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Determinação espectrofotométrica de alumínio em concentrados salinos utilizados em hemodiálise empregando pré-concentração em fluxo

Spectrophotometric aluminium determination in high salts concentrations solution used in hemodyalisis emploing preconcentration in flow injection

Resumo

An automatic flow injection procedure for spectrophotometric aluminium determination in purified water and solutions containing high salts concentrations used for hemodyalisis treatment was developed. The method was base on reaction of Al3+ with cianine eriochrome R (ECR) after preconcentration using the AG50W-X8 cationic-exchange resin. Elution was carried out using a 1 % (m/v) calcium chloride solution. The manifold comprised an automatic proporcional injector controlled by a computer equipped with an eletronic interface and software written in QuicBASIC 4.5 with facilities to control the injector and perform data acquisition. Samples with concentration ranging from 4.96 to 19.90 µg L-1 Al were analyzed and recoveries between 88 and 113% were obtained by using the standard addition method. Other profitable analytical characteristics such as a relative standard deviation 1.3 % (n = 10) for a typical sample 14.5 µg L-1 Al, a linear response ranging up to 60.0 µg L-1Al, and a sampling throughput of 10 determinations per hour were achieved. A detection limit of 4.2 µg L-1 Al was estimated as suggested by IUPAC.

preconcentration; aluminium; hemodyalisis


preconcentration; aluminium; hemodyalisis

Artigo

DETERMINAÇÃO ESPECTROFOTOMÉTRICA DE ALUMÍNIO EM CONCENTRADOS SALINOS UTILIZADOS EM HEMODIÁLISE EMPREGANDO PRÉ-CONCENTRAÇÃO EM FLUXO

Maria do Socorro Silva Pereira

Instituto de Química de São Carlos, Universidade de São Paulo, CP 780, 13560-970 São Carlos - SP

Boaventura Freire dos Reis*

Centro de Energia Nuclear na Agricultura, Universidade de São Paulo, CP 96, 13400-970 Piracicaba - SP

*e-mail: reis@cena.usp.br

Recebido em 8/8/01; aceito em 27/2/02

SPECTROPHOTOMETRIC ALUMINIUM DETERMINATION IN HIGH SALTS CONCENTRATIONS SOLUTION USED IN HEMODYALISIS EMPLOING PRECONCENTRATION IN FLOW INJECTION. An automatic flow injection procedure for spectrophotometric aluminium determination in purified water and solutions containing high salts concentrations used for hemodyalisis treatment was developed. The method was base on reaction of Al3+ with cianine eriochrome R (ECR) after preconcentration using the AG50W-X8 cationic-exchange resin. Elution was carried out using a 1 % (m/v) calcium chloride solution. The manifold comprised an automatic proporcional injector controlled by a computer equipped with an eletronic interface and software written in QuicBASIC 4.5 with facilities to control the injector and perform data acquisition. Samples with concentration ranging from 4.96 to 19.90 µg L-1 Al were analyzed and recoveries between 88 and 113% were obtained by using the standard addition method. Other profitable analytical characteristics such as a relative standard deviation 1.3 % (n = 10) for a typical sample 14.5 µg L-1 Al, a linear response ranging up to 60.0 µg L-1Al, and a sampling throughput of 10 determinations per hour were achieved. A detection limit of 4.2 µg L-1 Al was estimated as suggested by IUPAC.

Keywords: preconcentration; aluminium; hemodyalisis.

INTRODUÇÃO

O alumínio é o terceiro elemento mais abundante na crosta terrestre1 e sua presença em vegetais, utensílios domésticos, partículas de pó e na água pode ser facilmente verificada. Em vista disso, cerca de 10 a 100 mg desse elemento são ingeridos diariamente pelo ser humano. Embora essa quantidade pareça alta nem toda ela atinge a corrente sangüínea, pois apenas uma pequena parte é reabsorvida, sendo posteriormente eliminada pelos rins. Não há função bioquímica conhecida que seja executada pelo Al, contudo sua concentração média no sangue é em torno de 7 µg L-12-3.

