Acessibilidade / Reportar erro

Amostra de filmagem e análise da pragmática na síndrome de Down

Resumos

TEMA: avaliar o desenvolvimento da linguagem é uma tarefa complexa que exige conhecimentos teóricos e práticos a respeito dos aspectos que se deseja investigar, considerando-se a metodologia a ser utilizada na coleta e na análise dos dados, a fim de serem obtidos resultados consistentes e confiáveis, que reflitam a realidade do sujeito. OBJETIVO: considerando-se a obtenção do maior número de dados em menor tempo possível, sem prejuízo da qualidade e efetividade dos dados obtidos, nosso objetivo é identificar o momento e o tempo de filmagem de situação de interação, mais adequados para realizar a análise da pragmática de crianças com síndrome de Down. MÉTODO: foi traçado o perfil comunicativo de 25 crianças com síndrome de Down, de dois a sete anos de idade, utilizando-se a proposta de avaliação elaborada por Fernandes (2004), comparando-se os dados obtidos na análise de amostras de 30 e 15 minutos de filmagem. A situação analisada foi a de interação entre terapeuta e criança em brincadeira lúdica. Para verificar a significância dos dados, foi realizada análise estatística, utilizando os testes de Friedman e Wilcoxon e a técnica de Intervalo de Confiança, com nível de significância igual a 0,05 (5%). CONCLUSÃO: não foram encontradas diferenças significativas relacionadas às amostras obtidas com diferentes durações de filmagem para a análise da pragmática da comunicação de crianças com síndrome de Down.

Linguagem; Síndrome de Down; Comunicação; Terapia de Linguagem


BACKGROND: assessing language development is a complex task that requires practical and theoretical knowledge about the investigated issues. It is also important to take into account data gathering and analysis methodology, in order to achieve consistent and reliable results that mirror the subject's reality. AIM: considering the purpose of obtaining the maximum data in minimum time, without jeopardizing their quality and effectiveness, our aim is to identify the better sample's size and moment of videotaped interaction to study the pragmatic abilities of children with Down syndrome. METHOD: the communicative profile of 25 children with Down syndrome aged between 2 and 7 years were determined as proposed by Fernandes (2004). Data obtained through samples of 15 and 30 minutes were analyzed and compared. The situation analyzed provided interaction between the child and a speech-and language-therapist in play situations. To determine the statistical significance of data the tests Friedman, Wilcoxon and confidence interval were applied with a significance level of 0.05 (5%). CONCLUSION: there were no significant differences related to the obtained samples with different videotaped duration for pragmatic analysis of the communication of children with Down syndrome.

Language; Down Syndrome; Communication; Language Therapy


ARTIGOS DE PESQUISA

Amostra de filmagem e análise da pragmática na síndrome de Down* * Pesquisa Realizada na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Eliza PortoI; Suelly Cecilia Olivan LimongiII; Irlaine Guedes dos SantosIII; Fernanda Dreux Miranda FernandesIV

IFonoaudióloga. Especialização em Fonoaudiologia nos Distúrbios Psiquiátricos da Infância pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

IIFonoaudióloga. Livre-Docente. Professor Doutor Associado do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

IIIAcadêmica em Fonoaudiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

IVFonoaudióloga. Professor Associado do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Cipotânea, 51 Cidade Universitária - São Paulo - SP - CEP 05360-160 ( portoeliza@yahoo.com.br).

RESUMO

TEMA: avaliar o desenvolvimento da linguagem é uma tarefa complexa que exige conhecimentos teóricos e práticos a respeito dos aspectos que se deseja investigar, considerando-se a metodologia a ser utilizada na coleta e na análise dos dados, a fim de serem obtidos resultados consistentes e confiáveis, que reflitam a realidade do sujeito.

OBJETIVO: considerando-se a obtenção do maior número de dados em menor tempo possível, sem prejuízo da qualidade e efetividade dos dados obtidos, nosso objetivo é identificar o momento e o tempo de filmagem de situação de interação, mais adequados para realizar a análise da pragmática de crianças com síndrome de Down.

