Acessibilidade / Reportar erro

CONDENSAÇÃO ALDÓLICA DE FURFURAL E ACETONA CATALISADA POR BASES ORGÂNICAS NITROGENADAS: UM ESTUDO PRELIMINAR DE DESEMPENHO CATALÍTICO VISANDO A PRODUÇÃO DE BIOQUEROSENE DE AVIAÇÃO

ALDOL CONDENSATION OF FURFURAL WITH ACETONE CATALYZED BY NITROGENATED ORGANIC BASES: A PRELIMINARY STUDY OF THE CATALYTIC PERFORMANCE TOWARD THE PRODUCTION OF BIOJET FUEL

Resumo

The aldol condensation between furfural and acetone was studied in the presence of organic bases, such as Piperazine (PIP), 3-Aminopropyltriethoxysilane (APTES) and 1,5,7-Triazabicyclo [4.4.0] dec-5-ene (TBD), as basic catalysts. The latter base showed the highest conversion rates of furfural and high selectivity to the single-condensation product 4-(2-Furyl)-3-buten-2-on (F-Ac). These data are consistent with the greater basicity of TBD in relation to the other amines. This study was carried out aiming at the future anchoring of the bases in inorganic supports for the production of heterogeneous catalysts.

Keywords:
furfural; acetone; aldol condensation; TBD


Keywords:
furfural; acetone; aldol condensation; TBD

INTRODUÇÃO

Novas alternativas tecnológicas sustentáveis têm sido desenvolvidas no sentido de buscar novos caminhos para substituir os combustíveis de origem fóssil. A produção de biocombustíveis é uma das formas de se gerar energia a partir de recursos renováveis.11 Mota, J. A. J.; Monteiro, R. S.; Quim. Nova 2013, 36, 1483.

2 Suarez, P. A. Z.; Santos, A. L. F.; Rodrigues, J. P.; Alves, M. B.; Quim. Nova 2009, 32, 768.

3 Rodrigues, J. A. R.; Quim. Nova 2011, 34, 1242.

4 Azadi, P.; Malina, R.; Barrett, S. R. H.; Kraft, M.; Renewable Sustainable Energy Rev. 2017, 76, 1479.
-55 Dabdoub, M. J.; Bronzel, J. L.; Quim. Nova 2009, 32, 776. O bioquerosene de aviação é um biocombustível inovador ainda pouco explorado, porém, com grande potencial devido à possibilidade de uso de matéria-prima oriunda de biomassa.66 Lima, P. S.; Ferreira, L. A.; Freitas, L. H.; Rheinheimer, M. W.; Sokolovicz, Y. C. A.; Schrekker, H. S.; J. Braz. Chem. Soc. 2014, 25, 2266.,77 Diederichs, G. W.; Mandegari, M. A.; Farzad, S.; Görgens, J. F.; Bioresour. Technol. 2016, 216, 331.

O processo de produção de biocombustível envolve não somente a escolha da matéria-prima, mas também a escolha de uma rota química para geração do produto. Quatro rotas tecnológicas de produção de bioquerosene vêm recebendo destaque:88 Silva, N. L.; Maciel, M. R. W.; Maciel Filho, R.; Batistella, C. B.; PI0803465-6, 2008.

9 Chiaramonti, D.; Prussi, M.; Buffi, M.; Tacconi, D.; Appl. Energy 2014, 136, 767.

10 Cremonez, P. A.; Feroldi, M.; Araújo, A. V.; Borges, M. N.; Meier, T. W.; Feiden, A.; Teleken, J. G.; Renewable Sustainable Energy Rev. 2015, 43, 1063.
-1111 West, R. W.; Liu, Z. Y.; Dumesic, J. A.; ChemSusChem. 2008, 1, 417.

  1. transesterificação/descarbonilação/hidrogenação de óleos vegetais e gorduras;

  2. síntese de Fischer-Tropsch a partir de biomassa (processos BTL);

  3. hidroprocessamento de óleo vegetal;

  4. condensação aldólica e hidrogenação de furfural e derivados.

