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Contaminação de produtos de higiene e cosméticos por n-nitrosaminas

Contamination of cosmetics and personal care products by n-nitrosamines

Resumo

N-nitrosamines are carcinogenic compounds that have been found during the last three decades in a variety of consumer products, including cosmetic and personal care products, and their raw materials. These compounds are formed from amine precursors and nitrosating agents present in the formulations. This paper reviews the formation and occurrence of N-nitrosamines in cosmetic products, as well as presents considerations about analytical, toxicological and regulatory aspects.

N-nitrosamines; cosmetic products; analytical methods


N-nitrosamines; cosmetic products; analytical methods

REVISÃO

Contaminação de produtos de higiene e cosméticos por n-nitrosaminas

Contamination of cosmetics and personal care products by n-nitrosamines

Susanne Rath* * e-mail: raths@iqm.unicamp.br ; Larissa S. Canaes

Departamento de Química Analítica, Instituto de Química, Universidade Estadual de Campinas, CP 6154, 13084-971 Campinas - SP, Brasil

ABSTRACT

N-nitrosamines are carcinogenic compounds that have been found during the last three decades in a variety of consumer products, including cosmetic and personal care products, and their raw materials. These compounds are formed from amine precursors and nitrosating agents present in the formulations. This paper reviews the formation and occurrence of N-nitrosamines in cosmetic products, as well as presents considerations about analytical, toxicological and regulatory aspects.

Keywords: N-nitrosamines; cosmetic products; analytical methods.

INTRODUÇÃO

As N-nitrosaminas são compostos N-nitrosos, considerados potentes carcinógenos, que podem estar presentes em uma grande variedade de produtos como alimentos, bebidas, medicamentos, amostras biológicas como saliva, sangue e tecidos; agrotóxicos, produtos de borracha, amostras ambientais como solo, água, efluentes e ar; cosméticos, entre outros.

As N-nitrosaminas tornaram-se objeto de intensivos estudos toxicológicos nos últimos cinquenta anos, mais precisamente a partir de 1954, quando os cientistas britânicos Magee e Barnes reportaram, de forma inédita, sobre a associação entre danos hepáticos em ratos e a N-nitrosodimetilamina (NDMA).1 Dois anos mais tarde, os mesmos pesquisadores confirmaram a indução de tumores hepáticos em ratos que foram alimentados com NDMA.2

Durante o período de 1957 a 1962, na Noruega, observou-se que animais alimentados com ração de peixe, à qual tinha sido adicionada de elevadas concentrações de nitrito, apresentaram desordens hepáticas e câncer. Estudos revelaram que a ração estava contaminada com NDMA, que foi formada a partir da nitrosação de aminas presentes na ração.3

Durante a década de 60, muitos outros relatos ocorreram quanto à presença e formação de N-nitrosaminas em ração, o que motivou cientistas de todo mundo a investigar a presença destes compostos em outras matrizes, o que de fato se comprovou. N-nitrosaminas foram encontradas na cerveja comercializada na Alemanha e em diferentes tipos de alimentos, especialmente produtos cárneos curados.

A indústria de cosméticos não ficou de fora desta problemática e tomou ciência da possível presença de N-nitrosaminas em cosméticos em um Encontro da Sociedade Americana de Químicos (American Chemical Society), em 1977, quando foi reportada por Fine, pela primeira vez, a contaminação de produtos de higiene e cosméticos pela N-nitrosodietanolamina (NDELA).4

Desde então, diversas N-nitrosaminas foram encontradas em cosméticos em todo mundo e o assunto continua sendo amplamente discutido.

O presente artigo de revisão apresenta uma discussão sobre a formação e ocorrência de N-nitrosaminas em diversas formulações cosméticas e produtos de higiene, bem como os principais métodos para determinação desses compostos, aspectos toxicológicos e de legislação, assim como dados quanto ao nível de concentração destes contaminantes tóxicos encontrados em diferentes formulações.

PROPRIEDADES QUÍMICAS E FÍSICO-QUÍMICAS DAS N-NITROSAMINAS

As N-nitrosaminas são compostos N-nitrosos alifáticos ou aromáticos que apresentam um grupo funcional nitroso ligado a um átomo de nitrogênio. As propriedades físico-químicas dependem dos radicais ligados ao átomo de nitrogênio, sendo que as N-nitrosaminas podem se encontrar nas formas sólida, líquida ou gasosa.5

As N-nitrosaminas podem ser sintetizadas a partir do ácido nitroso e aminas secundárias. O primeiro relato da síntese de N-nitrosaminas data de 1853.6

De modo geral, as N-nitrosaminas são estáveis em meios neutros e fortemente básicos e, portanto, uma vez formadas são dificilmente destruídas. No entanto, se decompõem lentamente quando expostas à radiação ultravioleta formando aldeídos, nitrogênio e óxido nitroso, ou aminas e ácido nitroso.5,7 Em meio fortemente ácido ocorre clivagem do grupo nitroso, sendo que a reação pode ser catalisada pela presença de nucleófilos como iodeto, tiocianato, brometo e/ou cloreto. Um reagente comumente utilizado para destruir N-nitrosaminas é o ácido bromídrico em ácido acético glacial.7

As estruturas das N-nitrosaminas mais comumente encontradas em cosméticos e produtos de higiene estão apresentadas na Tabela 1.8-10

As N-nitrosaminas são geralmente formadas e/ou sintetizadas pela reação de uma amina secundária com agentes nitrosantes, como nitrito. Mas também podem ser formadas a partir da nitrosação de aminas primárias ou terciárias.

