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Dinâmica da taxa de câmbio em uma economia monetária periférica: uma abordagem keynesiana

Dynamics of the exchange rate in a peripheral monetary economy: a keynesian approach

Resumos

O artigo discute os determinantes da taxa de câmbio em uma economia monetária periférica, com base em uma perspectiva teórica centrada na economia política keynesiana. Para tal, analisam-se inicialmente as propriedades essenciais de uma economia monetária aberta e, na sequência, apresentam-se as proposições básicas da visão pós-keynesiana da determinação da taxa de câmbio, desenvolvida principalmente por John Harvey, o qual, no entanto, não discute as causas específicas do comportamento da taxa de câmbio em economias periféricas "emergentes". Por fim, após reexaminar a ideia de "condição periférica", o texto discute as peculiaridades históricas e institucionais associadas ao modo de inserção das economias periféricas no sistema monetário e financeiro internacional moderno.

taxas de câmbio; economia monetária; economia keynesiana; centro-periferia


The purpose of this paper is to discuss, from a Keynesian analytical perspective, the determination of exchange rates in a peripheral monetary economy. Initially, the paper approaches the essential properties of an open monetary economy. Next, it presents the basic proposals of the Post Keynesian view of exchange rate determination, which was developed chiefly by John Harvey, who, nevertheless, does not discuss the specific causes of exchange rates behaviour in "emerging" peripheral economies. Finally, after re-examining the idea of "peripheral condition," the paper approaches the historical and institutional peculiarities associated with the way in which peripheral economies are integrated in the modern international monetary and financial system.

exchange rates; monetary economy; Keynesian economics; centre-periphery


ESTANTE DE HISTÓRIA DO PENSAMENTO ECONÔMICO E ECONOMIA POLÍTICA

Dinâmica da taxa de câmbio em uma economia monetária periférica: uma abordagem keynesiana

Dynamics of the exchange rate in a peripheral monetary economy: a keynesian approach

Rogerio P. de AndradeI; Daniela Magalhães PratesII

IProfessor do Instituto de Economia, Unicamp

IIProfessora do Instituto de Economia, Unicamp, e Pesquisadora do CNPq

RESUMO

O artigo discute os determinantes da taxa de câmbio em uma economia monetária periférica, com base em uma perspectiva teórica centrada na economia política keynesiana. Para tal, analisam-se inicialmente as propriedades essenciais de uma economia monetária aberta e, na sequência, apresentam-se as proposições básicas da visão pós-keynesiana da determinação da taxa de câmbio, desenvolvida principalmente por John Harvey, o qual, no entanto, não discute as causas específicas do comportamento da taxa de câmbio em economias periféricas "emergentes". Por fim, após reexaminar a ideia de "condição periférica", o texto discute as peculiaridades históricas e institucionais associadas ao modo de inserção das economias periféricas no sistema monetário e financeiro internacional moderno.

Palavras-chave: taxas de câmbio, economia monetária, economia keynesiana, centro-periferia.

Classificação JEL B50, F02, F30, F50.

ABSTRACT

The purpose of this paper is to discuss, from a Keynesian analytical perspective, the determination of exchange rates in a peripheral monetary economy. Initially, the paper approaches the essential properties of an open monetary economy. Next, it presents the basic proposals of the Post Keynesian view of exchange rate determination, which was developed chiefly by John Harvey, who, nevertheless, does not discuss the specific causes of exchange rates behaviour in "emerging" peripheral economies. Finally, after re-examining the idea of "peripheral condition," the paper approaches the historical and institutional peculiarities associated with the way in which peripheral economies are integrated in the modern international monetary and financial system.

Key words: exchange rates; monetary economy; Keynesian economics; centre-periphery.

JEL Classification B50, F02, F30, F50.

1_ Introdução

Este artigo pretende discutir, a partir de um referencial teórico keynesiano, os determinantes da trajetória da taxa de câmbio em economias monetárias periféricas que se inseriram nos processos de globalização financeira, convertendo-se em economias "emergentes". Esse tema ganhou relevância a partir do final da década de 1990, quando as políticas de câmbio administrado (fixo ou bandas cambiais) predominantes nesses países culminaram em sucessivas crises cambiais e foram substituídas pelos regimes de câmbio flutuante. Contudo, embora a maioria dos países emergentes adote de jure esse regime, as respectivas autoridades monetárias procuram, de facto, deter os movimentos da sua taxa de câmbio mediante intervenções ativas nos mercados cambiais. Assim, na realidade, o regime cambial predominante nesses países no período pós-crise é o regime de flutuação suja, com graus diferenciados de intervenção.

As intervenções sistemáticas dos Bancos Centrais nos mercados de câmbio - expressão do "medo de flutuar" (fear of floating), nos termos de Calvo & Reinhart (2002) - estariam associadas à necessidade de conter a volatilidade excessiva das taxas de câmbio flutuantes nas economias periféricas (que se revelou muito maior do que nos países centrais) e/ou à adoção de estratégias defensivas em meio a um ambiente financeiro internacional marcado pela instabilidade dos fluxos de capitais, especialmente daqueles direcionados para esses países. Esse comportamento defensivo manifesta-se mediante tentativas de redução da vulnerabilidade externa por meio da acumulação preventiva de reservas cambiais (uma "demanda precaucional" por reservas) e/ou busca de um patamar competitivo para a taxa de câmbio no âmbito de políticas de crescimento baseadas no esforço exportador (Dooley; Folkerts-Landau & Garber, 2005; Aizenman; Lee & Rhee, 2004).

A abordagem pós-keynesiana da determinação da taxa de câmbio, desenvolvida, principalmente, por John Harvey, contribui para a compreensão da dinâmica das taxas de câmbio no sistema monetário e financeiro internacional globalizado que emergiu após o colapso do regime de Bretton Woods. No entanto, não fornece uma explicação para as especificidades dessa dinâmica no caso das economias periféricas emergentes, entre as quais a sua maior volatilidade. Para avançar nessa explicação, resgataremos, a seguir, as reflexões de Keynes e keynesianos sobre as propriedades de uma economia monetária, bem como discutiremos o perfil hierárquico e assimétrico do sistema monetário e financeiro internacional. Além disso, revisitaremos a abordagem estruturalista acerca da natureza da condição periférica.

A presente discussão está organizada da seguinte forma. Na sequência desta introdução, o item dois discutirá, de acordo com uma perspectiva keynesiana, as propriedades essenciais de uma economia monetária. Tal item abordará ainda os principais aspectos de uma economia monetária aberta. O item três apresentará a visão pós-keynesiana da determinação da taxa de câmbio. O item quatro resgatará a ideia de "condição periférica" e examinará as especificidades da dinâmica cambial nas economias periféricas emergentes. O último item apresentará as considerações finais do artigo.

2_ A Estrutura analítica: propriedades essenciais de uma economia monetária

Nosso ponto de partida está em reconhecer a importância da sugestão de Keynes (1933) de que as economias modernas são economias monetárias, no sentido de que a existência do dinheiro afeta de forma crucial os motivos e as decisões dos agentes econômicos, tanto no curto como no longo prazo.