As rotas são interessantes sob o ponto de vista sustentável. No entanto, possuem grandes desafios, uma vez que exploram um campo ainda não economicamente rentável. As rotas (a) e (c) têm como fonte de biomassa os triglicerídeos, já a última rota tem como fonte a decomposição de açúcares presentes em biomassa lignocelulósica, podendo ter alto potencial para produção de biocombustíveis.1010 Cremonez, P. A.; Feroldi, M.; Araújo, A. V.; Borges, M. N.; Meier, T. W.; Feiden, A.; Teleken, J. G.; Renewable Sustainable Energy Rev. 2015, 43, 1063.

11 West, R. W.; Liu, Z. Y.; Dumesic, J. A.; ChemSusChem. 2008, 1, 417.

12 Mccall, M. J.; Kocal, J. A.; Bhattacharyya, A.; Kalnes, T. N.; Brandvold, T. A.; US8039682B2, 2011.
-1313 Maciel Filho, R.; Batistella, C.; Maciel, Wolf, M. R.; Silva, N. L.; AS 0667963097BR - C1, 2012. A hidrólise de celulose e hemicelulose, seguida da degradação ácida da glicose e xilose produzidas formam o 5-hidroximetilfurfural e o furfural, respectivamente. A condensação aldólica entre o furfural e acetona pode formar compostos oxigenados de maior cadeia que, uma vez hidrogenados, podem produzir alcanos na faixa de 8 a 16 átomos de carbono, ideal para a produção de querosene de aviação. A reação envolve a formação do intermediário 4-(2-Furil)-4-hidroxi-2-butanona (F-OH) que, na sequência, desidrata formando o produto insaturado 4-(2-Furil)-3-buten-2-ona (F-Ac). Este produto pode reagir com uma segunda molécula de furfural e formar o 1,4-pentadien-3-ona-1,5-di-2-furanil (F-Ac-F)1414 Fakhfakh, N.; Cognet, P.; Cabassud, M.; Lucchese, Y.; Los Rios, M. D.; Chem. Eng. Process 2008, 4, 349. conforme o esquema reacional mostrado na Figura 1.

Figura 1
Condensação aldólica entre a acetona e o furfural

A presença de catalisadores básicos na condensação aldólica entre furfural e a acetona é imprescindível.1515 Sun, Y.; Cheng, J.; Bioresour. Technol. 2002, 83, 1.,1616 Huber, G. W.; Dumesic, J. A.; Catal. Today. 2006, 111, 119. Muitos processos químicos industriais utilizam catalisadores em pelo menos uma das etapas. Um catalisador deve apresentar altas taxas de conversão e seletividade aos produtos desejados.1717 Shreve, R. N.; Brink, J. A. J.; Chemical Process Industries, 4th ed., McGraw-Hill: Washington, 1997. Dumesic e colaboradores publicaram1818 Huber, G. W.; Dumesic, J. A.; Science 2005, 308, 1446. um trabalho referente à produção de n-alcanos líquidos por uma rota química baseada em carboidratos de biomassa ligninocelulósica. A combinação sequencial de reações de hidrólise/desidratação de polissacarídeos, condensação aldólica e hidrogenação, forma uma rota química atraente, recentemente aplicada na formulação de combustíveis automotivos. A desidratação foi realizada por catalisadores ácidos, a condensação aldólica por catalisadores sólidos básicos e a desidratação/hidrogenação por catalisadores de metais nobres suportados. A principal ideia é a utilização de um reator catalítico de quatro fases com entradas para cada componente: reagentes orgânicos em meio aquoso, hexadecano, gás hidrogênio e catalisador. O hexadecano torna a fase orgânica mais hidrofóbica removendo as espécies hidrofóbicas (produtos) do catalisador antes de haver a deposição de coque no catalisador.

