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Bibliotecas públicas em cidades médias do estado do Amazonas, Brasil

Public libraries in mid size towns in the state of Amazonas, Brazil

Resumo

Consiste no resultado de estudo diagnóstico sobre bibliotecas públicas realizado nos municípios de Coari, Itacoatiara, Manacapuru, Parintins, Tabatinga e Tefé, localizados no estado do Amazonas, Brasil. Apresenta dados de pesquisas de campo desenvolvidas entre os anos de 2012, 2013, 2014, 2016 e 2017 que objetivavam analisar as instalações físicas, bem como serviços, frequência de usuários, atuação profissional e entre outras coisas, o nível de interação do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Amazonas com os municípios. A pesquisa de cunho qualiquantitativo utilizou parâmetros metodológicos estabelecidos pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas das Cidades da Amazônia Brasileira que busca observar e entender o modo de viver dos cidadãos entre cidades amazônicas a partir de estudos da rede urbana. Sem se deter sobre aspectos teóricos da Geografia Urbana, apresenta as seis cidades consideradas médias no contexto amazonense, bem como um panorama das condições de suas bibliotecas públicas municipais.

Palavras-chave:
Biblioteca Pública; Sistema de Bibliotecas Públicas; Cidades do Amazonas; Políticas públicas para bibliotecas; Amazonas, Brasil

Abstract

The work consists in the result of a diagnostic study on public libraries held in the municipalities of Coari, Itacoatiara, Manacapuru, Parintins, Tabatinga and Tefé, located in the state of Amazonas, Brazil. It presents data from field surveys developed between the years 2012, 2013, 2014, 2016 and 2017 that aimed to analyse physical installations, as well as services, frequency of users, professional performance and among other things, the level of interaction of the State system of public libraries with the municipalities. The research of quantitative nature used methodological parameters established by the nucleus of studies and research of the cities of the Brazilian Amazon that seeks to observe and understand the way of living of the citizens between Amazonian cities from Studies of the Urban network. Without dwelling on theoretical aspects of urban geography, it reflects on the six cities considered average in the amazon context and presents a panorama about its municipal public libraries.

Key words:
Public library; Public library system; Cities of the Amazon; Public policies for libraries; Amazonas, Brazil

1. Introdução

O valor social da biblioteca pública tem sido promulgado e defendido por diferentes países que transformaram a visão conservadora de espaços silenciosos e exclusivamente centrado nos livros em ambientes arquitetônicos funcionais e harmoniosos, dotados de acervos e equipamentos voltados para atender diferentes públicos, numa perspectiva baseada em estudos de comunidades e que seguem as Diretrizes da International Federation of Library Associations and Institutions (IFLA) que define a Biblioteca Pública como:

[...] organização criada, mantida e financiada pela comunidade, quer através da administração local, regional ou central, quer através de outra forma de organização comunitária. Disponibiliza acesso ao conhecimento, à informação, à aprendizagem ao longo da vida e a obras criativas, através de um leque alargado de recursos e serviços, estando disponível a todos os membros da comunidade independentemente de raça, nacionalidade, idade, gênero, religião, língua, deficiência, condição econômica e laboral e nível de escolaridade. (KOONTZ; GUBBIN, 2013KOONTZ, Christie; GUBBIN, Barbara. Diretrizes da IFLA sobre os serviços da Biblioteca Pública. 2. ed. rev., Lisboa, julho de 2013. Disponível em: https://www.ifla.org/files/assets/hq/publications/series/147-pt.pdf. Acesso em: 3 jun. 2018.
https://www.ifla.org/files/assets/hq/pub...
, p. 13).

O panorama apresentado, contudo não se adéqua a realidade da maioria dos municípios amazonenses, quiçá de muitas cidades brasileiras, num evidente distanciamento entre o que pregoa a teoria e a real condição do país. Aspectos como esses foram abordados por Machado e Suaiden (2015MACHADO, Frederico Borges; SUAIDEN, Emir José. A biblioteca pública, entre a teoria e a prática. Biblos: Revista do Instituto de Ciências Humanas e da Informação, Porto Alegre, v. 29, n.2, p.22-39, 2015. Disponível em: http://www.brapci.inf.br/index.php/article/view/0000019602/b0deb834c09511fb93494c58759b8833. Acesso em: 28 out. 2018.
http://www.brapci.inf.br/index.php/artic...
, p. 25) que ao refletiram sobre teoria e prática no campo das bibliotecas públicas no Brasil, apontaram que:

Ao se voltar à literatura da área, por meio dos estudos de abordagens históricas sobre o livro, leitura, bibliotecas públicas e das políticas voltadas a estas, observa-se que os serviços e atividades oferecidos por essas bibliotecas são comuns a diversas situações e regiões e, dessa maneira, representam um modelo brasileiro de biblioteca pública. Esse modelo encontra suas origens e desenvolvimento na história dessas bibliotecas e nas políticas públicas voltadas a elas. E a partir de sua história e das políticas realizadas foram desenvolvidos diversas imagens sociais dessa biblioteca, construindo um caleidoscópio que reflete a situação de uma instituição social pública desvirtuada de sua função social.

Em vista das dimensões geográficas, sociais e econômicas do país, as bibliotecas públicas podem se apresentar em diferentes estágios de desenvolvimento e apesar dos inquestionáveis benefícios que podem exercer nas comunidades é um equipamento pouco valorizado pela administração pública. Machado (2010MACHADO, Elisa Campos. Análise de políticas públicas para bibliotecas no Brasil. InCID: R. Ci. Inf. e Doc., Ribeirão Preto, v. 1, n.1, p. 94-111, 2010. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/incid/article/view/42307. Acesso em: jun. 2017.
http://www.revistas.usp.br/incid/article...
, p. 107) ao analisar as políticas públicas para as bibliotecas públicas no Brasil observou que:

Problemas como falta de recurso para manutenção do acervo e infraestrutura, além de salários inadequados, são comuns nos pequenos municípios do interior do país, o que inviabiliza a contratação de bibliotecários com formação para atuar e implementar serviços de qualidade para a população.