Em uma economia monetária, a função reserva de valor da moeda é fundamental. Por meio dela, é possível entender o dinheiro como o "refúgio da incerteza", a "morada do poder de compra", ou uma "máquina do tempo de liquidez" (Davidson, 1994). O dinheiro torna-se o elo menos incerto entre o presente (ou o "passado irrevogável") e o futuro desconhecido, a forma mais segura de preservar riqueza e poder de compra ao longo do tempo. Uma consequência disso é que, ao se tornar uma forma de retenção de riqueza, a moeda transforma-se também em um ativo; portanto, torna-se uma alternativa a outras formas de acumulação de riqueza, principalmente em situações de elevada incerteza em relação ao futuro.

Em uma economia monetária, o dinheiro não é tido como neutro, ou seja, não é mera conveniência facilitadora das trocas. Uma economia monetária é o termo que deve ser utilizado para caracterizar um sistema econômico (capitalista)

in which money plays a part of its own and affects motives and decisions and is, in short, one of the operative factors in the situation, so that the course of events cannot be predicted, either in the long period or in the short, without a knowledge of the behaviour of money between the first state and the last

(Keynes, 1933, p. 408-409).

Em uma economia monetária, os vários ativos, inclusive a moeda, possuem atributos peculiares. Esses atributos, que qualquer ativo possui em maior ou menor grau, são (Keynes, 1936, cap. 17; Carvalho, 1992, cap. 5): a) as quasi-rendas esperadas q, b) o custo de carregamento c, c) o prêmio de liquidez l, e d) a valorização esperada a.

A combinação desses atributos fornece a taxa própria de juros de um ativo qualquer (ra) (ou seu retorno total esperado):

r a = a + q - c + l

A preferência pela liquidez se expressa por meio de um trade-off entre retornos monetários (a + q - c) e o prêmio de liquidez (l). Esse dilema se reflete na forma como os agentes estruturam sua carteira de ativos, isto é, como gerenciam seu estoque de riqueza ao longo do tempo. Em particular, em uma economia monetária com tais características, a liquidez é fortemente valorizada em momentos em que a incerteza em relação ao futuro é tida como mais elevada, justificando maior demanda pelo ativo dinheiro, ou substitutos muito próximos a ele, de forma a compor um portfólio o mais líquido possível, à espera de circunstâncias mais auspiciosas no que toca à posse de ativos menos líquidos que possam, eventualmente, vir a oferecer retornos monetários esperados mais elevados. Assim, uma (percepção de) maior incerteza rebaixa q e aumenta l. Neste sentido, a busca por liquidez tem papel crucial na determinação das decisões de gasto. Daí a ideia de que o dinheiro tem implicações de curto e de longo prazo sobre o "lado real" da economia. Dada a lógica de acumulação capitalista e a existência ubíqua da incerteza, em determinadas situações haverá clara preferência pelo dinheiro e seus substitutos mais próximos, uma vez que esses são os ativos líquidos par excellence.

A preferência pela liquidez corresponde, portanto, a uma forma de comportamento racional (defensivo) sob incerteza keynesiana genuína ou fundamental (não quantificável, não probabilística).1 1 Obviamente, o conceito de incerteza aqui enfatizado é aquele teorizado de forma consistente, desde Keynes, por Shackle (e.g., 1972, 1979), Davidson (e.g., 1994), Lawson (1988), Runde (1990), Dow (1995), Vercelli (2002) e Dequech (2000), entre outros. A preferência pela liquidez, assim como o recurso às convenções (discutidas adiante), é, do ponto de vista de uma análise keynesiana, a resposta tipicamente racional de agentes que devem elaborar cálculos prospectivos e tomar decisões estratégicas em um ambiente de incerteza.

Convenções

Em uma economia monetária, uma forma que os agentes encontram para lidar com a incerteza em relação ao futuro consiste na adoção de comportamentos convencionais. A análise de Keynes das convenções está exposta no capítulo 12 da Teoria Geral (TG) e em seu artigo seminal de 1937 (Keynes, 1936, 1937a).

Nos termos de Keynes, a convenção possui as seguintes características:

1. As condições correntes de mercado são um guia razoável para a tomada de decisão (em condições de "normalidade", os agentes tendem a atribuir pouco peso a mudanças futuras).

2. Os agentes assumem que o estado de opinião corrente, tal qual expresso nos preços e na produção, baseia-se em um resumo correto das perspectivas futuras da economia, aceitando isso enquanto tal até que algo novo e relevante surja (Keynes, 1936, p. 152; Keynes, 1937a, p. 114). Em outras palavras, as pessoas agem, com base em um raciocínio indutivo, como se "the future will resemble the past" (Keynes, 1937b, p. 124).

3. Além disto, Keynes enfatiza a intersubjetividade das ações. Por acreditar que o conhecimento que detém é "limitado, vago e incerto" e por achar que os demais agentes no mercado podem estar mais bem informados, o agente individual que necessita tomar uma decisão acaba por "to conform with the behaviour of the majority or the average opinion" (Keynes, 1937b, p. 114).2 2 Sobre a questão da intersubjetividade, ver as várias contribuições em Fullbrook (2002).

Assim, as convenções surgem porque os agentes possuem conhecimento limitado e incerto acerca dos vários fatores relevantes que afetam suas decisões, bem como dos resultados dessas decisões. Elas são como uma âncora que baliza o processo de tomada de decisão sob incerteza fundamental. As convenções atuam como uma espécie de "substitute for the knowledge which is unattainable" (Keynes, 1937b, p. 124). Elas são uma forma de conhecimento social tácito, gerado com base na experiência passada e nas interações entre os agentes no espaço e no tempo. As convenções são a incorporação de um tipo de conhecimento que foi gerado a partir da ação intersubjetiva no tempo histórico.

Assim, a precificação dos ativos depende das avaliações convencionais vigentes a cada conjuntura. Nessa visão, não há fundamentos a priori aos quais os preços dos ativos inexoravelmente tenderão (em um mítico longo prazo). A incerteza em relação ao futuro prevalece.