MÉTODO: foi traçado o perfil comunicativo de 25 crianças com síndrome de Down, de dois a sete anos de idade, utilizando-se a proposta de avaliação elaborada por Fernandes (2004), comparando-se os dados obtidos na análise de amostras de 30 e 15 minutos de filmagem. A situação analisada foi a de interação entre terapeuta e criança em brincadeira lúdica. Para verificar a significância dos dados, foi realizada análise estatística, utilizando os testes de Friedman e Wilcoxon e a técnica de Intervalo de Confiança, com nível de significância igual a 0,05 (5%).

CONCLUSÃO: não foram encontradas diferenças significativas relacionadas às amostras obtidas com diferentes durações de filmagem para a análise da pragmática da comunicação de crianças com síndrome de Down.

Palavras-Chave: Linguagem; Síndrome de Down; Comunicação; Terapia de Linguagem.

Introdução

Avaliar o desenvolvimento da linguagem é uma tarefa complexa que exige do pesquisador conhecimentos teóricos e práticos a respeito dos aspectos que deseja investigar. Além disso, é de extrema importância considerar a metodologia a ser utilizada na coleta e na análise dos dados, a fim de se obter resultados consistentes e confiáveis, que reflitam a realidade do sujeito.

Owens (1996) comenta que dados sobre o desenvolvimento da linguagem são difíceis de serem coletados e, freqüentemente, requerem uma seqüência de procedimentos para garantir sua a validade, confiança e descrição objetivas. O autor ressalta que o propósito e a predisposição teórica do pesquisador influenciam o tipo de procedimento de coleta de dados utilizado.

Os dados de desenvolvimento de linguagem são comumente coletados de dois modos: uma amostra de conversa espontânea ou observação natural e uma situação de teste estruturada ou manipulada experimentalmente (Owens, 1996).

A avaliação dos aspectos funcionais da linguagem, como é definida a análise pragmática (Fernandes, 1996), possibilita ao fonoaudiólogo delinear como e quando a criança utiliza suas habilidades comunicativas. Vários critérios, métodos e técnicas vêm sendo utilizados para coleta e análise de dados referentes ao uso da linguagem por crianças.

Desde a década de 80 vêm sendo desenvolvidos diversos protocolos, questionários e escalas de observação da conduta comunicativa infantil (Baixauli-Fortea et al. 2004). Adams (2002) realizou uma revisão sobre as formas de avaliação da pragmática e descreveu os instrumentos disponíveis, tais como, uma lista organizada de maneira desenvolvimental para emergência e tipo de intenção comunicativa; uma lista abrangente de verificação do comportamento pragmático, o Children's Communication Checklist; a avaliação do conhecimento da pragmática da linguagem; e a investigação de detalhes específicos baseados em análise da observação. A autora comenta que entre esses instrumentos e métodos de avaliação, uns são validados e fidedignos, e outros não. Portanto, o futuro da avaliação pragmática, talvez, não seja proliferar mais esquemas de códigos, mas sim fazer com que as pesquisas que estão sendo realizadas se tornem mais acessíveis, e assegurar sua validação e fidedignidade por meio do uso de técnicas estatísticas corretas.

Owens (1996) comenta que meios eletrônicos de coleta são essenciais para a microanálise. A gravação em vídeo, apesar de mais intrusiva, é melhor do que somente em áudio, por que possibilita ao pesquisador observar os elementos não lingüísticos da situação, juntamente com os elementos lingüísticos. Iverson et al. (2003), ao estudarem a comunicação gestual de crianças com síndrome de Down, optaram por utilizar gravação de uma situação espontânea em videotape para posteriormente transcrever todos os gestos e palavras inteligíveis produzidos pelos sujeitos. Nesse estudo os autores realizaram 30 minutos de gravação.