Sem recursos, sem infraestrutura, mas principalmente sem dispor de pessoal com conhecimentos sobre o que fazer, espaços existentes sem atrair usuários criam imagem pouca produtiva do que convém ser efetivamente uma biblioteca pública. Esses aspectos foram discutidos por outros autores e serão retomadas no decorrer desse artigo.

Esse trabalho consiste em fragmento das análises que compõe estudo doutoral (em andamento), pela Universidade de Salamanca, Espanha, que reflete sobre a atuação do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Amazonas tomando por base mais de 50% das cidades do estado (32 municípios, mas a capital, Manaus). Desse montante, as análises do ponto de vista qualitativo visam conhecer o comportamento informacional dos moradores de 5 municípios, no intuito de compreender de que forma vêem a biblioteca pública e o mecanismo utilizado para solucionar suas necessidades informacionais.

O Brasil possui montante populacional estimado em 208.494.900 habitantes (IBGE, 2018) e de acordo com as listas apresentadas pelo Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas - SNBP estão presentes nas cidades do país 6.102 bibliotecas públicas municipais, distritais, estaduais e federais, instaladas nos 26 estados e no Distrito Federal, (SNPB, 2018). Os dados, instigam pensar a existência de mais de 34 mil habitantes para cada biblioteca pública, fato que por si repercute como descaso alarmante. Se centrarmos a mesma visão para o estado do Amazonas, com sua população estimada em 4.080.611 (IBGE, 2018), onde conforme dados do SNBP, há 59 bibliotecas públicas, a “expectativa” é de 68 mil pessoas para cada biblioteca.

Foi com essa linha de raciocínio que essa pesquisa empreendeu um olhar sobre bibliotecas públicas municipais no Amazonas, maior estado brasileiro, com área territorial correspondente a 1.559 146,876 km², que se distribui por 62 municípios. As cidades utilizadas especificamente nas análises foram Coari, Itacoatiara, Manacapuru, Parintins, Tabatinga e Tefé que fazem parte da rede urbana da calha dos rios Solimões e Amazonas e são definidas pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas das Cidades da Amazônia Brasileira - NEPECAB, como cidades médias. O termo “cidades médias” constitui um dos pontos de análises do NEPECAB que reflete sobre cidades amazônicas com viés diferenciado do que é estabelecido pelo IBGE, pois conforme aponta Rodrigues (2011, p. 61) a justificativa é que:

O IBGE elaborou uma divisão em que os parâmetros analisados servem para regionalizar todas as unidades federativas do Brasil, sendo mais rígido em seus recortes espaciais, o que não pode ocorrer em função da dinâmica do espaço, considerando que a região é uma dimensão escalar do espaço.

A metodologia utilizada pelo NEPECAB, de acordo com Schor e Oliveira (2011SCHOR, Tatiana; OLIVEIRA, José Aldemir de. Reflexões metodológicas sobre o estudo da rede urbana no Amazonas e perspectivas para a análise das cidades na Amazônia brasileira. ACTA Geográfica, Ed. Esp. Cidades na Amazônia Brasileira, Manáus, p.15-30, 2011. Disponível em: http://revista.ufrr.br/index.php/actageo/article/view/539/628. Acesso em: 13 mar. 2017.
http://revista.ufrr.br/index.php/actageo...
) viabiliza estudos que objetivam sistematização de informações sobre o urbano na Amazônia, numa perspectiva de auxiliar reflexões a partir de olhares que vão além de conceitos já consolidados, numa proposta regionalizada que parte do entendimento e caracterização das cidades de acordo com sua função, relações de dependências e dinâmicas desenvolvidas com as demais cidades. Os estudos buscam refletir sobre o modo de viver nas cidades amazônicas e nesse sentido abarcam elementos como economia, saúde, cultura, educação, deslocamentos e outros.

A justificativa na escolha das cidades se firmou do desejo de identificar como se apresentavam no campo da cidadania cultural, tendo em vista que excetuando Manaus, detêm posições relevantes em termos econômicos e territoriais, em relação às demais cidades do estado.

As análises foram realizadas com base em pesquisa de cunho qualiquantitativo, numa perspectiva de amostragem intencional. Sobre pesquisa Qualiquantitativa, Ensslin (2008ENSSLIN, Leonardo. O design na pesquisa quali-quantitativa em engenharia de produção: questões epistemológicas. Revista Produção, Florianópolis, v. 8, n. 1, p.1-16, mar. 2008. Disponível em: https://producaoonline.org.br/rpo/article/viewFile/28/25. Acesso em: 6 abr. 2018.
https://producaoonline.org.br/rpo/articl...
, p. 7) orienta que

pode ser utilizada para explorar melhor as questões pouco estruturadas, os territórios ainda não mapeados, os horizontes inexplorados, problemas que envolvem atores, contextos e processos.

Foram realizadas as seguintes técnicas de coleta de dados: levantamento de fontes estatísticas e documentais, observação direta, entrevistas com gestores e moradores locais, bem como foi utilizado formulário padrão do Cadastro Nacional de Bibliotecas Públicas, criado em 2011 pela Fundação Biblioteca Nacional para a composição dos dados referentes à infraestrutura de bibliotecas (instalações, equipamentos físicos e tecnológicos, acervos, serviços, quadro de pessoal e outros).

As pesquisas de campo aconteceram entre os anos de 2012 a 2017 e os resultados refletem sobre inexistência de bibliotecas públicas em duas cidades (Coari e Tabatinga), no caso de Coari, que não possuía espaço fixo, tampouco estava aberta ao público, optou-se por considerar que o município não dispunha de biblioteca pública, apesar de dispor de acervos e estantes. A investigação apontou também apatia relacionada a espaços e serviços em dois municípios (Manacapuru, Itacoatiara), mas também pontos relativamente positivos observados em outras duas bibliotecas públicas (Parintins e Tefé). Especificamente para esse estudo, foram viabilizadas considerações sobre o Programa Livro Aberto e sua relação com o Amazonas e a perspectiva de criação de bibliotecas nas cidades brasileiras.