Se existem "fundamentos", esses são criados mediante interações sociais de forma a fornecer uma visão do futuro (imaginado) que embase as decisões correntes (Wray & Tymoigne, 2008, p. 15). O preço de mercado dos ativos, expresso por q, c, l e a, é comparado a um preço "normal" ou convencional, o qual fornece uma espécie de âncora para os agentes. Esse preço normal é socialmente determinado por meio de um processo de imitação, que consiste em copiar o que a maioria ou a opinião média do mercado considera naquele contexto como o "correto". Aqueles agentes que tentam antecipar a opinião média acerca dos preços de mercado mais adequados estão engajados na "atividade da especulação".3 3 Na TG, há uma discussão acerca da relação entre convenções e especulação. A atividade da especulação é assemelhada a uma espécie de concurso de beleza. A lógica de comportamento dos agentes aí engajados (no mercado de ativos) define-se nos seguintes termos: " To anticipating what average opinion expects average opinion to be. [...] to guess better than the crowd how the crowd will behave" (Keynes, 1936, p. 157). Para Keynes, a maioria desses "jogadores" (p. 156) está interessada, na verdade, " not with making superior long-term forecasts of the probable yield of an investment over its whole life, but with foreseeing changes in the conventional basis of evaluation a short time ahead of the general public" (Keynes, 1936, p. 154). É a precariedade mesma da convenção, em parte devida ao comportamento especulativo (que pode ser interpretado como uma forma de comportamento não convencional), que, para Keynes, está na raiz dos ciclos econômicos e das ondas de instabilidade e volatilidade que caracterizam os preços nos mercados de ativos, com consequências negativas sobre o "lado real" da economia, em particular sobre as decisões de investir em capital fixo. Assim, a convenção de um preço normal fornece uma alternativa concreta à suposta existência de "fundamentos inerentes" na determinação das expectativas de mudanças de preços. Se os agentes em um determinado mercado avaliam que "mudanças estruturais" criaram um ambiente em que o "preço normal" deveria ser muito diferente do que é, então fortes ondas especulativas podem se seguir (Wray & Tymoigne, 2008, p. 16). Isto é o que normalmente ocorre, por exemplo, em mercados cambiais em que se consolidam percepções de que determinada moeda está "desalinhada".

Pontos de partida excludentes na análise dos mercados financeiros

Uma caracterização mais completa de uma economia monetária, com ênfase sobre a dinâmica dos mercados financeiros, requer a discussão de outros aspectos igualmente importantes. Aqui, pretendemos contrapor a ideia de mercados financeiros eficientes (e os conceitos associados de expectativas racionais e "fundamentos") à teoria da preferência pela liquidez (Keynes, Davidson, etc.).

De acordo com a visão convencional, se os níveis de produção e emprego forem gerados pela operação eficiente dos mercados, a moeda e as relações financeiras não têm papel relevante a desempenhar. No caso dos mercados cambiais, essa visão de mundo se traduz na ideia de que são os fluxos comerciais, muito mais que os de capital, que dominam a determinação dos preços. Dinheiro e crédito serviriam "apenas" para fornecer os fundos para a atividade dominante (o comércio internacional). Além do mais, acredita-se que haveria tendência inevitável para o equilíbrio entre importações e exportações, conclusão essa que se segue naturalmente se a demanda principal por divisas decorrer do propósito de levar adiante atividades ligadas ao comércio internacional.

No longo prazo, os preços das divisas seriam o resultado da demanda mundial por bens e serviços, de forma tal que se garantam relações comerciais equilibradas. Esse resultado macroeconômico provém, no plano microeconômico, de decisões individuais racionais (racionalidade "substantiva", isto é, otimização dinâmica) e eficientes; nesse processo de tomada de decisão, não há lugar para previsões enviesadas dos preços futuros dos ativos. Em outras palavras, ações "irracionais" não se sustentam no longo prazo (embora possam se manifestar no curto prazo).

Por outro lado, Davidson (1998, 2000) argumenta que os mercados financeiros não podem ser eficientes. Em um mundo "não ergódico", não se pode acreditar que os dados disponíveis a cada momento do tempo fornecem um guia confiável e seguro para decisões que terão resultados concretos no futuro incerto. Nessas condições, a função primordial dos mercados financeiros é a de prover liquidez. Esta "função de liquidez" (Davidson, 1998, p. 282) requer a capacidade de comprar e revender ativos em um mercado ordenado e bem organizado, de forma a ser sempre possível obter o ativo (moeda) que permita quitar dívidas à medida que essas vão vencendo. Regras e instituições devem ser criadas para garantir que mercados líquidos funcionem de forma bem-ordenada.

Se a função primordial dos mercados financeiros é a de ofertar liquidez de maneira ordenada, então a questão da eficiência não se coloca de forma relevante. No mundo real das economias capitalistas modernas, como afirma Davidson, "efficient markets are not liquid and liquid markets are not efficient" (Davidson, 2000, p. 6; ênfase no original).

Assim, a hipótese dos mercados eficientes, como soe acontecer com as abordagens que se inspiram na velha tradição "clássica", relega o papel do dinheiro e das finanças no máximo ao curto prazo.

Mercados e liquidez

Ativos líquidos são ativos financeiros comercializados em mercados a vista (spot), ordenados e bem organizados (cf. Davidson, 1994, p. 49-50). Um mercado bem organizado é aquele em que a interação entre compradores e vendedores não envolve um custo elevado e que requer um produto padronizado com baixos custos de carregamento. Dadas as atividades rotineiras, as mudanças esperadas nos preços de mercado serão reduzidas e dentro da "normalidade".

Um mercado ordenado requer uma instituição reguladora conhecida como market maker: aquele agente ou instituição que anuncia publicamente a disposição de agir prontamente como um comprador e/ou vendedor residual de forma a assegurar a estabilidade e a ordem (orderliness) no caso de ocorrer, tanto do lado da demanda como da oferta, uma mudança abrupta desestabilizadora. O market maker, com base em regras pré-anunciadas e conhecidas daquele mercado, deve garantir que, após uma perturbação ou um choque, o preço de mercado não diferirá caoticamente do preço recentemente transacionado.

Para operar de forma adequada, o market maker precisa dos seguintes recursos: a) um estoque regulador do ativo transacionado no mercado em questão; b) um estoque significativo de dinheiro (e/ou, quando necessário, acesso imediato a um montante adicional de dinheiro). Naquelas situações em que fortes deslocamentos de oferta ou demanda possam vir a gerar movimentos amplos nos preços de mercado, o market maker deve entrar em cena: comprar em um mercado em queda e vender em um mercado aquecido, de forma a limitar as flutuações dos preços de mercado dentro de intervalos aceitáveis. Por confiarem no market maker, os agentes acreditam que, no dia seguinte, o preço de abertura do mercado não diferirá significativamente do preço de fechamento do dia anterior.4 4 Em um mercado organizado, quando o market maker percebe que é incapaz de desempenhar sua função de manter a ordem e a estabilidade, em geral as negociações são suspensas. Isso possibilita que o market maker reorganize seus recursos e estratégias de intervenção, de maneira que a ordem possa ser restaurada quando o mercado for reaberto.

A economia monetária aberta

Tendo discutido os aspectos mais gerais de uma economia monetária, o próximo passo é "abri-la". A literatura (pós-)keynesiana lida com uma noção de economia monetária em geral, sem fazer distinções claras no que toca às interações (comerciais e financeiras) de uma determinada economia com o resto do mundo. Mas é perfeitamente possível ampliar a discussão e aplicar os conceitos associados à economia monetária a uma dimensão específica dos mercados de ativos financeiros, a saber, os mercados de ativos cambiais. Nesses mercados, há dois fenômenos característicos: 1) a existência de uma classe específica de ativos, os "ativos cambiais" (na falta de um nome mais adequado), que possuem certas peculiaridades (tais como volatilidade exacerbada de a e prêmios de liquidez l hierarquizados); 2) o processo peculiar de formação dos preços desses ativos cambiais.

