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Técnicas de gestão e silenciamento organizacional: o relato de um gerente

Resumo

Objetivou-se analisar as mudanças nas relações estabelecidas no ambiente de trabalho condicionadas pela implementação de técnicas de gestão que caracterizam um modelo toyotista e produziram o fenômeno do silêncio organizacional. A história de um trabalhador do sistema financeiro estrutura nosso argumento. Observações e documentos mediaram a compreensão da história individual com as relações sociais gerais. Guiados pelas categorias de singularidade, particularidade e universalidade, estabelecemos os nexos entre a situação do trabalhador, as técnicas de gestão da empresa e o movimento de reestruturação produtiva. Os resultados mostram que as várias técnicas foram meios de silenciar construídos ao longo da carreira do trabalhador, à medida que as frustrações foram acumuladas e as necessidades do processo de trabalho se alteraram. O que na vida de um gestor é frustração e silêncio, no movimento de totalização são alterações no ser gestor, marcado pelo esvaziamento das funções de planejamento e controle.

Palavras-chave:
História de Vida; Função Gerencial; Silêncio Organizacional; Silenciamento Organizacional; Técnicas de Gestão

Abstract

this study analyzes the changes in the relations established in the work environment conditioned by the implementation of management techniques characterizing a Toyotist model and that produced the phenomenon of organizational silence. The story of a financial system worker was used as a guide for structuring our argument. Observations and documents mediated the understanding of the individual story along with the general social relations. Guided by the categories singularity, particularity and universality, we established the links among the worker’s situation, the company’s management techniques and the productive restructuring movement. The results show that the various management techniques were means of silencing built up throughout the worker’s career, as frustrations accumulated and the needs of the work process changed. What in the life of a manager is frustration and silence, in the totalization movement are changes in the being manager marked by the emptying of planning and controlling functions.

Keywords:
Life Story; Management Techniques; Organizational Silence; Organizational Silencing; Managerial Function

Introdução

Não se trata de nenhuma novidade que as técnicas de gestão seguem um contínuo processo de sofisticação, sobretudo nas últimas décadas, como parte do desenvolvimento das forças produtivas. Em relação à gestão de recursos humanos, vários autores (Alves, 2000Alves, G. (2000). O novo (e precário) mundo do trabalho. São Paulo, SP: Boitempo Editorial.; Faria, 2011Faria, J. H. (2011). Economia política do poder: Uma crítica da teoria geral da administração (2a ed.). Curitiba, PR: Juruá Editora.; Gaulejac, 2007Gaulejac, V. (2007). Gestão como doença social: Ideologia, poder gerencialista e fragmentação social. São Paulo, SP: Ed. Ideias & Letras.) têm chamado atenção para a sofisticação do controle que, se à época do modelo taylorista-fordista controlava os corpos e os comportamentos pela vigilância direta e pela velocidade da esteira, atualmente prescinde do olhar constante do supervisor. O mesmo olhar que controlava também subjetivava a objetividade do processo de trabalho, necessitando de um número menor de mecanismos de participação dos subordinados para o aperfeiçoamento das práticas quotidianas de trabalho. Ademais, a proximidade entre supervisor-subordinado e uma organização sindical mais próxima dos trabalhadores cumpriam o papel de garantir uma relativa liberdade de expressão aos trabalhadores. Em geral, no primeiro caso aprimorando o processo de trabalho, e no segundo reivindicando melhoria nas condições de trabalho.

A automação de certas formas de controle mediante tecnologias de base microeletrônica dispensou parte do aparato responsável pela supervisão, achatando a estrutura hierárquica, e desdobrou-se, entre outros pontos, no necessário aumento da participação dos trabalhadores (Bessi, Zimmer, & Grisci, 2007Bessi, V. G., Zimmer, M. V., & Grisci, C. L. I. (2007). O panóptico digital nas organizações: Espaço-temporalidade e controle no mundo do trabalho contemporâneo. Organizações & Sociedade, 14(42), 83-96. doi:10.1590/S1984-92302007000300005
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), seja para aperfeiçoar o processo de trabalho, seja para prover os gestores com informações que permitam melhorar os processos decisórios. Essa necessidade pôde ser observada ainda na década de 1970 com a implantação dos círculos de controle da qualidade, do qual se seguiu um sem-número de outros programas participativos, tais como: cogestão, caixa de sugestões, gestão participativa, entre outros. A implantação desses programas, porém, possui limitações, como mostram Morrison e Milliken (2000Morrison, E. W., & Milliken, F. J. (2000). Organization al silence: A barrier to change and development in a pluralistic world. The Academy of Management Review, 25(4), 706-725. doi:10.2307/259200
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) em seu ensaio teórico sobre o silêncio organizacional, termo cunhado para expressar o fenômeno da não participação espontânea dos trabalhadores com sugestões, informações, reclamações ou ideias que trariam benefícios para as empresas. Com a tentativa de identificar as razões de tal passividade, manifestada pelo silêncio ou pelo não vozear, essas estudiosas buscaram diagnosticar suas causas, bem como sugeriram a implantação de novos instrumentos de participação.

Nosso objetivo, embora próximo daquele dos pesquisadores do silêncio organizacional, se distancia do deles, pois visamos analisar as alterações nas relações estabelecidas no ambiente de trabalho que foram condicionadas pela implantação das técnicas de gestão que caracterizam o modelo toyotista e produziram esse fenômeno a partir do materialismo histórico-dialético. Ademais, vale notar que as técnicas de gestão toyotistas não ficaram restritas apenas à indústria automobilística, mas foram também adotadas e adaptadas por diferentes setores (ver Alves, 2000Alves, G. (2000). O novo (e precário) mundo do trabalho. São Paulo, SP: Boitempo Editorial.; Antunes, 2006Antunes, R. (2006). Os sentidos do trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .).

Portanto, para alcançar nosso objetivo, valemo-nos de um aporte teórico distinto devido a nossa afiliação à corrente crítica, referenciados em autores como Marx e Mészáros, em críticos brasileiros tais como Tragtenberg e Faria, cujas pesquisas críticas em estudos organizacionais apresentam originalidade teórica (Misoczky, Flores, & Goulart, 2015Misoczky, M. C., Flores, R. K., & Goulart, S. (2015). An anti-management statement in dialogue with critical Brazilian authors. Revista de Administração de Empresas, 55(2), 130-138. Retrieved from http://bit.ly/2SHcr55
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), entre outros. Contribuímos também ao buscar, semelhantemente a outros pesquisadores (Brown & Coupland, 2005Brown, A. D., & Coupland, C. (2005). Sounds of silence: Graduate trainees, hegemony and resistance. Organization Studies, 26(7), 1049-1069. doi:10.1177/0170840605053540
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; Fletcher & Watson, 2007Fletcher, D., & Watson, T. (2007). Voice, silence and the business of construction: Loud and quiet voices in the construction of personal, organizational and social realities. Organization, 14(2), 155-174. doi:10.1177/1350508407074221
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), um aporte teórico diferente do positivismo que tem pautado a maioria das pesquisas sobre o silêncio organizacional (Moura-Paula & Ferraz, 2015Moura-Paula, M. J., & Ferraz, D. L. S. (2015). Silêncio organizacional: Introdução e crítica. Cadernos EBAPE.BR , 13(3), 516-529. doi:10.1590/1679-395114581
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).

Além desta introdução, este artigo possui mais quatro partes. Na próxima, discutimos o referencial teórico que embasa nossas análises e considerações. Posteriormente, tratamos do método que utilizamos para conduzir a pesquisa e analisar os dados. Na penúltima parte apresentamos a análise, e na quarta fazemos nossas considerações sobre o estudo realizado.