West, Dumesic e colaboradores empregaram um sistema bifásico, utilizando tetraidrofurano (THF), com objetivo de separar os produtos solúveis no meio orgânico e insolúveis em água. O cloreto de sódio é usado para diminuir a miscibilidade entre as fases orgânica e aquosa.1111 West, R. W.; Liu, Z. Y.; Dumesic, J. A.; ChemSusChem. 2008, 1, 417. No entanto, diante do uso do solvente orgânico e quantidade de água no processo, o sistema bifásico não parece ser a melhor alternativa para produção dos n-alcanos lineares. Constata-se, também, a formação de ácidos orgânicos que podem neutralizar o catalisador básico.1919 West, R. M.; Liu, Z. Y.; Peter, M.; Gartner, C. A.; Dumesic, J. A.; J. Mol. Catal. A 2008, 296, 18. Catalisadores óxidos metálicos e hidrotalcitas em meio aquoso foram, também, testados na reação.2020 Faba, L.; Diaz, E.; Ordonez, S.; Biomass Bioenergy 2013, 56, 592.,2121 Xu, C.; Liu, Y. G. X.; Xin, R.; Wang , Z.; RSC Adv. 2013, 3, 793. Há estudos sobre a aplicação de catalisadores zeolíticos em testes catalíticos na reação de condensação aldólica.2222 Kikhtyanin, O.; Chlubná, P.; Jindrová, T.; Kubicka, D.; Dalton Trans. 2014, 43, 10628.,2323 Kikhtyanina, O.; Kelbichová, V.; Vitvarová, D.; Kubu, M.; Kubicka, D.; Catal. Today 2014, 227, 154.

Esta rota foi testada com três catalisadores diferentes usados em cada etapa. Inicialmente, os carboidratos foram hidrolisados na presença de HCl e transformados em hemicelulose e oligômeros de xilose. Na sequência, os açúcares foram desidratados para formar o furfural. A reação de condensação aldólica entre furfural e acetona, seguida da hidrogenação dos intermediários formados, produziu n-alcanos. A reação de condensação aldólica foi catalisada por NaOH levando a excelentes rendimentos. Os catalisadores metálicos suportados utilizados nas reações de hidrogenação foram Pd/Al2O3 e Pt/NbOPO4.1111 West, R. W.; Liu, Z. Y.; Dumesic, J. A.; ChemSusChem. 2008, 1, 417.

Os compostos orgânicos com funções aminas possuem características básicas de Lewis e de Bronsted. O 1,5,7-Triazabiciclo[4.4.0]dec-5-eno (TBD) é uma base forte com valor de pKa do ácido conjugado igual 26.2424 Schroeder, G.; Luska, B.; Jarczewski, A. Nowak-Wydra, B.; Brzezinski, B.; J. Mol. Struct. 1995, 344, 77. O TBD tem sido usado na catálise de algumas reações orgânicas como, por exemplo, na reação de Henry,2525 Simoni, D.; Rondanin, R.; Morini, M.; Baruchello, R.; Invidata, F. P.; Tetrahedron Lett. 2000, 41, 1607. na reação de Michael,2626 Horvath, A.; Tetrahedron Lett. 1996, 37, 4423. reação de Horner-Wadsworth-Emmos,2727 Simoni, D.; Rossi, M.; Rondanin, R.; Mazzali, A.; Baruchello, R.; Malagutti, C.; Roberti, M.; Invidata, F. P.; Org. Lett. 2000, 2, 3765. Claisen-Schimidt2828 Cota, I.; Medina, F.; Sueiras, J.; Tichit, D.; Tetrahedron Lett. 2011, 52, 385. e entre benzaldeído e 1-metoxi-2-metil-1-trimetil siloxipropeno.2929 Srivastava, R.; J. Mol. Catal. A 2007, 264, 146. Nosso grupo empregou esta base ancorada em sílica mesoporosa na transesterificação de óleos vegetais para produção de biodiesel, obtendo excelentes rendimentos.3030 De Lima, A. L.; Mbengue, A.; Gil, R. A. S.; Ronconi, C. M.; Mota, C. J. A.; Catal. Today 2014, 226, 210. 3-Aminopropil trietoxisilano (APTES) possui um grupoamino primário, enquanto que a piperazina tem estrutura cíclica com a presença de dois grupos aminos secundários. Elas possuem valores de pKa do ácido conjugado igual a 10,5 e 9,8, respectivamente. Ambas já foram aplicadas em reações de condensação de Knoevenagel3131 Rana, S.; Jonnalagadda, S. B.; Catal. Commun. 2017, 92, 31.