O mecanismo envolvido na nitrosação de aminas secundárias pelo íon nitrito está apresentado nas reações 1 a 3. Na Equação 4 está descrita a expressão da velocidade da reação global.

Uma vez que o agente nitrosante é formado a partir de duas moléculas de ácido nitroso, a reação total é de segunda ordem em relação à concentração deste. A reação de formação da N-nitrosamina depende do pH, uma vez que é favorecida quando a amina se encontra na sua forma não protonada (meio básico) e quando ocorre a formação do anidrido nitroso a partir do nitrito (favorecido em meio ácido). O pH ótimo de nitrosação em meio aquoso para aminas que apresentam um pKa > 5 é na faixa de 3,0 a 3,4; ou seja, próximo do pKa do ácido nitroso. Para um mesmo pH, a velocidade de nitrosação da amina aumenta em função da diminuição da basicidade da mesma.11,12

A reação de nitrosação de aminas secundárias pode ser catalisada por ânions nucleofílicos como tiocianato, cloreto, brometo e outros.11-13

Como potentes inibidores da reação de nitrosação destacam-se o ácido ascórbico, α-tocoferol, ácido sulfâmico, entre outros. Esses compostos competem com a amina pelo agente nitrosante.11-13 As reações envolvidas serão discutidas mais adiante.

ASPECTOS TOXICOLÓGICOS

Os compostos N-nitrosos e, em particular, as N-nitrosaminas, são considerados potentes carcinógenos, além de apresentarem ação teratogênica e mutagênica em animais de laboratório.14-16 Efeitos carcinogênicos de N-nitrosaminas já foram observados em mais de 40 espécies de animais, inclusive em macacos.14

As N-nitrosaminas, de modo geral, requerem ativação metabólica para exercerem sua ação carcinogênica (Figura 1). A primeira etapa da biotransformação envolve uma hidroxilação do carbono α do grupo alquila, catalisada pela mono-oxigenase de função mista do Citocromo P450, principalmente o CYP2E1 e sua isoforma CYP2A6, formando um aldeído ou cetona e uma N-nitrosamina primária, instável, a qual tautomeriza para um alquildiazoidróxido. Este azoidróxido pode dar origem a um íon diazônio que pode levar à alquilação de sítios nucleofílicos do DNA, RNA e proteínas.11 Esta biotransformação é considerada a etapa fundamental na iniciação do câncer.


No caso da NDELA, foi verificado que a β-oxidação é a principal via de disposição metabólica em roedores.17 A conversão da NDELA para N-nitroso-N-2-hidroxietilglicina ocorre via formação da N-nitroso(2-hidroxietil)-N(formilmetil)amina, a qual existe em equilíbrio com o seu hemiacetal cíclico, a N-nitroso-2-hidroximorfolina. A β-oxidação é catalisada preferencialmente pelo aldeído desidrogenase nas frações microssomais hepáticas (S9) de roedores do que pelas mono-oxigenases microssomais.18

A indução de tumores pode ocorrer em diferentes órgãos, dependendo da estrutura química da N-nitrosamina, da dose, da via de exposição e da espécie animal. Embora não existam evidências diretas da incidência de câncer em humanos, como resultado da exposição às N-nitrosaminas, presume-se que o homem também seja sensível à ação tóxica desses compostos.16,19

As N-nitrosaminas são absorvidas rapidamente no trato gastrointestinal e também através da pele.20 A NDELA é absorvida pela pele e acumulada em órgãos como fígado, bexiga e outros, onde induz efeitos tóxicos crônicos. Dietanolamina e trietanolamina, comumente encontrada como matéria-prima de produtos cosméticos, não são consideradas carcinogênicas, mas podem causar irritação na pele e nas mucosas, além de servirem como precursoras da formação de N-nitrosaminas.10

Embora muitas N-nitrosaminas avaliadas sejam consideradas carcinogênicas em animais de laboratórios, o efeito adverso causado pela presença desses compostos em produtos cosméticos depende de vários fatores, como estrutura do composto, concentração, tipo de formulação cosmética, frequência de uso do produto, grau de absorção da N-nitrosamina pela pele e estabilidade frente à radiação UV.21

A NDELA é carcinogênica em ratos após administração oral e em hamsters após injeção subcutânea. Foram observados nos ratos carcinomas hepatocelulares e adenomas renais e nos hamsters, adenocarcinomas na cavidade nasal, tumores na traquéia, adenomas hepatocelulares e fibrosarcomas locais.22

A N-nitrosomorfolina (NMOR) é carcinogênica em camundongos, hamsters e várias espécies de peixe. Foi observada, após administração oral, a formação de tumores malignos e benignos no fígado, pulmão e vasos sanguíneos em ratos. Além disso, foi verificado que a NMOR é carcinogênica após administração em uma única dose.22

A NDEA e a NDMA são carcinogênicas em todos os animais testados, entre esses ratos, camundongos, hamsters, coelhos, macacos, peixes, sapos, porcos, cães e aves. Os principais órgãos afetados são o fígado, trato digestório e rins.22

N-nitrosaminas em produtos de higiene e cosméticos

A palavra "cosmético" deriva da palavra grega kosmetikós, que significa "hábil em adornar". Há milhares de anos homens e mulheres vêm utilizando cosméticos. Arqueólogos encontraram em túmulos egípcios de aproximadamente 3.500 a.C. sinais do uso de pintura para os olhos e unguentos aromáticos.23