Nesses mercados, um determinante crucial das decisões dos agentes é, obviamente, a taxa de câmbio (corrente e esperada). As variações da taxa de câmbio refletem mudanças nas posições especulativas dos agentes que atuam nos mercados cambiais ampla e intensamente interligados, muito mais do que mudanças nos padrões de comércio entre as várias nações (Harvey, 1999).

Nos mercados cambiais, são os Bancos Centrais de cada país, operando isolada ou conjuntamente, informados por seus objetivos mais amplos de política doméstica, que atuam como market makers em seus espaços nacionais, com os objetivos, não excludentes, de conter a volatilidade cambial e especialmente no caso das economias periféricas emergentes, manter as taxas de câmbio num patamar competitivo e acumular reservas (ver item 4, adiante).

Cabe discutir, portanto, à luz dos conceitos apresentados, os determinantes da trajetória da taxa de câmbio em uma economia monetária com base em uma perspectiva keynesiana. Em particular, nossa discussão pretende demarcar um pouco mais o campo de análise e contemplar um plano mais específico, a saber, a dinâmica da taxa de câmbio em uma economia monetária periférica.5 5 No item 4, abordaremos o conceito de "condição periférica", identificando os mecanismos, relações, forças, etc. atuantes nesse tipo de economia, mas que estão ausentes nas chamadas "economias centrais".

3_ Determinantes da taxa de câmbio: a visão pós-keynesiana

A abordagem pós-keynesiana da determinação da taxa de câmbio fornece uma explicação para a dinâmica volátil das taxas de câmbio no sistema monetário e financeiro internacional globalizado que emergiu após o colapso do regime de Bretton Woods. Seu ponto de partida é um contexto histórico particular marcado pelas seguintes características: 1) maior volatilidade, com as taxas de câmbio, taxas de juros e os preços dos ativos sujeitos tanto a amplas flutuações de curto prazo, como a mudanças relevantes em prazos mais longos; e 2) alto grau de contágio, com a propagação de turbulências financeiras do epicentro do sistema para países e mercados que, aparentemente, não possuem nenhuma relação com o problema original (mesmo para aqueles considerados como condutores de políticas macroeconômicas "sólidas").

Essas características estão associadas ao perfil tanto do sistema monetário como do sistema financeiro internacional contemporâneo. A maior preferência pela liquidez dos agentes e a volatilidade dos fluxos de capitais e, pour cause, dos mercados de câmbio, decorrem tanto da natureza da divisa-chave6 6 Utilizamos aqui os conceitos de moeda e de divisa propostos por Aglietta (1986): a moeda é soberana no seu espaço nacional, tornando-se uma divisa quando passa a circular em âmbito internacional. (o dólar fiduciário) e da combinação do regime de câmbio flutuante com o ambiente de livre mobilidade de capitais - que estimulou a especulação nos mercados de câmbio e os fluxos de capitais de curto prazo, que acentuaram ainda mais a volatilidade desses mercados - como da dinâmica do sistema financeiro internacional, condicionada pela globalização financeira e pela predominância das chamadas "finanças de mercado".

Conceitos como preferência pela liquidez, demanda especulativa por moeda e a formação de expectativas sob incerteza tem no mercado de câmbio um lócus privilegiado de análise. A abordagem pós-keynesiana (e.g., Davidson, 1998, 2000; Dow, 1999; Harvey, 1991, 1999, 2006, 2009) ancora-se na ideia de que os fluxos de capitais de curto prazo desempenham papel ativo e autônomo e são os principais determinantes da trajetória das taxas de câmbio. Em outras palavras, os preços das divisas seriam reflexo das decisões de compra e venda das tesourarias dos bancos (bank trading desks) - que são os dealers dos mercados de câmbio - e de alocação de portfólio dos investidores, guiadas, por sua vez, por expectativas de ganhos de capital de curto prazo (mudanças esperadas em a), desvinculadas (pelo menos de forma direta) dos "fundamentos macroeconômicos", como discutido a seguir. Assim, uma questão fundamental na perspectiva pós-keynesiana diz respeito aos fatores subjacentes à formação das expectativas dos agentes nos mercados de câmbio num ambiente de incerteza.

Uma contribuição importante para a análise pós-keynesiana é a de Schulmeister (1988), que procurou explicar a trajetória da taxa de câmbio do dólar no período 1980-85, enfatizando que esses anos foram marcados por sequências de apreciação e depreciação do dólar (frente ao marco e ao iene), interrompidas por flutuações erráticas. Nesse período, a valorização da divisa-chave decorreu da maior duração dos movimentos de apreciação relativamente àqueles de depreciação.

As compras e as vendas de divisas pelas tesourarias dos bancos seriam baseadas nas chamadas "regras de negociação" (trading rules), as quais contribuem para dois efeitos: o comportamento de manada (bandwagon) e a realização de lucros com a venda de ativos apreciados (cash-in). Essas regras, por sua vez, seriam guiadas por dois tipos de expectativa sobre os movimentos futuros das taxas de câmbio: a) as expectativas de curto prazo, mais suscetíveis às "notícias" (news) econômicas e políticas; e b) as expectativas de médio prazo, influenciadas pelos "fundamentos econômicos", como a situação do balanço de pagamentos, as taxas de crescimento do produto e os diferenciais de taxas de juros e de inflação.

Segundo Schulmeister (1988), novos acontecimentos econômicos ou políticos favoráveis à moeda de determinado país acarretariam mudanças nas expectativas de alguns dealers, que, em busca de ganhos de capital, iniciariam um movimento de compra dessa moeda e, com isso, de alta do seu preço, o qual atrairia outros dealers, dando lugar a um efeito manada. Todavia, quanto maior o movimento de apreciação, maior a possibilidade de os agentes envolvidos internalizarem os lucros decorrentes da valorização cambial (cash-in), diante da expectativa de não sustentabilidade da trajetória de alta. O movimento de apreciação terminaria quando os principais dealers tomassem posições contrárias à moeda em questão.

Embora Schulmeister não argumente nesses termos, é perfeitamente possível interpretar tal processo como a plena operação de um "mecanismo keynesiano" de decisão sob incerteza (mencionado anteriormente): alguns agentes adotam comportamentos especulativos, não convencionais, em busca de ganhos extraordinários temporários, enquanto os demais agentes seguem as convenções (a opinião da média ou da maioria), até que essas mesmas convenções tornam-se obsoletas pela própria ação do comportamento não convencional bem-sucedido. É nesse sentido que se pode afirmar que as convenções trazem dentro de si as sementes de sua própria destruição.

Com os trabalhos de Harvey (1991, 1993, 1999, 2006 e 2009, entre outros), a abordagem pós-keynesiana da determinação da taxa de câmbio atingiu novo patamar e se consolidou. Harvey aprofundou a discussão da dinâmica volátil das taxas de câmbio no contexto pós-Bretton Woods, detalhando a lógica subjacente à formação das expectativas dos agentes nos mercados cambiais. Nos seus primeiros artigos (e.g., Harvey, 1991 e 1993), Harvey procurou integrar as contribuições de alguns predecessores (Davidson, Miles, Schulmeister) num modelo de determinação da taxa de câmbio que explora o papel das expectativas de curto e de médio prazos dos agentes na trajetória das taxas de câmbio.

