Acessibilidade / Reportar erro

A literatura sobre shadow education: recortes de pesquisa 1 1 Editor responsável: Helena Maria Sant'Ana Sampaio Andery - https://orcid.org/0000-0002-1759-4875 , 2 2 Normalização, preparação e revisão textual: Maria Thereza Sampaio Lucinio – thesampaio@uol.com.br

Literatura sobre shadow education: recortes de investigación

Resumo

O artigo trata de recortes de pesquisa da literatura sobre shadow education (ensino suplementar), explorando estudos que representam cada recorte e suas principais conclusões. A análise das pesquisas indica que a preocupação com a produção de desigualdades educacionais permeia a literatura sobre shadow education, tendo em vista que essas atividades tendem a promover o aumento de distâncias educacionais entre estudantes que ocupam posições diferentes no espaço social. Destaca-se, também, que o ambiente de competição por posições escolares/universitárias relativamente favoráveis parece fomentar a demanda por atividades de ensino suplementar em diferentes contextos e que a proliferação de atividades de ensino suplementar tende a afetar as práticas de professores e alunos no ensino regular.

Palavras-chave
shadow education; ensino suplementar; desigualdades educacionais

Resumen

El artículo aborda extractos de una búsqueda bibliográfica sobre shadow education, explorando estudios que representan cada extracto y sus principales conclusiones. Este análisis indica que la preocupación por la producción de desigualdades educativas está por toda la literatura sobre shadow education, considerando que estas actividades tienden a promover un aumento en las distancias educativas entre los estudiantes que ocupan diferentes posiciones en el espacio social. Además, el entorno competitivo para puestos escolares o universitarios relativamente favorables parece fomentar la demanda de actividades de educación complementaria, y que el aumento en el número de actividades de educación complementaria tiende a afectar las prácticas de docentes y estudiantes en educación regular.

Palabras clave
shadow education; educación suplementaria; desigualdades educativas

Abstract

The article focuses on excerpts from a literature research on shadow education, exploring studies that represent each sub-theme and its main conclusions. Our analysis indicates that the concern with the production of educational inequalities permeates the research about shadow education, considering that these activities tend to promote an increase in educational distances among students placed different positions in the social space. It is also noteworthy that the competitive environment for relatively favorable school or university positions seems to foment the demand for supplementary educational activities in different contexts, and that the increase in the number of these kinds of activities tends to affect the practices of teachers and students in the regular education.

Keywords
shadow education; supplementary education; educational inequalities

Introdução

Estudos produzidos em diferentes áreas do conhecimento têm indicado a intensificação, nas últimas décadas, da participação de crianças e jovens em atividades de ensino oferecidas fora do tempo (e geralmente fora do espaço) dedicado ao ensino regular. Tratada na literatura produzida em língua inglesa como shadow education ou private tuition e como mercado das explicações na literatura portuguesa, a participação em aulas e cursos extraescolares (ou atividades de ensino suplementar) apenas recentemente tem sido objeto de investigação sistemática, ainda que a prática seja antiga (Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
; Hussein, 1987Hussein, M. G. A. (1987). Private tutoring: a hidden educational problem. Educational Studies in Mathematics, 18(1), 91-96. https://doi.org/10.1007/BF00367916
https://doi.org/10.1007/BF00367916...
).

Considerando a amplitude do conjunto de experiências extraescolares que podem ser entendidas como ensino suplementar, as pesquisas sobre o tema costumam restringir suas análises às aulas ou aos cursos pagos que guardam alguma relação com as disciplinas do ensino regular e que são frequentados por crianças ou jovens ainda na educação básica ou recém-egressos desse nível de ensino (Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
; Bray & Kwok, 2003Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
). A explicação da metáfora da sombra oferece uma boa síntese do escopo das pesquisas sobre o tema:

A metáfora da sombra é apropriada em muitos sentidos. Primeiro, o ensino suplementar privado só existe porque o ensino regular existe; segundo, conforme o tamanho e a forma do ensino regular mudam, o tamanho e a forma do ensino suplementar também mudam; terceiro, em quase todas as sociedades muito mais atenção é dada ao ensino regular do que à sua sombra; e quarto, os contornos do sistema de shadow education são muito menos nítidos que aqueles do sistema de ensino regular.

(Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, p. 17, tradução nossa)

Ainda que a existência de uma relação de causa e efeito unidirecional entre o ensino regular e o ensino suplementar possa ser questionada, a metáfora continua útil por ressaltar que a pesquisa sobre shadow education trata essencialmente de atividades relacionadas às experiências extraescolares de ensino-aprendizagem que guardam correspondência com o ensino regular. Sendo assim, geralmente estão fora do escopo das pesquisas sobre shadow education as experiências com atividades suplementares frequentadas após o ingresso dos estudantes no ensino superior, assim como os cursos realizados durante a educação básica que não dialogam com as disciplinas do ensino regular. Dessa forma, ainda que existam exceções3 3 Liu e Bray (2017), por exemplo, incluem em suas análises atividades suplementares que não guardam relação com as atividades desenvolvidas no ensino regular. , as pesquisas costumam excluir de suas análises a participação dos estudantes em aulas ou cursos de música, dança e esportes, entre outros.

Tendo em vista tanto a expansão das atividades de ensino suplementar em diferentes contextos quanto a proliferação de pesquisas sobre o tema, esse artigo tem como objetivo contribuir para a discussão tratando de abordagens/temas de pesquisa que são recorrentes na literatura sobre shadow education, explorando estudos que investigam esses temas e destacando suas principais conclusões.

Em linha com o proposto, as próximas seções do artigo abordam os seguintes temas de pesquisa: 1) estudos que procuram caracterizar o perfil socioeconômico de alunos que participam de atividades de ensino suplementar; 2) estudos que tratam da relação entre shadow education e o desempenho dos estudantes em testes; 3) estudos dedicados a compreender os motivos que levam estudantes/famílias a demandarem atividades de ensino suplementar; e 4) estudos que analisam as relações entre o ensino regular e o ensino suplementar4 4 Os estudos que compõem o artigo constituem parte de um levantamento bibliográfico realizado entre 2018 e 2020, compondo pesquisa de doutorado sobre ensino suplementar no Brasil. O levantamento bibliográfico inicial, realizado em 2018, foi feito a partir da busca dos termos shadow education, private tuition, mercado das explicações, ensino suplementar e educação sombra. À consulta inicial, feita a partir do Banco de Teses da Coordenação de Pessoal de Nível Superior – Capes, do Google Scholar e do repositório da Universidade de São Paulo, foram acrescentadas outras referências, levando em conta novas publicações, as referências dos estudos que compunham o levantamento inicial e outros repositórios (Journal Storage – jstor, Scientific Electronic Library Online – SciELO, ResearchGate). Até 2020, o levantamento bibliográfico resultou em aproximadamente 130 estudos, sem, contudo, esgotar o levantamento de pesquisas sobre shadow education. Nesse sentido, o artigo não tem como proposta oferecer uma síntese das pesquisas sobre shadow education, nem sobre os diferentes temas de pesquisa abordados por essa literatura. A intenção é, principalmente, tratar de recortes de pesquisa que parecem ser recorrentes na literatura consultada sobre shadow education, oferecendo uma visão panorâmica do assunto. Para isso, foram selecionados estudos/autores que são recorrentemente citados, mas também estudos empreendidos em diferentes contextos/países e em diferentes períodos. . Antes de abordar esses recortes da literatura sobre shadow education, algumas considerações gerais sobre o tema serão apresentadas na próxima seção.

Considerações gerais sobre shadow education

Em geral, os estudos sobre shadow education, que se multiplicam a partir da década de 1990, têm se dedicado a caracterizar as práticas de ensino suplementar a partir da ótica da oferta ou da demanda, segundo os tipos de atividades extraescolares frequentadas (ou as disciplinas mais demandadas), conforme as formas de participação nessas atividades e de acordo com a escala e a intensidade de frequência a atividades de ensino suplementar em cada contexto/país (Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, 2011Bray, M. (2011). The challenge of shadow education: Private tutoring and its implications for policy makers in the European Union. European Commission. https://etico.iiep.unesco.org/en/resource/challenge-shadow-education-private-tutoring-and-its-implications-policy-makers-european
https://etico.iiep.unesco.org/en/resourc...
; Bray & Lykins, 2012Bray, M., & Lykins, C. (2012). Shadow education: Private supplementary tutoring and its implications for policy makers in Asia. Asian Development Bank. https://www.think-asia.org/bitstream/handle/11540/101/shadow-education.pdf?sequence=1
https://www.think-asia.org/bitstream/han...
). Além disso, alguns estudos dividem as atividades de ensino suplementar entre atividades direcionadas a prevenir ou remediar dificuldades escolares no ensino regular e atividades de “enriquecimento” educacional, que se somam às experiências educativas do ensino regular (aulas de reforço escolar para alunos com dificuldades de aprendizagem são exemplo do primeiro caso, e aulas ou cursos preparatórios para testes de ingresso no ensino superior ilustram a segunda situação).

A maior parte dos estudos sobre shadow education dedica-se a estudar o tema a partir da ótica da demanda, quase sempre obtendo informações sobre a participação em atividades suplementares por meio da aplicação de questionários (relacionados ou não a avaliações em larga escala). Essa opção geralmente está associada à dificuldade de obtenção de informações sobre a oferta de ensino suplementar, uma vez que situações informais de trabalho são comuns entre professores particulares, o que dificulta o acesso a informações precisas sobre a oferta de aulas particulares (Bray, 2013Bray, M. (2013). Shadow education: comparative perspectives on the expansion and implications of private supplementary tutoring. Procedia – Social and Behavioral Sciences, 77, 412-420. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03.096
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03...
, p. 413).

Tendo por base informações sobre a demanda por atividades suplementares, os estudos sobre o tema indicam que os tipos de atividade suplementar buscados variam conforme o contexto. De toda forma, apesar das diferenças relacionadas a cada país e a cada sistema de ensino, são recorrentes as menções aos cursos preparatórios para os testes de ingresso no ensino superior, aos cursos de idiomas e às aulas de reforço escolar. Em relação às disciplinas mais procuradas, estudos empreendidos em diferentes contextos apontam que as aulas suplementares de matemática são as mais demandadas (Baker, Akiba, Le Tendre, & Wiseman, 2001Baker, D. P., Akiba, M., Le Tendre, G. K., & Wiseman, A. W. (2001). Worldwide shadow education: outside-school learning, institutional quality of schooling, and cross-national mathematics achievement. Educational evaluation and policy analysis, 23(1), 1-17. https://www.jstor.org/stable/3594156
https://www.jstor.org/stable/3594156...
; Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, pp. 34-36; Chan & Bray, 2014Chan, C., & Bray, M. (2014). Marketized private tutoring as a supplement to regular schooling: Liberal Studies and the shadow sector in Hong Kong secondary education. Journal of Curriculum Studies, 46(3), 361-388. https://doi.org/10.1080/00220272.2014.883553
https://doi.org/10.1080/00220272.2014.88...
, p. 6; Costa, Ventura, Neto-Mendes, & Martins, 2013).

Além da variabilidade de tipos de cursos suplementares, Bray (2007)Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
indica que há certa diversidade de formas de participação nessas atividades: elas podem ser oferecidas individualmente ou em grupos (pequenos ou grandes), presencialmente ou a distância (por correspondência ou pela internet), na residência dos estudantes ou dos professores, na própria escola em que ocorrem as aulas regulares ou em centros de ensino que oferecem as atividades.

No que diz respeito à escala e à intensidade da participação de estudantes em atividades de ensino suplementar, três casos costumam ser citados como exemplos de alta prevalência dessas atividades e de grande intensidade de frequência a cursos (sendo a intensidade mensurada de acordo com o número de horas semanais ou mensais de dedicação às atividades extraescolares): Japão, Coréia do Sul e Hong Kong. Ainda que os estudos sobre o tema apontem para uma tendência global de crescimento da participação de crianças e jovens nessas atividades (Bray, 2013Bray, M. (2013). Shadow education: comparative perspectives on the expansion and implications of private supplementary tutoring. Procedia – Social and Behavioral Sciences, 77, 412-420. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03.096
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03...
, 2015Bray, M. (2015). Exacerbating or Reducing Disparities? The Global Expansion of Shadow Education and Implications for the Teaching Profession. Anais do International Council on Education for Teaching, Naruto, Tokushima, Japão. https://hub.hku.hk/bitstream/10722/222068/1/Content.pdf
https://hub.hku.hk/bitstream/10722/22206...
; Zhang & Bray, 2020Zhang, W., & Bray, M. (2020). Comparative research on shadow education: achievements, challenges, and the agenda ahead. European Journal of Education, 55(3), 322-341. https://doi.org/10.1111/ejed.12413
https://doi.org/10.1111/ejed.12413...
), esses três casos apontados permanecem como exemplos importantes de disseminação de atividades de ensino suplementar, com percentuais de participação em cursos suplementares de 88% entre estudantes japoneses que pretendiam ingressar no ensino superior no final da década de 1980 (Stevenson & Baker, 1992Stevenson, D. L., & Baker, D. P. (1992). Shadow education and allocation in formal schooling: transition to university in Japan. American Journal of Sociology, 97(6), 1639-1657. https://www.jstor.org/stable/2781551
https://www.jstor.org/stable/2781551...
), de 70% de participação em cursos extraescolares entre alunos da educação básica na Coréia do Sul no ano de 2011 (Choi & Park, 2016Choi, Y., & Park, H. (2016). Shadow education and educational inequality in South Korea: examining effect heterogeneity of shadow education on middle school seniors’ achievement test scores. Research in Social Stratification and Mobility, 44, 22-32. https://doi.org/10.1016/j.rssm.2016.01.002
https://doi.org/10.1016/j.rssm.2016.01.0...
) e de 70% entre estudantes do ensino médio em Hong Kong (Bray & Kwok, 2003Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
).