Muitos estudos foram conduzidos após a primeira confirmação da presença de NDELA em cosméticos em 1977 e foi comprovado o potencial de nitrosação de várias matérias-primas empregadas na indústria cosmética. Em alguns casos, as N-nitrosaminas são formadas pela nitrosação de componentes primários de matéria-prima, enquanto em outras situações a presença é decorrente da matéria-prima contaminada por aminas nitrosáveis. Entre as aminas nitrosáveis em cosméticos destacam-se os emulsificadores trietanolamina e dietanolamina. Embora a reação de nitrosação da trietanolamina seja mais lenta, por ser uma amina terciária, esse emulsificador muitas vezes contém como contaminante a dietanolamina, amina secundária facilmente nitrosável.21

Entre os possíveis agentes nitrosantes em cosméticos destacam-se os conservantes gem-nitroalogenados como o 2-bromo-2-nitro-1,3 propanodiol (Bronopol®) e o 5-bromo-5-nitro-1,3 dioxano (Bronidox®). Tem sido verificada a formação da NDELA a partir da liberação de nitrito destes conservantes com posterior reação com dietanolamina ou trietanolamina.24,25

Mais de 8000 matérias-primas são usadas na formulação de produtos cosméticos. Muitas destas são potenciais fontes da formação de N-nitrosaminas, entre essas, amidas, alcanolaminas, alcanolamidas de ácido graxos, óxidos de amina e aminas. Essas matérias-primas têm as funções de: espessantes, umectantes, emolientes, tensoativos, estabilizadores de espuma, hidratantes, lubrificantes, protetores de pele e anti-irritantes. De modo geral, as matérias-primas usadas na indústria cosmética variam em grau de pureza e, assim, algumas trietanolaminas podem conter dietanolaminas em uma percentagem que chega até 15%. A amina secundária pode sofrer nitrosação e, assim, ser responsável pela presença de N-nitrosaminas na formulação.21

Como potenciais agentes nitrosantes em cosméticos destacam-se o nitrito, óxidos de nitrogênio, alquil nitritos e nitrocompostos. Nitritos podem estar presentes como contaminantes em matérias-primas de cosméticos como resultado de estocagem em recipientes tratados com nitrito ou como impureza resultante de reações de nitração durante o processo de síntese. Um estudo realizado com quatorze diferentes matérias-primas orgânicas revelou que 14% de um total de 114 amostras continham nitrito em uma concentração superior a 50 µg kg-1. Matérias-primas inorgânicas e pigmentos usados como ingredientes em cosméticos também podem ser fontes de nitrito em produtos acabados. Em um estudo realizado com 63 matérias-primas inorgânicas, o nitrito foi encontrado em 70% das amostras analisadas em níveis de concentração acima de 1 mg kg-1. Entretanto, foi verificado que o nitrito proveniente de pigmentos inorgânicos não contribui significativamente para formação de N-nitrosaminas em produtos cosméticos.21

O 2-bromo-2-nitro-1,3-propanodiol libera nitrito lentamente com o tempo e, portanto, é um agente nitrosante in situ em produtos cosméticos contendo esse conservante.

Óxidos de nitrogênio, presentes normalmente no ar, especialmente em ar poluído, são também considerados potentes agentes nitrosantes em cosméticos. O anidrido nitroso (N2O3) e dióxido de dinitrogênio (N2O4) são capazes de nitrosar aminas em condições alcalinas e o NO2 é prontamente absorvido do ar pela trietanolamina. Uma vez o cosmético aplicado na pele, a água da emulsão cosmética evapora, deixando essencialmente uma camada não aquosa. O óxido de nitrogênio, facilmente absorvido por matrizes não polares, pode nitrosar aminas presentes na formulação e ser responsável pela formação de N-nitrosaminas in situ.21

Estudos adicionais sugerem que outros agentes nitrosantes podem se formar em produtos cosméticos a partir de reações de componentes das matérias-primas, como alcanolaminas, com nitrito ou óxidos de nitrogênio para produzir alquil nitritos. Alquil nitritos são efetivos agentes nitrosantes, mesmo em condições não ácidas.21

A formação de N-nitrosaminas em matrizes cosméticas é complexa porque muitas formulações são constituídas de emulsões, ou seja, contendo uma fase aquosa e outra não aquosa (oleosa). Enquanto aminas, como dietanolamina e trietanolamina, e também nitrito são solúveis na fase aquosa, alcanolamidas ácidas de cadeias longas e óxidos de nitrogênio são encontrados na fase oleosa. Isto sugere que exista provavelmente mais de um mecanismo que explique a formação de N-nitrosaminas em matrizes cosméticas, dependendo fundamentalmente dos precursores e de suas solubilidades relativas em cada fase.21

Estudos realizados por Powell26 constataram que a trietanolamina, contendo aproximadamente 15% de dietanolamina, não é nitrosada pelo nitrito para formar N-nitrosodietanolamina (NDELA) em sistemas não aquosos. Entretanto, seguindo com a adição de ácido esteárico, ocorre a formação de NDELA. Neste caso, o ácido esteárico interage com o nitrito carregando o agente nitrosante para a fase não aquosa. Pelas mesmas razões, a nitrosação de óleos solúveis trietanolamina-estearato ocorre mais rapidamente em solventes não polares. A presença de surfactantes também afeta a nitrosação de aminas em sistemas de emulsão, pelo fato de alterarem a distribuição dos precursores nas duas fases.

Apesar da velocidade de nitrosação em matrizes cosméticas ser muitas vezes lenta é importante considerar que os produtos cosméticos podem permanecer estocados por um extenso período de tempo e que durante esse período a reação, desde que contenha os precursores presentes, continua se processando. A reação pode ser acelerada pela temperatura.