Seguindo a trilha de Shulmeister (1988), Harvey partiu da constatação de que o principal condicionante da evolução das taxas de câmbio seria as transações dos dealers nos mercados de câmbio (e não as demandas de liquidez para investimento e comércio), que seriam influenciadas pelos dois tipos de expectativa definidas por Shulmeister. Por um lado, as expectativas de médio prazo (Eet+n), que seriam menos voláteis (isto é, sua elasticidade seria menor). Melhores "fundamentos" seriam um sinal de robustez da moeda para os traders (essas expectativas também guiariam as decisões dos agentes envolvidos com fluxos de investimento direto, de portfólio e de comércio). Por outro lado, as expectativas de curto prazo (Eet+m) seriam suscetíveis a novos fatos políticos e econômicos (sobretudo monetários) e, assim, sujeitas a mudanças súbitas e frequentes (sua elasticidade seria maior). Para Harvey, essas expectativas também dependeriam dos modelos utilizados pelos traders e da tendência recente da taxa de câmbio (número de períodos consecutivos nos quais a taxa de câmbio se moveu na mesma direção), que condicionariam os efeitos bandwagon e cash-in, respectivamente.7 7 Ver Harvey (1991) para uma formalização dos argumentos do autor.

Assim, a taxa de câmbio no presente Et seria função dos valores esperados para as taxas de câmbio de curto e de médio prazos, ou seja, de Eet+n e Eet+m. Mudanças nos dois tipos de expectativa resultariam em alterações na taxa de câmbio presente, que, na realidade, decorreriam, na sua maior parte, de reavaliações das expectativas de curto prazo. A elevada volatilidade das taxas de câmbio no curto prazo seria decorrência da volatilidade inerente das expectativas num ambiente de incerteza, tempo histórico e irreversibilidade das decisões dos agentes. Como afirma o próprio Harvey, enfatizando a causalidade subjacente à argumentação, "expectations are volatile, therefore actions are volatile, therefore economic variables are volatile" (Harvey, 1991, p. 69). E, quanto mais elásticas as expectativas, maiores serão as flutuações cambiais.

Harvey (1999) analisou os tipos de demanda por moeda estrangeira (associados a comércio, investimento direto, investimento de portfólio e gestão das reservas internacionais) e destacou o predomínio dos investimentos de portfólio, que seriam intrinsecamente instáveis e subordinados a uma lógica especulativa e, com isso, os principais responsáveis pela volatilidade das taxas de câmbio. As expectativas desses investidores acerca dos movimentos dos preços dos ativos condicionariam os deslocamentos das taxas de câmbio e dos preços correntes desses ativos.

Se os preços dos ativos estiverem estreitamente vinculados aos movimentos das taxas de câmbio, esses movimentos tornam-se um dos principais focos dos investidores de portfólio. Assim, as taxas de câmbio correntes dependeriam das expectativas em relação a sua tendência futura, como nos demais mercados financeiros. Mas, ao contrário dos demais ativos, a moeda em si não precisa ser objeto de especulação:

This is really no different from any other asset market, except, interestingly, that the currency itself need not be the direct object of speculation. Nevertheless, because the exchange rate is such an important part of the value of any international asset, the potential of fluctuations must be carefully considered. Speculators need never have foreign money as the object of their desire, and yet it will play a central role, both affecting and being affected by portfolio capital flows

(Harvey, 1999, p. 206).

Em suma, o fato de as taxas de câmbio estarem subordinadas à busca de ganhos de capital no curto prazo pelos investidores explicaria sua volatilidade no contexto pós-Bretton Woods. Rápidas mudanças nas expectativas em relação aos movimentos futuros das taxas de câmbio implicariam súbitas alterações nos preços correntes. Por sua vez, deslocamentos súbitos das expectativas podem ser explicados pela interação de seis fatores, quais sejam: 1) a natureza especulativa dos mercados de câmbio; 2) a ausência de uma âncora para as taxas de câmbio; 3) a influência da incerteza sobre as decisões dos agentes; 4) o efeito amplificador do "comportamento de manada" (efeito bandwagon); 5) a "cultura específica" (subculture) dos agentes que atuam nos mercados de divisas (principalmente, dealers e investidores de portfólio);8 8 Harvey (1999, 2006, 2009) tomou emprestado da análise institucionalista o termo "subcultura" ( subculture) para se referir ao padrão de comportamento (e valores subjacentes, associados a determinado ambiente institucional e social) de um certo grupo de agentes. No caso dos mercados de câmbio, os agentes responsáveis pela maior parte das transações (bancos dealers e investidores de portfólio) seriam especialmente propensos à busca de lucros no curto prazo em operações de alto risco, já que seus respectivos empregos e remuneração dependem do lucro obtido nessas operações. 6) a forma particular de tomada de decisões, que se basearia em "princípios heurísticos" (cf. Harvey, 1999, p. 206-209).

Em Harvey (2009), o autor consolidou os principais aspectos da sua abordagem da determinação da taxa de câmbio numa estrutura analítica que se ancora não somente na teoria pós-keynesiana, mas também nos trabalhos de economistas institucionalistas e dos psicólogos Amos Tversky e Daniel Kahneman (autores associados à economia experimental), aprofundando a análise dos fatores mencionados acima, especialmente do processo de formação das expectativas e a tomada de decisão dos agentes nos mercados de câmbio.

Enquanto a teoria pós-keynesiana enfatiza o papel da incerteza, do tempo histórico, da influência autônoma dos mercados financeiros e das expectativas dos agentes (como determinantes fundamentais da trajetória dos preços dos ativos), a abordagem institucionalista - na qual os mercados são vistos como instituições sociais, que não necessariamente conduzem a resultados "eficientes" - contribui para a compreensão da cultura específica (subculture) vigente no mercado de câmbio e da sua forma de organização. Como, na perspectiva pós-keynesiana, são os fluxos de capital de portfólio que dominam as transações nos mercados de câmbio, as expectativas sobre os movimentos futuros das taxas de câmbio constituem os principais determinantes das cotações correntes:

Today's prices are created by the weighted (by liquidity and confidence) average of market participants' expectations of tomorrow's price. Agents are not, as in rational expectations, forecasting an event that is independent of their actions - they are creating the event (Davidson 1982-83). Realized outcomes clearly affect the exchange rate, [...] but even then the current structure of the currency market means that they do so primarily through expectations. [A currency] moves more in reaction to the announcement of a trade imbalance than from the pressures created by the imbalance itself

(Harvey, 2009, p. 42).

