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Testes de desempenho de eletrodos: eletrodos de referência

Performance tests for electrodes: reference eletrodes

Resumo

This paper is designed to divulge some tests found in books, articles and international technical standards, by means of which it is possible to evaluate the performance of reference electrode widely used in potentiometric and voltammetric methods. The reference potential (Eref), junction resistance (Rj), the ability of keeping up the potential when current is flowing (polarizability), and of generating junction potentials (Ej) are applied to some commercial electrodes. The results obtained are amply discussed and some corrective procedures are suggested when the electrode fails.

reference electrode; quality tests


reference electrode; quality tests

DIVULGAÇÃO

Testes de desempenho de eletrodos: eletrodos de referência

Ademário Íris da Silva Jr. e Hiram da Costa Araújo Filho

Escola Técnica Federal de Química do Rio de Janeiro - Rua Senador Furtado, 121 - Maracanã - 20270-021 - Rio de Janeiro - RJ

Reinaldo Carvalho Silva*

Escola Técnica Federal de Santa Catarina - Av. Mauro Ramos, 950 - 88020-300 - Florianópolis - SC

Recebido em 2/9/98; aceito em 14/1/00

Performance tests for electrodes: Reference eletrodes. This paper is designed to divulge some tests found in books, articles and international technical standards, by means of which it is possible to evaluate the performance of reference electrode widely used in potentiometric and voltammetric methods. The reference potential (Eref), junction resistance (Rj), the ability of keeping up the potential when current is flowing (polarizability), and of generating junction potentials (Ej) are applied to some commercial electrodes. The results obtained are amply discussed and some corrective procedures are suggested when the electrode fails.

Keywords: reference electrode; quality tests.

INTRODUÇÃO

Os eletrodos de referência e de trabalho usados em potenciometria e voltametria precisam encontrar-se em condições tais que sobre eles não haja qualquer suspeita quando estiverem operando. Apesar da importância de avaliar, manter e recuperar eletrodos, os fabricantes pouco ou nada têm feito para instruir, de modo correto, os usuários, que, mesmo usando intensivamente os eletrodos, não têm referenciais de qualidade aplicáveis a estes dispositivos. Se um eletrodo aparentemente não funciona de modo adequado, em muitos casos, atendendo aos ditames da moderna sociedade de consumo,é descartado e substituído por outro novo.

Num esforço, diametralmente oposto, de "desvelar das caixas-pretas", testes de desempenho têm sido desenvolvidos e publicados em livros, artigos e normas técnicas estrangeiras1-14. A maior parte destes testes é de fácil execução pelos usuários e, em conjunto, constituem uma base comum através da qual podem ser confrontados os desempenhos de eletrodos similares. No âmbito industrial, ou nos laboratórios onde eletrodos são utilizados intensivamente, a realização sistemática destes testes pode indicar o momento propício para fazer a manutenção ou providenciar a substituição do eletrodo. Na pesquisa em eletroquímica, a perfeita caracterização de um novo sistema de referência pode ser alcançada pela aplicação destas medições. Este artigo apresenta quatro testes muito úteis para a avaliação dos eletrodos de referência: O potencial de referência (Eref), a resistência de junção (Rj), o potencial de junção (Ej) e a polarizabilidade. Há outros ainda1, mas estes quatro são os mais importantes, posto que diretamente ligados à qualidade do eletrodo.

O eletrodo de referência responde por cerca de 80% dos problemas nas medições potenciométricas1. Nos sistemas voltamétricos, eletrodos de referência defeituosos podem acarretar desde voltamogramas irregulares, até a completa destruição da superfície do eletrodo de trabalho quando, sem o valor de referência garantido durante a varredura, os potenciais fornecidos pelo potenciostato tornam-se desgovernadamente altos. É, pois, conseqüente que seja este o eletrodo submetido a testes em primeiro lugar. O circuito equivalente ao eletrodo de referência, com potenciais e resistências, está apresentado na Figura 1, ao lado do desenho esquemático de alguns eletrodos de referência. A Figura 1 omite a versão provavelmente mais utilizada dos eletrodos de referência: aquela que comparece acoplada aos sensores de pH, constituindo o eletrodo duplo combinado de pH. Embora todos os testes possam, indistintamente, ser aplicados a este caso, ele será especificamente discutido, mais adiante, neste artigo, para maior clareza.


Como a única função do eletrodo de referência, em qualquer sistema eletroquímico, é a de fornecer um potencial elétrico fixo e definido, o parâmetro principal posto à prova será justamente o potencial de referência do eletrodo. Todavia, a observação da Figura 1 torna pertinentes algumas considerações.