Além da intensidade da competição educacional (que tende a ser maior em contextos em que as vantagens educacionais estão relacionadas a vantagens profissionais e de condições de vida), que leva estudantes/famílias a buscarem essas atividades como uma forma de aquisição de vantagens educacionais, a centralidade de processos de avaliação baseados em testes e aspectos culturais são características que explicam a alta prevalência de participação em cursos suplementares nesses contextos (Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, pp. 29-59; Bray, 2009Bray, M. (2009). Confronting the shadow education system: What government policies for what private tutoring? IIEP-UNESCO. http://www.iiep.unesco.org/en/confronting-shadow-education-system-what-government-policies-what-private-tutoring-12159
http://www.iiep.unesco.org/en/confrontin...
, p. 77; Bray & Kwok, 2003Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
, p. 618; Chan & Rao, 2009Chan, C. K. K., & Rao, N. (2009). Revisiting the Chinese learner: changing contexts, changing education. Comparative Education Research Centre, The University of Hong Kong. http://ndl.ethernet.edu.et/bitstream/123456789/33608/1/383.Carol%20K.K.%20Chan.pdf
http://ndl.ethernet.edu.et/bitstream/123...
; Choi, 2012Choi, J. (2012). Private tutoring and educational inequality: evidence from a dynamic model of academic achievement in Korea. Anais da Population Association of America Annual Meeting Program, New Orleans, Louisiana, Estados Unidos. http://paa2013.princeton.edu/papers/130384
http://paa2013.princeton.edu/papers/1303...
, p. 2; Lee, Lee, & Jang, 2010, p. 98; Stevenson & Baker, 1992Stevenson, D. L., & Baker, D. P. (1992). Shadow education and allocation in formal schooling: transition to university in Japan. American Journal of Sociology, 97(6), 1639-1657. https://www.jstor.org/stable/2781551
https://www.jstor.org/stable/2781551...
). No caso da Coréia do Sul, vale destacar que a combinação de alta competição por vagas em cursos superiores/universidades de maior prestígio com um sistema de ensino que tende a restringir a diferenciação educacional na educação básica tem levado estudantes e famílias a buscarem as atividades de ensino suplementar como um meio de diferenciação educacional: ao que parece, shadow education, nesse contexto, atua como uma forma de burlar a equalização educacional promovida pelo sistema de ensino regular na educação básica (sobre isso, veja Kim & Lee, 2010Kim, S., & Lee, J. H. (2010). Private Tutoring and Demand for Education in South Korea. Economic Development and Cultural Change, 58(2), 259-296. https://doi.org/10.1086/648186
https://doi.org/10.1086/648186...
).

Independente das caraterísticas da participação em atividades suplementares em cada contexto, os estudos sobre o tema geralmente têm como preocupação central as consequências que a proliferação dessas atividades pode ter para a produção de desigualdades educacionais, o que quase sempre se traduz em duas questões: 1) quem são os estudantes que acessam e os que não acessam essas atividades?; e 2) a participação nessas atividades se reflete em maiores chances de bom desempenho em exames que medeiam o progresso dos estudantes entre ciclos, etapas ou níveis educacionais?

Ou seja, se estudantes socialmente privilegiados, que já tendem a ter melhores condições para o alcance de resultados educacionais relativamente positivos (Alves & Franco, 2008Alves, M. T. G., & Franco, C. (2008). A pesquisa em eficácia escolar no Brasil: evidências sobre o efeito das escolas e fatores associados à eficácia escolar. In N. Brooke, & J. F. Soares (Orgs.), Pesquisa em eficácia escolar: Origem e trajetórias (pp. 482-500). UFMG.; Coleman et al., 1966Coleman, J.S., Campbell, E.Q., Hobson, C.J., McPartland, J., Mood, A.M., Weinfeld, F.D., & York, R.L. (1966). Equality of Educational Opportunity. Government Printing Office.; Hanushek, 1997Hanushek, E. A. (1997). Assessing the effects of school resources on student performance: an update. Educational Evaluation and Policy Analysis, 19(2), 141-164. https://doi.org/10.3102/01623737019002141
https://doi.org/10.3102/0162373701900214...
; Simielli, 2015Simielli, L. E. R. (2015). Equidade educacional no Brasil: Análise das oportunidades educacionais em 2001 e 2011 [Tese de doutorado, Fundação Getúlio Vargas]. http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/13438
http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/h...
), são os que mais acessam essas atividades e se a participação desses estudantes nesses cursos aumenta as chances de obtenção de resultados educacionais positivos, é possível que essas atividades estejam atuando como uma via de aumento de desigualdades educacionais entre estudantes de condições sociais distintas, o que pode ter consequências para a manutenção ou o aumento de desigualdades sociais (sobretudo em contextos onde as vantagens educacionais atuam como uma via importante de acesso a posições profissionais e sociais relativamente satisfatórias).

Vale destacar que, ainda que estejam presentes, no Brasil, características que tendem a estimular a competição educacional associada à participação de crianças e jovens em atividades de ensino suplementar (como uma forte relação entre educação e posições profissionais e sociais futuras (Ribeiro, 2014Ribeiro, C. A. C. (2014). Mobilidade e Estrutura de Classes no Brasil Contemporâneo. Sociologias, 16(37), 178-217. https://doi.org/10.1590/15174522-016003711
https://doi.org/10.1590/15174522-0160037...
; Souza, Ribeiro, & Carvalhaes, 2010Souza, P., Ribeiro, C. A., & Carvalhaes, F. A. O. (2010). Desigualdade de Oportunidades no Brasil: considerações sobre classe, educação e raça. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 25(73), 77-100. https://doi.org/10.1590/S0102-69092010000200005
https://doi.org/10.1590/S0102-6909201000...
; Teixeira & Menezes-Filho, 2012Teixeira, W. M., & Menezes-Filho, N. A. (2012). Estimando o retorno à educação do Brasil considerando a legislação educacional brasileira como um instrumento. Revista de Economia Política, 32(3), 479-496. https://doi.org/10.1590/S0101-31572012000300008
https://doi.org/10.1590/S0101-3157201200...
) e a centralidade de testes para avaliação e seleção dos estudantes que podem avançar entre etapas e níveis de ensino), são poucos os trabalhos dedicados ao tema no país5 5 Southgate (2009), tendo por base informações do PISA de 2003, classifica o Brasil como um país de alto percentual de uso de shadow education (p. 146). A pesquisa aponta que 49% dos estudantes brasileiros relataram participar dessas atividades, valor próximo ao da Coréia do Sul (55%). Em relação às horas semanais dedicadas às atividades extraescolares, os estudantes brasileiros indicaram ter gasto, em média, aproximadamente duas horas por semana em cursos oferecidos fora do tempo dedicado ao ensino regular, valor superior ao registrado pelos alunos de Hong Kong (1,39 hora por semana), mas inferior ao informado pelos sul coreanos (4,62 horas por semana) (pp. 99-100). . Mesmo que os estudos existentes geralmente indiquem que os cursos preparatórios para o vestibular, os cursos de idiomas e as aulas particulares se destacam no contexto brasileiro (Castro, 2013Castro, N. S. E. (2013). Investigação sobre as formas de preparação para o ingresso no ensino superior: uma educação na sombra ou uma sombra na educação? [Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul]. http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/3776
http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/...
; Costa et al., 2013Costa, J. A., Ventura, A., Neto-Mendes, A., & Martins, M. E. (2013). Reforço escolar: análise comparada dos meandros de um fenômeno em crescimento. Educação Unisinos, 17(3), 205-214. https://doi.org/10.4013/edu.2013.173.3942
https://doi.org/10.4013/edu.2013.173.394...
; Galvão, 2020Galvão, F. V. (2020). Ensino suplementar no contexto brasileiro: uma análise baseada nos dados do Enem. Educação e Sociedade, 41, 1-18. https://doi.org/10.1590/ES.232022
https://doi.org/10.1590/ES.232022...
; Gomes, Vargas, Paiva, Rodrígues, & Schneider, 2010; Gouveia & Neto-Mendes, 2014Gouveia, A., & Neto-Mendes, A. A. (2014). O mercado do reforço escolar: a procura e a oferta de cursinhos comerciais na cidade de Brasília. Revista Ciências Humanas UNITAU, 7(2), 17-41. https://doi.org/10.32813/2179-1120.2014.v7.n2.a149
https://doi.org/10.32813/2179-1120.2014....
), faltam estudos baseados em grandes amostras, que explorem padrões regionais de participação em diferentes tipos e formas de atividades suplementares. Além disso, no caso brasileiro, talvez sejam importantes estudos exploratórios dedicados a dimensionar a participação de crianças e jovens em uma gama mais ampla de atividades suplementares (extrapolando as atividades diretamente relacionadas ao currículo do ensino regular, como aulas de piano, violão, futebol, tênis, balé, natação, informática, canto coral, desenho, teatro, karatê, capoeira, ginástica olímpica etc.), que contextualizem a situação brasileira no que diz respeito ao tema, identifiquem os significados que diferentes atividades assumem em nosso contexto e avaliem os efeitos dessas atividades sobre desigualdades educacionais e sociais. Pesquisas voltadas ao mapeamento da oferta de cursos suplementares, dedicadas ao estudo da atuação das empresas de ensino suplementar existentes no país, também parecem necessárias6 6 A Kumon, por exemplo, é uma das empresas que ofertam atividades suplementares que tem atuado no Brasil. Originada no Japão em meados da década de 1950, a empresa contava, em abril de 2020, com franquias em mais de cinquenta países, atendendo a aproximadamente 4 milhões de alunos em cursos nas áreas de linguagens e matemática, principalmente. No Brasil, a empresa contava com mais de mil e quinhentas unidades em outubro de 2020. (https://www.kumongroup.com/eng/about/index.html?ID=eng_world e https://www.kumon.com.br/busca-de-unidades, recuperado em 14 out. 2020) .

Por fim, é válido dizer que a produção de estudos sobre o tema parece aumentar à medida que a participação em atividades de ensino suplementar se dissemina, em cada contexto7 7 Não é possível tratar, neste artigo, de todos os fatores que podem estar associados ao crescimento do mercado de atividades suplementares em diferentes contextos. De toda forma, além da competição educacional, a expansão da oferta educacional pelo setor privado, com o crescimento de grandes empresas ligadas à prestação de serviços educacionais (nos ensinos regular e suplementar), parece ser uma das fontes da expansão global dessas atividades (Aurini & Davies, 2004; Zhang & Bray, 2020, p. 12). Além disso, é possível sugerir que as atividades de ensino suplementar, que viabilizam a formação de cestas únicas de “consumo” de bens educacionais – a depender das possibilidades, disposições e preferências de cada estudante –, parecem se ajustar bem ao contexto da alta modernidade, em que os indivíduos precisam fazer escolhas acerca dos estilos de vida a serem seguidos (sobre isso, veja Giddens, 2002, pp. 79-85), escolhas que vão contribuir para a constituição das identidades dos indivíduos. Isto é, no contexto da alta modernidade, é possível que esse tipo de experiência educacional, personalizada (e mercantilizada), seja valorizado como uma das vias pelas quais os indivíduos podem construir suas identidades. . Nesse sentido, em linha com a tendência de alta incidência dessas atividades, a produção de estudos sobre shadow education tem sido muito frequente em países asiáticos. De toda forma, seguindo o aumento da disseminação dessas atividades em diferentes países/regiões (Portugal, Alemanha, Irlanda, Estados Unidos, Leste Europeu, Oriente Médio, entre outros), os estudos sobre shadow education têm se multiplicado em diversos contextos, algo que deve se intensificar, em consonância com as previsões de expansão das atividades de ensino suplementar no mundo (Bray, 2015Bray, M. (2015). Exacerbating or Reducing Disparities? The Global Expansion of Shadow Education and Implications for the Teaching Profession. Anais do International Council on Education for Teaching, Naruto, Tokushima, Japão. https://hub.hku.hk/bitstream/10722/222068/1/Content.pdf
https://hub.hku.hk/bitstream/10722/22206...
, p.9).