Ao serem analisadas pesquisas realizadas com populações específicas, com crianças portadoras de síndrome de Down, observamos que são vários os métodos de pesquisa utilizados quando se quer avaliar o uso funcional da linguagem. Laws e Bishop (2004a) utilizaram como procedimento de coleta de dados da população estudada, incluindo indivíduos com síndrome de Down, uma lista de verificação que poderia ser respondida pelos pais ou professores das crianças. Laws e Bishop (2004b) e Andrade (2006) comentam que crianças com síndrome de Down, entre outras alterações, apresentam prejuízo de linguagem e que esse prejuízo é variável e alguns componentes da linguagem podem estar mais prejudicados que outros. O gesto, como elemento não lingüístico, é utilizado para comunicação e serve como transição para linguagem falada (Capone e McGregor, 2004; Andrade, 2006; Flabiano e Limongi, 2006).

Considerando indivíduos com diagnóstico dentro do espectro autístico, ao avaliar o perfil comunicativo dessa população, Fernandes (2003) utilizou situação específica gravada em videoteipe e protocolo de registro. Essa situação envolveu materiais como: um brinquedo com movimento, um pote transparente difícil de ser aberto, livros, bexiga, pote com líquido para fazer bolhas de sabão, guloseimas de que as crianças gostem e outras que não gostem. Não foi mencionado o tempo de filmagem e análise da interação entre sujeito e adulto. Cardoso e Fernandes (2003) também estudaram crianças com diagnóstico dentro do espectro autístico com o objetivo de verificar o desempenho e a evolução dessas crianças quanto ao uso de funções comunicativas interpessoais e não interpessoais. Para tanto, foram utilizados jogos e brinquedos, filmadora de vídeo, fita e protocolo de registro. As situações comunicativas foram estabelecidas, sendo os contextos comunicativos variáveis conforme as atividades, individuais e em grupo, propostas pelo adulto ou escolhidas pelos sujeitos. Quanto ao tempo de filmagem, foram gravados 15 ou 30 minutos de interação entre os sujeitos e a terapeuta para posterior análise.

Andrade (2002) realizou uma pesquisa para verificar como dois grupos de crianças, com e sem antecedentes genéticos para gagueira, se diferenciam em relação à aquisição e desenvolvimento de vários aspectos da linguagem, entre eles a pragmática. Para avaliar a pragmática foi utilizada filmadora e como instrumento o teste de pragmática proposto por Fernandes (2004).

Muñoz-Céspedes e Melle (2004) falam sobre a avaliação das habilidades pragmáticas em indivíduos que sofreram traumatismo crânio encefálico (TCE). Os autores recomendam que seja usada gravação em vídeo por que permite a análise detalhada e precisa da amostra de linguagem e serve para observar o avanço do paciente. Os autores ressaltam que a variedade de disciplinas que estão interessadas em estudar a competência pragmática nos pacientes com TCE tem dado lugar a uma ampla gama de provas e protocolos para sua avaliação.

Crespo-Eguílaz et al. (2003) avaliaram a linguagem de crianças disfásicas. Entre os instrumentos utilizados na avaliação os autores escolheram o Children's Communication Checklist para avaliar os aspectos pragmáticos da linguagem.

Assim como há diferentes métodos de coleta, há muitas considerações que influenciam os dados obtidos por estes procedimentos (Owens, 1996). Ao analisar a pragmática deve se preocupar com o contexto, incluindo elementos lingüísticos ou não, sendo que qualquer som ou gesto interpretável pelo adulto é considerado linguagem (Fernandes, 1996). Já em 1978, Kreckel comentava sobre análise filmada de interações sociais. O autor referia que esse tipo de análise possibilita um maior detalhamento do comportamento. Em seu estudo é relatado que a presença da filmadora pode causar uma distorção no comportamento, eliminando aqueles indesejáveis e/ou enfatizando aqueles desejáveis. No entanto, o autor ressalta que apenas comportamentos do repertório do indivíduo podem ser oprimidos ou enfatizados, ou seja, uma pessoa não irá produzir comportamentos que não está em seu repertório.