2. Cidades médias do amazonas

As cidades que serão descritas a seguir se destacam por apresentar certa condição de autonomia entre os demais municípios do Amazonas, pois em seu entorno geram fluxos por oferecer bens e serviços além de exercer influências na rede urbana do estado (transportes) pelos rios.

Corrêa (1989CORRÊA, R. L. A Rede Urbana. São Paulo: Ática, 1989., p.05), orienta que rede urbana “é o meio através do qual a produção, circulação e consumo se realizam. Via rede urbana e a crescente rede de comunicações a ela vinculada, distantes regiões puderam ser articuladas, estabelecendo uma economia mundial”.

Nesse sentido, pensar a Amazônia e entender sua geografia envolta por rios e florestas, bem como o modo de viver dos seus moradores que dependem do ciclo das águas pode ser um ponto de partida. No campo das políticas públicas para a cultura e, por conseguinte, suas bibliotecas ou ações voltadas para formação de leitores esse conhecimento se faz premente.

O NEPECAB ao dirigir atenção para o estudo da rede urbana na Amazônia tem instigado o entendimento sobre cidades e para tal propôs um modelo para composição dos perfis que pode ser realizado a partir de arranjos institucionais. Oliveira (2014OLIVEIRA, José Aldemir de. As cidades da natureza, a natureza das cidades e o controle do território. 2014. 12p. Disponível em: http://www.ub.edu/geocrit/coloquio2014/Jose%20Aldemir%20de%20Oliveira.pdf. Acesso em fev. 2017. , p. 6), sobre a questão, explicou que:

Na tentativa de construir a tipologia da rede urbana para o estado do Amazonas, delimitou-se um conjunto de arranjos institucionais que poderiam se analisados conjuntamente, estabelecer uma hierarquia urbana que fosse para além das definições usualmente utilizadas para definir a tipologia urbana. Partiu-se dos seguintes arranjos institucionais: dinâmica populacional, variáveis históricas, relações intra e interurbanas, serviços e comércio, tendências locacionais das atividades produtivas, arrecadação de impostos, insumos para a cesta básica regionalizada, índice da construção civil, produtos extrativistas, movimentos sociais, ONGs e práticas religiosas, infraestrutura urbana e fluxo de transporte.

Vários trabalhos publicados por pesquisadores do NEPECAB têm sido substanciais para a composição dessa base sistêmica, pois ao se debruçarem sobre o estudo do urbano no Amazonas trazem a tona manancial de informações ainda pouco cotejadas. As análises sobre a rede urbana das calhas dos rios Amazonas e Solimões buscam compreender funções em termos hierárquicos. Definidas pelo NEPECAB como Cidades Médias, as cidades listadas apresentam eixos diferenciados, os quais foram assim estabelecidos:

Quadro 1
Classificação e Tipologia Urbana - NEPECAB.

Diferentes aspectos podem influenciar o modo de ser das cidades nas redes urbanas do Amazonas, compreender suas particularidades pode contribuir para a construção de propostas que venham subsidiar políticas públicas para as cidades que tem os rios como aliados, mas também como condicionantes.

Os tópicos seguintes apontam informações básicas sobre as 6 cidades médias do Amazonas e sua relação com o campo das bibliotecas públicas:

  • Tabatinga - dentre as 6 cidades médias, é a que se localiza mais distante da capital, a 1.110 km na tríplice fronteira com Colômbia e Peru. Possui área territorial de 3.224,875 km² e população, estimada em 2018, em 64.488 habitantes. O Censo Demográfico 2010 (IBGE, 2012) havia apontado Tabatinga como uma das dez cidades com maior concentração populacional indígena no Brasil, muitos dos quais, da etnia Tikuna. A cidade não dispõe de biblioteca pública, mas em vista da existência da Biblioteca do Banco de La República, em Letícia, na Colômbia, brasileiros podem fazer uso do espaço e serviços na fronteira do país. A proximidade com a cidade de Letícia decorrente de vários incrementos fortalece a relação de Tabatinga na rede urbana amazonense.

  • Tefé - localizada bem no centro, no traçado geográfico do Amazonas é uma das mais antigas do estado e também das mais dinâmicas. Distante 525 quilômetros de Manaus, possui montante populacional formado por cerca de 60.154 habitantes (IBGE, 2018). O acesso logístico à cidade pode ocorrer por meio fluvial ou aéreo. Pelo rio, dependendo da embarcação uma viagem com saída de Manaus pode ter duração de até 36 horas, mas há embarcações mais rápidas (e com preços mais elevados). Dentre os municípios do Amazonas, Tefé tem alcançado destaque no campo cultural por meio das ações realizadas pela Biblioteca Pública Municipal Protásio Lopes Pessoa, que disponibiliza serviços de empréstimo domiciliar e local, bem como atividades vinculadas a clube de leitura, saraus literários e visitas guiadas à Biblioteca.

  • Coari - é o quinto mais populoso município do Amazonas, com cerca de 84 272 mil habitantes (estimativa IBGE de 2018). A posição econômica do município começou a ser alterada a partir de 1986 com a instalação da plataforma de Urucu (da Petrobras), que propiciando a extração de gás e petróleo na região, elevou o município a segunda economia do estado, sem ampliar com isso os índices de qualidade de vida. Está localizado cerca de 370 quilômetros da cidade de Manaus. No tocante a biblioteca pública, constatou-se em pesquisa realizada em 2012 que o município não possuía esse equipamento mesmo tendo recebido material enviado pelo Ministério da Cultura, que foi localizado guardado em sacos e caixas em um depósito da prefeitura. Em nova visita realizada em 2014, o material havia sido organizado em outra sala, junto à prelazia do município, mas não estava aberto ao público. Em 2017, constatou-se que estantes e livros haviam sido novamente remanejados, alocados em uma sala da Secretaria de Cultura do município, permanecendo indisponível ao público.