Embora seja possível criar um sistema sem junção para a medida de Eref 15, nas aplicações práticas as medições são realizadas com eletrodos de referência contendo junção, e dessa forma também será feito o teste. Considerando que os potenciais de junção (Ej) estão associados ao sistema, o potencial de referência do eletrodo (Eref) será, a rigor, o resultado da soma Erefreal + Ej, admitindo-se que Ej será de apenas algumas unidades de mV (o que nem sempre é verdadeiro,podendo, nos casos de concentrações elevadas de H3O+ ou HO-, obter-se potenciais de junção de dezenas de mV!). Em segundo lugar, as resistências assinaladas não devem ser muito altas, para que a queda ôhmica (iR, sendo i a corrente e R a resistência) não venha a comprometer o valor do potencial de referência. Embora os circuitos onde operam os eletrodos de referência sejam montados de forma que a corrente através do eletrodo de referência seja mínima, mesmo uma corrente tão baixa quanto 10 nA acarretará uma queda ôhmica de 10 mV se as resistências indicadas, em conjunto, vierem a alcançar valores de 1 MW. Assim, o primeiro teste a ser executado em eletrodos de referência objetiva avaliar o conjunto das resistências associadas ao eletrodo. Somente após aprovação neste teste é que se deve proceder à medida do potencial de referência. Do mesmo modo, é somente após aprovação nestes dois testes, que se pode avaliar: a capacidade do eletrodo resistir a correntes sem alterar seu potencial (teste de polarizabilidade) e como o eletrodo tende a gerar potenciais de junção (teste de Ej).

RESISTÊNCIA DE JUNÇÃO

Para realizar este teste é necessário uma fonte de corrente alternada com freqüência mínima de 50 Hz e voltagem máxima de 5 V além de um eletrodo de prata ou platina. A solução mais simples é usar um pequeno transformador com entrada de 110 V (ou 220 V) e saída de 5 V. Alternativamente, podem-se usar os terminais de um condutivímetro, comercialmente disponível, como fonte de corrente alternada. Os fios de prata retirados de sensores de pH quebrados podem ser lixados e decapados com HNO3 a fim de servirem para este teste. Mergulha-se a junção do eletrodo sob teste em solução saturada de cloreto de potássio ao lado do fio de prata (ou Pt) e conectam-se os dois terminais, em série, à fonte e às pontas de prova de um multímetro, medindo-se a corrente alternada gerada. A Figura 2 mostra o arranjo dos componentes. É necessário medir, em circuito aberto (circuito desligado, por onde a corrente não pode circular) a diferença de potencial na saída do transformador. Para tanto, antes de realizar a montagem da Figura 2, liga-se o primário do transformador à fonte de corrente alternada de 110 (ou 220 V) e conectam-se os terminais de um voltímetro ao secundário, lendo-se a diferença de potencial. De acordo com a lei de Ohm, este valor, em volt, é dividido pela corrente lida (na montagem da Figura 2), em miliampères, para fornecer a resistência, em kiloohm. O valor calculado, embora correspondente à resistência total do circuito, é tomado como sendo a resistência da junção, uma vez que as contribuições das outras partes são desprezíveis. O valor máximo aceitável para a resistência da junção é de 5 kW.


Este teste foi aplicado a alguns eletrodos comerciais, usualmente encontrados no mercado nacional. Os resultados alcançados, registrados na Tabela 1, estão mais diretamente associados ao estado do eletrodo do que à qualidade da fabricação.

Os valores de Rj são determinados pela restrição ao livre trânsito de íons através da junção. Assim, dependem do tipo de junção e do seu grau de colmatação uma vez que, pelo uso, substâncias sólidas tendem a se alojar nos poros. Este problema é especialmente freqüente em eletrodos de referência de Ag/AgCl com solução saturada de KCl. Isto acontece porque a solubilidade do AgCl é bem maior em solução que contém elevada concentração de cloreto, devido à formação de cloro-complexos de prata (AgCl2- e outros). Na junção, a diluição provoca precipitação de AgCl que colmata os poros, tendendo a aumentar os valores de Rj. Com o uso, podem aparecer valores de resistência de junção superiores a 5 kW, que exigem limpeza da junção pela adição de NH3 (que dissolve AgCl) e HNO3 (que dissolve a prata ali formada por fotólise). É recomendada também a limpeza com solução de HCl 0,1 mol.dm-3 contendo 7,5% de tiouréia para contaminações com sulfeto e solução de HCl 0,1 mol.dm-3 contendo 1% de pepsina para contaminações com proteínas. Excesso de cristais de KCl no interior do eletrodo também compromete o desempenho da junção, exigindo dissolução do sal sólido e a substituição do eletrólito (vide Tabela 1). Os problemas associados à junção são os mais comuns em eletrodos de referência defeituosos.