Assim, como as próprias previsões são capazes de criar os valores realizados das taxas de câmbio, uma etapa fundamental na elaboração de uma teoria pós-keynesiana da determinação da taxa de câmbio torna-se a compreensão do processo subjacente à formação das expectativas e à tomada de decisões dos agentes no mercado de câmbio. Segundo Harvey (1999, p. 201-208; 2006, p. 163-168; 2009, p. 45-50), os trabalhos de Tversky e Kahneman contribuem para o entendimento desse processo. A ideia central é que, no mundo real, as pessoas tomam decisões com base em "princípios heurísticos" (uso do "senso comum" ou "regras de bolso", genéricas, informais, que tendem a simplificar o processo de tomada de decisão), entre os quais três se destacam. Em primeiro lugar, o princípio da "disponibilidade" (availability): as pessoas tendem a atribuir maior probabilidade a eventos mais recentes. Em termos gerais, quanto mais disponível algo estiver na memória, mais o agente o considerará como mais frequente ou provável de acontecer no futuro.9 9 Note aqui a semelhança com um dos aspectos da convenção em Keynes (discutido anteriormente): sob incerteza (conhecimento escasso ou ausente), os agentes agem com base na crença (na regra indutiva) de que o futuro será igual às condições correntes e recentes de mercado. Em segundo lugar, o princípio da "representatividade" (representativeness), utilizado quando o agente precisa definir se um evento A pertence a uma classe B (ou é resultado de um processo B): quanto maior a semelhança entre o evento A e a classe (ou o processo) B, maior a probabilidade de A fazer parte (ou ser resultado) de B. A representatividade pode levar os agentes a imaginarem a operação de fatores causais (processos determinísticos), quando, na verdade, o acaso (processos aleatórios) poderia estar em operação. Em terceiro lugar, o princípio da "ancoragem" (anchoring), utilizado quando as pessoas precisam realizar uma estimativa acerca dos resultados futuros. Nesse caso, elas tendem a ancorar quaisquer revisões subsequentes na primeira estimativa originalmente feita. A ancoragem atribui um peso excessivo e indevido à "primeira estimativa" (ou "primeira aproximação") do agente.

Para Harvey (2009, p. 50), a combinação desses três princípios heurísticos, que tendem a gerar expectativas viesadas (forecast-construction biases), com os cinco aspectos que destaca da interpretação de Keynes da dinâmica dos mercados de ativos (a saber, incerteza, convenções, grau de confiança, busca de resultados rápidos e animal spirits), forneceria uma interpretação adequada para as decisões nos mercados cambiais. Isso resultaria em volatilidade acentuada de preços, comportamentos de manada e induziria os agentes a empregarem "análises técnicas", a assumirem riscos excessivos e a se engajarem em movimentos periódicos de realização de lucros.

Segundo Harvey, os agentes também levariam em conta (na decisão de compra e venda de divisas) a liquidez esperada dos ativos. Esse atributo dependeria de fatores específicos e também da moeda de denominação do ativo:

Liquidity increases if the currency in which the asset is denominated is one in which many commodities are priced or if it is the de facto or de jure international reserve currency (the dollar has benefited from both of these since World War Two)

(Harvey, 2009, p. 85).

Assim, pode-se afirmar que, ao menos implicitamente, Harvey reconhece que, no interior do sistema monetário internacional, há uma hierarquia monetária, na qual o dólar, a divisa-chave, ocupa posição privilegiada. Contudo, com argumentaremos adiante, esse autor não destacou a existência de assimetrias entre as moedas conversíveis (emitidas pelos demais países centrais) e as moedas não conversíveis (emitidas pelos países periféricos emergentes).

4_ A condição periférica: especificidades da dinâmica cambial nos países periféricos emergentes

A condição periférica decorre da inserção estrutural peculiar de uma determinada economia na divisão internacional do trabalho, marcada pela existência de dois polos tal qual expressa na metáfora centro-periferia. Em particular, pode ser interpretada tendo em vista a existência de assimetrias e heterogeneidades relevantes no que toca a:

_criação e disseminação do progresso técnico;

_sistemas nacionais de inovação enquanto estrutura institucional determinante para geração endógena de progresso técnico;

_estruturas produtivas;

_perfis típicos de distribuição de renda e geração de emprego;

_grau de autonomia da política econômica;

_the last but not the least: a importante especificidade estrutural associada à posição na hierarquia das divisas e a não conversibilidade monetária, o que contribui para maior instabilidade macroeconômica e, consequentemente, elevada volatilidade cambial.

Acreditamos que este último aspecto é crucial, embora ele não tenha recebido a devida ênfase na literatura estruturalista, que tendeu a se concentrar mais sobre os fenômenos e processos atuantes no "lado real" das economias periféricas. Os vários estruturalismos (tanto o "clássico" como o "neo", conforme a taxonomia de Lustig, 1988) não deram o destaque necessário às relações financeiras e à dinâmica dos mercados financeiros, em particular dos mercados cambiais. Assim, a ideia é que esse "elo perdido" precisa ser recuperado. Cabe, portanto, tentar preencher tal lacuna através de uma discussão da dinâmica cambial nessas economias. É exatamente o fato de que há hierarquia entre moedas que nos permite elucidar as forças em operação que engendram a volatilidade cambial estrutural das economias periféricas.

O referencial de inspiração keynesiana desenvolvido anteriormente constitui o ponto de partida para o estudo da dinâmica da formação das taxas de câmbio nominais dos países que denominamos "periféricos emergentes", que, neste artigo, são os países capitalistas periféricos que se inseriram no ambiente de globalização financeira10 10 A globalização financeira refere-se à eliminação das barreiras internas entre os diferentes segmentos dos mercados financeiros, somada à interpenetração dos mercados monetários e financeiros nacionais e sua integração aos mercados globalizados (Chesnais, 1996). e, assim, tornaram seus mercados cambiais mais suscetíveis aos fluxos voláteis de capitais de curto prazo.11 11 É importante destacar que a discussão aqui realizada restringe-se à dinâmica das taxas de câmbio nominais. Para uma análise das especificidades da trajetória das taxas de câmbio reais efetivas dos países periféricos emergentes, sobretudo daqueles produtores e exportadores de commodities, ver Bresser Pereira (2009).

Todavia, para a compreensão dessa dinâmica, é preciso considerar a posição particular dos países periféricos emergentes no sistema monetário internacional contemporâneo, questão não contemplada por Harvey e outros pós-keynesianos. Esse sistema constitui um arranjo institucional hierarquizado e assimétrico em torno de uma divisa-chave, como destacou Keynes durante os debates que precederam a conferência de Bretton Woods (Keynes, 1980). Além da posição superior da divisa-chave (o dólar fiduciário, no sistema atual), posicionada no topo da hierarquia das divisas (e, por isso, a divisa mais líquida, como reconhece Harvey), o sistema monetário e financeiro internacional caracteriza-se por assimetrias entre as divisas dos países centrais e aquelas dos países periféricos emergentes, que condicionam a dinâmica dos mercados de câmbio destes últimos países.