Um protetor solar contendo como ingrediente ativo o 2-etilexil 4-(N,N-dimetilamino) benzoato (Padimato O) e 2-bromo-2-nitro-1,3-propanodiol foi analisado em 1987, sendo que não foi detectada a presença de N-nitrosaminas nesta ocasião. Quando o mesmo produto foi analisado após 3 anos, apresentou uma concentração de 8 mg kg-1 de N-nitrosaminas derivadas de uma amina secundária tipicamente encontrada no Padimato O. Portanto, os produtos que podem ser expostos ao sol e temperatura podem levar à formação de elevados níveis de N-nitrosaminas durante o período de estocagem. Produtos sazonais como protetores solares que não são vendidos até o final do verão podem ser estocados até o ano seguinte e as condições de armazenamento podem afetar os níveis de N-nitrosaminas nestes produtos.21

Além desses fatores, também existem compostos que têm a habilidade de catalisar reações de nitrosação, como é caso de ânions nucleofílicos, entre esses, tiocianato, cloreto e brometo. A velocidade de nitrosação é dependente da basicidade da amina. Assim sendo, a velocidade de nitrosação, na presença do catalisador, foi incrementada para as aminas fracamente básicas.13 Ainda, foi verificado que a nitrosação de dialquilaminas de cadeia longa pode ser acelerada pela presença de surfactantes que formam agregados micelares. A extensão do efeito catalítico depende do tamanho da cadeia da amina, uma vez que estas se tornam mais solúveis na fase micelar à medida que a cadeia aumenta. O aumento da velocidade de nitrosação pode ser explicado, em parte, através das interações eletrostáticas na superfície da micela, as quais desestabilizam a amina protonada em relação a sua forma livre, assim como também pela maior solubilidade do agente nitrosante (anidrido nitroso) na fase micelar.13

Produtos cosméticos são geralmente protegidos contra contaminação por bactérias e fungos, através da adição de conservantes que podem ou não liberar formaldeídos. Geralmente o pH do meio se encontra na faixa de 6 a 8. O conservante 2-bromo-2-nitro-1,3-propanodiol tem sido extensivamente avaliado acerca do seu papel na formação de N-nitrosaminas27 visto que, em pH alcalino, o composto sofre decomposição liberando formaldeído e nitrito.28 Foi comprovada a formação de NDELA a partir da presença de dietanolamina em pH 6.29

No entanto, a formação de N-nitrosaminas pode ser inibida com a adição de inibidores de nitrosação à formulação cosmética, como ácido sulfâmico, sulfamato de amônio, ácido tânico, α-tocoferol, ácido ascórbico, entre outros. Os inibidores reduzem rapidamente o agente nitrosante. Entre os inibidores, o ácido ascórbico tem sido o mais estudado. A reação envolvida está apresentada a seguir (5):

Uma vez que o NO pode ser reoxidado pelo ar atmosférico ao anidrido nitroso, é importante que um excesso de ácido ascórbico seja adicionado para inibir a nitrosação em sistemas que sejam expostos ao ar.12

Alguns estudos têm identificado inibidores de nitrosação eficazes para produtos cosméticos. Para emulsões cosméticas são necessários inibidores para as fases hidrofóbicas e hidrofílicas, para garantir que a inibição seja eficiente em ambas as fases. Muitos inibidores solúveis em água têm sido avaliados, incluindo ácido ascórbico, ascorbato de sódio, sorbato de potássio, bissulfito de sódio e propil galato.29-33 Os inibidores solúveis em óleo que têm sido investigados incluem butil-hidroxitolueno (BHT), butil-hidroxianisol, α-tocoferol, e ascorbil palmitato.31,34,35 Ácido ascórbico e bissulfito de sódio foram os mais eficientes, inibindo a nitrosação em praticamente 99%. Butil-hidroxitolueno, α-tocoferol, ascorbato de sódio e ascorbil palmitato foram inibidores eficazes em alguns casos, mas não em todos os sistemas estudados.

A ação inibidora do ácido ascórbico sobre a reação de nitrosação de aminas foi descoberta acidentalmente na formulação do analgésico aminopirina, quando foi impedida a formação de NDMA. Posteriormente, foi observado que esta vitamina inibia fortemente a formação de compostos N-nitrosos a partir da maioria das aminas e amidas.36 Também foi verificado que a administração conjunta de ácido ascórbico e aminas ou amidas em animais inibe os efeitos hepatotóxicos, carcinogênicos e teratogênicos provenientes da síntese endógena de N-nitrosaminas ou nitrosamidas.37

Para garantir a diminuição da formação de N-nitrosaminas nos produtos cosméticos é importante que sejam tomados cuidados, como redução do uso de agentes nitrosantes responsáveis pela formação de N-nitrosaminas como nitrito, gases nitrosos (NOx) e/ou conservantes que liberam nitrito (compostos gem-nitroalogenados); substituição de aminas facilmente nitrosáveis por outras aminas que são menos facilmente nitrosáveis, por exemplo, aminas primárias38 e controle da matéria-prima quanto à presença de N-nitrosaminas.

Dunnett e Telling35 realizaram um estudo para avaliar a eficiência do butil-hidroxitolueno, α-tocoferol e ascorbato em inibir a formação de N-nitrosaminas em cosméticos que continham 0,01% do conservante 2-bromo-2-nitro-1,3-propanodiol. Os autores verificaram que a adição de 0,01% de butil-hidroxitolueno, 0,01% de ascorbato e 0,2% de α-tocoferol no cosmético que continha 0,05% de 2-bromo-2-nitro-1,3-propanodiol inibe a formação de NDELA (concentração menor que 2,5 µg kg-1). Ainda, uma vez que o ascorbato ou butil-hidroxitolueno, em concentrações elevadas, provocam o escurecimento do produto cosmético, devido à oxidação, é recomendado que o teor de 2-bromo-2-nitro-1,3-propanodiol adicionado seja menor do que 0,01% e seja usado α-tocoferol em uma concentração de 0,2% ou butil-hidroxitolueno de 0,02 a 0,1%.

