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Intoxicação experimental por Passiflora foetida (Passifloraceae) em caprinos

Experimental poisoning by Passiflora foetida (Passifloraceae) in goats

Resumos

Passiflora foetida é mencionada por produtores da região Nordeste como causa de intoxicação espontânea em animais. Este trabalho teve por objetivos avaliar a toxicidade de P. foetida em caprinos e determinar seu princípio ativo e a época do ano em que a mesma é tóxica. Inicialmente a planta administrada em duas doses diárias de 40g por kg de peso animal (g/kg) coletada dois dias antes da administração não resultou tóxica. Posteriormente a planta administrada imediatamente após a coleta resultou tóxica nas doses que variaram de 4 a 8 g/kg, em quatro caprinos. O animal que recebeu 8g/kg apresentou sinais clínicos graves e recuperou-se após a administração de tiossulfato de sódio. Os demais caprinos apresentaram sinais menos graves e se recuperaram espontaneamente. Posteriormente, a planta foi administrada em diferentes épocas a 23 caprinos na dose de 10g/kg. A planta foi significativamente mais tóxica (P<0,05) na época seca; no total, dos 14 caprinos que receberam a planta na época seca, 11 apresentaram sinais clínicos de intoxicação e dos 13 caprinos que receberam a planta na época das chuvas, apenas 3 apresentaram sinais clínicos. Todos os animais que apresentaram sinais clínicos, se recuperaram após a administração de tiosulfato de sódio. Os sinais clínicos caracterizavam-se por apatia, pulso venoso positi-vo, ataxia, berros, taquicardia e taquipneia, midríase e decúbito esternal seguido por decúbito lateral. Antes de cada administração era feito o teste do papel picrosódico para estimar o teor de cianeto na planta, classificando a reação em discreta, leve, moderada e acentuada. As amostras com reação discreta não apresentaram toxicidade, as com reação leve induziram sinais leves e as com reação moderada causaram sinais graves ou moderados de intoxicação. Não foram observados testes com reação acentuada. Os resultados do trabalho demonstram que P. foetida é uma planta cianogênica que causa intoxicação após a ingestão das folhas frescas, principalmente no período de estiagem.

Plantas tóxicas; Passiflora foetida; Passifloraceae; intoxicação por planta; plantas cianogênicas; cianeto; caprinos


Passiflora foetida is mentioned as a toxic plant by farmers in northeastern Brazil. This research aimed to establish the toxicity of P. foetida for goats, in different seasons of the year, and to determine its toxic compound. Initially, the plant collected two days before administration was non toxic at the daily dose of 40g per kg of body weight (g/kg) given during two days. Furthermore, the plant was administered immediately after collection at a dose of 4-8g/kg to four goats. The animal that ingested 8g/kg showed severe clinical signs, but recovered after treatment with sodium thiosulfate. The other three goats showed mild signs of poisoning and recovered spontaneously. The plant was then administered during different seasons to 23 goats at the dose of 10g/kg. The plant was significantly (P<0.05) more toxic during the dry season than during the rainy season; 11 out of 14 goats that received the plant in the dry season showed clinical signs, but only 3 out of 13 goats that ingested the plant during the rainy season had signs. All goats with clinical signs recovered after the administration of sodium thiosulfate. Clinical signs were apathy, tachycardia and tachypnea, jugular venous pulse, incoordination, bellowing, mydriasis, and sternal recumbence followed by lateral recumbence. Before each administration the plant was tested for cyanide by the picric acid paper test to estimate the cyanide concentration in the plant, which was defined as slight, moderate, high, and very high. Samples with slight reaction were not toxic, those with moderate reaction induced mild signs of poisoning, and those with high reaction induced severe clinical signs. Samples with very high concentrations of cyanide were not observed. The results demonstrated that P. foetida is a cyanogenic plant, which causes poisoning after the ingestion of fresh leaves, mainly during the dry period.

Poisonous plants; Passiflora foetida; Passifloraceae; plant poisoning; cyanide poisoning; goats


ANIMAIS DE PRODUÇÃO

Intoxicação experimental por Passiflora foetida (Passifloraceae) em caprinos

Experimental poisoning by Passiflora foetida (Passifloraceae) in goats

Fabrício K. de L. Carvalho; Rosane M.T. de Medeiros; José A.S. de Araujo; Franklin Riet-Correa* * Autor para correspondência; franklin.riet@pq.cnpq.br

IHospital Veterinário, Centro der Saúde e Tecnologia Rural (CSTR), Universidade Federal de Campina Grande (FCG), Campus de Patos, 58700-000 Patos, PB, Brasil