Referencial teórico

A necessidade do capital de se apropriar dos saberes do trabalhador em um ambiente de intenso uso tecnológico ensejou a necessidade de haver maior participação deste no processo de trabalho. A rigidez do modo de regulação taylorista-fordista impunha uma série de restrições ao capital que precisavam ser superadas, de forma que a chamada acumulação flexível (Harvey, 2013Harvey, D. (2013). Condição pós-moderna (24a ed.). São Paulo, SP: Ediçoes Loyola.) permitiu que tal objetivo fosse alcançado. A participação dos trabalhadores, antes restrita, passou a ser encorajada, pois poderia apresentar correções ou sugestões que melhorariam sua produtividade e ao mesmo tempo seriam capazes de corrigir eventuais desvios da gerência.

Taylor já se preocupava com os conhecimentos que os trabalhadores possuíam, mas sua intenção era observar como o trabalho era feito, sistematizá-lo, encontrando a melhor maneira de fazê-lo e posteriormente induzir que aqueles adotassem o “novo” jeito de trabalhar prescrito pela gerência (Behr & Nascimento, 2008Behr, R. R., & Nascimento, S. P. (2008). A gestão do conhecimento como técnica de controle: Uma abordagem crítica da conversão de conhecimento tácito em explícito. Cadernos EBAPE.BR, 6(1), 1-11. Retrieved from http://bit.ly/2UZveM3
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). A crise do taylorismo-fordismo nos anos 1970 e o surgimento de novas tecnologias de base microeletrônica ensejaram mudanças tanto no controle do processo de trabalho como na forma como se esperava que os trabalhadores dele participassem. Não por acaso, nessa época chamam atenção do Ocidente o toyotismo e sua forma de gerir o processo de trabalho que permitia maior participação dos trabalhadores, embora fosse uma participação restrita que não eliminava, em última instância, a alienação dos trabalhadores (Antunes & Alves, 2004Antunes, R., & Alves, G. (2004). As mutações no trabalho na era da mundialização do capital. Educação & Sociedade, 25(87), 335-351. doi:10.1590/S0101-73302004000200003
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).

Além de importar práticas desenvolvidas no Japão, como a gestão da qualidade total e os círculos de controle da qualidade, pesquisadores do comportamento organizacional atentaram também para a voz nas organizações como uma preciosa forma de obter maior participação. Embora os pesquisadores tomem o trabalho de Hirschman (1973Hirschman, A. (1973). Saída, voz e lealdade: Reações ao declínio de firmas, organizações e Estados. São Paulo, SP: Editora Perspectiva.) como inspiração, já existia a preocupação de que os trabalhadores colaborassem com as decisões mediante o fornecimento de informações aos tomadores de decisão desde os anos 1930 (Timming & Johnstone, 2015Timming, A. R., & Johnstone, S. (2015). Employee silence and the authoritarian personality: A political psychology of workplace democracy. International Journal of Organization al Analysis, 23(1), 154-171. doi:10.1108/IJOA-06-2013-0685
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). Atualmente, o foco da participação está tanto na voz quanto no silêncio (Gollan & Xu, 2015Gollan, P. J., & Xu, Y. (2015). Re-engagement with the employee participation debate: Beyond the case of contested and captured terrain. Work, Employment and Society , 29(2), 1-13. doi:10.1177/0950017014522722
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). O que parece não ter mudado desde as pesquisas anteriores até as atuais é que a participação serve apenas para os trabalhadores ajudarem a aprimorar decisões que não foram tomadas por eles mesmos e cooptá-los, evitando que sua alienação ainda maior do processo de trabalho levasse a uma escalada de conflitos no local de trabalho (Faria, 2009Faria, J. H. (2009). Gestão participativa: Relações de poder e de trabalho nas organizações. São Paulo, SP: Editora Atlas.).

Como dissemos, para superar a crise estrutural do capital nos anos 1970, foram necessárias novas tecnologias físicas e de gestão que permitissem recuperar as taxas de lucro dos empreendimentos capitalistas, então deprimidas. Assim, níveis gerenciais puderam ser cortados. Como há menos pessoal responsável pela supervisão, é necessário que os trabalhadores falem mais, vozeiem suas opiniões de maneira construtiva, encerrando ou modificando práticas da organização (Morrison, 2014Morrison, E. W. (2014). Employee voice and silence. Annual Review of Organization al Psychology and Organization al Behavior, 1, 173-197. doi:10.1146/annurev-orgpsych-031413-091328
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). Os pesquisadores percebem, entretanto, que muitas vezes os trabalhadores “escolhem” ficar em silêncio. Morrison e Milliken (2000)Morrison, E. W., & Milliken, F. J. (2000). Organization al silence: A barrier to change and development in a pluralistic world. The Academy of Management Review, 25(4), 706-725. doi:10.2307/259200
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são as primeiras a enfrentar esse problema e cunham o termo silêncio organizacional, por elas considerado a retenção de preocupações e opiniões sobre problemas organizacionais pelos empregados. Pinder e Harlos (2001Pinder, C. C., & Harlos, K. P. (2001). Employee silence: Quiescence and acquiescence as responses to perceived injustice. Research in Personnel and Human Resource Management, 20, 331-369. doi:10.1016/S0742-7301(01)20007-3
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), a seu turno, indicam que o silêncio dos empregados é um conceito multifacetado, que pode ser definido como qualquer forma de expressão genuína sobre circunstâncias organizacionais para aqueles percebidos como capazes de modificá-las ou repará-las. Os pesquisadores buscaram compreender então os motivos de os trabalhadores “optarem” por ficar em silêncio e quais silêncios são ou não benéficos para as organizações. Contrariamente a algumas pesquisas, preferimos utilizar o termo “silêncio organizacional” a “silêncio dos empregados”, pois se trata de um fenômeno coletivo, embora se manifeste individualmente (Morrison & Milliken, 2000Morrison, E. W., & Milliken, F. J. (2000). Organization al silence: A barrier to change and development in a pluralistic world. The Academy of Management Review, 25(4), 706-725. doi:10.2307/259200
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). A compreensão dos fatores individuais que fariam os empregados optarem pelo silêncio não deve perder de vista o contexto no qual esses silêncios são construídos ou forjados.

Para Morrison e Milliken (2000Morrison, E. W., & Milliken, F. J. (2000). Organization al silence: A barrier to change and development in a pluralistic world. The Academy of Management Review, 25(4), 706-725. doi:10.2307/259200
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), a relutância dos empregados em relatar problemas está relacionada ao temor dos gerentes de receber feedbacks negativos e a uma série de crenças implícitas que estes têm daqueles. Além disso, o silêncio pode ser causado por pressões ou normas sociais existentes nos grupos e pelo desejo de não ser o porta-voz de ideias indesejáveis ou más notícias e pelo medo, pois há o temor de ser rotulado negativamente ou retaliado, de ter diminuídas as chances de progressão na carreira ou de demissão (Detert & Edmondson, 2011Detert, J. R., & Edmondson, A. C. (2011). Implicit voice theories: Taken-for-granted rules of self-censorship at work. Academy of Management Journal, 54(3), 461-488. doi:10.5465/amj.2011.61967925
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; Milliken, Morrison, & Hewlin, 2003Milliken, F. J., Morrison, E. W., & Hewlin, P. F. (2003). An exploratory study of employee silence: Issues that employees don’t communicate upward and why. Journal of Management Studies, 40(6), 1453-1476. doi:10.1111/1467-6486.00387
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). Considerando que o silêncio pode reduzir a inovação no local de trabalho, interferir na mudança organizacional, diminuir algumas atitudes positivas dos trabalhadores - como satisfação e comprometimento (Wang & Hsieh, 2013Wang, Y.-D., & Hsieh, H.-H. (2013). Organization al ethical climate, perceived organizational support, and employee silence: A cross-level investigation. Human Relations, 66(6), 783-802. doi:10.1177/0018726712460706
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), os pesquisadores defendem a necessidade de se buscar formas de superá-lo, rompendo tanto com o temor e pressupostos dos gerentes quanto com os medos dos trabalhadores, permitindo que o fluxo ascendente de informação corrija eventuais desvios fora do campo de visão tanto da gerência imediata quanto da cúpula da organização.