Challis e colaboradores estudaram a cinética de nitrosação da morfolina em meio aquoso (pH 5-7) na presença de nitrito e formaldeído e verificaram que o processo segue quatro rotas distintas (Figura 2). Três rotas envolvem uma nitrosação eletrofílica da amina neutra ou N-hidroximetilamina, formada previamente pela reação da amina com formaldeído. A outra possibilidade envolve uma reação nucleofílica do íon nitrito com um íon imínio derivado da N-hidroximetilamina. Sendo assim, é necessário que dois tipos de inibidores sejam adicionados aos cosméticos para inibir de forma eficiente a formação de N-nitrosaminas: um composto sequestrador de XNO (antioxidantes) e um composto que reaja com o íon imínio (composto nucleofílico).39


Ocorrência de N-nitrosaminas em produtos cosméticos

Devido à grande variedade de aminas contidas nas matérias-primas que são utilizadas em produtos de higiene e cosméticos, existe a possibilidade da formação de diversas N-nitrosaminas se agentes nitrosantes estiverem presentes. Estudos realizados comprovaram que cosméticos que continham elevados níveis de N-nitrosaminas também continham elevados níveis de agentes nitrosantes. No entanto, não existe correlação consistente entre o total de agentes nitrosantes e níveis de N-nitrosaminas encontrados.21

Tem sido destacado o número de trabalhos publicados a respeito do teor de N-nitrosaminas em produtos de higiene e cosméticos, sendo que a maioria deles se relaciona com o teor de NDELA, NMOR e NDMA nestes produtos.10 Cabe ressaltar que a maioria dos dados foram publicados nas décadas de 80 e 90. No entanto, os poucos artigos publicados nos últimos 5 anos indicam que o problema ainda não foi resolvido e que ainda se encontram no mercado cosméticos contaminados com N-nitrosaminas.

Um estudo realizado pela agência norte americana FDA (Food and Drug Administration), no período de 1978 a 1980, detectou NDELA em 110 de 252 produtos contendo trietanolamina na formulação e 25 de 64 produtos não contendo essa amina terciária.40

Estudos realizados por Spiegelhalder e Preussmann41 com produtos comercializados na Alemanha comprovaram a contaminação de um número considerável de produtos de higiene e cosméticos por N-nitrosaminas. De 145 amostras analisadas, 50 (34,5%) continham NDMA, enquanto que 26 (18%) continham NMOR. A quantidade máxima encontrada para NDMA foi de 24 µg kg-1 e para NMOR foi de 640 µg kg-1, ambas em amostras de xampu. Apenas em 3 amostras foram encontradas outras N-nitrosaminas de baixa massa molar: N-nitrosodietilamina (15 µg kg-1) em uma amostra de creme para banho e ambas N-nitrosodi-n-propilnitrosamina (35 µg kg-1) e N-nitrosodi-n-butilnitrosamina (15 µg kg-1) foram detectadas em uma amostra de espuma para banho. A NDELA foi encontrada em 25 amostras (17%), sendo a maior concentração (1400 µg kg-1) encontrada numa amostra de produto para banho infantil.41

Em outro estudo foram avaliados cosméticos comercializados na Alemanha no ano de 1986 e foi verificado que 40% estavam contaminados com NDELA em concentrações variando de 7 a 2000 µg kg-1. Depois do Ministério da Saúde da Alemanha (BGA, Bundesgesundsheitamt) ter recomendado o não uso de aminas secundárias em cosméticos, um novo estudo foi realizado, em 1987, onde foi verificado que apenas 13% dos produtos cosméticos disponíveis no mercado da Alemanha continham NDELA em concentrações na faixa de 10 a 235 µg kg-1.42

Em outro trabalho foi relatada a contaminação de cosméticos por NDELA em uma concentração de até 47000 µg kg-1.4,43

Na análise de protetores solares (loções) comercializados em Israel foi verificada a presença de NDELA em 3 das 20 amostras analisadas em uma concentração na faixa de 17 a 27 µg kg-1.44

Em pesquisa realizada com cosméticos incluindo géis, loções, xampus, cremes, condicionadores e espumas para banho disponíveis no mercado holandês foram constatadas a presença de NDELA em níveis de 46 a 7644 µg kg-1, sendo que os níveis mais altos foram encontrados em amostras de gel para cabelo, seguido das amostras de gel de banho.45

No entanto, níveis bem menores foram detectados por Wang e colaboradores em amostras de xampu, espuma de banho e cremes para pele. A média dos valores encontrados foi de 1,26; 1,49; 3,43; e 2,49 mg L-1 para N-nitrosodietanolamina (NDELA), N-nitroso-bis-(2-hidroxipropilamina (NBHPA), N-nitrosodi-n-propilamina (NDPLA) e N-nitrosodifenilamina (NDPHLA), respectivamente.46

Embora alguns produtos não apresentem contaminação por N-nitrosaminas, foi verificado que produtos estocados por certos períodos podem levar à formação desses compostos. Matyska e colaboradores10 verificaram a presença de NDELA em cosméticos estocados por 5 e 15 anos.