A análise pragmática exige a preocupação com o contexto. Considerando-se esse aspecto, a coleta realizada por meio de filmagem parece ser o modo mais adequado para a analise de todos os aspectos pragmáticos da linguagem de um indivíduo.

O estabelecimento de critérios de avaliação para padronizar os dados encontrados é importante para a obtenção de resultados consistentes. Além de considerar ato comunicativo como unidade mínima de análise que começa quando a interação adulto-criança, criança-adulto ou criança-objeto é iniciada e termina quando o foco de atenção muda ou há troca de turno (Fernandes, 1996), é importante ponderar o tempo de filmagem a ser utilizado nessa análise. Geralmente são realizadas filmagens de 30 minutos para coleta de dados (Fernandes, 2004). Pensando-se na obtenção do maior número de dados em menor tempo possível, sem prejuízo da qualidade e efetividade dos dados obtidos, nosso objetivo é identificar o momento e o tempo de filmagem mais adequados em situação de interação para realizar a análise da pragmática de crianças com Síndrome de Down.

Método

A presente pesquisa foi aprovada pela Comissão de Ética para Análise de Pesquisa - CAPPesq do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, com o protocolo de número 838/05 e todos os responsáveis pelos sujeitos da pesquisa assinaram um termo de Consentimento.

Participaram da pesquisa 25 crianças com síndrome de Down, com idade cronológica entre dois e sete anos, sendo 15 meninas e 10 meninos. Todos os sujeitos estavam em terapia fonoaudiológica no Laboratório de Investigação Fonoaudiológica em Síndromes e Alterações Sensório Motoras do Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional FMUSP.

Para colher os dados foram utilizados filmadora e fitas VHS para filmar a interação entre terapeuta e criança em atividade lúdica. O material utilizado na interação era composto de uma caixa de brinquedos contendo: uma boneca pequena, uma caixa acrílica com um pedaço de pano e uma peça de lego, uma cesta, miniaturas de utensílios de cozinha (panelas, tampas de panela, pratos, copos, faca, garfo, colheres, jarra, concha, espumadeira), miniaturas de alimentos (ovos, pepino, banana, bolacha, maçã), miniaturas de animais (gato, cavalo, galinha, leão), bola, caminhão com carroceria, telefone, blocos de madeira (diversas formas e cores). Para a transcrição dos dados foi utilizado o protocolo de Perfil Comunicativo elaborado por Fernandes (2004).

Foram realizadas filmagens de 30 minutos ininterruptos de interação entre criança e terapeuta, brincando com os materiais previamente determinados pela pesquisadora. Após a filmagem, foi registrado o número de atos comunicativos, número de atos comunicativos por minuto, o meio comunicativo utilizado, ou seja, meio gestual, vocal ou verbal e por fim a função comunicativa de cada ato, tanto do adulto como da criança, ocorridos nos 30 minutos de filmagem. Durante o registro dos dados foram realizadas marcações determinando o inicio e o final dos 15 minutos iniciais, mediais e finais da interação. Para analisar as funções comunicativas foi considerada a interatividade do ato comunicativo; portanto, para a análise, os atos comunicativos foram divididos em atos comunicativos mais interativos e menos interativos, segundo classificação realizada por Fernandes (2005).

Após os registros dos dados, foram analisados os valores encontrados nos 30 minutos totais, subdivididos em 15 minutos iniciais, 15 minutos mediais (contados a partir dos cinco minutos iniciais) e 15 minutos finais de interação entre terapeuta e criança e, posteriormente, esses resultados foram comparados entre si. Foram denominados "tempo", os itens relacionados a 30 e 15 minutos e "momentos" os relacionados a inicial, medial e final. Para verificar a significância dos dados, foi realizada análise estatística, em que foram utilizados o teste de Friedman e Wilcoxon e a técnica de Intervalo de Confiança, com nível de significância igual a 0,05 (5%).