A assimetria monetária refere-se, mais precisamente, à dimensão hierárquica do sistema monetário internacional. Nesse sistema, as divisas se posicionam de forma hierárquica, de acordo com seu grau de conversibilidade, no que diz respeito à sua capacidade de desempenhar em âmbito internacional as três funções da moeda: meio de pagamento, unidade de conta e de denominação dos contratos, e ativo de reserva. O dólar, a divisa-chave, situa-se no topo da hierarquia, uma vez que tem o maior grau de conversibilidade (possui o prêmio de liquidez l máximo em escala mundial). Numa posição intermediária, encontram-se as moedas emitidas pelos demais países centrais, denominadas de "divisas conversíveis", já que são utilizadas, de forma secundária, como meio de denominação dos contratos em âmbito internacional e demandadas como ativo de reserva pelos investidores estrangeiros (possuem prêmio de liquidez elevado, mas não máximo, como o dólar). No espectro oposto, estão as moedas emitidas pelos países emergentes, que são as divisas inconversíveis, visto que são incapazes de desempenhar, mesmo de forma secundária ou marginal, essas funções.12 12 Cohen (1998) adota o conceito de "pirâmide monetária" para classificar as diversas modalidades de moedas, que se diferenciariam em relação ao seu grau de "internacionalização monetária". Essas moedas (enquanto ativos) são precificadas com um prêmio de liquidez mais baixo, embora possam ser demandadas tendo em vista as expectativas de deslocamentos no valor do atributo a.

À assimetria do sistema monetário internacional sobrepõe-se a assimetria do sistema financeiro internacional, a qual possui duas dimensões. A primeira refere-se aos determinantes dos fluxos de capitais direcionados aos países emergentes. Esses fluxos dependem, em última instância, de uma dinâmica exógena a esses países, que estão permanentemente vulneráveis à sua reversão, decorrente tanto de mudanças na fase do ciclo econômico e/ou na política econômica, em particular a monetária, dos países centrais, como do aumento da preferência pela liquidez dos investidores de portfólio globais. A segunda dimensão da assimetria financeira diz respeito à inserção marginal desses países periféricos emergentes nos fluxos de capitais globais. Apesar do crescimento da participação dos ativos emitidos por esses países nos portfólios dos investidores residentes nas economias centrais ao longo dos anos 1990, essa participação ainda é residual (cf. Obstfeld & Taylor, 2004).

As assimetrias monetária e financeira, que se autorreforçam, têm dois importantes desdobramentos para a dinâmica dos mercados de câmbio dos países periféricos emergentes. Em primeiro lugar, esses mercados são especialmente vulneráveis à volatilidade intrínseca dos fluxos de capitais, determinados, em última instância, por uma dinâmica exógena. Nos momentos de reversão do ciclo, de mudanças na política monetária no centro ou de aumento da preferência pela liquidez, os ativos financeiros "emergentes", por não desempenharem a função de reserva de valor e, assim, não cumprirem o papel de "receptáculo" da incerteza em âmbito mundial, são os primeiros alvos dos movimentos de "fuga para a qualidade" dos investidores globais.

Em segundo lugar, o fato de uma proporção marginal dos fluxos ser alocada nos países emergentes contribui, igualmente, para a maior volatilidade dos seus mercados de câmbio. Em outras palavras, esses países são price-takers. Se, de forma geral, a instabilidade das aplicações é maior no caso dos ativos estrangeiros em relação aos nacionais (Plihon, 1996) (ou seja, os investidores tendem a resgatar de forma mais frequente as aplicações em ativos externos), no caso dos ativos "emergentes" essa instabilidade é ainda maior, dados os impactos igualmente marginais da sua venda sobre a rentabilidade dos portfólios globais.

Contudo, a despeito da natureza residual dos fluxos de capitais direcionados aos países periféricos emergentes, os efeitos potencialmente instabilizadores desses fluxos sobre os mercados de câmbio e financeiros domésticos são significativos, uma vez que, em relação ao tamanho desses mercados, o volume alocado pelos investidores globais não é marginal (Akyüz & Cornford, 1999). Ademais, como na maioria desses países os mercados financeiros são pouco líquidos e profundos, as vendas por parte dos investidores estrangeiros reduzem significativamente os preços dos títulos, com importante repercussão sobre outros segmentos do mercado financeiro (Studart, 2001). No caso dos mercados totalmente ou parcialmente dolarizados (títulos com cláusula de correção cambial), os feedbacks potenciais entre os mercados de títulos de renda fixa e de câmbio são mais acentuados em razão do descasamento de moedas. Neste contexto, uma desvalorização cambial provocada pela reversão dos fluxos contamina o preço dos títulos, afetando a situação financeira dos devedores domésticos (Griffith-Jones, 1995).

Além de resultar em flutuações potencialmente mais amplas das taxas de câmbio dos países periféricos emergentes, que são o preço definidor das condições de conversão de ativos e passivos denominados na divisa não conversível na divisa-chave, a natureza não conversível das suas divisas resulta tanto na existência de um prêmio de risco-país em relação à moeda-chave (expressando, pois, um rebaixamento do atributo l dos ativos "emergentes"), como num risco cambial mais elevado, que afeta as condições de paridade entre os juros internos e externos (aspecto também destacado por Plihon, 1999).

Aqui é importante resgatar a ideia dos atributos dos ativos apresentada anteriormente. Para efeitos de nossa análise, os atributos prêmio de liquidez l e valorização esperada a são de importância crucial, uma vez que é mediante a avaliação e a precificação desses que os agentes tomam decisões nos mercados cambiais em relação a quais ativos demandar e em que quantidade.

O risco-país e o risco cambial mais elevados dos ativos emitidos pelos países periféricos emergentes constituem manifestações do menor prêmio de liquidez de suas divisas em âmbito internacional, que, em função das assimetrias monetária e financeira descritas acima, são os primeiros alvos dos movimentos de "fuga para a qualidade" nos momentos de elevada aversão ao risco.

Assim, a estratégia preventiva de construção de um estoque elevado de reservas cambiais (uma espécie de "demanda precaucional", cf. Aizenman et al., 2004; Dow, 1999, p. 156-157) constituiria uma resposta defensiva racional desses países no contexto de finanças globalizadas e liberalizadas, ao ampliar a capacidade potencial de sustentação da liquidez externa (e de estabilização) em momentos de reversão dos fluxos de capitais. Neste caso, o Banco Central estaria atuando par excellence como market maker.

Em contrapartida, nas fases de alta dos ciclos de liquidez internacional e de maior apetite por riscos (ou de "animal spirits" mais aguçados), os ativos emergentes tornam-se "objeto de desejo" dos investidores globais em função das expectativas de valorização (elevação de a) das suas respectivas divisas (associadas ao diferencial de juros favorável e/ou às perspectivas de ganhos de capital nos mercados acionários com relações preço/lucro relativamente baixas), que compensam seu menor prêmio de liquidez.

5_ Observações finais

Neste artigo, procuramos investigar, com base numa matriz teórica keynesiana, a dinâmica das taxas de câmbio dos países periféricos que se inseriram no contexto de globalização financeira e, com isso, tornaram-se mercados "emergentes".