  • Parintins - localizada na margem direita do rio Amazonas, a 360 quilômetros da cidade de Manaus, se destaca por possuir a segunda maior população do estado, com montante populacional aproximado de 113.168 habitantes (IBGE 2018). A economia da cidade se movimenta em torno do setor de comércio, agricultura, pecuária, avicultura, entre outros, mas desponta também do ponto de vista cultural e turístico em função do Festival Folclórico de Parintins, evento com alcance nacional e internacional que divide a cidade nas cores azul e vermelho, em prol dos bois Garantido e Caprichoso. A cidade dispõe da Biblioteca Pública Municipal Tonzinho Saunier que na época em que foi realizada a última visita (2014) tinha uma bibliotecária atuando nos serviços. Além dessa Biblioteca Pública, Parintins passou a contar em 2013 com o Liceu de Artes e Ofícios Cláudio Santoro, ampla estrutura em forma de arena que recebe o Festival Folclórico de Parintins. Construído ao custo de R$ 48 milhões foi planejado para além dos três dias das festas, por isso dispõe de salas de aulas, uma pequena biblioteca, espaço museológico, sala para projeção de filmes e para apresentações teatrais.

  • Itacoatiara - faz parte da Região Metropolitana de Manaus e ocupa a posição do terceiro mais populoso município do estado com 99.955 habitantes (IBGE, 2018) e área territorial de 8.891,99 Km2, localizados na calha do Médio Amazonas. Sua economia é considerada a terceira maior do estado, sendo o polo agropecuário e o setor de transportes de cargas fluviais os mais influentes. Com localização privilegiada, distante apenas 176 km da cidade de Manaus, a cidade dispõe de infraestrutura considerada boa em termos de bens e serviços, além de dispor das possibilidades de deslocamentos por meios de transportes rodoviário, fluvial e aéreo. A cidade conta com a Casa da Cultura de Itacoatiara, construída em 1970 que abriga a Biblioteca Pública Municipal Anísio Jobim, que sem identificação (letreiro externo) funciona nos horários de manhã e tarde, mas recebia em 2017, média de cinco usuários por dia.

  • Manacapuru - está localizado na margem esquerda do rio Solimões, cerca de 84 quilômetros da cidade de Manaus, com população estimada em 96.236 habitantes, IBGE (2018). Sua economia é baseada na agricultura, extrativismo vegetal, pesca e comércio, se destacando também no segmento turístico. Conhecida como "Princesa do Solimões", recebe grande fluxo de pessoas oriundas de municípios e comunidades circunvizinhas por via fluvial e terrestre que utilizam a cidade como base para seguir para outras localidades. Desde 2008, Manacapuru passou a integrar a Região Metropolitana de Manaus e com a inauguração da Ponte do Rio Negro, ocorrida em 2011 à cidade se tornou ainda mais acessível do ponto de vista logístico. Na sua principal artéria, chamada Avenida Manuel Urbano está localizada a Casa da Cultura de Manacapuru, inaugurada em 1971, que abriga a Biblioteca Pública Municipal Professora Elizabeth Lima de Almeida, além da biblioteca, o espaço dispõe de pequena área para apresentações teatrais e conferências.

Dentre as seis cidades do Amazonas definidas como cidades médias, apenas Parintins apresenta montante populacional acima de 100 mil habitantes. Tefé com a menor estimativa populacional, 62.021 mil habitantes, é considerada uma das mais dinâmicas da região, fator que cria o entendimento de que outros fatores podem repercutir como base para determinar suas posições e influenciar nas relações do ambiente em que estão inseridas.

3. Bibliotecas públicas, o que são? Como estão?

O Manifesto da IFLA/UNESCO para Bibliotecas Públicas (1994) aponta a instituição biblioteca pública como “[...] o centro local de informação, tornando prontamente acessíveis aos seus utilizadores o conhecimento e a informação de todos os gêneros”. O documento orienta entre outras coisas que o direito à informação é um dos pré-requisitos para a promoção de uma sociedade democrática. A introdução do Manifesto sinaliza o potencial da biblioteca pública observando que:

A liberdade, a prosperidade e o desenvolvimento da sociedade e dos indivíduos são valores humanos fundamentais. Só serão atingidos quando os cidadãos estiverem na posse da informação que lhes permita exercer os seus direitos democráticos e ter um papel activo na sociedade. A participação construtiva e o desenvolvimento da democracia dependem tanto de uma educação satisfatória, como de um acesso livre e sem limites ao conhecimento, ao pensamento, à cultura e à informação.

O Documento, que tem influenciado diversos países a dotarem suas cidades com bibliotecas públicas atentas para questões que envolvem processo de implantação e existência de espaços, legislação, integração, quadros funcionais, acervos. Contudo, se tomarmos ao pé da letra orientações como essas, especificamente no tocante as bibliotecas que compõe esse estudo ou até mesmo extensivo a outras bibliotecas do país, somos obrigados a reconhecer que muitas não cumprem minimamente tais recomendações. Almeida Júnior (2013ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. Biblioteca Pública: avaliação de serviços. Eduel: Londrina, 2013. Disponível em: http://www.uel.br/editora/portal/pages/arquivos/biblioteca%20publica_digital.pdf. Acesso 28 maio 2018., p. 42) sobre a condição da biblioteca pública no Brasil observou que,

A biblioteca pública brasileira pode ser interpretada como um equipamento cultural obsoleto, inoperante e totalmente dispensável. A afirmação pode ser entendida como extremamente forte, mas traduz as análises desenvolvidas pela literatura, as observações que qualquer pesquisador interessado pode obter através de visitas às bibliotecas públicas brasileiras e as conversas com bibliotecários responsáveis ou não por essas bibliotecas.