Os eletrodos de dupla junção apresentam valores de Rj correspondentes à soma da resistência de cada junção. Por este motivo, quase sempre a segunda junção de tais eletrodos apresenta uma configuração que tende a uma baixa restrição ao trânsito de íons (junção encamisada, com filme de eletrólito entre duas peças de formato cônico, ou de fluxo livre, com tubo fino pelo qual escoa o eletrólito). Não obstante, como o valor de 5 kW está estabelecido para o eletrodo e não para cada junção, é mais difícil para eletrodos de dupla junção passarem neste teste, como pode ser verificado na Tabela 1. Ressalte-se que a resistência de junções encamisadas depende do grau de aperto entre as peças (infelizmente, nem sempre ajustável). Por exemplo, em um eletrodo deste tipo a resistência, inicialmente em 70 kW, após um pequeno afrouxamento entre as peças, tornou-se inferior a 1 kW. Em voltametria é muito utilizado nos eletrodos de referência, uma junção de vidro sinterizado com poros muito finos, conhecida como "vycor". Apesar disto, a área (geométrica) exposta ao eletrólito nessa junção é muito grande (13 mm2), de tal forma que sua resistência situa-se em valores mais baixos que a dos eletrodos potenciométricos (com áreas de junção tão pequenas quanto 0,1 mm2 ).

Finalmente, é importante lembrar que a medida de Rj pressupõe que todas as resistências do circuito são desprezíveis frente à da junção. Antes de condenar a junção de um eletrodo é preciso certificar-se de que isto é verdadeiro para as soluções de KCl, cabos e conectores, valendo-se do mesmo citado dispositivo.

POTENCIAL DE REFERÊNCIA

O potencial de referência é a diferença de potencial medida entre o eletrodo de referência e o eletrodo padrão de hidrogênio (EPH), ao qual é, por definição, atribuído o valor de 0 V em qualquer temperatura. Todavia, devido às naturais dificuldades práticas associadas ao EPH, o que se recomenda é a comparação do eletrodo sob teste com um outro no qual se confie, normalmente um eletrodo de calomelano saturado (ECS) especialmente reservado para esta finalidade, e preferencialmente checado periodicamente em relação ao EPH.

Os dois eletrodos são colocados com suas junções imersas em solução saturada de KCl e seus terminais ligados ao medidor de pH, (escala de mV absolutos), tal como mostra a Figura 3. A temperatura precisa estar equilibrada com erro menor que 0,5oC. Lê-se então o valor ao 0,1 mV.


Os medidores potenciométricos modernos, seguindo o que se estabeleceu para o eletrodo padrão de hidrogênio17, conectam os eletrodos de acordo com o arranjo:

- Referência | | Indicador +

Sendo DE = Eind - Eref o valor lido na escala. Para que não haja confusão quanto ao significado do valor lido, é oportuno ligar o eletrodo de referência tomado como padrão, sempre ao terminal reservado ao eletrodo de referência. Isto pode ser feito valendo-se da indicação no medidor de pH ou observando-se o tipo de conector. Em quase todos os sensores de pH modernos, eletrodo indicador e de referência estão no mesmo corpo, chamado de eletrodo duplo combinado. A parte central do sensor, apresentando em sua extremidade o bulbo de vidro pH sensitivo, é o eletrodo indicador e a parte mais exterior é o de referência (Figura 4). Este mesmo padrão é seguido nos conectores, sendo sempre o negativo do eletrodo de referência colocado mais externamente,conforme mostra a Figura 5. Pelo acima exposto, se, por exemplo, um eletrodo de calomelano saturado estiver sob teste contra outro calomelano saturado, e, a 25oC houver sido lido no medidor -3,5 mV, calcula-se:



Eind - Eref = -3,5 mV. Como Eref = 244,5 mV, então teremos 241,0 mV para o potencial de referência do eletrodo sob teste.

As equações empíricas da Tabela 2 fornecem os potenciais de referência de alguns eletrodosx EPH.

Um erro de ± 5 mV é o máximo tolerável. Valores obtidos neste teste para eletrodos comerciais, usualmente encontrados no mercado nacional, encontram-se registrados na Tabela 3. Os eletrodos são os mesmos já citados, sem ações corretivas para Rj. Os resultados ali registrados estão mais associados ao estado do eletrodo do que à qualidade de fabricação.