A toxicidade do Al manifesta-se em pessoas com disfunção renal crônica, sendo que neste caso, os rins não conseguem eliminar o Al absorvido4. Essas pessoas são submetidas ao tratamento de hemodiálise, e a solução utilizada pode conter traços de Al como impureza. Dessa forma, o Al é inserido diretamente na corrente sangüínea, levando ao seu acúmulo nos ossos e no cérebro, causando doenças como a osteodistrofia renal e a encefalopatia dialítica5. Tendo em vista esses problemas, é necessário o controle deste elemento nas soluções de hemodiálise, através de um monitoramento periódico.

A Comissão da Comunidade Européia de Toxicologia para controle de alumínio fixou em 15 µg L-1 o limite tolerável em soluções de hemodiálise6. Em geral, a concentração salina nessas soluções é da ordem de 400 g L-1, o que dificulta a determinação7. As técnicas de detecção mais utilizadas são fluorescência de raios-X8, cromatografia líquida9, polarografia10, análise por ativação de nêutrons11 e espectrometria de absorção atômica em forno de grafite12-13. A espectrofotometria UV-Vis também tem sido empregada, recorrendo a uma etapa de separação e pré-concentração em linha baseada no processo de análise química por injeção em fluxo (FIA)14.

Neste trabalho foi desenvolvido um procedimento automatizado para determinação de alumínio em águas purificadas e em concentrados salinos utilizados em hemodiálise, empregando separação com resina de troca iônica, processo FIA e detecção espectrofotométrica.

PARTE EXPERIMENTAL

Soluções de reagentes e amostras

Todos os reagentes utilizados foram de grau analítico (Merck, Aldrich). As soluções utilizadas foram preparadas com água purificada em um sistema Milli-Q (resistência 18,2 MW cm) e armazenadas em recipientes plásticos previamente descontaminados.

Solução estoque de 1000 mg L-1 de Al foi preparada a partir do sal Al(NO3)3.9H2O. As soluções de referência contendo 0,0; 10,0; 20.0; 40,0; 60,0 e 80,0 µg L-1 de Al foram preparadas por diluição da solução estoque. Dois lotes destas soluções foram preparados, sendo um com água purificada (resistência 18,2 MW cm) e outro contendo 21,10 g de NaCl, 0,36 g de MgCl2, 0,77 g de CaCl2 e 0,38 g de KCl para 100 mL de solução.

Solução do eluente, cloreto de cálcio 1% (m/v) preparada de água. Solução do reagente cromogênico, cianina eriocromo R (ECR) 0,2 % (m/v), preparada em água.

O pH de todas as soluções (incluindo as amostras) foi ajustado para 6,0 com ácido clorídrico 1 mol L-1.

Uma massa de 150 mg da resina catiônica AG50W-X8 (Bio Rad, mesh 200-400) na forma sódica, foi acondicionada em uma mini-coluna construída em acrílico conforme descrito anteriormente15-16 em detalhes. A coluna foi acoplada ao injetor susbtituindo a alça de amostragem. Antes de iniciar o procedimento de análise, a solução do eluente foi bombeada durante 5 min, para prover o condicionamento da coluna. Em geral, trabalhava-se mais de um mês (200 h), sem precisar recarregar a coluna. A partir desse tempo, observava-se um decréscimo do sinal, então trocava-se a resina.

O vasilhame utilizado no preparo e armazenamento das soluções foi descontaminado, mantendo-se em uma solução de etanol (90 %) e ácido nítrico (10%) durante 48 h. Antes do uso era lavado abundantemente com água do sistema Milli-Q. As soluções foram estocadas em recipientes de polietileno.

As amostras, água purificada e concentrados salinos foram fornecidas pelo setor de nefrologia da Santa Casa de Misericórdia de Piracicaba - SP. Os concentrados salinos apresentavam as seguintes concentrações (m/v): NaCl 21%; MgCl2 0,36%; CaCl2 0,77% e KCl 0,38%.

Para o teste de recuperação foram adicionados 1 mL de uma solução contendo 1000 µg L-1 de Al em 50 ml da solução da amostra.