32 Shanmuganathan, S.; Greiner, L.; de María, P. D.; Tetrahedron Lett. 2010, 51, 6670.
-3333 Das,S. K. ; Wang, X.; Ostwal, M. M.; Zhao, Y. F.; Han, Y.; Lai, Z.; Chem. Eng Sci. 2016, 145, 21. e também na captura de dióxido de carbono.3333 Das,S. K. ; Wang, X.; Ostwal, M. M.; Zhao, Y. F.; Han, Y.; Lai, Z.; Chem. Eng Sci. 2016, 145, 21.,3434 Vilarrasa-García, E.; Cecilia, J. A.; Azevedo, D.C.S.; Cavalcante Jr., C.L.; Rodríguez-Castellon, E.; Microporous Mesoporous Mater. 2017, 249, 25. A Figura 2 mostra as estruturas químicas dos compostos orgânicos.

Figura 2
Estrutura química de compostos amino-orgânicos (a) APTES, (b PIP e (c) TBD

No presente trabalho, propõe-se empregar compostos orgânicos básicos com grupamentos funcionais amino primário, secundário e terciário, com diferentes basicidades, visando um estudo preliminar catalítico com aplicação na reação de condensação aldólica entre furfural e acetona. Os compostos testados foram a Piperazina (PIP), o 3-Aminopropiltrietoxisilano (APTES) e o 1,5,7-Triazabiciclo[4.4.0]dec-5-eno (TBD). A ideia é poder verificar a viabilidade de ancoragem destas bases em suportes inorgânicos visando a heterogeneização posterior do sistema catalítico.

PARTE EXPERIMENTAL

Reagentes e solventes

Furfural e acetona foram adquiridos da Sigma-Aldrich, em grau analítico, bem como as bases orgânicas piperazina (PIP), 3-Aminopropiltrietoxisilano (APTES) e 1,5,7-Triazabiciclo[4.4.0]dec-5-eno (TBD).

Avaliação catalítica

A avaliação catalítica foi realizada variando-se os seguintes parâmetros: tipo e quantidade de catalisador (TBD, APTES e PIP), temperatura de reação e razão molar Acetona/Furfural. A quantidade de furfural nas reações foi de 1 mL. Assim, para razão molar 10:1 acetona: furfural a quantidade de acetona foi de 9 mL. Em todos os testes de avaliação catalítica a agitação no reator tipo Parr foi mantida em 900 rpm. Após o final de cada experimento foi retirada uma alíquota do meio reacional e solubilizada em acetato de etila, sendo então analisada em equipamento de cromatografia gasosa acoplada a espectrômetro de massas. A coluna cromatográfica foi do tipo HP-5 (5% Fenil, 95% Dimetilpolisiloxano) com comprimento de 30 m, espessura de filme igual a 0,25 µm e diâmetro interno de 0,25 mm. As condições de análise foram: temperatura inicial de forno igual a 50 °C, tempo inicial de 1,5 min e temperatura máxima em 250 °C. A taxa de aquecimento é igual a 15 °C min-1, modo split 100:1. A conversão de furfural, seletividade ao F-Ac e frequência de turnover estão descritas pelas equações 1, 2, 3 e 4, tendo sido obtidas a partir das análises cromatográficas através de curvas de calibração.

(1) Convers ã o Furfural % = mols furfural in í cio mols furfural final mols furfural in í cio

(2) Seletividade F AC % = mols F Ac mols Furfural in í cio mols furfural final

(3) Frequ ê ncia de turnover = mols F Ac mols TBD . tempo

(4) Ren dim ento % = mols F Ac mols furfural in í cio

Na primeira série de testes catalíticos avaliou-se a atividade dos catalisadores TBD, APTES e PIP frente à reação de condensação aldólica entre a acetona e furfural a 50 °C, durante 7 h, com 1,4 mol% de catalisador/mol de furfural e razão molar 10:1 acetona/furfural. Alguns efeitos de variáveis independentes reacionais foram estudados ao melhor catalisador avaliado: temperatura, quantidade de catalisador e razão molar acetona/furfural.

Na segunda série de testes de avaliação catalítica, o catalisador 1,5,7-Triazabiciclo[4.0.0]dec-5-eno (TBD) foi testado frente à condensação aldólica entre a acetona e o furfural, 1,4 mol% catalisador/mol furfural em todos os experimentos. Cada experimento foi avaliado em diferentes temperaturas: 25 °C, 50 °C, 75 °C e 100 °C. O tempo reacional foi igual a 7 h e a razão molar 10:1 acetona/furfural.