ABSTRACT

Passiflora foetida is mentioned as a toxic plant by farmers in northeastern Brazil. This research aimed to establish the toxicity of P. foetida for goats, in different seasons of the year, and to determine its toxic compound. Initially, the plant collected two days before administration was non toxic at the daily dose of 40g per kg of body weight (g/kg) given during two days. Furthermore, the plant was administered immediately after collection at a dose of 4-8g/kg to four goats. The animal that ingested 8g/kg showed severe clinical signs, but recovered after treatment with sodium thiosulfate. The other three goats showed mild signs of poisoning and recovered spontaneously. The plant was then administered during different seasons to 23 goats at the dose of 10g/kg. The plant was significantly (P<0.05) more toxic during the dry season than during the rainy season; 11 out of 14 goats that received the plant in the dry season showed clinical signs, but only 3 out of 13 goats that ingested the plant during the rainy season had signs. All goats with clinical signs recovered after the administration of sodium thiosulfate. Clinical signs were apathy, tachycardia and tachypnea, jugular venous pulse, incoordination, bellowing, mydriasis, and sternal recumbence followed by lateral recumbence. Before each administration the plant was tested for cyanide by the picric acid paper test to estimate the cyanide concentration in the plant, which was defined as slight, moderate, high, and very high. Samples with slight reaction were not toxic, those with moderate reaction induced mild signs of poisoning, and those with high reaction induced severe clinical signs. Samples with very high concentrations of cyanide were not observed. The results demonstrated that P. foetida is a cyanogenic plant, which causes poisoning after the ingestion of fresh leaves, mainly during the dry period.

Index terms: Poisonous plants, Passiflora foetida, Passifloraceae, plant poisoning, cyanide poisoning, goats

RESUMO

Passiflora foetida é mencionada por produtores da região Nordeste como causa de intoxicação espontânea em animais. Este trabalho teve por objetivos avaliar a toxicidade de P. foetida em caprinos e determinar seu princípio ativo e a época do ano em que a mesma é tóxica. Inicialmente a planta administrada em duas doses diárias de 40g por kg de peso animal (g/kg) coletada dois dias antes da administração não resultou tóxica. Posteriormente a planta administrada imediatamente após a coleta resultou tóxica nas doses que variaram de 4 a 8 g/kg, em quatro caprinos. O animal que recebeu 8g/kg apresentou sinais clínicos graves e recuperou-se após a administração de tiossulfato de sódio. Os demais caprinos apresentaram sinais menos graves e se recuperaram espontaneamente. Posteriormente, a planta foi administrada em diferentes épocas a 23 caprinos na dose de 10g/kg. A planta foi significativamente mais tóxica (P<0,05) na época seca; no total, dos 14 caprinos que receberam a planta na época seca, 11 apresentaram sinais clínicos de intoxicação e dos 13 caprinos que receberam a planta na época das chuvas, apenas 3 apresentaram sinais clínicos. Todos os animais que apresentaram sinais clínicos, se recuperaram após a administração de tiosulfato de sódio. Os sinais clínicos caracterizavam-se por apatia, pulso venoso positi-vo, ataxia, berros, taquicardia e taquipneia, midríase e decúbito esternal seguido por decúbito lateral. Antes de cada administração era feito o teste do papel picrosódico para estimar o teor de cianeto na planta, classificando a reação em discreta, leve, moderada e acentuada. As amostras com reação discreta não apresentaram toxicidade, as com reação leve induziram sinais leves e as com reação moderada causaram sinais graves ou moderados de intoxicação. Não foram observados testes com reação acentuada. Os resultados do trabalho demonstram que P. foetida é uma planta cianogênica que causa intoxicação após a ingestão das folhas frescas, principalmente no período de estiagem.

Termos de indexação: Plantas tóxicas, Passiflora foetida, Passifloraceae, intoxicação por planta, plantas cianogênicas, cianeto, caprinos

INTRODUÇÃO

Passiflora foetida (Fig.1), conhecida vulgarmente como canapú-fedorento, maracujá-do-mato ou maracujá-de-estalo, é uma planta trepadeira de crescimento vigoroso e contínuo, com sistema radicular pouco profundo, se reproduz por sementes e apresenta pouca exigência ao consumo de água. Possui folhas verdes lobadas e com gavinhas que são órgãos de sustentação. É de fácil proliferação por se multiplicar por estacas fixando-se, ou mesmo entrelaçando-se em outras plantas (Kissmann & Groth 1995). O gênero Passiflora é nativo do oeste da Índia e América do Sul, podendo ser vista entrelaçadas entre as árvores, e adaptando-se em vários tipos de terrenos, como por exemplo, solos rochosos e pedregosos, cascalhos, bancos de areia, costeiras de riachos e rios e entre outros diversos tipos de vegetação (Spooner et al. 2008).