Para superá-lo, é necessário antes identificá-lo. Nesse sentido, Van Dyne, Ang e Botero (2003Van Dyne, L., Ang, S., & Botero, I. C. (2003). Conceptualizing employee silence and employee voice as multidimensional constructs. Journal of Management Studies , 40(6), 1359-1392. doi:10.1111/1467-6486.00384
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) desenvolvem três tipologias de silêncio, amplamente utilizadas pelos pesquisadores (p. ex., Chou & Chang, 2017Chou, S. Y., & Chang, T. (2017). Employee silence and silence antecedents: A theoretical classification. International Journal of Business Communication. doi:10.1177/2329488417703301
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; Knoll & van Dick, 2013Knoll, M., & van Dick, R. (2013). Do I hear the whistle…? A first attempt to measure four forms of employee silence and their correlates. Journal of Business Ethics, 113(2), 349-362. doi:10.1007/s10551-012-1308-4
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; Pirie, 2016Pirie, W. J. (2016). Key determinants of organisational silence for non-standard workers. Management Decision, 54(6), 1522-1538. doi:10.1108/MD-11-2015-0490
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; Rafferty & Restubog, 2011Rafferty, A. E., & Restubog, S. L. D. (2011). The influence of abusive supervisors on followers’ organizational citizenship behaviours: The hidden costs of abusive supervision. British Journal of Management, 22(2), 270-285. doi:10.1111/j.1467-8551.2010.00732.x
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; Wang & Hsieh, 2013Wang, Y.-D., & Hsieh, H.-H. (2013). Organization al ethical climate, perceived organizational support, and employee silence: A cross-level investigation. Human Relations, 66(6), 783-802. doi:10.1177/0018726712460706
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), para compreender por que os trabalhadores ficam em silêncio para além do que já havia sido apontado por seus antecessores (Morrison & Milliken, 2000Morrison, E. W., & Milliken, F. J. (2000). Organization al silence: A barrier to change and development in a pluralistic world. The Academy of Management Review, 25(4), 706-725. doi:10.2307/259200
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; Pinder & Harlos, 2001Pinder, C. C., & Harlos, K. P. (2001). Employee silence: Quiescence and acquiescence as responses to perceived injustice. Research in Personnel and Human Resource Management, 20, 331-369. doi:10.1016/S0742-7301(01)20007-3
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). Segundo os autores, existe o silêncio: (1) aquiescente, que ocorre quando existe a retenção de ideias relevantes com base em um sentimento de resignação; (2) defensivo, que é fruto de uma reflexão estratégica sobre quais ideias devem ou não ser retidas; e (3) pró-social, que ocorre quando informações, opiniões ou ideias são retidas para beneficiar outra pessoa ou a própria organização. Dessas tipologias apontadas, só o silêncio pró-social não é considerado prejudicial (Rafferty & Restubog, 2011Rafferty, A. E., & Restubog, S. L. D. (2011). The influence of abusive supervisors on followers’ organizational citizenship behaviours: The hidden costs of abusive supervision. British Journal of Management, 22(2), 270-285. doi:10.1111/j.1467-8551.2010.00732.x
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), já que este impede que informações confidenciais cheguem ao conhecimento de concorrentes.

A ênfase nos casos em que o silêncio tanto é benéfico quanto prejudicial para “os objetivos organizacionais” revela um viés gerencial dos pesquisadores do comportamento organizacional (Donaghey, Cullinane, Dundon, & Wilkinson, 2011Donaghey, J., Cullinane, N., Dundon, T., & Wilkinson, A. (2011). Reconceptualising employee silence: Problems and prognosis. Work, Employment and Society, 25(1), 51-67. doi:10.1177/0950017010389239
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), que reduz as questões que podem ser feitas e as explicações que podem ser dadas, além de desconsiderar que o silêncio pode ser uma forma de desafiar a administração (Barry & Wilkinson, 2016Barry, M., & Wilkinson, A. (2016). Pro-social or pro-management? A critique of the conception of employee voice as a pro-social behaviour within organizational behaviour. British Journal of Industrial Relations, 54(2), 261-284. doi:10.1111/bjir.12114
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; Cullinane & Donaghey, 2014Cullinane, N., & Donaghey, J. (2014). Employee silence. In A. Wilkinson, J. Donaghey, T. Dundon, & R. Freeman (Eds.), Handbook of research on employee voice (pp. 398-409). Cheltenham: Edward Elgar Publishing.). Ao criticarem a concepção de silêncio organizacional do comportamento organizacional, predominante na literatura, Donaghey et al. (2011)Donaghey, J., Cullinane, N., Dundon, T., & Wilkinson, A. (2011). Reconceptualising employee silence: Problems and prognosis. Work, Employment and Society, 25(1), 51-67. doi:10.1177/0950017010389239
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observam que muitas vezes a administração pode criar uma série de normas e arranjos institucionais que fazem com que uma série de questões fiquem fora dos processos de voz que existem no ambiente de trabalho.

A suposta coincidência de interesses entre trabalhadores e empregadores que baliza os pesquisadores indica que aqueles deveriam falar sempre que houvesse benefício aos segundos, pois também seriam beneficiados. As críticas feitas chamam atenção para a questão ideológica envolvida nos estudos do silêncio (Moura-Paula & Ferraz, 2015Moura-Paula, M. J., & Ferraz, D. L. S. (2015). Silêncio organizacional: Introdução e crítica. Cadernos EBAPE.BR , 13(3), 516-529. doi:10.1590/1679-395114581
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), pois a concepção de que haveria convergência entre os interesses do trabalho e do capital leva os pesquisadores a criar todo um ideário que leva à sofisticação da exploração dos trabalhadores. O conflito capital-trabalho é escamoteado e o fenômeno do silêncio como uma forma de enfrentamento ou resistência à administração é o fator silenciado pelos pesquisadores e apagado de suas definições de silêncio organizacional.

Método

O resgate da história de vida dos trabalhadores nos fornece dados para reconstruirmos as relações que esses estabeleceram no trabalho antes, durante e após a implantação das técnicas de gestão e, por meio de seus depoimentos, analisamos as alterações sofridas ao longo do tempo que encontram o silêncio enquanto uma forma de resistência. Marx, numa carta de 1846 a Annenkov, escreveu:

A história social dos homens nunca é senão a história do seu desenvolvimento individual, quer eles tenham consciência disso quer não tenham. As suas relações materiais formam a base de todas as suas relações. Estas relações materiais não são senão as formas necessárias em que se realiza a sua atividade material e individual. (Marx, 2006, par. 9)

Compõem nosso corpus empírico a história de um gerente de banco, as observações do seu cotidiano de trabalho e os documentos produzidos pelo banco em que este trabalhou ao longo de sua história. A linha condutora deste texto será dada pela história de Cristóvão (nome fictício), um trabalhador que atua em um banco que nos últimos vinte anos têm implantado inúmeras técnicas de controle do processo de trabalho. Assim, trata-se de uma empresa representativa do movimento de reestruturação produtiva que se intensificou no Brasil em meados da década de 1990 (Grisci & Bessi, 2004Grisci, C. L. I., & Bessi, V. G. (2004). Modos de ser e de trabalhar na indústria bancária. Sociologias, 6(12), 160-200. doi:10.1590/S1517-45222004000200007
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). Optamos por usar a história de Cristóvão apenas enquanto linha condutora da estruturação argumentativa e, quando necessário, utilizamos para corroborar as colocações de nosso informante os demais dados coletados que nos serviram de meios para compreender a história individual que constitui e é constituída na - e pelas - relações de trabalho.