Na terceira série de testes de avaliação do catalisador, todos os experimentos foram feitos à temperatura de 50 °C,variando-se a quantidade de catalisador 0,7; 1,4; 3 e 6 mol% de catalisador/mol de furfural. O tempo reacional experimental foi de 7 h e a razão molar acetona /furfural foi de 10:1 em todos os experimentos da série.

Na quarta série de testes de avaliação catalítica a temperatura reacional foi mantida a 50 ºC durante 6 h e variou-se a razão molar acetona/furfural. Foram testadas as razões molares acetona/furfural de 1:2, 1:1, 5:1, 10:1 e 15:1. A quantidade de catalisador 1,4 mol% de catalisador/mol furfural foi mantida constante em todos os testes.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Comparação de catalisadores à base amino-orgânica

Na primeira série de testes catalíticos os três catalisadores, TBD, APTES e PIP foram comparados na reação de condensação aldólica entre furfural e acetona. A Figura 3 mostra a conversão de furfural com o tempo. Nota-se a maior atividade catalítica do TBD, que promoveu 100% de conversão após cerca de 7 horas de reação. Neste mesmo tempo, o APTES converteu pouco mais de 47% de furfural e a PIP apenas cerca de 15%. A justificativa pode ser relacionada à basicidade das aminas. O pKa dos ácidos conjugados do TBD é igual a 26, enquanto que o pKa do APTES e PIP são 10,5 e 9,8, respectivamente. Nestes testes catalíticos observou-se somente o intermediário F-OH e o produto insaturado F-Ac. Inicialmente, a base remove o hidrogênio alfa da acetona resultando em espécie rica em elétrons denominada enolato (carbânion). Este íon é estabilizado pela deslocalização de carga por ressonância em direção ao átomo de oxigênio. A seguir, o carbânion ataca a carbonila do furfural formando uma nova ligação C-C. Após transferência de próton é formado o intermediário F-OH. Na sequência, pode ocorrer nova abstração do próton ácido adjacente à carbonila para gerar um enolato, o qual pode, na sequência, eliminar grupamento OH- para gerar o produto insaturado 4-(2-Furil)-3-buteno-2-ona (F-Ac).

Figura 3
Conversão do furfural com o tempo de reação.Condições reacio nais: 50 °C, 1,4 mol% de catalisador/mol furfural, razão molar acetona/furfural 10:1

A Tabela 1 mostra os resultados de conversão e seletividade para os catalisadores a 50 ºC e 2 h de reação. A frequência de turnover [F.T.] foi calculada como parâmetro de atividade catalítica. Nota-se que o catalisador TBD teve maior frequência de turnover, logo maior atividade catalítica quando comparado aos catalisadores APTES e PIP. A seletividade ao F-Ac também foi maior com o catalisador TBD, corroborando a hipótese de sua maior basicidade ser a responsável pelo melhor desempenho catalítico, tanto em termos de conversão como de seletividade ao produto desejado.

Tabela 1
Desempenho catalítico dos catalisadores PIP, APTES e TBD a 50 ºC e 2 h

Os testes catalíticos seguintes foram realizados com o catalisador TBD, já que foi o que promoveu o melhor desempenho nos testes comparativos. Os experimentos foram realizados com objetivo de investigar a influência das variáveis independentes na conversão de furfural e seletividade ao produto F-Ac. Os efeitos estudados foram a temperatura, quantidade de catalisador (mol% catalisador/mol de furfural) e razão molar acetona/furfural. O estudo destes efeitos busca encontrar uma faixa operacional de testes experimentais de reação para avaliar a viabilidade do uso de TBD ancorado em suportes inorgânicos utilizados como catalisadores heterogêneos.