Em relação à evolução das pesquisas no tempo, pode-se dizer que, em um primeiro movimento de pesquisa, os estudos procuram dimensionar esse mercado, identificando as características socioeconômicas dos que acessam e dos que não acessam shadow education. Às vezes, simultaneamente a esse primeiro movimento, são desenvolvidos estudos dedicados a compreender os efeitos da participação nessas atividades sobre o desempenho dos estudantes em testes e os motivos que levam estudantes e famílias de cada contexto a demandarem essas atividades. Por fim, um outro conjunto de estudos sobre shadow education tende a se dedicar à compreensão dos efeitos dessas atividades sobre as rotinas escolares no ensino regular e sobre as desigualdades educacionais e sociais que podem se seguir (sobre a evolução das pesquisas sobre shadow education, veja Zhang & Bray, 2020Zhang, W., & Bray, M. (2020). Comparative research on shadow education: achievements, challenges, and the agenda ahead. European Journal of Education, 55(3), 322-341. https://doi.org/10.1111/ejed.12413
https://doi.org/10.1111/ejed.12413...
). Esses recortes/movimentos de pesquisa serão explorados nas próximas seções.

Caracterização socioeconômica dos participantes de shadow education

Geralmente preocupados em compreender se as atividades de ensino suplementar têm atuado como uma forma de garantir vantagens educacionais a uma parcela já socialmente privilegiada dos estudantes, os estudos que exploram as características de alunos/famílias que acessam cursos suplementares costumam se dividir entre os que realizam uma análise descritiva acerca de percentuais de participação em diferentes tipos de atividades de ensino suplementar, segundo indicadores da condição social dos alunos (como renda familiar ou anos de estudo dos pais, por exemplo), e os que estimam a associação entre variáveis indicativas das características socioeconômicas dos alunos e as chances de participação em atividades de ensino suplementar (nesse caso, o objetivo é verificar a relação entre fatores como renda familiar, anos de estudo dos pais ou raça/cor e a probabilidade de participação nos cursos considerados).

Em estudo descritivo, Bray e Kwok (2003)Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
investigam os padrões socioeconômicos da participação em atividades suplementares no contexto de Hong Kong. Tendo por base uma amostra de estudantes dos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio de seis escolas, os autores registram que aproximadamente 50% dos alunos participavam de alguma atividade de ensino suplementar no momento em que a pesquisa foi conduzida, sendo o percentual mais elevado quanto maior a proximidade do fim do ensino médio (nos dois últimos anos dessa etapa do ensino, a participação em cursos foi de aproximadamente 70%). Além disso, os autores apontam que, entre os alunos do ensino médio, a participação em atividades suplementares se concentra em grandes centros/turmas de preparo para o ingresso no ensino superior, sendo matemática e inglês as disciplinas mais procuradas (p. 615).

No que diz respeito ao perfil socioeconômico dos alunos, o estudo indica que a frequência às atividades suplementares aumenta conforme aumentam a renda e os anos de estudo dos pais dos alunos (o percentual de participação em cursos chega a dobrar, comparados os pais com menos e mais anos de estudo). Somado a isso, os autores destacam que a participação em atividades suplementares se concentra entre os estudantes que frequentam as melhores escolas e que apresentam melhores resultados escolares. Nesse sentido, essas atividades são procuradas menos com o propósito de sanar dificuldades escolares e mais com o intuito de aumentar as vantagens educacionais de estudantes que já contam com maior acúmulo de capital escolar. Registrando o clima de competição, os autores indicam que

as famílias dos melhores alunos de cada turma insistem para que eles participem de cursos suplementares para que eles permaneçam entre os melhores da turma, enquanto as famílias dos estudantes que estão perto de serem os melhores da turma insistem para que eles participem de cursos suplementares para que possam alcançar as melhores posições”.

(Bray & Kwok, 2003Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
, p. 617, tradução nossa).

Padrões similares são observados em outra pesquisa descritiva, empreendida por Gomes et al. (2010)Gomes, C. A., Vargas, A. R., Paiva, G. S., Rodrígues, G., & Schneider, L. (2010). Sistema educativo sombra: recortes no Brasil e em Portugal. Revista Ibero-americana de educação, 52(6), 1-14. https://doi.org/10.35362/rie5261768
https://doi.org/10.35362/rie5261768...
, no contexto brasileiro. O estudo, baseado em uma amostra de 358 estudantes do ensino médio de duas escolas de Brasília (uma pública e uma privada), indica que aulas suplementares de inglês e de disciplinas como matemática e física, em geral, são as mais demandadas, sendo o preparo para o ingresso no ensino superior e não a necessidade de sanar dificuldades no ensino regular a principal motivação dos alunos (pp. 8-11). Tratando do perfil socioeconômico dos alunos, os autores registram que a frequência a atividades de ensino suplementar é relativamente maior entre estudantes do sexo feminino, e que o percentual de participação nessas atividades é maior entre os alunos da escola privada (onde foi registrado um percentual de 52%, contra 22% na escola pública), distribuição que está relacionada à distribuição dos anos de estudo das mães dos alunos de cada escola (75,4% das mães da escola pública contavam com, no máximo, a educação básica completa, enquanto 78,8% das mães da escola privada tinham o ensino superior completo) (pp. 7-12).

Stevenson e Baker (1992)Stevenson, D. L., & Baker, D. P. (1992). Shadow education and allocation in formal schooling: transition to university in Japan. American Journal of Sociology, 97(6), 1639-1657. https://www.jstor.org/stable/2781551
https://www.jstor.org/stable/2781551...
realizam o primeiro estudo dedicado à estimativa de fatores associados à participação em atividades de ensino suplementar. Baseada em uma amostra representativa dos estudantes dos anos finais do ensino médio público e privado do contexto japonês do início da década de 1980, a pesquisa explora como as características socioeconômicas dos alunos afetam as chances de participação em diferentes modalidades de cursos suplementares (p. 1644).

Indicando que, no contexto considerado, o acesso às universidades de maior prestígio estava associado a vantagens profissionais e a certo prestígio social, os autores apontam que a uma educação básica relativamente igualitária se seguia um ensino superior bastante hierarquizado, com acesso mediado essencialmente por testes. A expressão “four pass, five fail” (p. 1642), referente às horas de sono dos que são aprovados ou reprovados nos exames, capta o clima de competição que tem levado os estudantes japoneses a demandarem cursos suplementares como uma forma de preparo para os processos seletivos relacionados ao ingresso no Ensino Superior.

Entre os resultados obtidos, o estudo indica que maiores níveis de renda familiar e de anos de estudo dos pais estavam associados ao aumento da probabilidade de participação nos cursos considerados. Além disso, estudantes do sexo masculino, estudantes com melhores históricos de desempenho escolar e que viviam em regiões urbanas apresentaram maior probabilidade de participação nos cursos (Stevenson & Baker, 1992Stevenson, D. L., & Baker, D. P. (1992). Shadow education and allocation in formal schooling: transition to university in Japan. American Journal of Sociology, 97(6), 1639-1657. https://www.jstor.org/stable/2781551
https://www.jstor.org/stable/2781551...
, pp. 1647-1652).

Southgate (2009)Southgate, D. E. (2009). Determinants of shadow education: A cross-national analysis [Tese de doutorado, Ohio State University]. http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.831.2258&rep=rep1&type=pdf
http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/dow...
empreende outra pesquisa do tipo, com base nos dados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes – PISA de 2003. Ainda que variem a depender do país considerado, os resultados indicaram que o nível educacional dos pais é um forte preditor da participação dos alunos em atividades de ensino suplementar, principalmente nos países em que uma alta proporção das famílias recorre a este tipo de atividade (p. 135). Além disso, destaca-se a influência da posse de recursos culturais, materializados principalmente na forma de livros, sobre a probabilidade de os pais demandarem atividades de ensino suplementar para seus filhos (p. 144). Por fim, a pesquisa indica que, na maioria dos países considerados, é maior a probabilidade de participação de alunas, relativamente a alunos, no ensino suplementar privado (p. 131), ficando a sugestão de que shadow education poderia constituir uma via de diminuição de desigualdades educacionais relacionadas a gênero, ao menos no caso de contextos em que estudantes do sexo feminino são discriminadas no ensino regular.

Também destacando o potencial de shadow education para a promoção do aumento de distâncias educacionais entre estudantes que ocupam posições distintas no espaço social, Buchmann, Condron e Roscigno (2010)Buchmann, C., Condron, D. J., & Roscigno, V. J. (2010). Shadow education, American style: test preparation, the SAT and college enrollment. Social Forces, 89(2), 435-461. https://doi.org/10.1353/sof.2010.0105
https://doi.org/10.1353/sof.2010.0105...
, com base em uma amostra de 8.820 estudantes norte-americanos do último ano do ensino médio que pretendiam participar ou já tinham participado do Scholastic Aptitude Test – SAT, verificam que as chances de participação em diferentes formas de preparo para o SAT são afetadas de modo distinto pelas variáveis que representam as características socioeconômicas dos estudantes: maiores níveis de renda familiar aumentam a probabilidade de participação em cursos presenciais privados e em aulas com professores particulares (que são as formas relativamente mais caras de preparo para o SAT), mas não afetam as chances de preparo feito por meio da aquisição de livros, vídeos e softwares ou por meio da participação em cursos preparatórios oferecidos pela própria escola frequentada no ensino regular; o fato de os pais dos alunos terem completado o ensino superior ou a pós-graduação não aumenta as chances de participação em qualquer tipo de preparo para o SAT, relativamente aos estudantes cujos pais estudaram no máximo até o ensino médio; estudantes do sexo feminino registram maior probabilidade de participação em qualquer um dos tipos de preparo considerados; e os alunos que são encorajados pelos pais a se prepararem para o SAT têm maior probabilidade de participação em todas as atividades levadas em conta na pesquisa (pp. 441-449).

A pesquisa destaca, ainda, os resultados relativos à probabilidade de participação nas atividades de preparo para o SAT conforme a cor/raça declarada pelos estudantes: a probabilidade de participação em praticamente todos os cursos (sobretudo nos mais caros) é destacadamente maior entre estudantes negros, relativamente aos estudantes brancos. Tendo em vista esse resultado, os autores sugerem que a maior probabilidade de estudantes negros participarem das formas mais caras (e possivelmente melhores) de preparo para o SAT pode constituir uma reação à estratificação racial/étnica que o SAT costuma impor no contexto considerado (Buchmann et al., 2010Buchmann, C., Condron, D. J., & Roscigno, V. J. (2010). Shadow education, American style: test preparation, the SAT and college enrollment. Social Forces, 89(2), 435-461. https://doi.org/10.1353/sof.2010.0105
https://doi.org/10.1353/sof.2010.0105...
, p. 448). Nesse sentido, ainda que os cursos considerados possam estar atuando como instrumento de potencialização de diferenças educacionais entre estudantes com diferentes níveis de renda, eles podem estar contribuindo para a redução de diferenças educacionais entre estudantes brancos e negros.

Como é possível notar, embora a caracterização do público que frequenta atividades de ensino suplementar aponte para uma variedade de sentidos e intensidades de relações entre a participação nessas atividades e as variáveis indicativas da condição social dos alunos, a principal tendência que tem sido registrada por esse tipo de pesquisa indica que as atividades de ensino suplementar têm sido acessadas pelos estudantes que possuem maior renda familiar e/ou cujos pais contam com mais anos de estudo. Em linha com essa propensão, a participação tende a ser maior entre os estudantes que têm condições de acessar melhores escolas no ensino regular e que tendem a apresentar melhores resultados educacionais. Nesse sentido, a participação em aulas ou cursos suplementares parece constituir uma via adicional de diferenciação educacional, garantindo vantagens educacionais adicionais a estudantes já privilegiados. E mesmo que em alguns casos as atividades de shadow education possam contribuir para certa equalização educacional (como as aulas de reforço escolar que certamente ajudam estudantes com dificuldades escolares a compreender melhor algo que não foi possível aprender na escola, ou como no caso de contextos em que essas atividades atuam como uma via de enfrentamento de desigualdades escolares relacionadas a gênero ou à cor/raça), essa equalização só é uma possibilidade para estudantes/famílias que detêm os recursos para perceber essas atividades como necessárias e para pagar por elas.

Por fim, vale dizer que as pesquisas dedicadas ao estudo das características socioeconômicas do público que acessa atividades de shadow education geralmente se restringem a explorar padrões de participação em cursos por meio do estabelecimento de relações entre variáveis, exercício que costuma não captar nuances sobre diferenças de qualidade entre os cursos frequentados ou sobre diferenças de significados sociais da participação em cada tipo de curso em cada contexto. Ainda que seja uma informação difícil de ser produzida, esse tipo de dado permitiria tanto uma melhor compreensão sobre as diferenças sociais de participação em cursos que aparentemente são similares (é muito provável, por exemplo, que cursos de idiomas de preços e qualidade variados sejam frequentados por estudantes de diferentes condições sociais) quanto uma melhor compreensão acerca de funções sociais que a frequência a diferentes tipos de atividades suplementares pode desempenhar entre estudantes/famílias que ocupam posições distintas no espaço social.