Todavia, antes de iniciarmos a análise propriamente dita, cabe ressaltar a base de compreensão que temos sobre a possibilidade de a técnica de coleta de dados “história de vida” contribuir para análises que se propõem balizadas pelo materialismo histórico-dialético (ver Ferraz, Biasotto, & Tonon, 2010Ferraz, D. L. S., Biasotto, L. D., & Tonon, L. (2010). A centralidade do trabalho no processo de construção da identidade: Um estudo com membros do Movimento dos Trabalhadores Desempregados. In D. H. Helal, F. C. Garcia, & L. C. Honório (Coords.), Relações de poder e trabalho no Brasil contemporâneo (pp. 109-131). Curitiba, PR: Juruá Editora .; Minini & Ferraz, 2015Minini, R. M., & Ferraz, D. L. S. (2015). A identidade de enfermeiros e supervisores em um hospital público de Belo Horizonte. Revista Gestão & Conexões, 4(1), 165-186. Retrieved from http://bit.ly/31Q0RJf
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). Para isso, recorremos a sucintas explanações que permitem algumas considerações.

Logo de partida, recorremos ao debate de Sève (1975Sève, L. (1975). Psicanálise e materialismo histórico. In B. C. Clément, P. Bruno, & L. Sève (Eds.), Para uma crítica marxista da teoria da personalidade (pp. 204-265). Lisboa: Editorial Estampa.), que coloca em evidência a biografia individual e o conjunto das relações sociais; o ponto decisivo do argumento é o “fato determinante de que a atividade humana se objetiva socialmente e permanece exterior aos indivíduos, no mundo das relações sociais onde a individualidade social desenvolvida encontra a sua verdadeira base” (p. 215). E é por meio da “biografia singular” que “as contradições das relações sociais objetivas [são] integradas” (p. 257).

Marx (2011Marx, K. (2011). Grundrisse: Manuscritos econômicos de 1857-1858: Esboços da crítica da economia política. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .), ao estudar o desenvolvimento histórico das relações sociais de produção, demonstra que sob o capital estabelecemos relações sociais de dependência entre sujeitos mutuamente indiferentes consolidando as condições necessárias para a exacerbação da construção de uma manifestação particular da generidade humana, o indivíduo racionalmente egoísta. A divisão social e técnica do trabalho intensifica o movimento de individuação e de isolamento social. As experiências que todo e cada sujeito experiencia em sua vida é uma forma de manifestação de um movimento geral de constituição de um ser social. Assim, tais experiências, embora vividas enquanto únicas e exclusivas, não ocorrem senão naquele movimento - o próprio isolamento é social.

O objetivo da pesquisa é analisar as relações estabelecidas no ambiente de trabalho que foram constituídas pela implantação das técnicas de gestão e produziram o fenômeno do silêncio organizacional. Logo, se o movimento de constituição do ser social sob o capital produz o ser social enquanto indivíduo racionalmente egoísta, um dos modos privilegiados de acessar o concreto é por meio das experiências vividas pelos indivíduos. Contudo, o objetivo não é compreender as “exclusividades” de cada um deles, mas sim os determinantes que produziram o indivíduo que silencia. Assim, singularidade, particularidade e universalidade são categorias importantes nesse movimento analítico (Lukács, 1966Lukács, G. (1966). Estética: La peculiaridad de lo estético. Ciudad de México: Grijalbo.; Pasqualini & Martins, 2015Pasqualini, J. C., & Martins, L. M. (2015). Dialética singular-particular-universal: Implicações do método materialista dialético para a psicologia. Psicologia & Sociedade, 27(2), 362-371. doi:10.1590/1807-03102015v27n2p362
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). Partimos, mediante o processo de abstração, das particularidades concretas para a compreensão do movimento de totalização (Gurgel & Justen, 2015Gurgel, C., & Justen, A. (2015). Teorias organizacionais e o materialismo histórico. Organizações & Sociedade , 22(73), 199-221. doi:10.1590/1984-9230731
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). Como apontado por Marx (2011Marx, K. (2011). Grundrisse: Manuscritos econômicos de 1857-1858: Esboços da crítica da economia política. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .), “o concreto é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações, portanto, unidade da diversidade” (pp. 77-78).

Entretanto, a compreensão desses determinantes não ocorre exclusivamente pelos relatos do sujeito envolvido no concreto analisado, pois não nos interessa compreender tão somente o saber do sujeito sobre si mesmo, não nos interessa, em última instância, julgar os homens pelo que eles dizem de si, conforme destacam Marx e Engels (2007Marx, K., & Engels, F. (2007). A ideologia alemã. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .) - embora isso também nos interesse, por ser um dos elementos constituintes do concreto. Assim, outros dados foram buscados conforme o movimento de apreensão do real por meio do pensamento exige para se efetuar a compreensão materialista da história. Para retirar da história exclusiva os elementos comuns, lançamos mão das análises internas dos relatos, procurando identificar como o comum se manifesta na exclusividade. Estabelecidos os pontos determinantes do silenciamento do sujeito, esses foram subsumidos à análise das condições concretas em que o silêncio é produzido no processo de reprodução material da existência.

Enfim, apresentadas essas colocações, destacamos que a história de vida não é tomada como o método da pesquisa, mas como a técnica de coleta de dados, uma das múltiplas formas utilizadas pelo pesquisador para submeter o concreto ao modo próprio do “pensamento de apropriar-se do concreto, de reproduzi-lo como um concreto mental” (Marx, 2011Marx, K. (2011). Grundrisse: Manuscritos econômicos de 1857-1858: Esboços da crítica da economia política. São Paulo, SP: Boitempo Editorial ., pp. 54-55).

Análise

Cristóvão é gerente de uma agência bancária. Começou a trabalhar na empresa em 1983 e, desde 1990, exerce a função de gerente de agência. São 25 anos como gestor. Segundo ele próprio, “nós não temos vida pessoal e vida profissional, nós temos vida, a profissão faz parte da vida”. Ao analisarmos suas recordações a respeito de sua trajetória de vida, verificamos o quanto o trabalho é central para ele. Entrar nessa empresa foi um acaso, mas, já que ele tinha entrado, decidiu: “vou fazer carreira”. E não poupou esforços para isso. Em 1983 encontrou um ambiente propício para suas aspirações.

Na época, a empresa colocava os trabalhadores que ingressavam em uma área interna, operacional, que tinha flexibilidade de horário, o que permitia que os trabalhadores ali lotados fizessem curso superior, mesmo que à época a empresa ainda não valorizasse as graduações, conforme Cristóvão menciona. A ascensão profissional, com consequente aumento de salário, se dava por meio de realização de concursos internos e processos de indicação para entrevistas, nas quais era determinante o “quem indica”. O perfil de Cristóvão se encaixava para o que a empresa necessitava naquele momento, tinha disponibilidade para morar em qualquer cidade do país e queria “crescer no banco”. É um período em que é necessário que os trabalhadores contribuam construtivamente para os objetivos da empresa, pois esta passava por mudanças que necessitavam de novas ideias que facilitassem melhorias contínuas em seus processos e desempenho, ou seja, tratava-se de um ambiente propício à voz (Van Dyne & LePine, 1998Van Dyne, L., & LePine, J. A. (1998). Helping and voice extra-role behavior: Evidence of construct and predictive validity. TheAcademy of Management Journal , 41(1), 108-119. Retrieved from http://bit.ly/2uM7iRt
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). Ainda, note-se que a coisificação das relações sociais se manifesta na objetivação do outro enquanto um recurso a ser gerenciado, e isso ocorre de forma que o trabalhador veja o seu trabalho como um privilégio ou como um desafio para a sua autorrealização profissional, e não perceba que se trata da maximização da exploração de seu trabalho e do trabalho do outro (Gaulejac, 2007Gaulejac, V. (2007). Gestão como doença social: Ideologia, poder gerencialista e fragmentação social. São Paulo, SP: Ed. Ideias & Letras.).