Efeito da temperatura na atividade catalítica do TBD

O efeito da temperatura de reação foi estudado devido à sua importância na cinética de reação. Além disso, altas temperaturas podem favorecer a degradação do furfural, podendo formar co-produtos orgânicos ácidos, que podem neutralizar a base e limitar a formação de produtos da condensação. A Figura 4 mostra o perfil da conversão de furfural e seletividade ao produto F-Ac ao longo do tempo na faixa de temperatura investigada. Foram realizados quatro testes visando a comparação entre diferentes temperaturas 25 °C, 50 °C, 75 °C e 100 °C, usando 1,4 mol% de catalisador TBD/mol de furfural e 7 h de reação. A conversão do furfural variou de 60% a 100% com o aumento da temperatura entre 25 °C e 100 °C. Nota-se que os resultados a 75 e 100 ºC não diferem significativamente, com 100% de conversão na primeira hora de reação. Em todos os experimentos houve somente a formação do intermediário F-OH e do produto F-Ac. A 25 °C, ainda com baixa conversão de furfural, observa-se uma maior seletividade ao intermediário F-OH e baixa seletividade ao produto F-Ac. O teste a 50 °C já mostra maiores conversões de furfural e diminuição da seletividade ao intermediário F-OH, com prevalência do produto F-Ac. Nas temperaturas mais altas, a conversão é igualmente maior assim como a seletividade ao F-Ac, que é praticamente o único produto observado conforme mostra na Figura 5.

Figura 4
Influência da temperatura na conversão do furfural. Condições reacionais: 1,4 mol% catalisador TBD/mol furfural, razão molar acetona/furfural igual 10:1; 7 h de reação

Figura 5
Influência da temperatura na seletividade do produto F-Ac. Con dições reacionais: 1,4 mol% catalisador TBD/mol furfural, razão molar acetona/furfural igual 10:1; 7 h de reação

Efeito da quantidade de catalisador TBD

A Figura 6 descreve os resultados obtidos variando-se as quantidades de catalisador TBD. A conversão de furfural aumenta com uma maior quantidade molar da base, como era de se esperar. Com 6 mol% de TBD/mol de furfural observa-se 100% de conversão em menos de 1 h de reação. Este mesmo valor de conversão é alcançado em cerca de 2 h quando se usa 3 mol% de TBD/mol de furfural. No valor de 1,4 mol% de TBD/mol de furfural a conversão integral só é obtida após cerca de 7 h; com o valor de 0,7 mol de TBD/mol de furfural a conversão atinge em torno de 40% após 7 h.

Figura 6
Efeito da quantidade de TBD na conversão de furfural. Condições reacionais: 50 °C, razão molar acetona/furfural igual 10:1 e 7 h de reação

A Figura 7 mostra a seletividade ao produto F-Ac. Nota-se que com a maior quantidade de base a seletividade chega a 100% em menos de 1 h de reação. Para o valor de 3 mol% de TBD/mol de furfural a seletividade de 100% é atingida entre 2 e 3 h. Nos outros dois casos, o intermediário F-OH é sempre observado no intervalo de tempo estudado. Para uma quantidade de 1,4 mol% de TBD/mol de furfural a seletividade ao F-Ac é de 95% após 7 h, enquanto que para 0,7 mol% de TBD/mol de furfural a seletividade a este produto é em torno de 20%, após as mesmas 7 h.

Figura 7
Efeito da quantidade de TBD na seletividade ao produto F-Ac ao longo do tempo de reação. Condições reacionais: 50 °C, razão molar acetona/furfural igual 10:1 e 7 h de reação

Os dados de conversão e seletividade mostram que é importante ajustar uma concentração de base ao meio reacional. Maiores quantidades levam, como esperado, a menores tempos para se atingir conversão e seletividade de 100%. Todavia, uma maior quantidade de base incorre num maior custo operacional, já que a base TBD não é barata. Assim, uma quantidade entre 1,4 e 3 mol% de TBD/mol de furfural parece a ideal para comprometer bons resultados de conversão e seletividade a um custo aceitável para o processo.

Efeito da razão molar acetona/furfural

Na quarta série de experimentos, o objetivo foi comparar a atividade catalítica do TBD em diferentes razões molares acetona/furfural. As condições reacionais foram 50 °C em 6 h de reação. Em todos os experimentos houve somente a formação do intermediário F-OH e do produto F-Ac. A Tabela 2 mostra os resultados. É possível verificar que a conversão de furfural e seletividade ao F-Ac é crescente quando a razão molar acetona/furfural aumenta de 1:2 até 15:1.

Tabela 2
Efeito da razão molar acetona/furfural na reação em temperatura de 50 ºC e 1,4 mol% de TBD/mol furfural

A primeira etapa no mecanismo da condensação aldólica é a desprotonação da acetona para formação do enolato que, em seguida, ataca a molécula de furfural. A maior razão molar acetona/furfural favorece a reação, pois aumenta a concentração do enolato no meio reacional e, por conseguinte, a conversão do furfural. Dessa maneira, a taxa de reação depende da quantidade de sítios básicos e da formação de intermediários enolatos.