Shadow education e desempenho

Talvez, antes mesmo de nos questionarmos sobre quem frequenta e quem não frequenta cursos suplementares, devêssemos colocar a seguinte pergunta: essas atividades de fato afetam a aprendizagem, os resultados escolares ou as trajetórias educacionais dos alunos? Mesmo que não afetassem, a desigualdade de acesso a experiências de ensino e de socialização já constituiriam uma questão em si. De toda forma, ainda que as pesquisas que exploram a relação entre a participação em atividades de ensino suplementar e o desempenho de estudantes em testes apresente resultados variados, parte significativa dos estudos sobre o tema (sobretudo os mais rigorosos) indicam que, ao menos, o desempenho dos estudantes em testes é afetado pela participação em cursos suplementares, o que muitas vezes se traduz em melhores possibilidades de acesso a posições escolares/universitárias relativamente melhores (Bray, 2014Bray, M. (2014). The impact of shadow education on student academic achievement: why the research is inconclusive and what can be done about it. Asia Pacific Educ. Rev., 15(3), 381-389. https://doi.org/10.1007/s12564-014-9326-9
https://doi.org/10.1007/s12564-014-9326-...
; Dang & Rogers, 2008Dang, H. A., & Rogers, F. H. (2008). The growing phenomenon of private tutoring: does it deepen human capital, widen inequalities, or waste resources? The World Bank Research Observer, 23(2), 161-200. https://doi.org/10.1093/wbro/lkn004
https://doi.org/10.1093/wbro/lkn004...
, pp. 169-179).

Além da diversidade de resultados estar associada à especificidade de cada contexto em que cada pesquisa é conduzida, as razões para variação das conclusões sobre a relação entre a participação em atividades suplementares e o desempenho dos alunos em testes estão frequentemente relacionadas à dificuldade de se isolar o efeito dos cursos suplementares do efeito de outros fatores que afetam o desempenho. Por exemplo, como saber se o desempenho em um exame para o ingresso no ensino superior é resultado da frequência a cursos preparatórios para o vestibular ou de disposições do estudante em relação aos estudos? O aluno teve um bom desempenho porque frequentou um curso preparatório, ou frequentou um curso preparatório porque já era um aluno relativamente mais engajado nas atividades do ensino regular e teria bons resultados independente do curso preparatório? Em que medida o desempenho observado é resultado do curso preparatório ou consequência de um conjunto de práticas do aluno e de sua família, que podem envolver, por exemplo, o acompanhamento da rotina de estudos pelos pais (como a ajuda com tarefas escolares) ou o acesso habitual a livros? Como algumas das informações que seriam necessárias para que essas perguntas fossem respondidas com alguma precisão não são levadas em conta em parte dos modelos que estimam a relação entre shadow education e desempenho, muitos dos estudos sobre o tema acabam produzindo estimativas que podem ser, em maior ou menor proporção, viesadas. Assim, a diversidade de informações e de técnicas utilizadas nas pesquisas produzidas em cada contexto explica, em alguma medida, a variação de resultados sobre o tema (Bray, 2014Bray, M. (2014). The impact of shadow education on student academic achievement: why the research is inconclusive and what can be done about it. Asia Pacific Educ. Rev., 15(3), 381-389. https://doi.org/10.1007/s12564-014-9326-9
https://doi.org/10.1007/s12564-014-9326-...
; Dang & Rogers, 2008Dang, H. A., & Rogers, F. H. (2008). The growing phenomenon of private tutoring: does it deepen human capital, widen inequalities, or waste resources? The World Bank Research Observer, 23(2), 161-200. https://doi.org/10.1093/wbro/lkn004
https://doi.org/10.1093/wbro/lkn004...
).

Em uma das pesquisas que procura utilizar informações e técnicas que minimizam o viés das estimativas, Choi e Park (2016)Choi, Y., & Park, H. (2016). Shadow education and educational inequality in South Korea: examining effect heterogeneity of shadow education on middle school seniors’ achievement test scores. Research in Social Stratification and Mobility, 44, 22-32. https://doi.org/10.1016/j.rssm.2016.01.002
https://doi.org/10.1016/j.rssm.2016.01.0...
exploram o efeito da participação em atividades suplementares de matemática sobre o desempenho em testes desta disciplina entre alunos do último ano do ensino fundamental do contexto sul-coreano. Os dados foram coletados por um período de 3 anos, o que possibilitou a consideração de experiências prévias de ensino e de resultados escolares anteriores como variáveis de controle.

Comparando grupos de estudantes com características socioeconômicas e escolares similares, a pesquisa indica que os efeitos de participação nas atividades de ensino suplementar de matemática são maiores entre os alunos que, devido a suas características socioeconômicas e experiências escolares prévias, tinham menor probabilidade de participar dessas atividades (pp. 29-30). Diante desse resultado, os autores sugerem que a inclusão de atividades suplementares no contraturno das escolas do ensino regular que atendem estudantes de menor nível socioeconômico poderia contribuir para a diminuição de distâncias educacionais no contexto considerado (Choi & Park, 2016Choi, Y., & Park, H. (2016). Shadow education and educational inequality in South Korea: examining effect heterogeneity of shadow education on middle school seniors’ achievement test scores. Research in Social Stratification and Mobility, 44, 22-32. https://doi.org/10.1016/j.rssm.2016.01.002
https://doi.org/10.1016/j.rssm.2016.01.0...
, p. 31).

Padrões diferentes de resultado são obtidos por Loyalka e Zakharov (2016)Loyalka, P., & Zakharov, A. (2016). Does shadow education help students prepare for college? Evidence from Russia. International Journal of Education Development, 49, 22-30. https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2016.01.008
https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2016....
. Tendo por base dados sobre a participação de estudantes russos do último ano do ensino médio em atividades suplementares de matemática e de russo, os autores registram que a participação em cursos oferecidos em centros de ensino suplementar afeta o desempenho em testes de matemática e russo, mas somente entre os estudantes que registram histórico de alto desempenho escolar (p. 27). Os autores sugerem que a ausência de efeito da participação em cursos no caso dos estudantes com histórico de baixo desempenho escolar pode estar associado à dificuldade desses estudantes identificarem as diferenças de qualidade entre cursos, o que os levaria a frequentar cursos de pior qualidade (p. 29).

Preocupado com os efeitos de shadow edcuation sobre as desigualdades escolares, Choi (2012)Choi, J. (2012). Private tutoring and educational inequality: evidence from a dynamic model of academic achievement in Korea. Anais da Population Association of America Annual Meeting Program, New Orleans, Louisiana, Estados Unidos. http://paa2013.princeton.edu/papers/130384
http://paa2013.princeton.edu/papers/1303...
, baseando-se em dados longitudinais de desempenho e de características socioeconômicas e escolares de estudantes sul-coreanos acompanhados do sétimo ano do ensino fundamental até o final do ensino médio, estima o efeito da frequência a atividades suplementares de matemática e inglês sobre o desempenho em testes das mesmas disciplinas.

Os resultados indicam que a frequência a aulas ou a cursos suplementares afeta positivamente o desempenho dos estudantes em todos os anos considerados, sendo o efeito maior durante os anos finais do ensino fundamental, relativamente ao ensino médio. Além disso, o estudo indica que os efeitos do estudo por conta própria ganham importância, em comparação com os efeitos do ensino suplementar, conforme os alunos progridem no sistema de ensino regular. Apesar disso, os autores registram que o ensino suplementar e o estudo por conta própria afetam positivamente um ao outro, o que indica que essas duas práticas são complementares, em termos de ganhos de rendimento nos testes (p. 21).

Ao contrário das pesquisas anteriores, Smyth (2009)Smyth, E. (2009). Buying your way into college? Private tuition and the transition to higher education in Ireland. Oxford Review of Education, 35(1), 1-22. https://www.jstor.org/stable/20462436
https://www.jstor.org/stable/20462436...
não observa relações estatisticamente significantes entre shadow education e desempenho, tendo por base estudantes do último ano do ensino médio do contexto irlandês. Também utilizando variáveis que tendem a minimizar o viés das estimativas, o estudo baseia-se em informações sobre o desempenho dos alunos em uma avaliação nacional utilizada para a seleção dos estudantes que pretendem ingressar no ensino superior e em dados sobre desempenho escolar anterior, atitudes em relação aos estudos, expectativas educacionais e características socioeconômicas dos alunos. Apesar do uso de variáveis que podem contribuir para uma mensuração precisa do efeito “líquido” das atividades suplementares sobre o desempenho, vale notar que a variável relativa à participação em atividades de ensino suplementar é bastante agregada, não sendo especificados os tipos de atividades realizadas ou as disciplinas envolvidas nas aulas ou cursos frequentados (pp. 8-9).

Como já indicado, os resultados apontam que, no contexto considerado, não foi observada relação entre a participação em cursos ou aulas suplementares e o desempenho dos estudantes em testes. Diante disso, o autor sugere que a explicação para a demanda por atividades suplementares no contexto irlandês pode estar relacionada ao clima de competição em torno dos testes que medeiam o progresso dos estudantes entre a educação básica e o ensino superior, o que geraria uma pressão por preparo adicional para os testes, mesmo que este não tenha efeito prático sobre o desempenho (Smyth, 2009Smyth, E. (2009). Buying your way into college? Private tuition and the transition to higher education in Ireland. Oxford Review of Education, 35(1), 1-22. https://www.jstor.org/stable/20462436
https://www.jstor.org/stable/20462436...
, pp. 18-19).

Conquanto os estudos sobre o tema revelem alguma variação de intensidade das relações entre shadow education e desempenho – a depender do contexto considerado, da escolha de variáveis e das técnicas utilizadas nas estimativas –, ao que parece, a participação em atividades de ensino suplementar tem afetado o desempenho dos estudantes em testes, tendo por base informações de sistemas de ensino de diferentes países.

Tomados em conjunto, os estudos tratados até aqui parecem indicar que as atividades de shadow education têm constituído ou tendem a constituir uma via de potencialização de diferenças educacionais entre estudantes de condições sociais diversas, com a possibilidade de que vantagens sociais sejam transmitidas, por essa via educacional extraescolar, entre gerações (ainda que outros mecanismos, atuando em sentido contrário, possam limitar a tendência de transmissão de vantagens sociais dos pais aos filhos).

Motivos para a participação em shadow education

Como já foi possível notar, a motivação para a participação em aulas ou cursos suplementares está normalmente associada a certo clima de competição, frequentemente fomentado pela existência de testes que medeiam o progresso dos estudantes nos sistemas de ensino e pela relação, geralmente significativa, entre destinos escolares e destinos profissionais e sociais (Bray, 2015Bray, M. (2015). Exacerbating or Reducing Disparities? The Global Expansion of Shadow Education and Implications for the Teaching Profession. Anais do International Council on Education for Teaching, Naruto, Tokushima, Japão. https://hub.hku.hk/bitstream/10722/222068/1/Content.pdf
https://hub.hku.hk/bitstream/10722/22206...
; Choi, 2012Choi, J. (2012). Private tutoring and educational inequality: evidence from a dynamic model of academic achievement in Korea. Anais da Population Association of America Annual Meeting Program, New Orleans, Louisiana, Estados Unidos. http://paa2013.princeton.edu/papers/130384
http://paa2013.princeton.edu/papers/1303...
; Guill & Lintorf, 2019Guill, K., & Lintorf, K. (2019). Private tutoring when stakes are high: insights from the transition from primary to secondary school in Germany. International Journal of Educational Development, 65, 172-182, 2019. https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2018.08.001
https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2018....
; Smyth, 2009Smyth, E. (2009). Buying your way into college? Private tuition and the transition to higher education in Ireland. Oxford Review of Education, 35(1), 1-22. https://www.jstor.org/stable/20462436
https://www.jstor.org/stable/20462436...
; Southgate, 2009Southgate, D. E. (2009). Determinants of shadow education: A cross-national analysis [Tese de doutorado, Ohio State University]. http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.831.2258&rep=rep1&type=pdf
http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/dow...
; Stevenson & Baker, 1992Stevenson, D. L., & Baker, D. P. (1992). Shadow education and allocation in formal schooling: transition to university in Japan. American Journal of Sociology, 97(6), 1639-1657. https://www.jstor.org/stable/2781551
https://www.jstor.org/stable/2781551...
). Costa et al. (2013)Costa, J. A., Ventura, A., Neto-Mendes, A., & Martins, M. E. (2013). Reforço escolar: análise comparada dos meandros de um fenômeno em crescimento. Educação Unisinos, 17(3), 205-214. https://doi.org/10.4013/edu.2013.173.3942
https://doi.org/10.4013/edu.2013.173.394...
parecem resumir bem a ideia:

Ainda que as relações entre condição social de estudantes/famílias, educação e destinos profissionais e sociais (e toda a competição associada a essas relações), que não são lineares e que variam a depender do contexto (Dubet et al., 2012Dubet, F., Duru-Bellat, M., & Vérétout, A. (2012). As desigualdades escolares antes e depois da escola: organização escolar e influência dos diplomas. Sociologias, 14(29), 22-70. https://doi.org/10.1590/S1517-45222012000100003
https://doi.org/10.1590/S1517-4522201200...
), sejam recorrentemente registradas como estando na base das razões para a participação em aulas ou cur

A crescente importância que tem sido dada à competição em educação (em particular no que diz respeito à procura dos melhores resultados escolares e à obtenção de lugares nas universidades e nos cursos de maior prestígio) ajuda a explicar o crescimento do número de negócios de reforço escolar em todo o mundo [...]. Este crescimento está diretamente relacionado com a manifesta procura por parte das famílias, cujas expectativas são a obtenção de melhores resultados escolares para os seus filhos e de reforço das probabilidades de sucesso no ensino superior e na vida profissional. (p. 213)

sos suplementares, os estudos que abordam o tema têm indicado que estudantes e famílias apontam uma diversidade de motivos para a participação nessas atividades.