Em 1986 o banco foi reestruturado e, sendo um dos bancos pertencentes ao governo brasileiro, perdeu algumas preferências em movimentações financeiras governamentais. Para compensar a perda, o governo autorizou que o banco atuasse em várias áreas financeiras. Foi transformado de banco agrícola e de desenvolvimento em banco múltiplo. Era, portanto, um momento de expansão de negócios, momento de mudanças que requisitavam trabalhadores que questionassem o status quo, que dessem opiniões e sugestões que pudessem fazer a empresa alcançar seus objetivos, isto é, que vozeassem. Os mecanismos de controle ainda eram incipientes. A figura do gerente geral era a figura máxima de supervisão. A outra esfera de controle, de nível estadual, era muito distante da realidade das agências. Devido a isso e pelo fato de suas atribuições serem mais genéricas, o gestor da agência tinha maior autonomia para tomar decisões. Apesar da existência de normas, o cadastro de instruções circulares, o gestor tinha alguma liberdade para usar sua criatividade no processo de gestão.

Nessa época Cristóvão, novo de idade e de empresa, não silencia. Ele participa, dá suas opiniões, é ouvido pelo gerente-geral e conhece gestores que o incentivam a perseguir a ascensão na carreira. São realizadas ações que maximizam o lucro do banco e permitem a visibilidade das ações do gerente e do Cristóvão. Nessa época, outros trabalhadores mais experientes já não tinham perfil para o que a empresa necessitava.

Ele [o gerente-geral] tinha uma visão extraordinária. A gente se identificou muito, tanto que chegou um período que tanto, que eu, ao invés do gerente adjunto (o segundo gestor da agência), o companheiro de negócios dele era eu. O gerente adjunto, pessoa gente finíssima também, com capacidade de trabalho também, . . . mas ele não tinha esse interesse, essa aptidão pelo negócio. Ele tava mais envolvido com o processo. (2015)

Cristóvão nos dá uma pista das mudanças que ocorreram na lógica da empresa. O foco passa a ser o relacionamento com o cliente, a busca de novos negócios, e não a área de controle de processos. A função do gerente-geral não era só de controlar o fazer da equipe, era também buscar novos negócios, captando novos clientes e oferecendo mais produtos para, assim, aumentar a produtividade impulsionando a geração de lucros para a empresa.

Cristóvão se torna gerente de agência em agosto de 1990, um período que continua sendo de destaque em sua carreira. A mudança estrutural do capital começa a se fazer presente no cotidiano das empresas brasileiras, gerando movimentos de ajustes estruturais. O primeiro movimento no banco é em abril de 1994, quando são criadas as superintendências regionais. Trata-se de mais um nível hierárquico para acompanhamento dos resultados e para aumento do controle do fazer gerencial. Elas são responsáveis por fazer a gestão de um grupamento de agências, por regiões. Anteriormente, essa responsabilidade era de uma superintendência estadual, o que dificultava um controle mais próximo de todas as agências. Antes das superintendências regionais, o contato com a superintendência estadual era raro, às vezes até semestral. Com elas, a supervisão mais frequente de um número menor de agências passa a ser possível. Após um período de consolidação da atuação das regionais, elas tornam-se um mecanismo que transforma a forma de controle sob as atividades das agências. A criação dessa estrutura parece ir contra a tendência de corte de níveis gerenciais, porém esses cortes ocorreram nas agências, pois a estrutura de funções sofreu uma grande alteração com a adoção de novas tecnologias físicas e de gestão. As pessoas precisam ser conduzidas, e por pessoas que possuem cérebro, que dirigem e definem o trabalho daqueles que possuem apenas as mãos (Faria, 2011Faria, J. H. (2011). Economia política do poder: Uma crítica da teoria geral da administração (2a ed.). Curitiba, PR: Juruá Editora.). Nesse momento, nos parece que o “cérebro” vai sendo transferido da cabeça dos gerentes-gerais para a dos superintendentes regionais. A tecnologia celebrada em uma das agências em que Cristóvão trabalhou, e na qual os próprios funcionários contribuíram para a compra do primeiro computador a ser usado como ferramenta de trabalho, é a mesma que vai permitir um aumento do controle do trabalho dos gestores de agência alguns anos mais tarde.

Em 1995, inicia-se um período de crise: entre o primeiro semestre de 1995 e o final de 1996, o banco acumula prejuízo de R$ 11,2 bilhões. Também nesse período há mudanças na política de recursos humanos. Para resolver o problema do prejuízo acumulado, o governo realiza chamada de capital de R$ 8 bilhões no segundo semestre de 1996 e para resolver o “problema de recursos humanos”, ainda em 1995 o banco lança dois programas, o Programa de Desligamento Voluntário e o Plano de Adequação de Quadros, o que acarretou a demissão de quase 20 mil funcionários no período de dezembro de 1995 a dezembro de 1998.

A mudança repentina de seus superiores em relação ao desempenho de Cristóvão como gestor coincide com o início da crise de 1995. No final de 1994, ele havia mudado de agência e começa a sofrer ameaças de morte de clientes por cobrar as operações que estavam atrasadas, inclusive dos fiadores, de autoridades da cidade. Não era hábito cobrar os clientes naquele local e, pelo prejuízo acumulado ao final de 1996 que citamos, parece que este se repetia pelas agências no restante do país. A avaliação de desempenho, de periodicidade semestral, demonstrou um resultado contraditório. Cristóvão é elogiado pelo seu desempenho, mas recebe um ultimato para encontrar uma nova agência para trabalhar. Será que Cristóvão, ao cobrar dívidas, gerou conflitos com pessoas poderosas da região? Será que Cristóvão, pelo destaque no cumprimento de metas, incomodava seu superior por ser um concorrente em potencial? Uma resposta positiva a essas questões justificaria a mudança repentina de seus superiores em relação ao seu valor como gestor.

Cristóvão muda-se para outro estado em agosto de 1996 e começa um novo e breve ciclo de geração de lucros para a empresa. Consegue atingir muitas metas, amplia a visibilidade do banco na região, até que, ao final de um processo disciplinar, perde a comissão de gerente-geral. “A partir daí”, declara Cristóvão, “minha carreira estagna” (2015). O banco havia se tornado mais normativo. As técnicas de participação utilizadas anteriormente com os gestores, que os conduziam a expressar suas ideias e opiniões de forma mais livre, permitiram que elas fossem incorporadas, resultando em novas normas e procedimentos padrões. Agora não havia mais espaço para inovar, mesmo que acarretasse maior lucratividade da empresa. As normas são diretas e seu descumprimento acarreta punições severas.

Entre 1995 e 2002 todo o sistema financeiro passa também por transformações tecnológicas. O número de pontos de atendimento cresce - mais um motivo que explica a criação das superintendências regionais -, as transações mudam de perfil e saem dos guichês de caixas para os terminais de autoatendimento e internet. Operações antes realizadas nas agências passam a máquinas de autoatendimento. A partir de 1998, a quantidade de transações via autoatendimento supera as operações feitas pelo caixa.