O gênero Passiflora compreende cerca de 400 espéci-es. Duas espécies têm papel importante no comércio, sendo usadas na produção de frutos: P. edulis e P. alata. Os frutos têm ampla utilização culinária, prestando-se para o consumo in natura e para o preparo de sucos, geléias, sobremesas e molhos para carnes, como também na formulação de calmantes (Calderon 2007).

P. foetida é mencionada em algumas áreas da Paraíba como causadora de intoxicação espontânea em animais que tem acesso a planta. É relatado um surto no município de Tenório, em caprinos que ingeriram a planta verde, que tinha sido cortada e jogada para os animais. Em outros municípios da Paraíba, P. foetida é mencionada por alguns proprietários como causadora de aborto, principalmente no período de chuva onde a planta encontrasse em maior quantidade. No Rio Grande do Norte na região do Seridó alguns proprietários mencionam esta planta como causa de aborto em bovinos, caprinos e em ovinos (Silva et al. 2006).

Não existem informações científicas concretas sobre a intoxicação por P. foetida. A planta já foi administrada experimentalmente, na dose de 10g/kg/peso vivo (pv) a caprinos sem causar sinais clínicos (Tokarnia et al. 2000). Para testar seu efeito abortivo, foi administrada a cabras prenhes em doses únicas de 10, 20 e 40g/kg pv animal, utilizando duas cabras por dose. Todas as cabras pariram cabritos normais (Franklin Riet-Correa 2004, dados não publicados).

Este trabalho teve o objetivo de comprovar a toxicidade da P. foetida em caprinos, determinar se a planta contém glicosídeos cianogênicos e estabelecer se há variações de toxicidade em diferentes épocas do ano.

MATERIAL E MÉTODOS

Reprodução experimental

Para o desenvolvimento do experimento foram utilizados 29 caprinos (27 experimentais e 2 controles), da raça Moxotó, com bom estado nutricional. Os animais foram vermifugados com endectocida, a base de ivermectina, e submetidos a um período de adaptação, durante o qualforam alimentados com feno de capim Tifton (Cynodon dactylon) à vontade e concentrado a base de farelo de trigo, farelo de milho e ração comercial na quantidade equivalente a 1% do seu peso vivo. Os experimentos foram realizados nas dependências do Hospital Veterinário (HV) do Centro de Saúde e Tecnologia Rural (CSTR), Universidade Federal de Campina (UFCG), Campus de Patos, PB.

Foram utilizados dados pluviométricos da cidade de Patos, obtidos na estação meteorológica A321-INMET/ UFCG, localizado no Nupeárido da UFCG (altitude: 282m; Latitude: -07º04'47"; longitude: -37º16'22").

Exsicatas preparadas com amostras da planta foram enviadas para identificação para o botânico Dr. Odací de Oliveira, da Universidade Federal Rural do Semiárido (UFERSA), localizada no município de Mossoró, Rio Grande do Norte.

Inicialmente quando ainda não se sabia que a toxicidade de P. foetida era por cianeto a planta foi administrada ao Caprino 1 durante três dias. No primeiro e segundo dia (7 e 8 de novembro de 2007), recebeu 40g por kg de peso animal (g/kg) de folhas da planta coletada dois dias antes da administração. No terceiro dia com a administração da planta recém colhida, em um local diferente do anterior, o animal ingeriu, até apresentar sinais clínicos, somente 8g/ kg da planta. Posteriormente, os Caprinos 2, 3 e 4 receberam doses únicas de 4, 5 e 5g/kg, respectivamente. Para determinar a toxicidade em diferentes épocas do ano foram utilizados 23 animais experimentais (números 5-27), que receberam a planta em dose única de 10g/kg. Dois caprinos foram utilizados como controle. No total, incluindo os Caprinos 1 a 4, a planta foi administrada a 14 caprinos no período seco (junho a janeiro) e a 13 caprinos no período de chuva (fevereiro a maio). Em todos os experimentos foram administradas folhas de P. foetida coletadas no município de Patos e administradas manualmente por via oral colocando pequenas quantidades da planta na boca do animal até que o mesmo mastigasse e deglutisse totalmente. Antes da administração da planta, os animais passavam 24 horas em jejum, posteriormente eram pesados para só então ser determinada quantidade de planta a ser administrada. Foram verificadas antes e depois da administração as freqüências cardíaca, respiratória e movimentos ruminais.