Em pesquisa dedicada a compreender os motivos que levam os pais dos alunos a procurarem atividades suplementares para seus filhos, Neto (2006)Neto, M. C. H. P. M. (2006). A procura das explicações: As razões dos pais [Dissertação de mestrado, Universidade de Aveiro]. http://hdl.handle.net/10773/4694
http://hdl.handle.net/10773/4694...
indica que, além de razões relacionadas ao preparo para os exames que medeiam o ingresso no ensino superior e ao enfrentamento de dificuldades de aprendizagem, a falta de tempo ou de conhecimento dos pais e a falta de apoio da escola são também indicadas como razões para a demanda por atividades suplementares, tendo por base os dados recolhidos entre os pais de uma escola de ensino médio e de ensino fundamental no contexto português (pp. 176-194). Padrões similares de motivos para a participação em cursos suplementares no contexto português são obtidos por Silveirinha (2007, pp. 188-191)Silveirinha, T. I. L. (2007). O fenômeno das explicações: Oferta, procura e implicações no 12° ano em estudo de caso [Dissertação de mestrado, Universidade de Aveiro]. https://ria.ua.pt/bitstream/10773/1012/1/2008000841.pdf
https://ria.ua.pt/bitstream/10773/1012/1...
e Gouveia (2017, pp. 192-194)Gouveia, A. S. (2017). Exames nacionais, apoios pedagógicos e explicações: a complexa construção dos resultados escolares em Portugal [Tese de doutorado, Universidade de Aveiro]. https://ria.ua.pt/handle/10773/18478?locale=pt_PT
https://ria.ua.pt/handle/10773/18478?loc...
, tendo por base dessa vez as respostas dos estudantes e não as de seus pais.

Em estudo que explora o tema no contexto de Hong Kong, Bray e Kwok (2003)Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
apontam que o preparo para exames se torna o principal motivo para a participação em cursos suplementares conforme os alunos se aproximam do final do ensino médio, mas que, entre alunos mais novos, são comuns motivos como o cumprimento de uma obrigação determinada pelos pais, a necessidade de ajuda com tarefas de casa, a dificuldade de acompanhar disciplinas no ensino regular e o desejo de fazer novos amigos (p. 616).

Fazer novos amigos é um dos motivos registrados também por estudantes japoneses que frequentam atividades de ensino suplementar, motivação superada pelo desejo de encontrar os amigos (já existentes), mas não pelo prazer de aprender, conforme aponta Entrich (2014, p. 45)Entrich, S. R. (2014). German and Japanese education in the shadow – do out-of-school lessons really contribute to class reproduction? IAFOR Journal of Education, 2(2). https://doi.org/10.22492/ije.2.2.01
https://doi.org/10.22492/ije.2.2.01...
. Ainda que os estudantes considerados na amostra japonesa registrem como principais motivações a necessidade de sanar dificuldades escolares e o desejo de acompanhar com mais facilidade as atividades do ensino regular, o fato de o desejo de encontrar os amigos ocupar a terceira posição entre os motivos para participação em cursos suplementares sugere que essas atividades podem extrapolar os aspectos instrumentais que costumam ser atribuídos a elas (sem deixar, é claro, de cumprir uma função instrumental).

Chan e Bray (2014)Bray, M. (2014). The impact of shadow education on student academic achievement: why the research is inconclusive and what can be done about it. Asia Pacific Educ. Rev., 15(3), 381-389. https://doi.org/10.1007/s12564-014-9326-9
https://doi.org/10.1007/s12564-014-9326-...
destacam, além da satisfação de necessidades de socialização que a interação com os próprios professores dos cursos suplementares pode proporcionar, a possibilidade de os alunos frequentarem essas atividades como uma forma de melhorarem sua autoestima e sua autoconfiança, já que o suporte adicional do ensino suplementar tende a contribuir para que eles se sintam mais seguros em relação aos estudos. Motivos para a participação em atividades de ensino suplementar relacionados à melhoria da autoestima e da autoconfiança dos estudantes são registrados também por Bray e Kwok (2003, p. 617)Bray, M. (2003). Adverse effects of private supplementary tutoring: Dimensions, implications and government responses. IIEP-UNESCO. http://www.iiep.un2esco.org/en/publication/adverse-effects-private-supplementary-tutoring-dimensions-implications-and-government
http://www.iiep.un2esco.org/en/publicati...
.

Voltando à motivação relacionada à competição educacional, alguns estudos indicam como motivo para participação em atividades de ensino suplementar a influência dos pares (Bray & Kwok, 2003Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
; Matsuoka, 2018Matsuoka, R. (2018). Inequality in shadow education participation in an egalitarian compulsory education system. Comparative Education Review, 62(4), 565-586. https://www.journals.uchicago.edu/doi/10.1086/699831
https://www.journals.uchicago.edu/doi/10...
; Smyth, 2009Smyth, E. (2009). Buying your way into college? Private tuition and the transition to higher education in Ireland. Oxford Review of Education, 35(1), 1-22. https://www.jstor.org/stable/20462436
https://www.jstor.org/stable/20462436...
). Nesse caso, dado o clima de competição em torno do desempenho nos testes que medeiam o progresso dos alunos no sistema de ensino, a pressão dos pares (entre os alunos ou entre os pais) tende a motivar a participação em cursos, que passam a ser entendidos como algo obrigatório, tendo em vista o objetivo (dos estudantes e/ou de seus pais) de não ficar para trás nessa espécie de jogo de concorrência educacional. Como já indicado para o caso da Irlanda, a influência/pressão dos pares seria a explicação para a participação em cursos mesmo quando eles não têm efeitos sobre o desempenho (Smyth, 2009Smyth, E. (2009). Buying your way into college? Private tuition and the transition to higher education in Ireland. Oxford Review of Education, 35(1), 1-22. https://www.jstor.org/stable/20462436
https://www.jstor.org/stable/20462436...
).

Por fim, vale notar que os estudos que tratam dos motivos que levam estudantes e/ou pais a demandarem atividades de ensino suplementar geralmente não exploram motivos relacionados à função de prestígio social que a participação em determinadas atividades de ensino suplementar pode exercer em cada contexto. Ainda que esses cursos possam ter consequências em termos de retornos escolares, seria importante compreender as representações dos indivíduos acerca de cada tipo de atividade suplementar em cada contexto e como a participação nessas atividades se ajusta ao conjunto de suas práticas e às posições que ocupam no espaço social, exercício que permitiria alguma compreensão acerca de motivações associadas ao prestígio social (tendo em vista que esse tipo de motivação dificilmente seria revelado em respostas diretas sobre o tema, já que a admissão da função de prestígio social faria ruir o prestígio denegado).

Além disso, a pesquisa conduzida por Castro (2013)Castro, N. S. E. (2013). Investigação sobre as formas de preparação para o ingresso no ensino superior: uma educação na sombra ou uma sombra na educação? [Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul]. http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/3776
http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/...
entre estudantes do terceiro ano do ensino médio de três escolas da cidade de Porto Alegre (uma escola estadual, uma municipal e uma particular, com questionários aplicados em duas turmas em cada escola, no ano de 2013) (p. 76) ilustra o potencial de análise do tema sob a ótica da distinção: questionados acerca dos motivos para frequentarem cursos de idiomas, os estudantes da escola privada registraram 11 motivos, sendo as respostas mais frequentes “mais conhecimento”, “aprender uma língua diferente”, “capacitação profissional” e “por prazer”. Entre os estudantes da escola estadual, 80% indicaram que o curso era uma forma de preparo para o trabalho e 20% registraram que era uma forma de preparo para o vestibular. No caso da rede municipal, 100% dos estudantes indicaram motivos relacionados ao preparo para o futuro profissional (pp. 137-138). Em casos como esse, revelando um pertencimento social que não precisa ser explicitado, a própria motivação para a participação em determinado curso suplementar – que indica, entre outras coisas, a possibilidade de não perceber o curso como uma necessidade – pode atuar como elemento de distinção social.

Relações entre os ensinos regular e suplementar

Talvez a categoria mais ampla de estudos que proponho aqui seja a que trata das relações entre os ensinos regular e suplementar e dos efeitos do último sobre o primeiro, sendo contrariada, nesse caso, a lógica que motiva a metáfora da sombra.

Explorando o tema no contexto do Kuwait, Hussein (1987)Hussein, M. G. A. (1987). Private tutoring: a hidden educational problem. Educational Studies in Mathematics, 18(1), 91-96. https://doi.org/10.1007/BF00367916
https://doi.org/10.1007/BF00367916...
trata o ensino suplementar como um problema educacional escondido. Destacando que os estudantes que procuram atividades suplementares de matemática estão mais preocupados em aprender técnicas de resolução rápida de exercícios do que com a aprendizagem de matemática de fato, o autor (que é professor de matemática no ensino regular) registra que a participação em cursos suplementares, focados no preparo para testes, leva os estudantes a perderem o interesse nas atividades desenvolvidas no ensino regular, sendo comum os casos de alunos que assistem ao mínimo de aulas que é permitido (p. 92).

Esse tipo de percepção é bem expresso por alunos de Hong Kong, em pesquisa conduzida anos mais tarde, que procurou registrar as percepções dos estudantes desse contexto sobre os ensinos regular e suplementar:

Nós não ouvimos o professor nas aulas regulares. Nós comemos e bebemos, e às vezes sonhamos acordados. O professor não se importa... Nas aulas do curso suplementar, eu me concentro. Todos se concentram. As coisas que o professor do curso suplementar diz são úteis. Elas são orientadas para os exames”.

(Fung, 2003Fung, A. (2003). Cram schooling in Hong Kong: the privatization of public education. Asian Anthropology, 2(1), 179-195. https://doi.org/10.1080/1683478X.2003.10552535
https://doi.org/10.1080/1683478X.2003.10...
, p. 188, tradução nossa).

Efeitos similares do ensino suplementar sobre o ensino regular – ou talvez os efeitos da centralidade dos testes e da competição educacional sobre as práticas educativas, que acabam se dividindo entre as preocupadas com o desenvolvimento mais geral ou amplo dos indivíduos e as que se restringem ao treino para a resolução de testes –, tem sido registrados por diferentes estudos, sendo muitas vezes destacada a possibilidade de sobreposição do ensino suplementar em relação ao ensino regular, ou a possibilidade do ensino suplementar atuar como uma espécie de substituto do ensino regular (Aurini & Davies, 2004Aurini, J., & Davies, S. (2004). The transformation of private tutoring: education in a franchise form. Canadian Journal of Sociology, 29(3), 419-438. https://doi.org/10.2307/3654674
https://doi.org/10.2307/3654674...
; Bray, 2013Bray, M. (2013). Shadow education: comparative perspectives on the expansion and implications of private supplementary tutoring. Procedia – Social and Behavioral Sciences, 77, 412-420. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03.096
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03...
, p. 417; Bray, 2015Bray, M. (2015). Exacerbating or Reducing Disparities? The Global Expansion of Shadow Education and Implications for the Teaching Profession. Anais do International Council on Education for Teaching, Naruto, Tokushima, Japão. https://hub.hku.hk/bitstream/10722/222068/1/Content.pdf
https://hub.hku.hk/bitstream/10722/22206...
, p. 6). Nesse caso, é válido o alerta feito por Costa et al., (2009)Costa, J. A., Neto-Mendes, A., & Ventura, A. (2009). As explicações em estudo de caso: alguns dados da cidade de Aquarela. Revista Lusófona de Educação, 13, 81-88. http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-72502009000100005&lng=pt&tlng=pt
http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?scri...
, indicando a possibilidade de que a as escolas do ensino regular possam vir a se transformar “[...] em mera agência de legitimação e de certificação de conhecimentos obtidos ‘à sua margem’” (p. 87).