A base de clientes praticamente dobra do período de 1996 a 2001. É necessário um novo perfil de gestor para esse novo banco. E esse gestor deve estar motivado à altura. Em agosto de 2001, o banco concede reajuste de até 152% para cerca de 3.400 funcionários, incluindo os superintendentes e gerentes de agência; esses últimos tiveram um aumento de acordo com o grau de complexidade da agência. Por exemplo, o reajuste salarial do gestor de agência com mais alto nível de complexidade foi de 62,5%. O recado que a nova estrutura de remuneração dá é muito claro: para ter aumento real de salário, o trabalhador do banco deve buscar galgar novas funções na empresa e adaptar-se às exigências da função gerencial. Note-se bem, é uma função, não um cargo. A qualquer momento o gerente pode perder sua função e voltar ao seu cargo inicial. O adicional pelo exercício de sua função compõe parte considerável do seu salário. O trabalhador passa a perseguir a promoção para gestor, tanto para melhorar suas condições materiais de existência quanto para melhorar seu status ante a sociedade, e isso reforça a competição. Nesse contexto, o maior e, por que não dizer, único beneficiário é o próprio capitalista - ainda que aqui ele se expresse na figura do Estado -, já que é ele quem ganhará com a competição entre os trabalhadores (Marx, 2013Marx, K. (2013). O capital: Crítica da economia política: livro I. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .). Vale ressaltar que, de 1996 a 2001, houve um período de congelamento salarial da categoria bancária. De 1996 a 2001, foi concedido abono salarial; em 1996 a 1999, foi negada a concessão de reajuste e, em 2000 e 2001, ocorreram reajustes de 1,7% e 2%, respectivamente.

Como lutar por toda a categoria se os ganhos são tão poucos e os riscos de retaliação pela empresa são tão grandes? A estagnação na carreira é um risco que não vale a pena correr. Essa mudança na estrutura de remuneração mostra que os trabalhadores sofreram uma grande crise, a qual atingiu tanto a sua materialidade quanto a sua subjetividade, o que afetou, inclusive, a forma de ser enquanto ser social. Há no capital um processo de subjetivação que qualifica e hierarquiza as diferenças, as subjetividades. Nesse processo, há a manifestação da verticalização das subjetividades, o que dificulta os mecanismos de coletividade. Consequência da verticalização da subjetividade, aquele-que-vive-do-trabalho (o trabalhador) procura “forjar” uma subjetividade ao encontro das suas relações de trabalho, das condições concretas que lhes são apresentadas, como no caso da qualificação profissional e da extensão dessas relações ao seu cotidiano (Antunes, 2006Antunes, R. (2006). Os sentidos do trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .).

A função gerencial prioriza o controle da atividade de outros como caminho para o aumento do lucro da empresa, e não na compreensão do processo do trabalho como forma de libertação. Ainda, mascara a alienação dos trabalhadores, gestores ou não, já que os trabalhadores, muitas vezes, se sentem recompensados por terem o “privilégio” de serem gestores ou por ser um trabalhador tão comprometido com os objetivos da empresa (Gaulejac, 2007Gaulejac, V. (2007). Gestão como doença social: Ideologia, poder gerencialista e fragmentação social. São Paulo, SP: Ed. Ideias & Letras.).

Além da mudança no sistema de remuneração, foi em meados da década de 1990 que as agências passam a ser supervisionadas mais de perto, com a consolidação da atuação das superintendências regionais. A proximidade das superintendências, aliada ao desenvolvimento tecnológico e à utilização de relatórios gerenciais, atualmente quase em tempo real, permite um controle a distância das atividades. Foram mapeados ao longo dos anos o conhecimento sobre o produto, o serviço e a forma de conseguir cumprir as metas de maneira que os níveis de lucratividade esperados pelos acionistas sejam atendidos; as séries históricas foram consideradas e não é mais tão necessária a participação dos funcionários das agências, nem de seus gestores. Os sistemas informatizados cumprem esse papel. Os padrões, definidos pelos altos gestores responsáveis pelo planejamento, chegam até o trabalhador descendo a cadeia hierárquica, independentemente de sua amplitude. Isso quer dizer que o trabalhador se adapta a uma forma de fazer planejada por outros (Faria, 2011Faria, J. H. (2011). Economia política do poder: Uma crítica da teoria geral da administração (2a ed.). Curitiba, PR: Juruá Editora.). Nesse momento, na empresa, os gestores mais próximos da execução acabam por também executar o controle de uma forma planejada por outros, tendo em vista sua subordinação aos gestores “superiores”. O cérebro dos gerentes-gerais “perdeu sua função”. O gerente-geral passa a ser simplesmente o porta-voz do superintendente regional. Em uma das observações que fizemos, ao chegarmos à agência, um gerente-geral estava com uma expressão desolada. Ao ser questionado sobre o que havia ocorrido, ele conta que havia feito uma reunião geral para planejar as vendas da semana e, após concluída a reunião, seu superintendente regional liga e pede que seja feita outra ação, diferente do que ele havia programado. Resignado, ele voltou a chamar a equipe para comunicar a mudança de planos.

Cristóvão tem suas críticas a respeito desse tipo de controle.

Porque eu acho que a empresa, as pessoas que fazem a empresa, principalmente esse grupamento de superintendentes regionais, eles atuam de uma forma que você pode até achar exagerada, mas é uma forma muito parecida com a forma que a Gestapo atuava. Como é que a Gestapo atuou? Ela semeou o medo de tal forma entre os alemães que um alemão desconfiava do outro. As pessoas não se comunicavam, não trocavam ideias, não trocavam confidências, porque você não sabia com quem tava falando. Você não sabia se estava falando com alguém da Gestapo, ou com alguém que era amigo do amigo de quem era da Gestapo. Então, assim, a pressão que a Gestapo fez no povo alemão foi de tal forma que criou esse temor na hora de se manifestar. (2015)

Começam as críticas à forma de encarar a gestão nas agências. De acordo com Cristóvão, “no banco, de 10 anos pra cá o que vale é [cumprir as metas], né, não se faz uma análise detalhada da gestão. . . . Não, é uma coisa reducionista, [atingiu a meta], ótimo, não [atingiu], é péssimo” (2015). Esse é o ponto central do silenciamento. O nível de controle, diário, sobre o desempenho das agências que gerenciam os torna meros porta-vozes de seus superiores. Não há espaço para o diálogo e o planejamento entre os gerentes de agência. Só importam as metas. Sobre a pressão para atingir as metas, Cristóvão prossegue:

Mas se você reunir mais de um administrador, o assunto chega a ser monótono. . . . Que tá difícil, que é complicado, um até me mandou ontem no WhatsApp: “PQP, ninguém consegue trabalhar nesse banco”. Por quê? Porque… um dia me contaram aí 76 [mensagens de] WhatsApp. (2015)

Cristóvão nos mostrou as mensagens que ele estava recebendo em um grupo de WhatsApp (aplicativo de envio instantâneo de mensagens para smartphones) durante as entrevistas. São mensagens de superintendentes cobrando por resultados, lançando desafios-relâmpago, são gestores respondendo que conseguiram cumprir, ou que estão buscando fazer, ou informando a cada hora o quanto já conseguiram cumprir etc. Toda essa vigilância para garantir a produtividade e a própria busca pela “harmonia administrativa” (Tragtenberg, 2006Tragtenberg, M. (2006). Burocracia e ideologia (2a ed.). São Paulo, SP: Editora Unesp.) fazem com que os gerentes tenham cautela ao responder aos superintendentes. Muito do que é dito no WhatsApp já vai entremeado de silêncio pela própria regulação que é feita sobre o que é digno de ser falado ou não. Não há espaço para que eles próprios criem, planejem a atuação da equipe, estão sendo engolidos pelas demandas que são colocadas pelos superintendentes regionais para que, além de cumprir as metas da agência, também ajudem o cumprimento da meta das superintendências, mas isso não é assunto de mensagens no WhatsApp. Grosseiramente, cada agência tem que vender produtos e serviços com base em um valor a ser alcançado, a meta. Cada produto é precificado e compõe uma variável na lista de itens a cumprir. Cada agência, superintendência regional e superintendência estadual possui uma lista com essas variáveis. Ao invés de o gestor ter autonomia para decidir junto com sua equipe na agência quais estratégias utilizar para conseguir cumprir os itens da lista, recebe ordens diárias para que determinado produto ou serviço seja trabalhado no mês, na semana ou até mesmo no dia, mas isso também não é pauta para WhatsApp. Escrever sobre esse assunto é mais difícil do que falar, o registro amedronta ainda mais do que a fala.