Foi marcado tanto o tempo de administração da planta ao animal como também o tempo que o animal levava para apresentar os primeiros sinais clínicos de intoxicação logo após o término da ingestão da planta e o tempo de evolução. Os sinais clínicos foram classificados como leves, naqueles animais que permaneceram em estação; moderados, naqueles que se apresentaram em decúbito esterno-abdominal, e graves nos que passaram para a posição de decúbito lateral.

Os animais foram avaliados clinicamente e mediante observação do comportamento. Os caprinos que apresentaram sinais clínicos de decúbito esterno-abdominal ou decúbito lateral, foram tratados com uma solução de tiossulfato de sódio a 20% (com água destilada) na dosagem de 50ml/100kg por via endovenosa.

Foi realizada a análise estatística, mediante o teste de qui quadrado, para comparar a toxicidade da planta durante o período seco e período chuvoso.

Determinação da presença de HCN

Antes da administração da planta era feito o teste do papel picrosódico, utilizando uma solução preparada com 5g de carbonato de sódio e 0,5g de ácido pícrico completando com água destilada para 100ml de solução. O teste foi realizado molhando-se uma tira de papel filtro na solução picrosódica (papel-reagente) e colocando a tira de papel reagente em um recipiente fechado com amostra da planta macerada. Uma das pontas do papel (lado seco) era fixada na tampa do recipiente, de modo que essa tira ficasse suspensa livremente acima do material. Para determinar a presença de HCN observou-se a mudança de cor do papel, amarelo passando para laranja e podendo passar posteriormente para vermelho tijolo. A intensidade da reação do papel picrosódico foi classificada em reação acentuada (quando o tempo de mudança de coloração para vermelho foi de até 5 minutos), moderada (quando o tempo de mudança de coloração foi de 5-10 minutos), leve (quando o tempo de mudança de coloração foi de 10 minutos até três horas), e discreta (quando a mudança de coloração vermelha só ocorreu após 3 horas ou quando apenas mudou de coloração para a cor laranja).

RESULTADOS

Intoxicação experimental com as folhas frescas de Passiflora foetida no período de seca

O Caprino 1 recebeu a planta durante três dias. No primeiro e segundo dia (7 e 8 de novembro de 2007), recebeu 40g/kg da planta que tinha sido coletada dois dias antes da administração, em local diferente daquele onde se coletou a planta para os demais experimentos. Nestes dois primeiros dias o caprino não apresentou sinais de intoxicação. No terceiro dia, o animal começou a apresentar sinais clínicos após a ingestão de 8g/kg da planta, recentemente coletada em local diferente da anterior. Os sinais clínicos caracterizavam-se por apatia, pulso venoso positivo, ataxia, berros, taquicardia e taquipneia, midríase e decúbito esternal seguido por decúbito lateral. Vinte e cinco minutos após o início dos sinais clínicos suspeitaram tratar-se de uma intoxicação por cianeto e o animal foi tratado com tiossulfato de sódio, voltando ao normal após alguns minutos.

O Caprino 2 que recebeu 4g/kg apresentou sinais clínicos leves, caracterizados por apatia, taquicardia e dispnéia seguido de taquipnéia. O Caprino 3, que recebeu 5g/kg da planta, apresentou sinais semelhantes, alem de atonia ruminal. No mês de dezembro foi administrado ao Caprino 4 a mesma dose (5g/kg), que apresentou os mesmos sinais clínicos do Caprino 3.

Os Caprinos 10, 11 e 12 receberam a planta nos meses de setembro e início de outubro de 2008 ingerindo a dose de 10g/kg, não apresentando sinais clínicos. O Caprino 13, que recebeu a planta no final do mês de outubro de 2008, apresentou depressão, taquicardia, taquipnéia e atonia ruminal. Os caprinos que receberam a planta nos meses de novembro e dezembro na dose de 10g/kg (Caprinos 14, 15, 16, 17) apresentaram quadro semelhante (taquicardia, pulso venoso positivo, taquipnéia com dispnéia, dificuldade em equilibrar-se, atonia ruminal, depressão, berros), sendo que os Caprinos 16 e 17 apresentaram também nistagmo e a evolução dos sinais clínicos foi mais rápida.

Os Caprinos 18 e 19 que ingeriram a planta no mês de janeiro de 2009, apresentaram sinais clínicos semelhantes aos dos Caprinos 16 e 17, porém eles entraram em decúbito esterno abdominal, e foram tratados com a solução aquosa de tiossulfato de sódio a 20% na dosagem de 50ml/100kg de peso animal por via endovenosa.