Por outro lado, alguns estudos indicam que a possibilidade de um atendimento educacional mais individualizado (sobretudo pela atuação de professores particulares ou de professores que atendem pequenos grupos de estudantes), focado em sanar dificuldades de aprendizagem ou em ajudar os alunos a se sentirem mais seguros em suas atividades escolares, pode contribuir para um melhor andamento das aulas no ensino regular (Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, p. 51; Silveirinha, 2007Silveirinha, T. I. L. (2007). O fenômeno das explicações: Oferta, procura e implicações no 12° ano em estudo de caso [Dissertação de mestrado, Universidade de Aveiro]. https://ria.ua.pt/bitstream/10773/1012/1/2008000841.pdf
https://ria.ua.pt/bitstream/10773/1012/1...
, pp. 213-214; Yung & Bray, 2017Yung, K. W. H., & Bray, T. M. (2017). Shadow education: features, expansion and implications. In T. K. C. Tse, & M. H. Lee (Eds.), Making Sense of Education in Post-Handover Hong Kong: Achievements and Challenges (pp. 95-111). Routledge., p. 106).

Silveirinha (2007)Silveirinha, T. I. L. (2007). O fenômeno das explicações: Oferta, procura e implicações no 12° ano em estudo de caso [Dissertação de mestrado, Universidade de Aveiro]. https://ria.ua.pt/bitstream/10773/1012/1/2008000841.pdf
https://ria.ua.pt/bitstream/10773/1012/1...
chama atenção também para o cansaço que as atividades extraescolares podem gerar entre os alunos (p. 213), o que poderia afetar o desempenho nas atividades no ensino regular. O mesmo problema (isto é, o cansaço da dupla jornada) pode afetar os professores do ensino regular, no caso de atuarem também no ensino suplementar, algo por vezes necessário em contextos em que o rendimento dos professores é baixo (Bray, 2015Bray, M. (2015). Exacerbating or Reducing Disparities? The Global Expansion of Shadow Education and Implications for the Teaching Profession. Anais do International Council on Education for Teaching, Naruto, Tokushima, Japão. https://hub.hku.hk/bitstream/10722/222068/1/Content.pdf
https://hub.hku.hk/bitstream/10722/22206...
, p. 7; Buchmann, 1999Buchmann, C. (1999). The state and schooling in Kenya: historical developments and current challenges. Africa Today, 46(1), 95-117. https://www.jstor.org/stable/4187254
https://www.jstor.org/stable/4187254...
, p. 108; Dang & Rogers, 2008Dang, H. A., & Rogers, F. H. (2008). The growing phenomenon of private tutoring: does it deepen human capital, widen inequalities, or waste resources? The World Bank Research Observer, 23(2), 161-200. https://doi.org/10.1093/wbro/lkn004
https://doi.org/10.1093/wbro/lkn004...
, p. 182).

De todos as consequências que as práticas de ensino suplementar podem ter sobre o ensino regular, a que mais tem gerado debate é a que diz respeito à possibilidade dos professores do ensino regular não cobrirem todo o currículo durante as aulas regulares contando que as atividades suplementares suprirão o restante dos conteúdos não trabalhados ou, em um caso mais extremo, dos professores não cobrirem todo o currículo no ensino regular para gerar uma demanda por atividades suplementares no contraturno (Biswal, 1999Biswal, B. P. (1999). Private tutoring and public corruption: a cost-effective education system for developing countries. The Developing Economies, 37(2), 222-240. https://doi.org/10.1111/j.1746-1049.1999.tb00232.x
https://doi.org/10.1111/j.1746-1049.1999...
; Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, p. 55; Bray, 2013Bray, M. (2013). Shadow education: comparative perspectives on the expansion and implications of private supplementary tutoring. Procedia – Social and Behavioral Sciences, 77, 412-420. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03.096
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03...
, p. 415; Silova & Bray, 2006Silova, I., & Bray, M. (2006). The hidden marketplace: private tutoring in former socialist countries. In I. Silova; V. Budiené; M. Bray (Eds.), Education in a hidden marketplace: Monitoring of private tutoring. (pp. 71-98). Education Support Program (ESP) of the Open Society Institute., p. 102; Yung & Bray, 2017Yung, K. W. H., & Bray, T. M. (2017). Shadow education: features, expansion and implications. In T. K. C. Tse, & M. H. Lee (Eds.), Making Sense of Education in Post-Handover Hong Kong: Achievements and Challenges (pp. 95-111). Routledge., p. 106).

Em um dos estudos que mais avança no tema, Jayachandran (2014)Jayachandran, S. (2014). Incentives to teach badly: after-school tutoring in developing countries. Journal of Development Economics, 108, 190-205. https://doi.org/10.1016/j.jdeveco.2014.02.008
https://doi.org/10.1016/j.jdeveco.2014.0...
explora se a oferta de aulas suplementares por parte dos professores do ensino regular aos seus próprios alunos afeta a cobertura do currículo no ensino regular no contexto do Nepal. Comparando escolas públicas em que os professores atuam como professores de atividades suplementares de seus próprios alunos no contraturno com escolas que não têm essa prática, a autora indica que a oferta de atividades suplementares pelos professores do ensino regular implica a redução da cobertura do currículo nas escolas onde isso ocorre. Além disso, o estudo aponta que as notas dos estudantes que não podem frequentar as atividades oferecidas no contraturno são negativamente afetadas, relativamente aos que as acessam (pp. 198-202).

O debate em torno das questões éticas envolvidas na oferta de ensino suplementar por professores do ensino regular tem resultado, quase sempre, em medidas regulatórias que proíbem os professores do ensino regular de oferecerem atividades suplementares a seus próprios alunos ou aos alunos da escola em que lecionam (esse tipo de regulação foi adotado por países como Japão, Coréia do Sul, Alemanha, França e Portugal, entre outros) (Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, p. 78; Bray, 2013Bray, M. (2013). Shadow education: comparative perspectives on the expansion and implications of private supplementary tutoring. Procedia – Social and Behavioral Sciences, 77, 412-420. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03.096
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03...
, p. 415; Neto-Mendes et al., 2008Neto-Mendes, A., Costa, J. A., & Ventura, A. (2008). Explicações: modos de regulação de uma atividade globalizada. Cadernos de Pesquisa, 38(135), 685-700. http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742008000300007
https://doi.org/10.1590/S0100-1574200800...
; Pinto et al., 2014Pinto, J., Costa, J. A., & Silva, J. C. (2014). Explicações, escolas e sucesso educativo: reflexão em torno da educação sombra. Indagatio Didactica, 6(4), 24-36. https://doi.org/10.34624/id.v6i4.3905
https://doi.org/10.34624/id.v6i4.3905...
, p. 32; Silova & Bray, 2006Silova, I., & Bray, M. (2006). The hidden marketplace: private tutoring in former socialist countries. In I. Silova; V. Budiené; M. Bray (Eds.), Education in a hidden marketplace: Monitoring of private tutoring. (pp. 71-98). Education Support Program (ESP) of the Open Society Institute., p. 29).

A interação entre os ensinos regular e suplementar tem sido afetada também por outras formas de regulação, que incluem a proibição dessas atividades. Diante do potencial para diferenciação educacional de estudantes com diferentes possibilidades de acesso a cursos suplementares, a proibição foi instituída na década de 1980, na Coréia do Sul, mas foi declarada inconstitucional posteriormente, sem ter sido implementada de fato, já que a dificuldade de fiscalização impediu que a medida fosse efetivada (Lee et al., 2010Lee, C. J., Lee, H., & Jang, H. M. (2010). The history of policy responses to shadow education in South Korea: Implications for the next cycle of policy responses. Asia Pacific Education Review, 11(1), 97-108. https://doi.org/10.1007/s12564-009-9064-6
https://doi.org/10.1007/s12564-009-9064-...
). Destacam-se, também, a restrição de horários de funcionamento de centros de ensino especializados na oferta de atividades suplementares, conforme situação mais recente de regulação na Coréia do Sul (Choi, 2012Choi, J. (2012). Private tutoring and educational inequality: evidence from a dynamic model of academic achievement in Korea. Anais da Population Association of America Annual Meeting Program, New Orleans, Louisiana, Estados Unidos. http://paa2013.princeton.edu/papers/130384
http://paa2013.princeton.edu/papers/1303...
, p. 9), ou o apoio governamental a essas atividades, como nos casos de Singapura e Coréia do Sul, em que o objetivo geralmente é viabilizar o acesso de estudantes de baixa renda a essas atividades, o que pode contribuir tanto para a equalização do acesso a atividades suplementares quanto para a equalização de resultados educacionais entre estudantes de diferentes estratos sociais (Bray, 2003Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
, pp. 50-51; Choi, 2012Choi, J. (2012). Private tutoring and educational inequality: evidence from a dynamic model of academic achievement in Korea. Anais da Population Association of America Annual Meeting Program, New Orleans, Louisiana, Estados Unidos. http://paa2013.princeton.edu/papers/130384
http://paa2013.princeton.edu/papers/1303...
, p. 9; Hallak & Poisson, 2007Hallak, J., & Poisson, M. (2007). Corrupt schools, corrupt universities: what can be done? IIEP- UNESCO. http://www.iiep.unesco.org/en/publication/corrupt-schools-corrupt-universities-what-can-be-done
http://www.iiep.unesco.org/en/publicatio...
, p. 269).

De toda forma, tendo em vista o sentido de competição/concorrência que parece permear a educação em diferentes contextos, fica a dúvida se as iniciativas de regulação, voltadas essencialmente para a redução dos efeitos negativos das atividades suplementares sobre os sistemas de ensino e sobre desigualdades educacionais, são suficientes para equacionar os problemas gerados por essas atividades. Isto é, talvez sejam necessárias ações que atuem não somente na correção dos efeitos adversos gerados pelo ensino suplementar, mas também na própria forma como os sistemas de ensino têm sido estruturados, por meio da atenuação das lutas de concorrência que, em vez de condições diferentes, tendem a eternizar a diferença de condições (Bourdieu, 2017Bourdieu, P. (2017). A distinção. Zouk., p. 158). Nesse sentido, a expansão e descentralização da oferta do ensino público e gratuito (nos níveis básico e superior), com acesso e progresso mediados por mecanismos que não sejam baseados somente na competição via testes, talvez contribuíssem para certa redução da competição educacional nos sistemas de ensino de diferentes contextos.

Considerações finais

O artigo procurou tratar brevemente de algumas das abordagens recorrentes de pesquisa presentes na literatura sobre shadow education, explorando estudos que pareceram bem representar os tipos de pesquisa conforme a delimitação proposta. Como ressalva, vale dizer que outras abordagens de pesquisa, relativamente recorrentes, poderiam também dar origem a tópicos próprios: a expansão de atividades suplementares pela ótica da oferta (Aurini & Davies, 2004Aurini, J., & Davies, S. (2004). The transformation of private tutoring: education in a franchise form. Canadian Journal of Sociology, 29(3), 419-438. https://doi.org/10.2307/3654674
https://doi.org/10.2307/3654674...
; Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, p. 37-41), os fatores culturais, sociais e institucionais que afetam a participação em cursos suplementares (Baker et al., 2001Baker, D. P., Akiba, M., Le Tendre, G. K., & Wiseman, A. W. (2001). Worldwide shadow education: outside-school learning, institutional quality of schooling, and cross-national mathematics achievement. Educational evaluation and policy analysis, 23(1), 1-17. https://www.jstor.org/stable/3594156
https://www.jstor.org/stable/3594156...
; Bray, 2007Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners. IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
https://etico.iiep.unesco.org/sites/defa...
, pp. 69-73; Guill & Lintorf, 2019Guill, K., & Lintorf, K. (2019). Private tutoring when stakes are high: insights from the transition from primary to secondary school in Germany. International Journal of Educational Development, 65, 172-182, 2019. https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2018.08.001
https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2018....
; Silova & Bray, 2006Silova, I., & Bray, M. (2006). The hidden marketplace: private tutoring in former socialist countries. In I. Silova; V. Budiené; M. Bray (Eds.), Education in a hidden marketplace: Monitoring of private tutoring. (pp. 71-98). Education Support Program (ESP) of the Open Society Institute., p. 84) ou mesmo o detalhamento dos arranjos regulatórios relativos ao mercado de ensino suplementar (Bray, 2003Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00...
; Bray, 2009Bray, M. (2009). Confronting the shadow education system: What government policies for what private tutoring? IIEP-UNESCO. http://www.iiep.unesco.org/en/confronting-shadow-education-system-what-government-policies-what-private-tutoring-12159
http://www.iiep.unesco.org/en/confrontin...
; Neto-Mendes et al., 2008Neto-Mendes, A., Costa, J. A., & Ventura, A. (2008). Explicações: modos de regulação de uma atividade globalizada. Cadernos de Pesquisa, 38(135), 685-700. http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742008000300007
https://doi.org/10.1590/S0100-1574200800...
) são temas que talvez possam ser abordados em outros trabalhos dedicados a explorar recortes da literatura sobre shadow education.