COMPARAÇÃO ENTRE TBD E OUTROS CATALISADORES

O catalisador TBD foi comparado com catalisadores heterogêneos, como óxidos mistos e hidrotalcitas. Os resultados estão representados na Tabela 3. Nota-se que o TBD possui maior atividade e seletividade que os catalisadores básicos heterogêneos mais tradicionais. Os óxidos mistos de MgO-ZrO2 (entrada 2) e MgO-Al2O3 (entrada 3) apresentam conversões menores, assim como menor seletividade ao produto F-Ac, numa mesma temperatura reacional. Vale salientar que nestes experimentos a razão molar acetona/furfural foi de 1:1, mas o tempo foi significativamente maior, assim como a quantidade molar de catalisador. Já para a hidrotalcita de Co e Al, numa mesma razão molar de 10:1 de acetona/furfural, a conversão foi de 83%, mas a 120 ºC e 10 h de reação. Estes dados mostram que o TBD tem grande potencial de ser utilizado como catalisador nesta reação, sobretudo se for ancorado em um suporte inorgânico, com vistas à reutilização do catalisador.

Tabela 3
Comparação entre catalisadores TBD, óxidos metálicos e hidrotalcitas

CONCLUSÕES

Três diferentes tipos de catalisadores básicos foram testados em reação de condensação aldólica entre a acetona e o furfural. O composto orgânico 1,5,7-Triazabiciclo[4.4.0]dec-5-eno (TBD) teve melhor atividade catalítica comparada à Piperazina (PIP) e ao 3-Aminopropil trietoxisilano (APTES), apresentando maior conversão de furfural, e seletividade ao 4-(2-Furil)-3-buten-2-ona. Este resultado está associado à maior basicidade do TBD em comparação com as outras aminas.