O valor de Eref é determinado pelos seguintes fatores: pureza das substâncias eletroativas; pureza e concentração do eletrólito; possibilidade de envenenamento do eletrodo (certas espécies podem migrar para o interior do eletrodo e provocar reações químicas irreversíveis, mudando as espécies eletroativas ou suas atividades); resistência de junção anormalmente alta, (acarretando elevada queda ôhmica); e integridade física do eletrodo (rachaduras, fios partidos ou com mau contato, conectores corroídos). Em se tratando de eletrodos comerciais, após cuidadoso exame dos fios, dos conectores e do eletrodo em si (de preferência com auxílio de uma lupa binocular) a troca da solução de eletrólito e a verificação do valor de Rj é praticamente tudo o que o usuário poderá fazer para trazer o valor de Eref ao seu valor correto. Se o eletrodo houver sido construído pelo usuário, e o erro não puder ser atribuído ao eletrólito ou à junção, será necessário repetir a preparação com substâncias mais puras, tomando especial precaução contra contaminações.

Como se pode observar na Tabela 3, apenas um eletrodo mostrou desvio maior que 5 mV. Este eletrodo, que apresentava valor apropriado de resistência de junção e estava carregado com uma nova solução de eletrólito, deve, ao longo dos anos de uso geral, ter sofrido um certo envenenamento. Porém, como nas medidas potenciométricas, a estabilidade do potencial de referência é mais importante que seu valor real, tolerando-se nesses casos desvios de + 10 mV5, o citado eletrodo permanece operante em potenciometria.

Também é interessante notar que, mesmo nos eletrodos reprovados no teste de Rj, a queda ôhmica não chegou a ponto de comprometer o valor de Eref, mas isto não deve dispensá-los de manutenção, através de ações corretivas apropriadas ao caso.

POTENCIAL DE JUNÇÃO

Após a medição do potencial de referência em solução saturada de KCl, repete-se o mesmo processo em uma solução de KCl a 0,001 mol dm-3. A diferença entre os potenciais obtidos nas duas soluções, aqui designada como Ej, não pode exceder ± 2 mV.

Valores de potenciais de junção (Ej), obtidos desta maneira para eletrodos comerciais, usualmente encontrados no mercado nacional, estão registrados na Tabela 4. Os eletrodos são os mesmos já citados.

Tal como realizado no ensaio, o valor obtido para Ej depende da igualdade entre as soluções dos eletrólitos e da proximidade entre os valores de resistência de junção nos dois eletrodos de referência (e não meramente que tenham sido aprovados no teste de Rj), isto para eletrodos cujos valores de potencial de referência estejam dentro da tolerância já mencionada. Assim, o primeiro eletrodo da Tabela 4, cujo valor de Ej, obtido nas condições do teste, foi de 8,0 mV, após troca da solução de eletrólito, passou a 1,3 mV. É preciso ficar claro que o valor lido nas condições do ensaio representa a diferença entre os potenciais de junção desenvolvidos nos dois eletrodos. Portanto, para eletrodos idênticos o valor lido seria nulo, mas, é claro que não é nulo o potencial que surge na junção das soluções interna e externa com concentrações tão contrastantes. Na realidade, o padrão de qualidade esperado para um eletrodo de referência, a respeito de Ej, é que ele desenvolva potenciais de junção de magnitude comparável aos do eletrodo de referência padrão. Também aqui levam desvantagem os eletrodos de dupla junção. Isto ocorre porque em tais eletrodos, o eletrólito intermediário (contendo sal necessariamente diferente de KCl) é que estabelece contato com o eletrólito externo, tendendo a gerar potenciais de junção mais altos que aqueles da interface do eletrodo padrão com o eletrólito externo.

POLARIZABILIDADE

Eletrodos de referência ideais devem ser idealmente não polarizados20, ou seja, devem manter seu potencial, independente da corrente que através deles passe. Na prática isto não acontece porque, em havendo fluxo de uma corrente relativamente grande em uma mesma direção, por um certo tempo, pelo consumo das espécies eletroativas, as atividades mudam e muda o potencial. Embora não haja ainda critérios universalmente aceitos para este caso, é preciso considerar que correntes até 0,2 mA podem circular através dos eletrodos de referência1,em condições normais de trabalho. Correntes desta magnitude, sejam anódicas ou catódicas, precisam ser suportadas sem alteração apreciável do potencial de referência. Galster sugere, então, um valor 10 vezes maior que este para realização do teste, de acordo com a montagem esquematizada na Figura 6.