Também Luis Milanesi (1983MILANESI, Luís. O que é biblioteca. São Paulo: Brasiliense, 1983. , p. 54-55), no livro O que é biblioteca, salientou que:

Quantificar o seu número é impossível ou, pelo menos, é uma tentativa precária e isso por dois fatos: primeiro, não se sabe com exatidão o que possa ser considerado biblioteca pública. Há muita generosidade na aplicação do termo. Por vezes ela é um armário com alguns livros escondido em alguma sala da prefeitura. Só funciona para efeito de estatística. Segundo, como alguns rios nordestinos, as bibliotecas podem ser intermitentes: funcionam em alguns períodos. Outras, obedecendo o ciclo da vida, nascem, crescem e morrem.

As afirmações são fortes, mas refletem a realidade encontrada nas cidades médias do Amazonas, onde em entrevistas, a maioria dos moradores não demonstra perceber espaços de bibliotecas como ambientes de oportunidades. A verdade é que a trajetória da biblioteca pública brasileira tem sido marcada por ações que pouco contribuiu para efetivar sua utilidade como organismo igualitário.

No campo de estudos sobre políticas públicas para bibliotecas públicas no Brasil, Paiva e Andrade (2014PAIVA, Marília de Abreu Martins; ANDRADE, Maria Eugenia Albino. Biblioteca pública no Brasil: políticas federais de 1990-2006. Perspectivas em Ciência da Informação, Belo Horizonte, v.19, número especial, p.95-114, out./dez. 2014. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/pci/v19nspe/09.pdf. Acesso em: 29 out. 2018.
http://www.scielo.br/pdf/pci/v19nspe/09....
, p. 112) ao analisarem o período entre 1990 a 2006 refletiram sobre programas criados pelo governo federal com o objetivo de prover municípios do país com esse equipamento, mas alertaram que:

A política pública para bibliotecas no Brasil praticamente está engatinhando, em relação ao que deveria e até ao que poderia ser, mas não retrocedeu. Como as próprias bibliotecas, contudo, continuam urgentes e imprescindíveis.

Atendo-nos apenas aos últimos 30 anos é possível dizer que o país viveu algumas experiências que objetivavam a criação ou o fortalecimento das bibliotecas públicas porém, em estruturas pensadas bem mais do ponto de vista do livro e estantes, sem viabilizar ações que promovessem interação da população em termos de acesso à informação, serviços e efetivamente leituras. Bernardino (2017BERNARDINO, Maria Cleide Rodrigues. Políticas de construção de território local de atuação para a biblioteca pública. Inf. & Soc.:Est., João Pessoa, v.27, n.1, p. 93-102, jan./abr. 2017. Disponível em: http://www.periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/ies/article/view/32937. Acesso em: 12 abr. 2018.
http://www.periodicos.ufpb.br/ojs/index....
, p. 94) que discute sobre territórios de atuação ao refletir sobre a imagem e capacidade de ação das bibliotecas públicas salienta que:

A biblioteca pública precisa construir um território local de atuação para esta sociedade. Necessita se fazer presente e atuante. Reconhecida. Necessária. Para isto é importante a reflexão de seu papel na sociedade, reconhecer sua identidade local, sua função para o desenvolvimento da cultura e da cidadania.

O verbo reconhecer tem um alcance significativo nessa análise, Bernardino ao apontar a necessidade de reconhecimento instiga pensar que é antes necessário conhecer, as bibliotecas públicas precisam ser conhecidas para tornar-se posteriormente reconhecidas. Um ponto positivo nesse caso pode ser observado com o que está acontecendo no município de Tefé, uma das cidades médias do Amazonas (que será descrita mais adiante), que oferecendo acervos e serviços está a frente das demais cidades estudadas, elevando o potencial da biblioteca pública com o apoio de gestores e da população.

Um dos últimos implementos voltados para o fortalecimento das bibliotecas públicas no Brasil ocorreu no âmbito do Programa Livro Aberto (2004), do Ministério da Cultura - MinC, inclusive muitas das bibliotecas públicas do Amazonas que constam nas listas do SNBP (2015) nasceram da participação em editais desse Programa que oferecia as condições para que as prefeituras solicitassem Kits de Implantação/modernização composto por equipamentos e livros. A contrapartida era que as gestões públicas municipais disponibilizassem espaços adequados e com acesso facilitado aos moradores ao local, além da contratação de pessoal para atuar nos serviços. No total, 44 municípios amazonenses foram beneficiados, além de 10 que receberam Kits de modernização. O fato de não haver acompanhamento e avaliação do processo de implantação ou de dinamização das bibliotecas, que não contou com a colaboração do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Estado, tampouco de bibliotecários, ocasionou a formação de ambientes sem visibilidade e sem integração com as comunidades, além da perspectiva de que o município por ter recebido Kit, passou a possuir biblioteca pública.

Os municípios de Coari e Tabatinga que receberam Kits de implantação não chegaram a possuir bibliotecas públicas, mas constam nas listas computadas, fator que confere situações de manipulação de informações, pois o Sistema Estadual de Bibliotecas do Amazonas não acompanhou o processo de implantação, mas o SNBP validou a existência das bibliotecas.

A partir da experiência com o Programa Livro Aberto fica latente a percepção de que não bastam coleções de livros, estantes e mesas em espaços sem liderança. É preciso pessoal capacitado e planejamento estratégico para exercer influências nas comunidades.

4. Sistemas de bibliotecas e a situação do amazonas

O Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas - SNBP foi criado em 1992 e agrega outros 26 Sistemas Estaduais de Bibliotecas Públicas (SEBPs), além de um Sistema no Distrito Federal. O site do SNPB aponta que os Sistemas Estaduais de Bibliotecas Públicas:

[...] apoiam os municípios na ampliação e fortalecimento de suas bibliotecas públicas e comunitárias e, fomentam a constituição de sistemas municipais de bibliotecas. Oferecem assessoria técnica em questões referentes aos espaços, acervo, infraestrutura, serviços e formação de pessoal de bibliotecas. (SNBP, 2018).