Equipamentos e acessórios

O sistema de análise compreendia um espectrofotômetro FEMTO, modelo 432, equipado com cela de fluxo de vidro com volume de 100 µL e caminho óptico de 10 mm; microcomputador PC 386 equipado com interface digital (PCL 711S) da América Advantech Co., a qual tem portas digitais para controle externo e conversor analógico/digital com 12 bits de resolução; bomba peristáltica Ismatec, modelo IPC-8, equipada com tubos de "Tygon" de diversos diâmetros internos; tubos de polietileno com 0,8 mm d.i.; injetor proporcional automático15 e coluna com a resina catiônica AG50W-X8 (200 a 400 mesh).

Descrição do procedimento

O módulo de análise foi projetado para efetuar a pré-concentração por tempo e o diagrama de fluxo é mostrado na Figura 1. Nesta posição do injetor, a solução da amostra (A) é bombeada através da coluna de resina (C) onde os cátions presentes são retidos; a solução do reagente (ECR) é bombeada através do injetor para a recuperação (Rec); e a solução do eluente (El) é bombeada através do reator (B) para o descarte. Quando o programa de controle era selecionado, o computador solicitava os valores das variáveis operacionais: intervalo de tempo de pré-concentração, intervalo de tempo de eluição, tempo de leitura e número de replicatas. Estes eram fornecidos via teclado, então, o computador assumia o controle do processo e deslocava a parte central do injetor para a posição de amostragem (Figura 1), enviando um pulso elétrico para o solenóide do injetor através da interface PCL 711S.


Após completar o tempo estabelecido para a etapa de pré-concentração, o injetor é comutado para a posição anterior dando procedimento à etapa de eluição. Nesta configuração, a solução do eluente flui através da coluna promovendo a eluição do analito. A solução do reagente era adicionada à zona do eluato na confluência (x) e a reação para formar o complexo a ser detectado ocorria durante o transporte da zona de amostra através do reator B. O sinal analítico era lido pelo microcomputador através da entrada analógica da interface (PCL 711S), a qual foi acoplada à saída analógica do espectrofotômetro utilizando-se um cabo blindado. Os dados eram salvos em arquivo do tipo ASCII para processamento posterior. Enquanto a etapa de leitura estava em curso, um gráfico do sinal em função do tempo era mostrado na tela do monitor de vídeo, permitindo sua visualização em tempo real. Finalizada a etapa de leitura do sinal, o injetor era deslocado para a posição de amostragem, dando início à próxima etapa de amostragem.

As variáveis que controlavam o processo e que foram estudadas: vazão de pré-concentração; intervalo de tempo do injetor na posição de amostragem; intervalo de tempo de eluição; vazão, concentração e natureza do fluido eluente; vazão da solução do reagente; comprimento da bobina de reação, foram otimizadas empregando soluções de referência. Após a otimização destas variáveis foram analisadas amostras de água purificada e concentrados salinos usados para preparar soluções de hemodiálise.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A quantidade do analito retido na coluna é função do intervalo de tempo de pré-concentração e da vazão da solução da amostra através da coluna. A vazão pode afetar as condições de sorção do analito. Assim, para verificar esse efeito, a vazão da solução da amostra foi variada de 0,5 a 2,8 mL min-1. Conforme mostra o gráfico da Figura 2, o sinal analítico aumentou até a vazão de 1,3 mL min-1, decrescendo para vazões maiores, sofrendo uma redução em torno de 30 e 50 % para a vazão de 2,4 e 2,8 mL min-1, respectivamente. O decréscimo de sinal observado pode ser atribuído à cinética de troca. O aumento da vazão da solução da amostra diminui o tempo de contato entre os íons do analito e os sítios ativos da resina, assim, afetando de forma desfavorável a reação de troca iônica15-16.