Existem na empresa formas institucionais de participação, canais que permitem a todos os funcionários, independentemente do cargo, vozear, mas os assuntos são pré-selecionados. Portanto, não é permitido falar sobre tudo, como apontado anteriormente por alguns pesquisadores, que criticam o mainstream das pesquisas e seu pressuposto de que os trabalhadores optam por ficar em silêncio, desconsiderando as relações de poder e a própria vontade da administração de indicar quais áreas para ela são prioritárias para a participação dos trabalhadores e quais devem ser ignoradas (Barry & Wilkinson, 2016Barry, M., & Wilkinson, A. (2016). Pro-social or pro-management? A critique of the conception of employee voice as a pro-social behaviour within organizational behaviour. British Journal of Industrial Relations, 54(2), 261-284. doi:10.1111/bjir.12114
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; Donaghey et al., 2011Donaghey, J., Cullinane, N., Dundon, T., & Wilkinson, A. (2011). Reconceptualising employee silence: Problems and prognosis. Work, Employment and Society, 25(1), 51-67. doi:10.1177/0950017010389239
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; Moura-Paula & Ferraz, 2015Moura-Paula, M. J., & Ferraz, D. L. S. (2015). Silêncio organizacional: Introdução e crítica. Cadernos EBAPE.BR , 13(3), 516-529. doi:10.1590/1679-395114581
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).

Cristóvão é gerente, mas ao mesmo tempo não o é, pois quer ser gerente como antes, quer ter liberdade para criar suas estratégias de atuação, que haja planejamento compartilhado, que o sistema de gestão funcione no potencial máximo para que a empresa maximize os lucros, consiga os resultados. Ele critica que “alguns poucos” tiram vantagem do modelo atual e conseguem ascensões meteóricas. Volta ao problema das condições do jogo instituídas pela empresa. Em nenhum ponto questiona o propósito do jogo em si, afinal, na lógica da empresa todos estão jogando para um objetivo, o lucro:

Você pode ser o cara mais brilhante do mundo, mas você tem que trabalhar com o time, seu time tem que brilhar. Se ele não brilhar, meu amigo, você não vai brilhar sozinho. 30, 40% não chegam, o cara chega, aí o cara fica nessa de… farinha pouca, primeiro o meu pirão, então ele quer que faça o que ele precisa, e é uma mentalidade que eu não entendo, cara, porque se todas as agências fizerem o que as agências precisam, a soma disso. . . . O cara, ele não quer uma ameaça, entendeu, à carreira dele. Ele quer ser gerente-executivo, ele quer ser diretor, então, por favor, saia da frente. Não me atrapalhe. Me atrapalhar é deixar de fazer como eu tô mandando, como eu tô dizendo, porque você não é gerente, né? (2015)

A ascensão profissional no banco se dá pelo mérito individual, existem poucas funções comissionadas para muitos trabalhadores que iniciam suas atividades na empresa. Ser rotulado como encrenqueiro pode dificultar essa possibilidade de ascensão, o silêncio acaba sendo o melhor caminho para proteger tanto a si mesmo quanto eventuais colegas que compartilhem da mesma posição. Dessa forma, o mesmo silêncio que parece defensivo e é motivado pelo medo de sofrer retaliações pode também ser pró-social, mas não necessariamente pró-gestão (Barry & Wilkinson, 2016Barry, M., & Wilkinson, A. (2016). Pro-social or pro-management? A critique of the conception of employee voice as a pro-social behaviour within organizational behaviour. British Journal of Industrial Relations, 54(2), 261-284. doi:10.1111/bjir.12114
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). Existe um incentivo muito grande da empresa para que os funcionários busquem essas funções, afinal, para a empresa “é dessa forma que se tem um aumento considerável do salário”. Desencoraja-se, assim, a luta por reajustes para toda a categoria e instala-se o clima de competição.

Cristóvão não percebe, hoje, que estava adequado ao que o banco necessitava de um gestor naquela época do fim dos anos 1980 e início dos anos 1990, em que, do ponto de vista estrutural, não havia possibilidade de um controle maior da atividade do gestor. Ele era o responsável por criar as condições de lucro. Cristóvão é um gerente que busca ser ouvido para aperfeiçoar suas práticas e de seus colegas, em suma, um gerente que deseja realizar seu trabalho, servindo aos interesses do capital, mas vê impossibilitado. Em sua concepção, alterar o modelo significa colocar pessoas que são beneficiadas por ele em uma situação desconfortável. Em sua percepção, o interesse individual, por promoção de alguns, prejudica o interesse individual de vários outros, que também querem ascensão na carreira. Cristóvão quer é servir ao capital, mais à sua maneira, por que foi assim que ele aprendeu com os gerentes que o precederam, foi outra forma de ser gerente que o processo de trabalho antes demandava, foi assim que ele viveu durante mais de 20 anos na empresa, e é assim que ele entende seu papel de gerente.

Quando o banco tem a possibilidade de controlar não só que produto ou serviço oferecer, mas também para quem e quando, com o advento dos controles proporcionados pelo desenvolvimento tecnológico, outro perfil de gestor é requerido. O foco no controle e na supervisão do trabalho intensifica-se, as etapas de planejamento e criação de estratégias próprias esvaecem-se. Cristóvão, no decorrer de sua carreira, por não acompanhar essa mudança de perfil, foi ficando obsoleto:

Nós chegamos nesse ponto no banco. Nós não conversamos uns com os outros, nós não trocamos ideias, nós reclamamos. Fazemos reunião e fica todo mundo chorando, “pô, tá difícil”, “pô, o cara faz isso, pressiona aquilo”, mas tomar uma decisão efetiva, esse grupo de pessoas que está sentido achacado, desrespeitado, vilipendiado, nenhum, nenhum. Porque instaurou-se a gestão do medo, da desconfiança. (2015)

Há um temor pela retaliação, pelo rótulo negativo, silenciar acaba sendo a melhor alternativa para não sofrer retaliações (Milliken et al., 2003Milliken, F. J., Morrison, E. W., & Hewlin, P. F. (2003). An exploratory study of employee silence: Issues that employees don’t communicate upward and why. Journal of Management Studies, 40(6), 1453-1476. doi:10.1111/1467-6486.00387
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). Mesmo nesse cenário que Cristóvão descreve, alguns de seus colegas gerentes-gerais se adaptam. Reclamam entre os pares, às vezes também com os subordinados. Mas fazem o que for necessário para ascender profissionalmente, buscam atingir as metas de sua agência e as encomendas especiais que são passadas pelo superintendente regional diariamente. Além da gestão do medo, citada por Cristóvão, instaurou-se também a autogestão da carreira. Muitos buscam ascensão profissional e Cristóvão não deseja mais, não vê que há espaço para suas convicções.

Considerações finais

Os depoimentos de Cristóvão sobre as situações que aconteceram ao longo dos anos de sua carreira permitiram que realizássemos um paralelo com as condições concretas que estavam presentes ao longo da história da empresa em que ele trabalha. O sistema de administração de recursos humanos muda quando Cristóvão entra na empresa. O funcionário que procurava se capacitar, realizar uma graduação, era considerado descomprometido com o trabalho. Hoje, com o discurso sobre gestão de competências, a empresa estimula esse tipo de capacitação, concedendo bolsas de graduação e pós-graduação aos trabalhadores. Para estar apto a concorrer para outras funções, o funcionário deve se capacitar, realizar cursos, conseguir certificação dos seus conhecimentos. A qualificação se torna um pré-requisito para conseguir avançar na carreira e aumentar o salário, o que por si só parece ser um paradoxo, afinal incentiva-se maior qualificação, porém é exigida menor atuação estratégica dos funcionários. Paradoxo aparente quando observamos as alterações no próprio sistema educacional universitário durante esse mesmo período, passando de um espaço reflexivo para um de ensino tecnicista.