Apesar da definição que lista afazeres e funções o apoio às bibliotecas públicas das cidades que compõe a pesquisa, advinda a partir do Sistema Estadual de Bibliotecas do Amazonas, de acordo com seus gestores, se ocorreram, foram ínfimas.

O Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Amazonas está vinculado a Coordenadoria de Biblioteca Pública Estadual do Amazonas, ligado a Secretaria de Cultura do Estado - SEC , que por quase 21 anos esteve a cargo de um único gestor que atuou entre 1997 a 2017. Numa retrospectiva básica é possível apontar que essa longa gestão optou por dar vazão à realização de eventos e festivais na cidade de Manaus, sem grandes investimentos às questões envolvendo livros e leituras especialmente nas áreas periféricas da capital ou dos municípios do estado. Nessa conjuntura, também a coordenadoria do Sistema Estadual de Bibliotecas no Amazonas que ainda nos dias atuais permanece centrada nas mãos de um único gestor (18 anos), sem autonomia, não acompanhou o surgimento de espaços de bibliotecas públicas no interior do estado, fator que contribuiu para a configuração de ambientes que mantém estruturas de repartições públicas, que chegam a dispor de até oito funcionários, mas que na maioria dos casos não oferecem serviços. Os principais argumentos utilizados por essa gestão para justificar o não acompanhamento das ações das bibliotecas nos municípios foram relacionados às distâncias geográficas e a falta de informação.

A constatação do desconhecimento sobre a condição da biblioteca pública dos municípios pela coordenação do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Amazonas é inquietante e gera a necessidade de se discutir formas de ação que viabilizem numa estrutura geográfica tão ampla as possibilidades de efetiva atuação sistêmica. Bernardino (2017BERNARDINO, Maria Cleide Rodrigues. Políticas de construção de território local de atuação para a biblioteca pública. Inf. & Soc.:Est., João Pessoa, v.27, n.1, p. 93-102, jan./abr. 2017. Disponível em: http://www.periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/ies/article/view/32937. Acesso em: 12 abr. 2018.
http://www.periodicos.ufpb.br/ojs/index....
, p. 96), aponta a criação de redes de bibliotecas como estratégia de fortalecimento e destaca a necessidade de “[...] ações que viabilizem e oportunizem sua participação no processo decisório da comunidade em que está inserido”. Nesse sentido, uma providência básica e necessária seria a adoção de medidas que tornasse consciente os envolvidos da existência de um sistema ou porventura uma rede de bibliotecas. No contexto das cidades médias do Amazonas, com exceção dos municípios de Tefé e Parintins, funcionários de bibliotecas públicas, que não receberam qualquer tipo de capacitação, tampouco participaram de reuniões visando estabelecer diálogos ou ações cooperativas, abrem as portas de espaços que reúnem estantes, mesas e livros e quando muito realizam empréstimos. A imagem da biblioteca pública diante desse quadro se torna cada vez mais comprometida.

A ideia de que o Brasil possui um sistema de bibliotecas públicas precisa ser revista. Não basta a existência de listas, é necessário que se compreenda que um sistema de bibliotecas deve servir para estabelecer meios e ações em prol de objetivos conjuntos, numa perspectiva onde atuações, procedimentos e serviços estejam articulados entre as unidades (bibliotecas) e onde o fluxo de informações gere condições para usufruto do todo que pode ser oferecido. A informação deve ser à base para uma proposta sistêmica entre bibliotecas.

4.1 As bibliotecas públicas em cidades médias do amazonas

As análises que serão apresentadas a seguir refletem as condições de seis cidades amazonenses no tocante as bibliotecas públicas com base em aspectos sobre instalações físicas, serviços e atividades desenvolvidas, média de usuários, perfil dos gestores das bibliotecas e interação com o Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Amazonas. Todas as cidades constam nas listas do SNBP como dispondo de bibliotecas públicas.

As cidades, conforme já descrito, se destacam entre as demais do estado por exercerem influências em condições territoriais, econômicas ou pela proximidade com a capital Manaus.

Quadro 2
Aspectos visuais das bibliotecas municipais em cidades médias do Amazonas.

O quadro oferece panorama visual das condições das bibliotecas públicas, com exceção do município de Tabatinga onde não foi constatado nenhum indício da presença de biblioteca pública, diferente de Coari, onde acervos e equipamentos enviados pelo MinC, foram localizados e fotografados.

Quanto a Tefé, a Biblioteca está localizada na área térrea de uma casa alugada (sem placa de identificação). Sobre o espaço físico, foram constatadas irregularidades que precisam ser esclarecidas, tendo em vista que o Ministério da Cultura disponibilizou ao município em 1998, valor de R$180 mil reais para a construção do prédio da biblioteca pública.

Nos municípios de Manacapuru e Itacoatiara foi possível perceber semelhanças do ponto de vista arquitetônico nos edifícios de suas Casas da Cultura, que datam do início dos anos 70, bem como quadro de ineficiência nos serviços desenvolvidos. As bibliotecas públicas estão instaladas no interior dessas edificações.

Somente Parintins possuía ambiente criado especialmente para receber a biblioteca pública do município, dispondo de salão de leitura, espaço infantil, área com equipamentos tecnológicos, além de estar devidamente identificada com letreiros contendo o nome da biblioteca.

4.2 Média de usuários nas bibliotecas públicas

Conforme é possível observar no gráfico, os municípios de Tabatinga e Coari, que não possuem bibliotecas públicas aparecem zerados em números de usuários, sendo Tefé, o município com maior demanda.

Gráfico 1
Média diária de usuários - bibliotecas públicas

De acordo com Dijaik Nery, coordenador da Biblioteca Pública de Tefé, a média de usuários em 2017 variava entre 40 a 70 usuários por dia, número animador em relação às demais cidades. Sem dispor de equipamentos tecnológicos (computadores com acesso a Internet), sem climatização para o calor amazônico, a Biblioteca Municipal de Tefé se destaca por oferecer espaço ordenado, empréstimos de livros e atividades culturais. Está localizada nas proximidades de uma escola da rede pública e seus serviços são divulgados na mídia local, dispondo inclusive de uma página no Facebook.