ASPECTOS DE LEGISLAÇÃO

As estruturas que regulam os cosméticos diferem significativamente entre os países e estão longe de estarem harmonizadas. De modo geral, os produtos cosméticos estão sujeitos a controles regulatórios em todos os países, visando garantir a segurança de uso dos produtos e evitar efeitos adversos sobre a saúde dos consumidores. É importante destacar que a falta de harmonização entre os mercados pode levar a barreiras alfandegárias.47

Enquanto produtos específicos podem ser incluídos na categoria de cosméticos em um país, em outros, o mesmo produto pode ser classificado como medicamento, quasi-medicamento (Quasi-drug) ou até mesmo medicamento vendido sem prescrição médica (OTC, Over-the-counter drug) (Tabela 2).

De acordo com a classificação, os produtos estão sujeitos a diferentes regimes regulatórios, o que pode alterar desde os requerimentos para sua aprovação, até limitar o uso de determinados ingredientes na sua formulação.

Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), "Cosméticos, Produtos de Higiene e Perfumes são preparações constituídas por substâncias naturais ou sintéticas, de uso externo nas diversas partes do corpo humano, pele, sistema capilar, unhas, lábios, órgãos genitais externos, dentes e membranas mucosas da cavidade oral, com o objetivo exclusivo ou principal de limpá-los, perfumá-los, alterar sua aparência e/ou corrigir odores corporais e/ou protegê-los ou mantê-los em bom estado". (Anexo I da Resolução 211 - DOU 14/07/05 - ANVISA). Estes são classificados, de acordo com os artigos 3º e 26º da Lei 6.360/76 e artigos 3º, 49º e 50º do Decreto 79094/77.48 Os produtos cosméticos estão enquadrados em quatro categorias: 1 - Produtos de higiene; 2 - Cosmético; 3 - Perfume e 4 - Produto de uso infantil. São classificados quanto ao grau de risco que oferecem: Grau 1 - Produtos com risco mínimo e Grau 2 - Produtos com risco potencial. Os critérios para essa classificação foram definidos em função da finalidade de uso do produto, áreas do corpo abrangidas, modo de usar e cuidados a serem observados, quando de sua utilização (Resolução nº 79, de 28 de agosto de 2000 - ANVISA).48

Na Comunidade Européia a estrutura regulatória é fornecida pela Diretiva 76/768/EEC e de seus subsequentes adendos. A regulação de substâncias é baseada em listas positivas e negativas.47

A Agência Americana (FD&C Act, Food, Drugs and Cosmetic Act) define duas categorias: cosméticos e medicamentos, incluindo na última categoria também os OTC.

Em 1979, o FDA dos Estados Unidos publicou uma portaria solicitando às indústrias ações para reduzir os níveis de NDELA em produtos de uso pessoal. Estas indústrias foram obrigadas a tomar medidas imediatas para eliminar a possível existência de NDELA e outras N-nitrosaminas em produtos cosméticos.49

Mais tarde, o Ministério da Saúde na Alemanha (BGA), em 1987, também publicou várias recomendações para a indústria cosmética no intuito de reduzir os níveis de N-nitrosaminas presentes nos produtos. Estas recomendações consideravam que aminas secundárias não deveriam ser utilizadas nesses produtos. Ácido graxos de dietanolamidas deveriam conter um teor menor possível de dietanolamina, a pureza da trietanolamina deveria ser maior que 99%, e que todos esses produtos deveriam conter menos de 1% de dietanolamina, menos de 0,5% de monoetanolamina e menos de 50 µg kg-1 de NDELA.50

Já em 1992, a Comissão Européia publicou diretrizes legais para restringir a ocorrência de N-nitrosaminas em cosméticos e regulamentar a pureza da matéria-prima. A diretriz 92/86/EEC preconiza que os produtos cosméticos devem ser ausentes de N-nitrosaminas e a matéria-prima não deverá conter mais do que 50 µg kg-1 de NDELA.51

No entanto, atualmente, diretrizes das agências reguladoras como ANVISA e da Comunidade Européia apenas estabelecem valores limites de contaminantes, entre esses N-nitrosaminas, em matérias-primas destinadas à formulação de produtos de higiene ou cosméticos. O valor máximo permitido de N-nitrosaminas em matérias-primas é de 50 µg kg-1. Não existem recomendações para um limite máximo de resíduo aceitável de N-nitrosaminas em produtos acabados.

A Tabela 3 apresenta algumas recomendações, seguidas hoje em dia, pelas indústrias de produtos cosméticos, com relação às matérias-primas que são os principais precursores de N-nitrosaminas.48,51

Como pode ser observado, não existem dados a respeito do teor máximo de N-nitrosaminas permitida para produtos cosméticos. Em outros países medidas preventivas foram tomadas em base aos resultados obtidos que indicaram a presença de N-nitrosaminas em diferentes formulações cosméticas. No Brasil, não existem dados disponíveis que tenham sido publicados, o que reforça a necessidade de estudos com relação à presença desses compostos presentes em cosméticos comercializados no Brasil.

MÉTODOS ANALÍTICOS

Diversos métodos analíticos foram empregados no passado para a determinação semiquantitativa e quantitativa de N-nitrosaminas em matrizes diversas, incluindo a cromatografia em camada delgada, espectrofotometria, colorimetria e polarografia.52-54 A matriz mais estudada foi o alimento, principalmente os produtos cárneos curados. Os métodos analíticos destinados para a determinação de N-nitrosaminas em produtos cárneos foram revisados recentemente por Rath e Reyes55 e Dutra e colaboradores.56

O método colorimétrico clássico para a determinação de N-nitrosaminas envolve a reação de Griess. A reação envolve a clivagem química da ligação N-NO e reação do agente nitrosante com uma amina aromática formando um sal de diazônio. Esse, por sua vez, na presença de uma outra amina aromática secundária, forma um azo composto que absorve na região do visível do espectro eletromagnético.57 Essa reação é limitada às concentrações de N-nitrosaminas na ordem de mg kg-1 e está sujeita a interferências da matriz.7

No entanto, todos esses métodos careciam de detectabilidade e não permitiam a determinação de N-nitrosaminas ao nível de traços. Essa foi uma limitação no século passado, logo quando foi evidenciada a contaminação de diversos produtos por N-nitrosaminas, principalmente alimentos. Apenas com o desenvolvimento de métodos cromatográficos associados a diferentes sistemas de detecção, sensíveis e seletivos, essa limitação foi superada e métodos confiáveis puderam ser estabelecidos.

