae). Rev. Saúde Publ. São Paulo 15: 490-452.
  • Barata, J.M.S. 1998. Macroscopic and exocorial structures of Triatominae eggs (Hemiptera, Reduviidae), p.409-448. In R.U. Carcavallo, I. Galíndez-Girón, J. Jurberg & H. Lent (eds.), Atlas of Chagas disease vectors in the Americas, v. II, Editora Fiocruz, Rio de Janeiro, 733p.
  • Barth, R. & H. Muth. 1958. Estudos anatômicos e histológicos sobre a subfamília Triatominae (Heteroptera, Reduviidae). VIII parte: Observações sobre a superfície dos ovos das espécies mais importantes. Mem. Inst. Oswaldo Cruz 56: 197-208.
  • Carcavallo, R.U., J. Jurberg, H. Lent, F. Noireau & C. Galvão. 2000. Phylogeny of the Triatominae (Hemiptera: Reduviidae). Proposals for taxonomic arrangements. Entomol. Vect. 7:1-99.
  • Forattini O.P. & J.M.S. Barata. 1974. Nota sobre a diferenciação de ovos de Rhodnius neglectus e R. prolixus Rev. Saúde Públ. 8: 447-450.
  • Galvão, C. 2003. A sistemática dos triatomíneos (Hemiptera, Reduviidae), de De Geer ao DNA. Entomol. Vect. 10: 511-530.
  • Galvão, C., R.U. Carcavallo, D.S. Rocha & J. Jurberg. 2003. A checklist of the current valid species of the subfamily Triatominae Jeannel, 1919 (Hemiptera, Reduviidae) and their geographical distribution, with nomenclatural and taxonomic notes. Zootaxa 202: 1-36.
  • Galvão, C. & V.M. Angulo 2006. Belminus corredori, a new species of Bolboderini (Hemiptera: Reduviidae: Triatominae) from Santander, Colombia. Zootaxa 1241: 61-68.
  • Hypa, V., D.F. Tietz, J. Zrzavý, R.O.M. Rego, C. Galvão & J. Jurberg. 2002. Phylogeny and biogeography of Triatominae (Hemiptera: Reduviidae): molecular evidence of a New World origin of the Asiatic clade. Mol. Phyl. Evol. 23: 447-457.
  • Jurberg, J., L.M. Fagundes & O.M. Barth. 1993. Estudo morfológico de ovos e ninfas de Dipetalogaster maximus (Uhler, 1894) (Hemiptera, Reduviidae,Triatominae). Rev. Bras. Biol. 53: 269-283.
  • Jurberg, J., M.B.A. Silva, C. Galvão, D.S. Rocha, H.S. Barbosa & R.U. Carcavallo. 2002. Descrição de ovos e dos estádios ninfais de Triatoma jubergi Carcavallo, Galvão & Lent, 1998 vistos através de microscopia óptica e eletrônica de varredura (Hemiptera, Reduviidae). Mem. Inst. Oswaldo Cruz 97: 209-216.
  • Jurberg, J. & M. Vogel. 1994. Morfologia de huevos y ninfas de Triatoma matogrossensis Leite e Barbosa, 1953 (Hemiptera, Reduviidae). Entomol. Vect. 1: 167-177.
  • Jurberg, J. & P. Campos. 1995. Morfologia de huevos y ninfas de Triatoma vitticeps (Stål, 1859) (Hemiptera, Reduviidae). Entomol. Vect. 2: 9-22.
  • Moncayo, A. 1999. Progress towards interruption of transmission of Chagas disease. Mem Inst Oswaldo Cruz 94: 401-404.
  • Pinto, C. 1924. Biologia do Triatoma brasiliensis Neivai. Sciencia Médica 2: 541-543.
  • Rocha, D.S., J. Jurberg & C. Galvão. 1996. Descrição de ovos e ninfas de Triatoma lecticularia (Stål, 1859) (Hemiptera, Reduviidae, Triatominae). Entomol. Vect. 3: 123-135.
  • Rosa, J.A. da, J.M.S. Barata, J.L.F. Santos & M. Cilense. 2000. Morfologia de ovos de Triatoma circummaculata e Triatoma rubrovaria (Hemiptera, Reduviidae). Rev. Saúde Públ. 34: 538-542.
  • Rosa, J.A. da, J.M.S. Barata, M. Cilense & F.M. Belda Neto. 1999. Head morphology of 1st and 5th instar nymphs of Triatoma circummaculata and Triatoma rubrovaria (Hemiptera, Reduviidae). Int. J. Insect Morphol. Embriol. 28: 363-375.
  • Rosa, J.A. da, J.M.S. Barata, N. Barelli, J.L.F. Santos & F.M. Belda Neto. 1992. Sexual distinction between 5th instar nymphs of six species of Triatominae (Hemiptera, Reduviidae). Mem. Inst. Oswaldo Cruz 87: 257-264.
  • Schumunis, G.A. 2000. A Tripanossomíase Americana e seu impacto na Saúde Pública das Américas. In: Brener Z., Andrade Z.A., Barral-Netto M. Trypanosoma cruzi e Doença de Chagas. Rio de Janeiro: 2ş ed. Guanabara Koogan;. p. 1-15.
  • Silva, M.B.A., J. Juberg, C. Galvão & R.U. Carcavallo. 2000. Estudo morfológico e morfométrico de ovos e ninfas de Triatoma guazu Lent & Wygodzinsky, 1979 (Hemiptera, Reduviidae, Triatominae) vistos por microscopia Óptica e Eletrônica de Varredura. Entomol. Vect. 7: 311-334.

  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Nov 2007
    • Data do Fascículo
      Out 2007

    Histórico

    • Aceito
      28 Fev 2007
    • Recebido
      24 Abr 2006
    Sociedade Entomológica do Brasil Sociedade Entomológica do Brasil, R. Harry Prochet, 55, 86047-040 Londrina PR Brasil, Tel.: (55 43) 3342 3987 - Londrina - PR - Brazil
    E-mail: editor@seb.org.br