A Biblioteca Pública de Parintins em 2014 recebia cerca de 30 usuários por dia. O edifício, instalado em local de fácil acesso, possuía placa de identificação, acervos de livros organizados, além de espaços climatizados. Em entrevista, a bibliotecária Erica Shaunna Cruz apontou em 2014 que a existência de computadores impulsionou a população no uso da Biblioteca Pública, porém o fato dos equipamentos não receberem manutenção e não permanecerem em boas condições de uso, fez com que o número de usuários diminuísse.

Chama a atenção no gráfico, a baixa presença de usuários nas bibliotecas públicas das cidades de Itacoatiara (5 usuários) e Manacapuru (15 usuários), que ocupando espaços em edificações criadas desde os anos 70, sem oferecer serviços não possuem demandas consolidadas, apesar de estarem localizadas nas proximidades da cidade de Manaus e, por conseguinte da coordenação do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Amazonas.

4.3 Serviços e atividades desenvolvidas

Os serviços realizados em uma biblioteca pública devem ser voltados para atender as necessidades informacionais de sua comunidade, numa perspectiva que vá além da consulta local e empréstimo de livros. A disponibilidade de recursos tecnológicos visando contribuir para inclusão digital, bem como a implementação de atividades culturais diversas, que atenda todas as idades, condições físicas e interesses podem contribuir para que a biblioteca pública se torne um espaço vital no ambiente da cidade, contudo, dentre os 4 municípios que dispunham de bibliotecas, somente Tefé apresentou diferencial em termos de serviços, com realização de ações culturais que tem mobilizado parcelas da comunidade. Quanto aos municípios de Parintins e Itacoatiara, os responsáveis pelas bibliotecas afirmaram realizar empréstimos domiciliares e consulta local, mas Manacapuru que em 2012 e 2014 também realizava empréstimo domiciliar, em 2016 apontou que o serviço havia sido suspenso.

Vale destacar a atuação do gestor da Biblioteca Pública de Tefé, que foi um dos finalistas do Prêmio Viva Leitura em 2016, pela criação do projeto Plantando Leitura, Colhendo Conhecimento, que gerou atração de usuários para o uso da biblioteca e que por meio de parcerias e campanhas ampliou o acervo da Biblioteca, composto por cerca de 8 mil volumes. Os livros passaram por tratamento técnico orientado inicialmente por uma bibliotecária que favoreceu com que a equipe da biblioteca fizesse uso do Sistema de Classificação Decimal de Dewey e Tabela de Cutter.

Nenhuma das bibliotecas dispunha de acervos, espaços ou serviços voltados para atender as minorias linguísticas, ação que deveria ser absolutamente necessária no Amazonas, considerando ser um estado que reúne muitas etnias indígenas, além de sua posição em área fronteiriça, também percentual de falantes de língua espanhola. Somente a Biblioteca Pública de Tefé, se destacou por desenvolver atividade de extensão acompanhando bibliotecas (Expedição Vaga lume), instaladas em comunidades indígenas.

4.4 Recursos humanos

Dentre os municípios, apenas Parintins contou com profissionais com formação em Biblioteconomia na atuação da Biblioteca Municipal Tonzinho Saunier, que ao longo dos seus 10 anos de existência já contou com 3 bibliotecárias. A gestão dessa Biblioteca (2018), não está mais a cargo de bibliotecários. Além do responsável pela Biblioteca Pública de Tefé, que tem formação em Normal Superior, também o coordenador da Biblioteca Pública de Itacoatiara tinha formação em Economia, a coordenação da Biblioteca Pública de Manacapuru em 2016 tinha formação em nível de 2 ͦ grau. Entre todos, somente o coordenador da Biblioteca Municipal de Tefé afirmou ter recebido algum tipo de capacitação no âmbito de bibliotecas, por ser participante voluntário de uma organização não governamental (Expedição Vaga lume).

A média de horário de funcionamento das bibliotecas é quase igual para todas, funcionam no período entre manhã e tarde com variações entre as 07:00 as 12:00 e das 13:00 as 17:00 e 18 horas. As quatro bibliotecas abrem de segunda a sexta-feira, nenhuma abria aos sábados e domingos. Em 2012, a Biblioteca Pública de Manacapuru, chegou a funcionar no horário das 07 às 22 horas e possuía o total de 9 funcionários que se revezavam por três turnos. Apesar do horário expandido, recebia poucos usuários. Em 2016, constatou-se a redução do horário para as 08 às 17 horas e o número de funcionários eram 6, no total. O baixo número de usuários nas cidades de Itacoatiara e Manacapuru refletem necessidades de avaliação.

4.5 Interação com o sistema estadual

Em entrevistas realizadas com responsáveis por bibliotecas públicas e secretários de cultura ou educação dos seis municípios todos afirmaram não haver recebido nenhuma orientação do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas no período em que estavam em atividade, contudo haviam recebido caixas contendo livros do Programa Mania de Ler, da Secretaria de Cultura do Estado. Apenas o coordenador da Biblioteca Pública Municipal de Tefé, afirmou ter mantido contato com o Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Amazonas, mas por que foi diretamente a Manaus em busca de auxílio. Segundo Dijaik, o Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas do Amazonas não intermediou nenhuma atividade no processo de formação da biblioteca pública do município, mas durante os últimos quatro anos enviou por duas vezes, caixas contendo livros do Programa Mania de Ler para ampliação do acervo.