Para fins analíticos, as N-nitrosaminas são divididas em voláteis e não voláteis, sendo as últimas consideradas todo composto N-nitroso não destilável em um sistema aquoso. Tais compostos incluem dialquilnitrosaminas de cadeia longa, N-nitrosopeptídeos e N-nitrosoderivados de bases orgânicas. As diferenças nas propriedades físico-químicas desses compostos dificultam o estabelecimento de métodos analíticos de aplicação geral.37

Devido à confirmação da presença de NDMA em alimentos e bebidas, na década de 70, os primeiros métodos desenvolvidos foram focados na determinação de N-nitrosaminas voláteis em alimentos. De modo geral, esses métodos eram baseados na extração das N-nitrosaminas da matriz alimento por destilação a vácuo ou óleo mineral e quantificação por cromatografia a gás (GC) associada a detectores como: ionização por chama (FID), termoiônico (TIC), condutividade eletrolítica de Coulson (CECD) e captura de elétrons (ECD). Mais tarde foi desenvolvido o detector de quimiluminescência (TEA, Thermal Energy Analyzer) por Fine e colaboradores,58 que acabou se tornando o detector de primeira escolha por muitos anos para fins quantitativos, devido à sua seletividade e detectabilidade e até hoje tem tido aplicação. O emprego deste sistema de detecção permitia simplificar o preparo de amostras.

Indubitavelmente, pelos motivos históricos apresentados, os métodos destinados à determinação de N-nitrosaminas voláteis tiveram uma maior atenção dos cientistas e, portanto, pode-se afirmar que, além de um maior número de artigos científicos publicados os métodos para essa finalidade tiveram um maior avanço. O mesmo não ocorreu com os métodos voltados para a determinação de N-nitrosaminas não voláteis. Um dos problemas no início era a associação do detector TEA ao sistema de HPLC. Um segundo problema era o preparo de amostras, uma vez que seria necessária a quantificação de concentrações ao nível de µg kg-1 em matrizes complexas.

Basicamente, o detector TEA é composto de um pirolisador catalítico, uma armadilha, uma câmera de reação e um tubo fotomultiplicador. O princípio consiste na clivagem da ligação N-NO da N-nitrosamina no pirolisador catalítico, no qual é formado o radical nitrosila (NO.). Os subprodutos são removidos na armadilha. Por sua vez, o radical nitrosila, por intermédio de vácuo, é conduzido para a câmera de reação, na qual é oxidado na presença de ozônio para dióxido de nitrogênio no estado excitado (NO2*). Quando a molécula decai para o seu estado fundamental, ocorre liberação de energia em um comprimento de onda de 600 nm. Essa radiação é detectada no tubo fotomultiplicador, sendo que a intensidade da radiação é proporcional à concentração da N-nitrosamina. A detectabilidade do detector TEA situa-se ao nível de pg. Mesmo considerando a seletividade e detectabilidade do detector TEA, se faz necessária a confirmação de identidade do analito por espectrometria de massas.

Atualmente, os métodos mais importantes para a determinação de N-nitrosaminas em matrizes complexas, entre essas os cosméticos, envolvem a cromatografia líquida ou a gás associada à espectrometria de massas. Também existem métodos que empregam a cromatografia líquida de alta eficiência associada a detectores UV-Vis ou de arranjo de diodos, com e sem derivatização pós-coluna. Flowers e colaboradores59 desenvolveram um método usando a cromatografia líquida de alta eficiência em fase reversa para a determinação de NDELA em produtos de higiene. A detecção foi realizada em 540 nm, após clivagem fotolítica da ligação N-NO e reação do nitrito formado com o reagente de Griess (sulfanilamida e N-1-naftiletilenodiamina). Vohra e Harrington60 descreveram um método para a determinação de NDELA em cosméticos usando a cromatografia líquida de alta eficiência associada a um detector polarográfico.

No caso de N-nitrosaminas não voláteis, como o caso da NDELA, reações de derivatização podem ser empregadas para permitir a determinação por cromatografia a gás. Entre os reagentes derivatizantes têm sido empregados o anidrido acético e N-metilbistrifluoroacetamida.61

Os principais métodos para quantificação de N-nitrosaminas em cosméticos e produtos de higiene estão sumarizados na Tabela 4.

A determinação de contaminantes em nível de traços em cosméticos e produtos de higiene requer anterior à etapa de quantificação, elaborado preparo de amostra que envolve a extração do analito da matriz, eliminação de interferentes e concentração. Os procedimentos de preparo de amostra dependem não só do analito e da composição da matriz a ser analisada, como gel, creme, loções, óleos e emulsões, mas também da técnica analítica e do sistema de detecção utilizado para a quantificação. A maioria dos métodos descritos na literatura sobre o preparo de amostra de cosméticos foi direcionada para as N-nitrosaminas não voláteis NDELA e NMOR, uma vez que essas foram as N-nitrosaminas mais identificadas nessas matrizes. De modo geral, diferentes procedimentos são conjugados, especialmente a extração líquido-líquido (LLE) e a extração em fase sólida (SPE).