Experimentos de variação de condições reacionais mostraram que conversão de 100% pode ser alcançada em temperaturas de 75 ºC em cerca de 1 h de reação. A quantidade molar de base em relação ao furfural, bem como a razão molar acetona/furfural, afetam significativamente a conversão e seletividade da reação. Um percentual de TBD de 3% molar em relação ao furfural já permite obter 100% de conversão e seletividade em 3 h, enquanto uma razão molar de acetona/furfural de 10:1 parece ser a mais adequada para obtenção de alta conversão e seletividade.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem as agências de fomento CAPES, CNPq e FAPERJ (E-26/202.741/2016) pelo suporte financeiro.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Mota, J. A. J.; Monteiro, R. S.; Quim. Nova 2013, 36, 1483.
  • 2
    Suarez, P. A. Z.; Santos, A. L. F.; Rodrigues, J. P.; Alves, M. B.; Quim. Nova 2009, 32, 768.
  • 3
    Rodrigues, J. A. R.; Quim. Nova 2011, 34, 1242.
  • 4
    Azadi, P.; Malina, R.; Barrett, S. R. H.; Kraft, M.; Renewable Sustainable Energy Rev. 2017, 76, 1479.
  • 5
    Dabdoub, M. J.; Bronzel, J. L.; Quim. Nova 2009, 32, 776.
  • 6
    Lima, P. S.; Ferreira, L. A.; Freitas, L. H.; Rheinheimer, M. W.; Sokolovicz, Y. C. A.; Schrekker, H. S.; J. Braz. Chem. Soc. 2014, 25, 2266.
  • 7
    Diederichs, G. W.; Mandegari, M. A.; Farzad, S.; Görgens, J. F.; Bioresour. Technol. 2016, 216, 331.
  • 8
    Silva, N. L.; Maciel, M. R. W.; Maciel Filho, R.; Batistella, C. B.; PI0803465-6, 2008
  • 9
    Chiaramonti, D.; Prussi, M.; Buffi, M.; Tacconi, D.; Appl. Energy 2014, 136, 767.
  • 10
    Cremonez, P. A.; Feroldi, M.; Araújo, A. V.; Borges, M. N.; Meier, T. W.; Feiden, A.; Teleken, J. G.; Renewable Sustainable Energy Rev. 2015, 43, 1063.
  • 11
    West, R. W.; Liu, Z. Y.; Dumesic, J. A.; ChemSusChem. 2008, 1, 417.
  • 12
    Mccall, M. J.; Kocal, J. A.; Bhattacharyya, A.; Kalnes, T. N.; Brandvold, T. A.; US8039682B2, 2011
  • 13
    Maciel Filho, R.; Batistella, C.; Maciel, Wolf, M. R.; Silva, N. L.; AS 0667963097BR - C1, 2012
  • 14
    Fakhfakh, N.; Cognet, P.; Cabassud, M.; Lucchese, Y.; Los Rios, M. D.; Chem. Eng. Process 2008, 4, 349.
  • 15
    Sun, Y.; Cheng, J.; Bioresour. Technol 2002, 83, 1.
  • 16
    Huber, G. W.; Dumesic, J. A.; Catal. Today. 2006, 111, 119.
  • 17
    Shreve, R. N.; Brink, J. A. J.; Chemical Process Industries, 4th ed., McGraw-Hill: Washington, 1997.
  • 18
    Huber, G. W.; Dumesic, J. A.; Science 2005, 308, 1446.
  • 19
    West, R. M.; Liu, Z. Y.; Peter, M.; Gartner, C. A.; Dumesic, J. A.; J. Mol. Catal. A 2008, 296, 18.
  • 20
    Faba, L.; Diaz, E.; Ordonez, S.; Biomass Bioenergy 2013, 56, 592.
  • 21
    Xu, C.; Liu, Y. G. X.; Xin, R.; Wang , Z.; RSC Adv. 2013, 3, 793.
  • 22
    Kikhtyanin, O.; Chlubná, P.; Jindrová, T.; Kubicka, D.; Dalton Trans. 2014, 43, 10628.
  • 23
    Kikhtyanina, O.; Kelbichová, V.; Vitvarová, D.; Kubu, M.; Kubicka, D.; Catal. Today 2014, 227, 154.
  • 24
    Schroeder, G.; Luska, B.; Jarczewski, A. Nowak-Wydra, B.; Brzezinski, B.; J. Mol. Struct. 1995, 344, 77.
  • 25
    Simoni, D.; Rondanin, R.; Morini, M.; Baruchello, R.; Invidata, F. P.; Tetrahedron Lett. 2000, 41, 1607.
  • 26
    Horvath, A.; Tetrahedron Lett. 1996, 37, 4423.
  • 27
    Simoni, D.; Rossi, M.; Rondanin, R.; Mazzali, A.; Baruchello, R.; Malagutti, C.; Roberti, M.; Invidata, F. P.; Org. Lett. 2000, 2, 3765.
  • 28
    Cota, I.; Medina, F.; Sueiras, J.; Tichit, D.; Tetrahedron Lett. 2011, 52, 385.
  • 29
    Srivastava, R.; J. Mol. Catal. A 2007, 264, 146.
  • 30
    De Lima, A. L.; Mbengue, A.; Gil, R. A. S.; Ronconi, C. M.; Mota, C. J. A.; Catal. Today 2014, 226, 210.
  • 31
    Rana, S.; Jonnalagadda, S. B.; Catal. Commun. 2017, 92, 31.
  • 32
    Shanmuganathan, S.; Greiner, L.; de María, P. D.; Tetrahedron Lett. 2010, 51, 6670.
  • 33
    Das,S. K. ; Wang, X.; Ostwal, M. M.; Zhao, Y. F.; Han, Y.; Lai, Z.; Chem. Eng Sci. 2016, 145, 21.
  • 34
    Vilarrasa-García, E.; Cecilia, J. A.; Azevedo, D.C.S.; Cavalcante Jr., C.L.; Rodríguez-Castellon, E.; Microporous Mesoporous Mater. 2017, 249, 25.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    17 Out 2017
  • Aceito
    05 Mar 2018
  • Publicado
    04 Abr 2018
Sociedade Brasileira de Química Secretaria Executiva, Av. Prof. Lineu Prestes, 748 - bloco 3 - Superior, 05508-000 São Paulo SP - Brazil, C.P. 26.037 - 05599-970, Tel.: +55 11 3032.2299, Fax: +55 11 3814.3602 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: quimicanova@sbq.org.br