Como foi possível notar, a disseminação das atividades de ensino suplementar tem levantado preocupações relativas à estratificação educacional, já que: 1) o acesso a essas atividades tem se concentrado entre estudantes relativamente privilegiados e 2) além de outras vantagens que possam conferir, em muitos casos, as atividades de ensino suplementar têm afetado positivamente os resultados escolares dos que as acessam, contribuindo para que estudantes que já tendem a ter melhores possibilidades educacionais reforcem suas chances de sucesso escolar, sobretudo no que diz respeito ao acesso às universidades ou aos cursos superiores mais demandados.

Ainda que exista certa variedade de motivos para estudantes e famílias demandarem atividades de ensino suplementar, aqueles relacionados à obtenção de vantagens educacionais parecem predominar, movimento que tende a reforçar a legitimidade das lutas de concorrência que têm permeado os sistemas educativos de diferentes contextos. Nesse sentido, a não ser que mudanças estruturais ocorram nos sistemas de ensino, espera-se o crescimento da demanda por atividades de ensino suplementar ou de quaisquer outras vias de diferenciação educacional que impliquem vantagens educacionais (geralmente seguidas da expectativa de vantagens profissionais e sociais), em linha com o previsto por Bray (2015, p. 9)Bray, M. (2015). Exacerbating or Reducing Disparities? The Global Expansion of Shadow Education and Implications for the Teaching Profession. Anais do International Council on Education for Teaching, Naruto, Tokushima, Japão. https://hub.hku.hk/bitstream/10722/222068/1/Content.pdf
https://hub.hku.hk/bitstream/10722/22206...
.

Por fim, vale indicar que os temas tratados são ainda muito pouco explorados no contexto brasileiro. Considerando que, no Brasil, as experiências educativas geralmente têm implicações significativas sobre as condições de vida futura dos indivíduos e que o ensino suplementar faz parte do conjunto de experiências educativas de uma parcela da população (Brandão & Lellis, 2003Brandão, Z., & Lellis, I. (2003). Elites acadêmicas escolarização dos filhos. Educação e Sociedade, 24(83), 509-526. https://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302003000200011
https://doi.org/10.1590/S0101-7330200300...
, pp. 519-520; Gomes et al., 2010Gomes, C. A., Vargas, A. R., Paiva, G. S., Rodrígues, G., & Schneider, L. (2010). Sistema educativo sombra: recortes no Brasil e em Portugal. Revista Ibero-americana de educação, 52(6), 1-14. https://doi.org/10.35362/rie5261768
https://doi.org/10.35362/rie5261768...
; Nogueira, 2004Nogueira, M. A. (2004). Favorecimento econômico e excelência escolar: um mito em questão. Revista Brasileira de Educação, 26, 133-144. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-24782004000200011
https://doi.org/10.1590/S1413-2478200400...
, p. 136), parece importante que se avance na compreensão da dimensão da participação dos estudantes brasileiros em atividades de ensino suplementar, dos efeitos dessas atividades sobre trajetórias escolares/educacionais e profissionais, das características socioeconômicas de quem acessa e de quem não acessa diferentes tipos de atividades suplementares e das consequências dessas atividades sobre as dinâmicas de ensino e aprendizagem nos sistemas de ensino regular no Brasil. Trazer essas questões à luz talvez seja um passo importante para que as desigualdades educacionais possam ser melhor compreendidas e enfrentadas em nosso contexto.

  • 2
    Normalização, preparação e revisão textual: Maria Thereza Sampaio Lucinio – thesampaio@uol.com.br
  • 3
    Liu e Bray (2017)Liu, J., & Bray, M. (2017). Determinants of demand for private supplementary tutoring in China: findings from a national survey. Education Economics, 25(2), 205-218. https://doi.org/10.1080/09645292.2016.1182623
    https://doi.org/10.1080/09645292.2016.11...
    , por exemplo, incluem em suas análises atividades suplementares que não guardam relação com as atividades desenvolvidas no ensino regular.
  • 4
    Os estudos que compõem o artigo constituem parte de um levantamento bibliográfico realizado entre 2018 e 2020, compondo pesquisa de doutorado sobre ensino suplementar no Brasil. O levantamento bibliográfico inicial, realizado em 2018, foi feito a partir da busca dos termos shadow education, private tuition, mercado das explicações, ensino suplementar e educação sombra. À consulta inicial, feita a partir do Banco de Teses da Coordenação de Pessoal de Nível Superior – Capes, do Google Scholar e do repositório da Universidade de São Paulo, foram acrescentadas outras referências, levando em conta novas publicações, as referências dos estudos que compunham o levantamento inicial e outros repositórios (Journal Storage – jstor, Scientific Electronic Library Online – SciELO, ResearchGate). Até 2020, o levantamento bibliográfico resultou em aproximadamente 130 estudos, sem, contudo, esgotar o levantamento de pesquisas sobre shadow education. Nesse sentido, o artigo não tem como proposta oferecer uma síntese das pesquisas sobre shadow education, nem sobre os diferentes temas de pesquisa abordados por essa literatura. A intenção é, principalmente, tratar de recortes de pesquisa que parecem ser recorrentes na literatura consultada sobre shadow education, oferecendo uma visão panorâmica do assunto. Para isso, foram selecionados estudos/autores que são recorrentemente citados, mas também estudos empreendidos em diferentes contextos/países e em diferentes períodos.
  • 5
    Southgate (2009)Southgate, D. E. (2009). Determinants of shadow education: A cross-national analysis [Tese de doutorado, Ohio State University]. http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.831.2258&rep=rep1&type=pdf
    http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/dow...
    , tendo por base informações do PISA de 2003, classifica o Brasil como um país de alto percentual de uso de shadow education (p. 146). A pesquisa aponta que 49% dos estudantes brasileiros relataram participar dessas atividades, valor próximo ao da Coréia do Sul (55%). Em relação às horas semanais dedicadas às atividades extraescolares, os estudantes brasileiros indicaram ter gasto, em média, aproximadamente duas horas por semana em cursos oferecidos fora do tempo dedicado ao ensino regular, valor superior ao registrado pelos alunos de Hong Kong (1,39 hora por semana), mas inferior ao informado pelos sul coreanos (4,62 horas por semana) (pp. 99-100).
  • 6
    A Kumon, por exemplo, é uma das empresas que ofertam atividades suplementares que tem atuado no Brasil. Originada no Japão em meados da década de 1950, a empresa contava, em abril de 2020, com franquias em mais de cinquenta países, atendendo a aproximadamente 4 milhões de alunos em cursos nas áreas de linguagens e matemática, principalmente. No Brasil, a empresa contava com mais de mil e quinhentas unidades em outubro de 2020. (https://www.kumongroup.com/eng/about/index.html?ID=eng_world e https://www.kumon.com.br/busca-de-unidades, recuperado em 14 out. 2020)
  • 7
    Não é possível tratar, neste artigo, de todos os fatores que podem estar associados ao crescimento do mercado de atividades suplementares em diferentes contextos. De toda forma, além da competição educacional, a expansão da oferta educacional pelo setor privado, com o crescimento de grandes empresas ligadas à prestação de serviços educacionais (nos ensinos regular e suplementar), parece ser uma das fontes da expansão global dessas atividades (Aurini & Davies, 2004Aurini, J., & Davies, S. (2004). The transformation of private tutoring: education in a franchise form. Canadian Journal of Sociology, 29(3), 419-438. https://doi.org/10.2307/3654674
    https://doi.org/10.2307/3654674...
    ; Zhang & Bray, 2020Zhang, W., & Bray, M. (2020). Comparative research on shadow education: achievements, challenges, and the agenda ahead. European Journal of Education, 55(3), 322-341. https://doi.org/10.1111/ejed.12413
    https://doi.org/10.1111/ejed.12413...
    , p. 12). Além disso, é possível sugerir que as atividades de ensino suplementar, que viabilizam a formação de cestas únicas de “consumo” de bens educacionais – a depender das possibilidades, disposições e preferências de cada estudante –, parecem se ajustar bem ao contexto da alta modernidade, em que os indivíduos precisam fazer escolhas acerca dos estilos de vida a serem seguidos (sobre isso, veja Giddens, 2002Giddens, A. (2002). Modernidade e identidade. Zahar., pp. 79-85), escolhas que vão contribuir para a constituição das identidades dos indivíduos. Isto é, no contexto da alta modernidade, é possível que esse tipo de experiência educacional, personalizada (e mercantilizada), seja valorizado como uma das vias pelas quais os indivíduos podem construir suas identidades.