Intoxicação experimental com as folhas frescas de Passiflora foetida no período chuvoso

Todos os animais deste período receberam a dose referente à 10g/kg. O Caprino 5 não apresentou sinais clínicos. Os Caprinos 6 e 7 referentes ao mês de abril e 8 e 9 referentes ao mês de maio receberam também a dose de 10g/kg, e também não apresentaram sinais clínicos.

O Caprino 20, que recebeu a planta no início do mês de fevereiro apresentou sinais clínicos leves, caracterizados por apatia, respiração abdominal, taquicardia, taquipnéia e diminuição dos movimentos ruminais.

Os Caprinos 21, 22, 23 e 24, referentes ao fim do mês de março até início do mês de abril, não apresentaramsinais de intoxicação. O Caprino 25, que ingeriu a planta no fim do mês de abril, apresentou discretos sinais clínicos (apatia leve taquicardia e taquipnéia com dispnéia). O Caprino 26 que ingeriu a planta no início do mês de maio, apresentou apatia, pulso venoso positivo, respiração abdominal, atonia ruminal, dificuldade em equilibrar-se, taquicardia e taquipnéia, enquanto que o Caprino 27 o qual ingeriu a planta no mês de maio não apresentou sinais clínicos.

Determinação da presença de HCN

Os resultados referentes à determinação do teor de glicosídeos cianogênicos, feito através do teste do papel picrosódico em 27 amostras de folhas frescas de P. foetida estão dispostos no Quadro 1. A Figura 2 representa os dados pluviométricos mensais e animais intoxicados durante o período do experimento. No teste do qui quadrado os resultados demonstraram que a frequência de animais intoxicados no período de seca (onze animais em um total de catorze) foi significativamente maior (p<0,05) que a frequência de intoxicação no período de chuva (três animais em um total de treze).



DISCUSSÃO

As informações obtidas neste trabalho revelam dados importantes em relação à ocorrência e epidemiologia da intoxicação por Passiflora foetida. A planta contém glicosídeos cianogênicos, em maior concentração durante a época da seca que durante a época de chuvas. Esses resultados sugerem que a intoxicação pode ocorrer, principalmente na época da seca, quando a planta é colocada a disposição dos animais de forma que estes a possam consumir em grandes quantidades durante um período curto de tempo, como mencionado por um produtor de caprinos do município de Tenório, na Paraíba, onde os animais ingeriram a planta verde, que tinha sido cortada e jogada para os animais.

A maior toxicidade da planta no período da seca é importante, pois é neste período que boa parte da vegetação desaparece, tornando assim esta planta, que é resistente às estiagens, disponível para a alimentação dos animais, oferecendo riscos de intoxicação. No Caprino 1, a planta coletada 24-48 horas antes não foi tóxica, o que sugere que semelhante ao que ocorre com Sorghum halepense (capim-de-boi) (Nóbrega et al. 2006) há uma rápida perda da toxicidade após o corte da planta. Pelo contrário outras plantas cianogênicas encontradas no semiárido como Manihot glaziovii (Amorim et al. 2005) e Cnidoscolus phyllacanthus (Oliveira et al 2008) mantêm a toxicidade por até 30 dias, enquanto que Piptadenia macrocarpa e P. viridiflora permanecem tóxicas após secagem por 6 e 14 meses (Brito et al. 2000).

O teste do papel picrosódico se mostrou eficiente para prever a toxicidade da planta, já que as amostras que apresentaram reações leves e moderadas (tempo de mudança de coloração para o vermelho de 10 minutos a 3 horas) resultaram tóxicas, enquanto que as com reação discreta (quando a mudança de coloração vermelha só ocorreu após 3 horas ou quando apenas mudou de coloração para a cor laranja) não induziram sinais clínicos.

Conclui-se que Passiflora foetida é uma planta cianogênica que pode causar intoxicação em ruminantes, principalmente durante o período seco; que a planta apresenta variações de toxicidade que podem ser determinadas pela utilização do teste do papel picrosódico; e que o tratamento com tiosulfato de sódio é eficiente para tratar a intoxicação.

Agradecimentos. Este trabalho foi financiado pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Para o Controle das Intoxicações por Plantas (CNPq, Proc. 573534/2008-0). Agradecemos ao botânico Professor Odacir de Oliveira pela identificação de Passiflora foetida e ao Professor Dr. Izaque Francisco C. de Mendonça por ter fornecido os dados pluviométricos da cidade de Patos.

Recebido em 14 de dezembro de 2010.

Aceito para publicação em 22 de janeiro de 2011.

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  • *
    Autor para correspondência;
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Jul 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 2011

    Histórico

    • Recebido
      14 Dez 2010
    • Aceito
      22 Jan 2011
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