A vazão da solução de amostra foi fixada em 1,3 mL min-1, variou-se o intervalo de tempo de permanência da coluna na posição de amostragem (pré-concentração) e os resultados obtidos são mostrados na Figura 3. Observa-se um crescimento do sinal praticamente linear até o intervalo de tempo de 240 s. O comportamento assintótico observado para tempos maiores pode ser atribuído à saturação dos sítios ativos da resina. Convém lembrar que outros cátions presentes na solução da amostra (K+, Na+, Ca2+, Mg2+) também eram retidos na coluna, contribuindo para a saturação da resina. As seletividades destes cátions para AG50W-X8 são menores que a do alumínio (Na+ 1,5; K+ 2,5; Ca2+ 3,9; Mg2+ 2,5)17, entretanto, o decréscimo observado pode ser atribuído ao efeito de massa, pois a concentração de cada um destes cátions era muito maior que a do alumínio.


Em vista destes resultados, selecionou-se o intervalo de 240 s e a vazão de 1,3 mL min-1 (volume = 5,3 mL) para os testes seguintes. Avaliou-se o efeito do comprimento da bobina de reação e conforme mostra a curva da Figura 4, a diminuição do sinal foi da ordem de 90 % comparando os resultados referentes às bobinas de 150 e 25 cm. O decréscimo do sinal com o aumento do comprimento do percurso analítico é uma característica intrínseca dos sistemas de análise em fluxo18 e pode ser afetado pelo desenvolvimento da reação e pelo volume da amostra. Os resultados observados neste experimento indicam que o analito é liberado da coluna em um pequeno volume e que o desenvolvimento da reação, praticamente, havia se completado. As condições de acoplamento com a cela de fluxo do espectrofotômetro não permitiram efetuar experimentos com reatores de menor comprimento, então, o reator de 25 cm de comprimento foi escolhido.


Como eluente foram experimentadas as soluções de CaCl2 e de BaCl2, ambas 1,0% (m/v), sendo que melhores resultados foram obtidos com a solução de cloreto de cálcio. O intervalo de tempo para eluição com o íon Ba2+ era maior. Este efeito poderia ser atribuído a uma menor eficiência no processo de troca, embora os dois cátions tenham a mesma carga. Consultando-se a tabela de seletividade da resina17 encontram-se os valores 3,9 para o Ca2+ e 8,7 para o Ba2+, assim, esperava-se que o bário fosse um eluente mais eficiente que o cálcio. Em geral, os testes de seletividade são efetuados em condições de equilíbrio o que não ocorre em sistema FIA, assim, outras características dos cátions podem influenciar o processo de troca.

A partir dos experimentos descritos nos parágrafos anteriores estabeleceu-se os valores expressos a seguir para as variáveis de controle do procedimento analítico. Vazão da solução da amostra, 1,3 mL min-1; tempo de pré-concentração, 240 s; vazão da solução do reagente, 0,8 mL min-1; vazão da solução do eluente, 1,3 mL min-1; e tempo de eluição, 100 s. Uma vez estabelecidos estes parâmetros, um conjunto de amostras de água purificada e de concentrados salinos usados para preparar soluções de hemodiálise foram analisadas e os resultados são mostrados na Tabela 1.

Para estimar o limite de detecção, a solução do branco foi processada 10 vezes consecutivas empregando os mesmos parâmetros de controle do sistema estabelecido para processar as soluções da amostra. Segundo a sugestão da IUPAC19, foi considerado como três vezes o desvio padrão do branco dividido pelo coeficiente angular da curva analítica e o valor encontrado foi de 4,2 µg L-1 de alumínio.

A validação dos resultados foi estimada empregando o método da adição de padrão e observa-se que a faixa de recuperação variou de 88 a 113 %, o que pode ser considerado ótimo para esse tipo de amostra18.

Outras características analíticas importantes tais como: desvio padrão relativo de 1,7 % (n =10); resposta linear em uma faixa de 10,0 a 60,0 µg L-1 de Al; consumo de reagente (cianina eriocromo R) 5,2 mg por determinação; freqüência de amostragem, 10 determinações por h foram observadas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Nov 2002
  • Data do Fascículo
    Nov 2002

Histórico

  • Aceito
    27 Fev 2002
  • Recebido
    08 Ago 2001
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