Referências

  • Alves, M. T. G., & Franco, C. (2008). A pesquisa em eficácia escolar no Brasil: evidências sobre o efeito das escolas e fatores associados à eficácia escolar. In N. Brooke, & J. F. Soares (Orgs.), Pesquisa em eficácia escolar: Origem e trajetórias (pp. 482-500). UFMG.
  • Aurini, J., & Davies, S. (2004). The transformation of private tutoring: education in a franchise form. Canadian Journal of Sociology, 29(3), 419-438. https://doi.org/10.2307/3654674
    » https://doi.org/10.2307/3654674
  • Baker, D. P., Akiba, M., Le Tendre, G. K., & Wiseman, A. W. (2001). Worldwide shadow education: outside-school learning, institutional quality of schooling, and cross-national mathematics achievement. Educational evaluation and policy analysis, 23(1), 1-17. https://www.jstor.org/stable/3594156
    » https://www.jstor.org/stable/3594156
  • Biswal, B. P. (1999). Private tutoring and public corruption: a cost-effective education system for developing countries. The Developing Economies, 37(2), 222-240. https://doi.org/10.1111/j.1746-1049.1999.tb00232.x
    » https://doi.org/10.1111/j.1746-1049.1999.tb00232.x
  • Bourdieu, P. (2017). A distinção Zouk.
  • Brandão, Z., & Lellis, I. (2003). Elites acadêmicas escolarização dos filhos. Educação e Sociedade, 24(83), 509-526. https://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302003000200011
    » https://doi.org/10.1590/S0101-73302003000200011
  • Bray, M. (2003). Adverse effects of private supplementary tutoring: Dimensions, implications and government responses IIEP-UNESCO. http://www.iiep.un2esco.org/en/publication/adverse-effects-private-supplementary-tutoring-dimensions-implications-and-government
    » http://www.iiep.un2esco.org/en/publication/adverse-effects-private-supplementary-tutoring-dimensions-implications-and-government
  • Bray, M. (2007). The shadow education system: private tutoring and its implications for planners IIEP-UNESCO. https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
    » https://etico.iiep.unesco.org/sites/default/files/118486e.pdf
  • Bray, M. (2009). Confronting the shadow education system: What government policies for what private tutoring? IIEP-UNESCO. http://www.iiep.unesco.org/en/confronting-shadow-education-system-what-government-policies-what-private-tutoring-12159
    » http://www.iiep.unesco.org/en/confronting-shadow-education-system-what-government-policies-what-private-tutoring-12159
  • Bray, M. (2011). The challenge of shadow education: Private tutoring and its implications for policy makers in the European Union European Commission. https://etico.iiep.unesco.org/en/resource/challenge-shadow-education-private-tutoring-and-its-implications-policy-makers-european
    » https://etico.iiep.unesco.org/en/resource/challenge-shadow-education-private-tutoring-and-its-implications-policy-makers-european
  • Bray, M. (2013). Shadow education: comparative perspectives on the expansion and implications of private supplementary tutoring. Procedia – Social and Behavioral Sciences, 77, 412-420. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03.096
    » https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.03.096
  • Bray, M. (2014). The impact of shadow education on student academic achievement: why the research is inconclusive and what can be done about it. Asia Pacific Educ. Rev, 15(3), 381-389. https://doi.org/10.1007/s12564-014-9326-9
    » https://doi.org/10.1007/s12564-014-9326-9
  • Bray, M. (2015). Exacerbating or Reducing Disparities? The Global Expansion of Shadow Education and Implications for the Teaching Profession. Anais do International Council on Education for Teaching, Naruto, Tokushima, Japão. https://hub.hku.hk/bitstream/10722/222068/1/Content.pdf
    » https://hub.hku.hk/bitstream/10722/222068/1/Content.pdf
  • Bray, M., & Kwok, P. (2003). Demand for private supplementary tutoring: conceptual considerations, and socio-economic patterns in Hong Kong. Economics of Education Review, 22, 611-620. https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
    » https://doi.org/10.1016/S0272-7757(03)00032-3
  • Bray, M., & Lykins, C. (2012). Shadow education: Private supplementary tutoring and its implications for policy makers in Asia Asian Development Bank. https://www.think-asia.org/bitstream/handle/11540/101/shadow-education.pdf?sequence=1
    » https://www.think-asia.org/bitstream/handle/11540/101/shadow-education.pdf?sequence=1
  • Buchmann, C. (1999). The state and schooling in Kenya: historical developments and current challenges. Africa Today, 46(1), 95-117. https://www.jstor.org/stable/4187254
    » https://www.jstor.org/stable/4187254
  • Buchmann, C., Condron, D. J., & Roscigno, V. J. (2010). Shadow education, American style: test preparation, the SAT and college enrollment. Social Forces, 89(2), 435-461. https://doi.org/10.1353/sof.2010.0105
    » https://doi.org/10.1353/sof.2010.0105
  • Castro, N. S. E. (2013). Investigação sobre as formas de preparação para o ingresso no ensino superior: uma educação na sombra ou uma sombra na educação? [Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul]. http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/3776
    » http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/3776
  • Chan, C., & Bray, M. (2014). Marketized private tutoring as a supplement to regular schooling: Liberal Studies and the shadow sector in Hong Kong secondary education. Journal of Curriculum Studies, 46(3), 361-388. https://doi.org/10.1080/00220272.2014.883553
    » https://doi.org/10.1080/00220272.2014.883553
  • Chan, C. K. K., & Rao, N. (2009). Revisiting the Chinese learner: changing contexts, changing education Comparative Education Research Centre, The University of Hong Kong. http://ndl.ethernet.edu.et/bitstream/123456789/33608/1/383.Carol%20K.K.%20Chan.pdf
    » http://ndl.ethernet.edu.et/bitstream/123456789/33608/1/383.Carol%20K.K.%20Chan.pdf
  • Choi, J. (2012). Private tutoring and educational inequality: evidence from a dynamic model of academic achievement in Korea. Anais da Population Association of America Annual Meeting Program, New Orleans, Louisiana, Estados Unidos. http://paa2013.princeton.edu/papers/130384
    » http://paa2013.princeton.edu/papers/130384
  • Choi, Y., & Park, H. (2016). Shadow education and educational inequality in South Korea: examining effect heterogeneity of shadow education on middle school seniors’ achievement test scores. Research in Social Stratification and Mobility, 44, 22-32. https://doi.org/10.1016/j.rssm.2016.01.002
    » https://doi.org/10.1016/j.rssm.2016.01.002
  • Coleman, J.S., Campbell, E.Q., Hobson, C.J., McPartland, J., Mood, A.M., Weinfeld, F.D., & York, R.L. (1966). Equality of Educational Opportunity Government Printing Office.
  • Costa, J. A., Neto-Mendes, A., & Ventura, A. (2009). As explicações em estudo de caso: alguns dados da cidade de Aquarela. Revista Lusófona de Educação, 13, 81-88. http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-72502009000100005&lng=pt&tlng=pt
    » http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-72502009000100005&lng=pt&tlng=pt
  • Costa, J. A., Ventura, A., Neto-Mendes, A., & Martins, M. E. (2013). Reforço escolar: análise comparada dos meandros de um fenômeno em crescimento. Educação Unisinos, 17(3), 205-214. https://doi.org/10.4013/edu.2013.173.3942
    » https://doi.org/10.4013/edu.2013.173.3942
  • Dang, H. A., & Rogers, F. H. (2008). The growing phenomenon of private tutoring: does it deepen human capital, widen inequalities, or waste resources? The World Bank Research Observer, 23(2), 161-200. https://doi.org/10.1093/wbro/lkn004
    » https://doi.org/10.1093/wbro/lkn004
  • Dubet, F., Duru-Bellat, M., & Vérétout, A. (2012). As desigualdades escolares antes e depois da escola: organização escolar e influência dos diplomas. Sociologias, 14(29), 22-70. https://doi.org/10.1590/S1517-45222012000100003
    » https://doi.org/10.1590/S1517-45222012000100003
  • Entrich, S. R. (2014). German and Japanese education in the shadow – do out-of-school lessons really contribute to class reproduction? IAFOR Journal of Education, 2(2). https://doi.org/10.22492/ije.2.2.01
    » https://doi.org/10.22492/ije.2.2.01
  • Fung, A. (2003). Cram schooling in Hong Kong: the privatization of public education. Asian Anthropology, 2(1), 179-195. https://doi.org/10.1080/1683478X.2003.10552535
    » https://doi.org/10.1080/1683478X.2003.10552535
  • Galvão, F. V. (2020). Ensino suplementar no contexto brasileiro: uma análise baseada nos dados do Enem. Educação e Sociedade, 41, 1-18. https://doi.org/10.1590/ES.232022
    » https://doi.org/10.1590/ES.232022
  • Giddens, A. (2002). Modernidade e identidade Zahar.
  • Gomes, C. A., Vargas, A. R., Paiva, G. S., Rodrígues, G., & Schneider, L. (2010). Sistema educativo sombra: recortes no Brasil e em Portugal. Revista Ibero-americana de educação, 52(6), 1-14. https://doi.org/10.35362/rie5261768
    » https://doi.org/10.35362/rie5261768
  • Gouveia, A. S. (2017). Exames nacionais, apoios pedagógicos e explicações: a complexa construção dos resultados escolares em Portugal [Tese de doutorado, Universidade de Aveiro]. https://ria.ua.pt/handle/10773/18478?locale=pt_PT
    » https://ria.ua.pt/handle/10773/18478?locale=pt_PT
  • Gouveia, A., & Neto-Mendes, A. A. (2014). O mercado do reforço escolar: a procura e a oferta de cursinhos comerciais na cidade de Brasília. Revista Ciências Humanas UNITAU, 7(2), 17-41. https://doi.org/10.32813/2179-1120.2014.v7.n2.a149
    » https://doi.org/10.32813/2179-1120.2014.v7.n2.a149
  • Guill, K., & Lintorf, K. (2019). Private tutoring when stakes are high: insights from the transition from primary to secondary school in Germany. International Journal of Educational Development, 65, 172-182, 2019. https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2018.08.001
    » https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2018.08.001
  • Hallak, J., & Poisson, M. (2007). Corrupt schools, corrupt universities: what can be done? IIEP- UNESCO. http://www.iiep.unesco.org/en/publication/corrupt-schools-corrupt-universities-what-can-be-done
    » http://www.iiep.unesco.org/en/publication/corrupt-schools-corrupt-universities-what-can-be-done
  • Hanushek, E. A. (1997). Assessing the effects of school resources on student performance: an update. Educational Evaluation and Policy Analysis, 19(2), 141-164. https://doi.org/10.3102/01623737019002141
    » https://doi.org/10.3102/01623737019002141
  • Hussein, M. G. A. (1987). Private tutoring: a hidden educational problem. Educational Studies in Mathematics, 18(1), 91-96. https://doi.org/10.1007/BF00367916
    » https://doi.org/10.1007/BF00367916
  • Jayachandran, S. (2014). Incentives to teach badly: after-school tutoring in developing countries. Journal of Development Economics, 108, 190-205. https://doi.org/10.1016/j.jdeveco.2014.02.008
    » https://doi.org/10.1016/j.jdeveco.2014.02.008
  • Kim, S., & Lee, J. H. (2010). Private Tutoring and Demand for Education in South Korea. Economic Development and Cultural Change, 58(2), 259-296. https://doi.org/10.1086/648186
    » https://doi.org/10.1086/648186
  • Lee, C. J., Lee, H., & Jang, H. M. (2010). The history of policy responses to shadow education in South Korea: Implications for the next cycle of policy responses. Asia Pacific Education Review, 11(1), 97-108. https://doi.org/10.1007/s12564-009-9064-6
    » https://doi.org/10.1007/s12564-009-9064-6
  • Liu, J., & Bray, M. (2017). Determinants of demand for private supplementary tutoring in China: findings from a national survey. Education Economics, 25(2), 205-218. https://doi.org/10.1080/09645292.2016.1182623
    » https://doi.org/10.1080/09645292.2016.1182623
  • Loyalka, P., & Zakharov, A. (2016). Does shadow education help students prepare for college? Evidence from Russia. International Journal of Education Development, 49, 22-30. https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2016.01.008
    » https://doi.org/10.1016/j.ijedudev.2016.01.008
  • Matsuoka, R. (2018). Inequality in shadow education participation in an egalitarian compulsory education system. Comparative Education Review, 62(4), 565-586. https://www.journals.uchicago.edu/doi/10.1086/699831
    » https://www.journals.uchicago.edu/doi/10.1086/699831
  • Neto-Mendes, A., Costa, J. A., & Ventura, A. (2008). Explicações: modos de regulação de uma atividade globalizada. Cadernos de Pesquisa, 38(135), 685-700. http://dx.doi.org/10.1590/S0100-15742008000300007
    » https://doi.org/10.1590/S0100-15742008000300007
  • Neto, M. C. H. P. M. (2006). A procura das explicações: As razões dos pais [Dissertação de mestrado, Universidade de Aveiro]. http://hdl.handle.net/10773/4694
    » http://hdl.handle.net/10773/4694
  • Nogueira, M. A. (2004). Favorecimento econômico e excelência escolar: um mito em questão. Revista Brasileira de Educação, 26, 133-144. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-24782004000200011
    » https://doi.org/10.1590/S1413-24782004000200011
  • Pinto, J., Costa, J. A., & Silva, J. C. (2014). Explicações, escolas e sucesso educativo: reflexão em torno da educação sombra. Indagatio Didactica, 6(4), 24-36. https://doi.org/10.34624/id.v6i4.3905
    » https://doi.org/10.34624/id.v6i4.3905
  • Ribeiro, C. A. C. (2014). Mobilidade e Estrutura de Classes no Brasil Contemporâneo. Sociologias, 16(37), 178-217. https://doi.org/10.1590/15174522-016003711
    » https://doi.org/10.1590/15174522-016003711
  • Silova, I., & Bray, M. (2006). The hidden marketplace: private tutoring in former socialist countries. In I. Silova; V. Budiené; M. Bray (Eds.), Education in a hidden marketplace: Monitoring of private tutoring (pp. 71-98). Education Support Program (ESP) of the Open Society Institute.
  • Silveirinha, T. I. L. (2007). O fenômeno das explicações: Oferta, procura e implicações no 12° ano em estudo de caso [Dissertação de mestrado, Universidade de Aveiro]. https://ria.ua.pt/bitstream/10773/1012/1/2008000841.pdf
    » https://ria.ua.pt/bitstream/10773/1012/1/2008000841.pdf
  • Simielli, L. E. R. (2015). Equidade educacional no Brasil: Análise das oportunidades educacionais em 2001 e 2011 [Tese de doutorado, Fundação Getúlio Vargas]. http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/13438
    » http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/13438
  • Smyth, E. (2009). Buying your way into college? Private tuition and the transition to higher education in Ireland. Oxford Review of Education, 35(1), 1-22. https://www.jstor.org/stable/20462436
    » https://www.jstor.org/stable/20462436
  • Southgate, D. E. (2009). Determinants of shadow education: A cross-national analysis [Tese de doutorado, Ohio State University]. http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.831.2258&rep=rep1&type=pdf
    » http://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download?doi=10.1.1.831.2258&rep=rep1&type=pdf
  • Souza, P., Ribeiro, C. A., & Carvalhaes, F. A. O. (2010). Desigualdade de Oportunidades no Brasil: considerações sobre classe, educação e raça. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 25(73), 77-100. https://doi.org/10.1590/S0102-69092010000200005
    » https://doi.org/10.1590/S0102-69092010000200005
  • Stevenson, D. L., & Baker, D. P. (1992). Shadow education and allocation in formal schooling: transition to university in Japan. American Journal of Sociology, 97(6), 1639-1657. https://www.jstor.org/stable/2781551
    » https://www.jstor.org/stable/2781551
  • Teixeira, W. M., & Menezes-Filho, N. A. (2012). Estimando o retorno à educação do Brasil considerando a legislação educacional brasileira como um instrumento. Revista de Economia Política, 32(3), 479-496. https://doi.org/10.1590/S0101-31572012000300008
    » https://doi.org/10.1590/S0101-31572012000300008
  • Yung, K. W. H., & Bray, T. M. (2017). Shadow education: features, expansion and implications. In T. K. C. Tse, & M. H. Lee (Eds.), Making Sense of Education in Post-Handover Hong Kong: Achievements and Challenges (pp. 95-111). Routledge.
  • Zhang, W., & Bray, M. (2020). Comparative research on shadow education: achievements, challenges, and the agenda ahead. European Journal of Education, 55(3), 322-341. https://doi.org/10.1111/ejed.12413
    » https://doi.org/10.1111/ejed.12413
1
Editor responsável: Helena Maria Sant'Ana Sampaio Andery - https://orcid.org/0000-0002-1759-4875

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    07 Jan 2021
  • Aceito
    10 Jun 2021
UNICAMP - Faculdade de Educação Av Bertrand Russel, 801, 13083-865 - Campinas SP/ Brasil, Tel.: (55 19) 3521-6707 - Campinas - SP - Brazil
E-mail: proposic@unicamp.br