A negligência observada quanto à atuação do Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas no Amazonas para o fortalecimento das bibliotecas contribuiu para gerar visões negativas sobre esse equipamento cultural nas cidades amazônicas, até mesmo na cidade de Parintins, onde a biblioteca pública dispõe de boa infraestrutura, sua presença não parecia exercer tanta influencia sobre os moradores, diferente da Biblioteca Pública de Tefé, que mesmo sem contar com boas instalações ou com profissionais com formação em Biblioteconomia, passou a atrair a atenção dos moradores da cidade. Tal constatação gerou a hipótese de que foram as iniciativas voltadas para a mediação da informação que tornaram exitosas as atividades desenvolvidas. Sobre o tema, Almeida Júnior (2009ALMEIDA JÚNIOR, Oswaldo Francisco de. Mediação da informação e múltiplas linguagens. Tendências da Pesquisa Brasileira em Ciência da Informação, v. 2, n. 1, p.89-103, jan./dez. 2009., p. 92), aponta que a Mediação da Informação é:

toda ação de interferência - realizada pelo profissional da informação -, direta ou indireta; consciente ou inconsciente; singular ou plural; individual ou coletiva; que propicia a apropriação de informação que satisfaça, plena ou parcialmente, uma necessidade informacional.

A Biblioteca municipal de Tefé, sem contar com grandes recursos apresenta ambiente ordenado, com livros classificados por classes, com acervos de literatura infantil, obras de literatura nacional e internacional, além de livros técnicos disponíveis para empréstimos. A Biblioteca dispõe de um grupo de leitura que viabiliza atividades culturais e tem progressivamente gerado quantitativos de usuários, diferente das experiências observadas nas outras cidades médias.

Considerando que o Estado do Amazonas possui 62 municípios e que as cidades apresentadas são (depois da capital Manaus), as mais representativas do estado, o que pensar das condições em termos de bibliotecas públicas das pequenas cidades? Diante do exposto é possível supor que a grande maioria da população amazonense, tem sido lesada quanto ao seu direito à biblioteca. Justificativas que alegam dificuldades de acesso geográfico devem ser descartadas e projetos precisam ser pensados visando promover atuação e fortalecimento das bibliotecas públicas, numa perspectiva em que o trabalho sistêmico possibilite minimizar distâncias.

5. Considerações finais

As seis cidades elencadas para esse estudo foram selecionadas no intuito de dispor de uma visão que ultrapassasse o limite da cidade de Manaus no tocante as bibliotecas públicas, abarcando as mais representativas do interior do estado, sejam por aspectos econômicos, territoriais e ou pela própria relação facilitada de acesso a capital. Definidas as cidades, o que se buscou foi constatar a existência de espaços, além de dispor de informações sobre bens e serviços e perceber níveis de interação do Sistema Estadual de Biblioteca Públicas do Amazonas com as bibliotecas públicas dos municípios. O estudo diagnóstico em síntese, ao enveredar por cidades consideradas médias no urbano do Amazonas constatou a seguinte condição:

  • Tabatinga e Tefé (Cidades médias de responsabilidade territorial), enquanto a primeira não possuía qualquer indício da presença de biblioteca pública, Tefé se destacou entre as demais cidades por oferecer espaço, acervos, serviços;

  • Coari e Parintins (Cidade média com dinâmica econômica externa) Coari apesar de dispor de boa condição econômica não possuía biblioteca pública, mesmo tendo recebido equipamentos e acervos; Parintins possui edifício criado para a biblioteca e contou com gestão de bibliotecários.

  • Itacoatiara e Manacapuru (Cidades médias com função de intermediária), a despeito da proximidade com a capital, inclusive por acesso rodoviário, ambas possuem bibliotecas públicas criadas nos anos 70, mas desenvolvem atuações inexpressivas.

A pesquisa constatou que não houve participação ativa da coordenação do Sistema Estadual de Bibliotecas do Amazonas para o fortalecimento desse segmento cultural nas cidades médias do Amazonas e as justificativas que se lançam sobre as dificuldades de acesso geográfico na região, são falhas se tomarmos exemplos das bibliotecas dos municípios de Manacapuru e Itacoatiara que, localizadas nas proximidades da cidade de Manaus se caracterizam por atuações apáticas que diferem da atuação do município de Tefé, onde a coordenação local tem realizado bom serviço.

A metodologia utilizada pelo NEPECAB para o estudo das cidades amazônicas permite compor além de análises sobre a mobilidade urbana, também reflexões sobre a estrutura urbana na Amazônia em sua relação espaço e tempo. A opção em tratar o tema biblioteca pública por esse viés permitiu compreender a indissociável relação desse equipamento cultural com a cidade, bem como percebê-la integrada a sua condição de dependência política, econômica e principalmente as necessidades práticas cotidianas da atuação bibliotecária, além da percepção de que há muito por fazer. Tendo em vista que a investigação ainda está em vias de análises, outras nuances deverão suscitar elementos para melhor responder ao modelo de sistema de biblioteca para o estado.

Miranda (1978MIRANDA, Antônio. A missão da biblioteca pública no Brasil. Revista de Biblioteconomia de Brasília, Brasília, v. 6, n. 1 p. 69-75, jan./jun. 1978. Disponível em: https://tonarede.org.br/wp-content/uploads/2017/09/A-missao-da-biblioteca-pu%CC%81blica-no-Brasil.pdf. Acesso em: 3 jan. 2018.
https://tonarede.org.br/wp-content/uploa...
, p.1) no artigo ‘A missão da biblioteca pública no Brasil’, elaborou o seguinte questionamento “Qual a missão da biblioteca pública num país de dimensões continentais e de desnivelamentos regionais tão marcantes como o Brasil?”, o autor afirmou não pretender dar uma resposta definitiva, contudo ouso dizer que a missão da biblioteca pública no Brasil é fundamental e nas pequenas e médias cidades deveria ser primordial por ser a única instituição com fundamentos democráticos capaz de facilitar o acesso à informação e ao rol de oportunidades culturais, contudo numa estrutura que efetivamente faça valer o seu potencial.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Maio 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2019

Histórico

  • Recebido
    31 Ago 2018
  • Aceito
    20 Nov 2018
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