Resultados

Nas Tabelas 1 a 5 e na Tabela 7 pode-se observar que não houve diferença significativa nos resultados obtidos nos diversos tempos e momentos de análise. Na Tabela 6, que se refere ao meio vocal utilizado pelos sujeitos, observa-se que existe uma diferença estatisticamente significante entre os momentos. O Quadro 1 mostra somente os p-valores de todas as comparações duas a duas dos momentos. Observa-se que a diferença entre os momentos ocorre para os 15 minutos iniciais versus os 15 minutos mediais.


Nas Tabelas 8 a 11 e nas Tabelas 13 e 14 pode-se observar que não houve diferença significante entre resultados obtidos nos diversos tempos e momentos de análise. Observa-se que somente na Tabela 12, referente aos meios comunicativos verbais, é que existe uma diferença estatisticamente significante entre os momentos. Sendo assim, o Quadro 2 mostra somente os p-valores de todas as comparações duas a duas dos momentos. Desta forma, pode-se verificar onde exatamente ocorre a diferença entre os momentos.


Verifica-se, então, que os 15 minutos finais são diferentes dos demais momentos e os 30 minutos são diferentes dos 15 minutos iniciais.

Discussão

A proposta desse trabalho foi identificar o momento e o tempo mais adequados de interação para realizar a análise da pragmática da comunicação de crianças com síndrome de Down, visando a obtenção do maior número de dados no menor tempo possível, sem prejuízo da qualidade e fidedignidade dos dados obtidos.

A coleta dos dados foi realizada em situação lúdica espontânea, como tem sido a prática em nossos estudos (Andrade, 2006; Flabiano e Limongi, 2006), de forma a reforçar a relação pesquisador-sujeito, proposta também indicada na literatura (Owens, 1996).

Para a coleta foram realizadas filmagens da interação entre a criança e seu terapeuta, o que possibilitou uma posterior análise detalhada do comportamento comunicativo tanto da criança quanto do adulto. A importância dessa forma de coleta de dados, ou seja, o uso de filmadora para o registro dos dados, foi enfatizado por Kreckel (1978) em seu estudo. Autores como Andrade (2002), Fernandes (2003), Cardoso e Fernandes (2003) e Muñoz-Céspedes (2004) utilizaram filmadora para registrar a avaliação do uso funcional da linguagem em diversas populações.

Crespo-Eguílaz et al. (2003) e Laws e Bishop (2004) optaram por utilizar questionários ou listas de verificação em suas pesquisas. Ao serem utilizados questionários e listas acabam-se por perder dados importantes, como o contexto do uso da comunicação e os elementos não lingüísticos (gestos e expressões faciais e corporais), que devem ser considerados como linguagem no estudo do uso funcional da comunicação (Fernandes, 1996).

Considerando-se que a população estudada apresenta um atraso na aquisição e no desenvolvimento da linguagem (Law e Bishop, 2004b) e que muitas dessas crianças não utilizam o meio verbal para se comunicar, o uso do meio comunicativo vocal é de extrema importância no processo de desenvolvimento da linguagem (Andrade, 2006; Flabiano e Limongi, 2006). Diante disso, olhando isoladamente apenas o item "meio comunicativo vocal", pode-se dizer que o tempo e o momento em que as crianças obtiveram melhor desempenho foram os 15 minutos finais.

Quanto à análise do desempenho pragmático do terapeuta na interação com a criança, observa-se que também ocorreu uma diferença estatisticamente significante apenas no item meio comunicativo. Verifica-se que os valores obtidos na análise dos 15 minutos finais para o meio comunicativo verbal mostraram-se diferentes dos demais tempos e momentos. Esse momento, 15 minutos finais, foi o que apresentou uma menor média de utilização do meio comunicativo verbal pelo adulto (93,09%).