Os principais procedimentos de preparo de amostras cosméticas para quantificação de N-nitrosaminas, descritas na literatura, levam em consideração o estado físico (sólido ou líquido) e propriedades físico-químicas da amostra (solubilidade em meio aquoso). A extração das N-nitrosaminas tem sido realizada por procedimentos de extração líquido-líquido com diclorometano,10 éter de petróleo e acetato de etila62 ou extração em fase sólida, empregando sílica gel46,62,64, Extrelut®45 e octadecilsilano.67,68 Também têm sido empregadas as separações em coluna de troca aniônica41,64,69 e a dispersão da matriz em fase sólida.

Para o procedimento de preparo de amostra, utilizando método de extração em fase sólida, geralmente são tomados de 1,0 a 3,0 g de amostra. Para tanto, têm sido empregados tanto cartuchos de fase normal como de fase reversa. Anterior à percolação da amostra na fase estacionária do cartucho, a amostra é solubilizada em um solvente apropriado, agitada e centrifugada. Quando são empregados cartuchos à base de sílica a amostra é solubilizada geralmente em acetato de etila. A etapa de lavagem e eluição é realizada com a passagem de 20 mL de uma mistura acetona/diclorometano (60:40 v/v). O eluato é concentrado sob fluxo de nitrogênio e ressuspenso na fase móvel anterior à quantificação.46

No caso do uso de cartuchos de fase reversa (octadecil) a amostra inicialmente é solubilizada em água e não são empregados solventes de lavagem para remoção de interferentes. Geralmente é descartada a fração inicial do volume aplicado, visando a eliminação de alguns compostos mais polares.45,59,67 A desvantagem do uso de cartuchos de fase reversa é que as N-nitrosaminas mais polares como a NDELA e NMOR não têm afinidade suficiente pela fase estacionária para permitir sua concentração durante a etapa de limpeza. Sendo assim, apenas são removidos da matriz os compostos mais apolares durante a extração em fase sólida.

Um resumo do preparo de amostras e métodos de quantificação está apresentado na Figura 3.


Um ponto importante a ser considerado é a possível formação de artefatos (N-nitrosaminas) durante o preparo de amostras, o que deve ser inibido pela adição de ácido sulfâmico, ascorbato, hexiloxianilina ou outros inibidores de nitrosação anterior à etapa de preparo de amostras.45,66

Para quebrar emulsões e espuma têm sido empregado sais como o cloreto de sódio ou ultra-som.45,65

CONCLUSÕES

Há mais de três décadas tem sido relatada a presença de N-nitrosaminas em produtos de higiene e cosméticos em todo mundo e medidas preventivas têm sido adotadas para minimizar a contaminação destes produtos por essas substâncias carcinogênicas. No entanto, no Brasil, se estudos foram conduzidos para a avaliação de N-nitrosaminas em produtos de higiene e cosméticos, esses dados não foram publicados.

É importante ressaltar que medidas preventivas somente são eficazes quando estiverem associadas a programas de fiscalização.

Na maioria dos países que monitoram a presença de N-nitrosaminas em produtos de higiene e cosméticos, verifica-se uma redução do teor destas ao longo dos anos, o que comprova que as indústrias têm controlado a matéria-prima, têm evitado o uso de substâncias que podem sofrer nitrosação e agentes nitrosantes nas formulações.

Os métodos analíticos para a determinação de N-nitrosaminas ganharam impulso quando foi evidenciado o potencial carcinogênico e mutagênico das N-nitrosaminas e quando essas foram detectadas em diversos tipos de alimentos. No entanto, as N-nitrosaminas encontradas em alimentos são na sua maioria N-nitrosaminas de baixa massa molar e voláteis. Sendo assim, os métodos que receberam maior atenção durante os primeiros anos foram a cromatografia a gás acoplada aos detectores de ionização por chama e de condutividade eletrolítica. No entanto, foi somente após o desenvolvimento do detector de quimiluminescência TEA que métodos confiáveis e sensíveis foram estabelecidos, visando a determinação de N-nitrosaminas em matrizes diversas. A seletividade deste sistema de detecção permitiu reduzir o preparo de amostras. Embora esse detector possa ser associado também ao cromatógrafo líquido de alta eficiência, esse sistema teve problemas quanto à interface e foi, em consequência, menos empregado e difundido no meio científico. Ao contrário do que se verifica nos alimentos, as N-nitrosaminas que foram encontradas em cosméticos são as não voláteis, entre essas se destacam a N-nitrosodietanolamina e N-nitrosomorfolina. Indubitavelmente, essas duas N-nitrosaminas foram as mais estudadas, tanto quanto à presença, métodos analíticos e formação nos produtos.

Atualmente, o detector TEA tem sido substituído pelo espectrômetro de massas, por permitir além da quantificação, a confirmação de identidade. No entanto, o número de métodos publicados nos últimos anos é extremamente baixo.

Em relação ao preparo de amostras de cosméticos para a determinação de N-nitrosaminas, têm sido empregadas, quase que exclusivamente a extração líquido-líquido e a extração em fase sólida. O procedimento depende da composição básica do produto de higiene ou cosmético.

Os dados sobre a contaminação de cosméticos por N-nitrosaminas em diversos países apontam que o problema ainda não foi resolvido e que existe a necessidade do desenvolvimento de métodos analíticos que possam ser utilizados no controle de qualidade.

Recebido em 8/10/08; aceito em 10/4/09; publicado na web em 17/9/09

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Aceito
      10 Abr 2009
    • Recebido
      08 Out 2008
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