Pelas descrições de Cristóvão, percebemos alguns momentos que pudemos traduzir em silenciamento nas formas que Van Dyne et al. (2003Van Dyne, L., Ang, S., & Botero, I. C. (2003). Conceptualizing employee silence and employee voice as multidimensional constructs. Journal of Management Studies , 40(6), 1359-1392. doi:10.1111/1467-6486.00384
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) apresentaram: silêncio aquiescente e silêncio defensivo, notadamente. Também verificamos a solidão e falta de solidariedade dos gestores nas últimas décadas. Ao mesmo tempo, Cristóvão também nos possibilitou ver que as críticas feitas à abordagem desenvolvida por Van Dyne et al. (2003)Van Dyne, L., Ang, S., & Botero, I. C. (2003). Conceptualizing employee silence and employee voice as multidimensional constructs. Journal of Management Studies , 40(6), 1359-1392. doi:10.1111/1467-6486.00384
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e outros autores do comportamento organizacional deixam de lado questões importantes, como as relações de poder (Brown & Coupland, 2005Brown, A. D., & Coupland, C. (2005). Sounds of silence: Graduate trainees, hegemony and resistance. Organization Studies, 26(7), 1049-1069. doi:10.1177/0170840605053540
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), e como a própria cúpula da empresa pode, sendo detentora da comunicação livre, indicar o que é ou não digno de ser levado em consideração - é a cúpula quem indica quais silêncios podem ou não ser mantidos ou rompidos, ainda que em princípio a escolha pareça ser dos próprios trabalhadores (Moura-Paula & Ferraz, 2015Moura-Paula, M. J., & Ferraz, D. L. S. (2015). Silêncio organizacional: Introdução e crítica. Cadernos EBAPE.BR , 13(3), 516-529. doi:10.1590/1679-395114581
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), ainda que esses silêncios sejam de resistência (Donaghey et al., 2011Donaghey, J., Cullinane, N., Dundon, T., & Wilkinson, A. (2011). Reconceptualising employee silence: Problems and prognosis. Work, Employment and Society, 25(1), 51-67. doi:10.1177/0950017010389239
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).

O banco controlou os tipos de silenciamento que foram construídos ao longo da carreira de Cristóvão, que acumulou frustrações e pôde observar como o que se esperava dos gestores se modificou com as alterações na organização do processo de trabalho. Novos perfis de superintendentes, gestores e empregados são requeridos atualmente no banco. A falha em se adaptar - operada via resistência e mudança de comportamentos - resultou em sofrimento.

Marx (2013Marx, K. (2013). O capital: Crítica da economia política: livro I. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .) comenta que ser trabalhador produtivo não é uma sorte, mas um azar, pois à medida que os trabalhadores vozeiam sobre questões relacionadas ao trabalho, no sentido de melhorar os processos de trabalho, eles estão contribuindo, ainda que não percebam, para que a exploração da sua força de trabalho aumente. Percebemos a preocupação de Cristóvão com a sustentabilidade da empresa, que ela consiga se manter no mercado, sendo lucrativa, ou seja, que ela continue a explorar a força de trabalho de várias outras pessoas. Mas também que elas sejam reconhecidas, que se sintam parte do resultado, que consigam ajudar a empresa a atingir seus objetivos, ou seja, que no nível individual sejam recompensadas, como se isso fosse possível sob o sociometabolismo do capital.

O silenciamento organizacional relativo à falta de discussão sobre a forma em que a carreira é estruturada na empresa, os mecanismos de competição entre os trabalhadores e o incentivo à individualidade nem é percebido. Cristóvão nem chega a entrar no mérito da exploração do capital, porque isso não é uma coisa que lhe está tão visível. Além disso, ele se preocupa também com o seu “aqui e agora”, que tanto critica da parte dos seus superiores. Só que o seu aqui e agora é de foro individual, é desempenhar o seu trabalho, do seu jeito, e se autopreservar. O silêncio de Cristóvão muitas vezes reflete seu sofrimento diante das mudanças pelas quais a empresa passou e a impossibilidade de ele ainda continuar produtivo perante as novas demandas que ela apresenta. Quanto mais o trabalhador produz riqueza mais pobre ele fica, sendo que o produto do seu trabalho e o próprio trabalho tornam-se mercadorias (Marx, 2013Marx, K. (2013). O capital: Crítica da economia política: livro I. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .). Na sociedade capitalista, há uma contradição, pois quanto mais o trabalhador se apropria da natureza sensível por meio do seu trabalho, menos domínio tem sobre os produtos do seu trabalho e mais precária é sua existência física (Marx, 2008Marx, K. (2008). Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .). Isso fica demonstrado na história de Cristóvão, porque, nessa sociedade, o trabalho objetivado é apropriado por outro, fazendo com que o trabalho seja sua negação, em vez de ser sua afirmação enquanto ser livre e consciente (Marx, 2013Marx, K. (2013). O capital: Crítica da economia política: livro I. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .).

O medo que Cristóvão e outros gestores têm de questionar os superintendentes vai além de meras percepções de que falar seja perigoso, pois a alta administração impõe sua agenda sobre o que quer ouvir e cria meios para silenciar pontos divergentes daquilo que ela considerou importante. O silêncio, que por um lado é resistência, por outro é imposição. Para cooptar os gestores a agir conforme deles se espera, a carreira é modificada e sua remuneração está atrelada a desempenhar suas tarefas tal como dele se demanda, a agir para manter a harmonia da empresa e respeitar o caráter quase sagrado da hierarquia (Tragtenberg, 2006Tragtenberg, M. (2006). Burocracia e ideologia (2a ed.). São Paulo, SP: Editora Unesp.). Não devemos nos surpreender com essas tentativas de cooptar os gerentes, já que o desenvolvimento das modernas práticas gerenciais visou reunir empregados e empregadores com intuito de aumentar o desempenho da empresa ao promover a harmonia e a cooperação (Kaufman, 2014Kaufman, B. E. (2014). Employee voice before Hirschman: Its early history, conceptualization, and practice. In A. Wilkinson, J. Donaghey, T. Dundon, & R. Freeman (Eds.), Handbook of research on employee voice (pp. 17-35). Cheltenham: Edward Elgar Publishing .).

No sociometabolismo do capital, a relação essencial do trabalho, isto é, a relação do trabalhador com a produção, está separada, estranhada. A sujeição da ciência natural como simples meio para fins alheios não é de modo algum acidental, mas está necessariamente ligada ao seu caráter fragmentado, “autônomo” e, evidentemente, à estrutura da atividade produtiva alienada em geral (Mészáros, 2006Mészáros, I. (2006). A teoria da alienação em Marx. São Paulo, SP: Boitempo Editorial .). Na lógica do fazer gerencial, nos parece que quanto mais convicto de suas funções o gestor está, mais há obstáculos ao movimento de conscientização do processo de exploração, e mais o silenciamento aparece em função de suas frustrações pela incapacidade de ter sua força de trabalho ainda mais exaurida. Nessa ânsia, os gestores e demais trabalhadores acabam se submetendo aos desígnios do capital quanto à produtividade que deles se espera e da participação que lhes é oferecida.

Agradecimentos

Agradecemos à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2020

Histórico

  • Recebido
    03 Nov 2017
  • Aceito
    08 Jan 2019
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