Ao se avaliar o uso funcional da linguagem, é de extrema importância considerar-se as diferenças individuais, pois se está lidando com comportamento, além do contexto em que a comunicação ocorre, o que inclui elementos lingüísticos e não-linguísticos, como ressaltado por Fernandes (1996). O método de avaliação da pragmática proposto por Fernandes (2004) envolve itens que, em conjunto, vão traçar o perfil comunicativo do sujeito. Considerando-se que, na maioria dos itens analisados não houve diferença significativa entre o tempo e momento para a coleta de dados, pode-se, utilizar qualquer tempo e momento, entre os estudados, para a realização da análise do perfil comunicativo da população avaliada.

Conclusão

O objetivo foi verificar o tempo e o momento mais adequados para a coleta de dados a respeito dos aspectos pragmáticos da comunicação de crianças com síndrome de Down. Não foram encontradas diferenças significativas relacionadas às amostras com diferentes durações de filmagem. É importante ressaltar que a análise estatística foi realizada baseando-se na média obtida no grupo estudado. Portanto, esses resultados são úteis para amostras significativas e dados de grupo para fins de pesquisa, em que se trabalha com média. Pode-se, então, utilizar qualquer tempo e momento para análise do perfil comunicativo de indivíduos com síndrome de Down, sem prejuízo da qualidade e fidedignidade dos dados.

No entanto, para cada sujeito em particular pode ser que haja diferenças significativas nos diferentes tempos e momentos. Por isso, ao se considerar o desenvolvimento da linguagem e comunicação em terapia fonoaudiológica, a análise individual é essencial para o delineamento de propostas de intervenção, baseadas nas características próprias de cada indivíduo.

É importante ressaltar que, se por um lado, a análise de amostras filmadas garante a reprodutibilidade e a fidedignidade dos dados obtidos, por outro ela envolve um recorte limitado das habilidades comunicativas da criança, uma vez que o contexto é limitado, os fatores motivacionais também e os interlocutores são especialistas. Isso faz com que valha a pena pensar em estudos que avaliem a complexidade das duas formas de coleta de dados, pois as entrevistas e questionários podem fornecer dados sobre a comunicação da criança em diferentes contextos, com diferentes estados mentais e diferentes interlocutores.

Recebido em 11.05.2006.

Revisado em 28.02.2007; 29.05.2007.

Aceito para Publicação em 29.05.2007.