Para tal, resgatamos, em primeiro lugar, as propriedades essenciais de uma economia monetária, de forma a fornecer os elementos teóricos básicos a uma discussão da ideia de economia monetária aberta. Em seguida, discutimos a visão pós-keynesiana da determinação da taxa de câmbio, desenvolvida sobretudo por John Harvey, que, todavia, não discutiu as especificidades estruturais e institucionais que condicionam a trajetória das taxas de câmbio nas economias periféricas emergentes (vis-à-vis àquelas dos países centrais).

Procuramos ainda, após uma rediscussão da ideia de "condição periférica", articular esse conceito com o de economia monetária aberta. Em particular, salientamos as especificidades históricas associadas à forma de inserção das economias monetárias periféricas emergentes no sistema monetário e financeiro internacional contemporâneo.

O presente trabalho obteve algumas conclusões importantes. Em primeiro lugar, enfatizamos a ideia de que a taxa de câmbio sofre influência preponderante dos fluxos de capital de curto prazo (e da especulação no mercado de ativos), que, por sua vez, são uma função das expectativas (altamente voláteis) dos agentes participantes desses mercados. Conceitos keynesianos como incerteza, convenções e preferência pela liquidez são cruciais para interpretar os fenômenos aí observados. Assim, a narrativa que emerge não é a de mercados caracterizados por eficiência, estabilidade e "otimalidade" (guiados pela noção fugidia de "fundamentos"), mas, sim, por estruturas institucionais que afetam de forma decisiva as avaliações (inter)subjetivas individuais, que devem ser formuladas em situações marcadas por dificuldades de formar previsões e mudanças recorrentes que obrigam a súbitas e rápidas revisões das expectativas (embora possam estar entremeadas por períodos em que vigora alguma estabilidade).

Em segundo lugar, em função das assimetrias monetárias e financeiras características da atual arquitetura financeira internacional pós-Bretton Woods, mudanças nas expectativas dos agentes causam impactos diferenciados sobre a órbita periférica. As divisas dos países periféricos emergentes (que são inconversíveis) possuem menor prêmio de liquidez (relativamente à divisa-chave e às divisas conversíveis). Assim, nos momentos de acirramento da incerteza, esses ativos são os primeiros alvos dos movimentos de fuga para a qualidade (ou seja, para os ativos denominados na divisa-chave) dos investidores globais.

Já nas fases de excesso de liquidez internacional e elevado apetite por risco, quando geralmente reinam convenções mais otimistas acerca da trajetória futura da economia e as taxas de juros nos países centrais situam-se em patamares mais reduzidos, os ativos periféricos emergentes passam a embutir elevada valorização esperada que compensa seu menor prêmio de liquidez (ou seja, o atributo a supera a "remuneração" implícita no prêmio de liquidez l) e, com isso, tornam-se ativos demandados pelos investidores internacionais.

Artigo recebido em outubro de 2009; aprovado em junho de 2010.

E-mail de contato dos autoresroger.andrade@uol.com.br, daniprates@uol.com.br

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  • WRAY, L. R. & TYMOIGNE, E. Macroeconomics meets Hyman P. Minsky: The Financial Theory of Investment. The Levy Economics Institute, Working Paper n. 543, Sept. 2008.
  • 1
    Obviamente, o conceito de incerteza aqui enfatizado é aquele teorizado de forma consistente, desde Keynes, por Shackle (e.g., 1972, 1979), Davidson (e.g., 1994), Lawson (1988), Runde (1990), Dow (1995), Vercelli (2002) e Dequech (2000), entre outros.
  • 2
    Sobre a questão da intersubjetividade, ver as várias contribuições em Fullbrook (2002).
  • 3
    Na
    TG, há uma discussão acerca da relação entre convenções e especulação. A atividade da especulação é assemelhada a uma espécie de concurso de beleza. A lógica de comportamento dos agentes aí engajados (no mercado de ativos) define-se nos seguintes termos: "
    To anticipating what average opinion expects average opinion to be. [...] to guess better than the crowd how the crowd will behave" (Keynes, 1936, p. 157). Para Keynes, a maioria desses "jogadores" (p. 156) está interessada, na verdade, "
    not with making superior long-term forecasts of the probable yield of an investment over its whole life, but with foreseeing changes in the conventional basis of evaluation a short time ahead of the general public" (Keynes, 1936, p. 154). É a precariedade mesma da convenção, em parte devida ao comportamento especulativo (que pode ser interpretado como uma forma de comportamento
    não convencional), que, para Keynes, está na raiz dos ciclos econômicos e das ondas de instabilidade e volatilidade que caracterizam os preços nos mercados de ativos, com consequências negativas sobre o "lado real" da economia, em particular sobre as decisões de investir em capital fixo.
  • 4
    Em um mercado organizado, quando o
    market maker percebe que é incapaz de desempenhar sua função de manter a ordem e a estabilidade, em geral as negociações são suspensas. Isso possibilita que o
    market maker reorganize seus recursos e estratégias de intervenção, de maneira que a ordem possa ser restaurada quando o mercado for reaberto.
  • 5
    No item 4, abordaremos o conceito de "condição periférica", identificando os mecanismos, relações, forças, etc. atuantes nesse tipo de economia, mas que estão ausentes nas chamadas "economias centrais".
  • 6
    Utilizamos aqui os conceitos de moeda e de divisa propostos por Aglietta (1986): a
    moeda é soberana no seu espaço nacional, tornando-se uma
    divisa quando passa a circular em âmbito internacional.
  • 7
    Ver Harvey (1991) para uma formalização dos argumentos do autor.
  • 8
    Harvey (1999, 2006, 2009) tomou emprestado da análise institucionalista o termo "subcultura" (
    subculture) para se referir ao padrão de comportamento (e valores subjacentes, associados a determinado ambiente institucional e social) de um certo grupo de agentes. No caso dos mercados de câmbio, os agentes responsáveis pela maior parte das transações (bancos
    dealers e investidores de portfólio) seriam especialmente propensos à busca de lucros no curto prazo em operações de alto risco, já que seus respectivos empregos e remuneração dependem do lucro obtido nessas operações.
  • 9
    Note aqui a semelhança com um dos aspectos da convenção em Keynes (discutido anteriormente): sob incerteza (conhecimento escasso ou ausente), os agentes agem com base na crença (na regra indutiva) de que o futuro será igual às condições correntes e recentes de mercado.
  • 10
    A globalização financeira refere-se à eliminação das barreiras internas entre os diferentes segmentos dos mercados financeiros, somada à interpenetração dos mercados monetários e financeiros nacionais e sua integração aos mercados globalizados (Chesnais, 1996).
  • 11
    É importante destacar que a discussão aqui realizada restringe-se à dinâmica das taxas de câmbio nominais. Para uma análise das especificidades da trajetória das taxas de câmbio reais efetivas dos países periféricos emergentes, sobretudo daqueles produtores e exportadores de
    commodities, ver Bresser Pereira (2009).
  • 12
    Cohen (1998) adota o conceito de "pirâmide monetária" para classificar as diversas modalidades de moedas, que se diferenciariam em relação ao seu grau de "internacionalização monetária".
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      Ago 2012

    Histórico

    • Recebido
      Out 2009
    • Aceito
      Jun 2010
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