Artigo de Pesquisa

Artigo Submetido a Avaliação por Pares

Conflito de Interesse: não

  • ADAMS, C. Practitioner review: the assessment of language pragmatics. J. child psychol. psychiat., Malden, v. 43, n. 8, p. 973-987, nov. 2002.
  • ANDRADE, C. R. F. História natural da gagueira - estudo III: vocabulário, fonologia e pragmática. Pró-fono R. Atual. Cient., Barueri (SP), v. 14, n. 3, p. 371-382, set.-dez. 2002.
  • ANDRADE, R. V. A emergência da expressão comunicativa na criança com síndrome de Down 2006. 206 f. Tese (Doutorado em Fisiopatologia Experimental) - Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo.
  • BAIXAULI-FORTEA, I.; ROSELLÓ, B.; MIRANDA-CASA, A. Evaluación de las dificultades pragmáticas: estudo de caso. R. Neurol., Barcelona, v. 38, supl. 1, p. 69-79, jan.-jun. 2004.
  • BERGLUND, E.; ERIKSSON, M.; JOHANSSON, I. Parental Reports of spoken language skills in children with Down Syndrome. J. Speech Lang. Hear. Res., Mariland, v. 44, n. 1, p. 179-191, fev. 2001.
  • CARDOSO, C.; FERNANDES, F. D. M. Uso de funções comunicativas interpessoais e não interpessoais em crianças do espectro autístico. Pró-fono R. Atual. Cient., Barueri (SP), v. 15, n. 3, p. 279-286, set.-dez. 2003.
  • CAPONE, N. C.; MCGREGOR, K. K. Gesture development: a review for clinical and reaserch practices. J. Speech Lang. Hear. Res., Mariland, v. 47, n. 1, p. 173-186, fev. 2004.
  • CRESPO-EQUÍLAZ, N.; NARBONA, J. Perfiles clínicos evolutivos y transiciones em el espectro del trastorno específico del desarrollo del lenguaje. R. Neurol., Barcelona, v. 36, supl. 1, p. 29-35, jan.-jun. 2003.
  • FERNANDES, F. D. M.Autismo infantil: repensando o enfoque fonoaudiológico - aspectos funcionais da comunicação. São Paulo: Lovise, 1996.
  • FERNANDES, F. D. M. Perfil comunicativo, desempenho sócio-cognitivo, vocabulário e meta-representação em crianças com transtornos do espectro autístico. Pró-fono R. Atual. Cient., Barueri (SP), v. 15, n. 3, p. 267-278, set.-dez. 2003.
  • FERNANDES, F. D. M. Pragmática. In: ANDRADE C. R. F.; BEFI-LOPES, D. M.; FERNANDES, F. D. M.; WERTZNER, H. ABFW: teste de linguagem infantil nas áreas de fonologia, vocabulário, fluência e pragmática. Barueri (SP): Pró-Fono, 2004. cap. 4, p. 83-97.
  • FERNANDES, F. D. M. Resultados de terapia fonoaudiológica com adolescentes com diagnóstico incluído no espectro autístico. Pro-fono R. Atual. Cient., Barueri (SP), v. 17, n. 1, p. 67-76, jan-abr. 2005.
  • FLABIANO, F. C.; LIMONGI, S. C. O. Relação entre gestos e linguagem oral em um par de gêmeos com síndrome de Down. R. Soc. Bras. Fonoaudiol., São Paulo, v. 11, n. 2, abr. 2006.
  • IVERSON, J. M.; LONGOBARDI, E.; CASELLI, M. C. Relationship between gestures and words in children with Down'syndroeme and typicallly developing children in the early stages of communicative development. Int. J. Lang. Commun. Dis., United Kingdon, v. 38, n. 2, p. 179-197, apr-jun. 2003.
  • KRECKEL, M. Comunicative acts: a semiological approach to the empirical analysis of filmed interaction. Semiotica, Cambridge, v. 24, n. 1 e n. 2, p. 85-111, jan-feb. 1978.
  • LAWS, G.; BISHOP, V. M. Pragmatic language impairment and social deficits in Williams syndrome: a comparison with Down's syndrome and specific language impairment. Int. J. Lang. Commun. Dis, United Kingdon, v. 39, n. 1, p. 45-64, jan-mar. 2004a.
  • LAWS, G.; BISHOP, V. M. Verbal deficits in Down syndrome and specific language impairment: a comparison. Int. J. Lang. Commun. Dis., United Kingdon, v. 39, n. 4, p. 423-451, oct-dec. 2004b.
  • MUÑOZ-CÉPEDES, J. M.; MELLE, N. Alteraciones de la pragmática de la comunicación después de um traumatismo craneoencefálico. R. Neurol., Barcelona, v. 38, n. 9, p. 856-859, maio 2004.
  • OWENS, R. Language research and analysis. In: OWES, R. Language and development [S.l.: s.n.], Needhan Heigth: Allyn & Bacon, 1996. p. 429-443.
  • Endereço para correspondência:
    Rua Cipotânea, 51
    Cidade Universitária - São Paulo - SP - CEP 05360-160
    (
  • *
    Pesquisa Realizada na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Set 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2007

    Histórico

    • Aceito
      29 Maio 2007
    • Revisado
      29 Maio 2007
    • Recebido
      11 Maio 2006
    Pró-Fono Produtos Especializados para Fonoaudiologia Ltda. Condomínio Alphaville Conde Comercial, Rua Gêmeos, 22, 06473-020 Barueri , São Paulo/SP, Tel.: (11) 4688-2220, Fax: (11) 4688-0147 - Barueri - SP - Brazil
    E-mail: revista@profono.com.br