O circuito deve ser deixado ligado durante 1 h com a corrente de 2 mA sendo lida no multímetro. Após este período, lê-se o potencial de referência no medidor de pH. Desliga-se a corrente e, após estabilidade do sinal, lê-se novamente o potencial. Inverte-se então o sentido da corrente e deixa-se que flua por mais 1h. Lê-se novamente o potencial com o circuito fechado e aberto. O potencial de referência, em todos os casos de circuito fechado, não deverá diferir da leitura inicial mais do que 10 mV. Observe-se que este valor é unicamente associado à queda ôhmica na junção (2 mA x 5 kW) enquanto flui corrente. Com circuito aberto, não deverá haver diferença em relação ao valor inicial.

Valores típicos obtidos neste ensaio estão registrados na Tabela 5, para eletrodos comerciais, usualmente encontrados no mercado nacional, aprovados nos testes de Eref e Rj. Os eletrodos são os mesmos já citados.

A despolarização de um eletrodo de referência depende, fundamentalmente, da sua capacidade de, rapidamente realizar, concomitantemente ao processo redox que lhe é característico, mudanças tais que mantenham as atividades das espécies eletroativas constantes. Assim, ao aplicarmos uma carga anódica a um eletrodo de Ag/AgCl, prata do fio passa para a solução como íon Ag+. Este reage com íons cloreto precipitando AgCl. A única alteração, desprezível em relação ao estado inicial, é na concentração de cloretos, quase sempre mantida muito alta. O problema nestes eletrodos de segunda ordem é cinético, uma vez que estes equilíbrios, envolvendo espécies em diferentes estados físicos, não se estabelecem muito rapidamente. Eletrodos de referência de pequenas dimensões, pelo rápido esgotamento das espécies eletroativas, se polarizam mais facilmente. Apesar disto, na prática, dificilmente isto se constituiria em comprometimento grave no valor de Eref, pois no trabalho com microeletrodos as correntes são limitadas a nano, ou mesmo pico ampères.

Os resultados expressos na Tabela 5 permitem outros comentários.

O teste é bastante severo, pois nenhum eletrodo alcançou o exato valor inicial de potencial. Apesar disto, as variações encontradas foram bastante pequenas, décimos ou poucas unidades de mV, que, realmente, não são nocivas para a maioria das aplicações. Talvez se possa, usando um valor de corrente ou tempo, menor, produzir um teste mais de acordo com a qualidade requerida aos eletrodos de referência usuais.

Além destes quatro testes, Galster indica mais dois para os eletrodos de referência: o coeficiente de temperatura, destinado a avaliar como Eref varia com a temperatura; e a vazão de eletrólito através da junção. Tais testes, de interesse quase exclusivo dos fabricantes de eletrodos, não serão descritos aqui.

Ao finalizar, é importante mencionar algumas limitações da medida de Eref tal como aqui descrita. Às vezes, para fugir do citado problema da colmatação da junção em eletrodos de Ag/AgCl (sat.) ou para evitar uma variação intensa de potencial com temperatura (observe-se na Tabela 2 como varia o coeficiente de temperatura com a concentração de cloreto nos eletrodos de Ag/AgCl), usam-se eletrodos contendo soluções diluídas de eletrólito. Nestes casos, os potenciais de junção podem assumir valores muito altos se for usado como referência padrão o eletrodo de calomelano saturado, devendo então ser escolhido, para este fim específico, um outro eletrodo que também contenha solução diluída e cujo potencial seja conhecido versus EPH. Para voltametria e titulações realizadas em meio não-aquoso é importante poder contar com um eletrodo de referência também não-aquoso. Ao medir o valor de Eref de tais sistemas de referência, não se pode usar o ECS como padrão, sem contaminar a medida com valores altos de potencial de junção, gerados na interface de solventes diferentes. Uma maneira de contornar este problema é medir o potencial de referência, voltametricamente, através do valor de E1/2, em relação ao ferroceno21.

CONCLUSÃO

Os testes de desempenho dos eletrodos de referência aqui divulgados, são importantes para garantir a confiabilidade da medida eletroquímica. Os valores absolutos obtidos diferiram de eletrodo para eletrodo (mesmo considerando eletrodos novos), o que leva a crer que os resultados obtidos em uma só medida, nem sempre ajudem a traçar um diagnóstico correto. É mais aconselhável o acompanhamento ao longo da vida útil do eletrodo, realizando um conjunto de testes de desempenho periodicamente, para que dessa forma, seja possível realizar manutenção preventiva e ações corretivas, cuja eficiência poderá ser avaliada in loco com maior segurança. É muito importante realizar os testes nos eletrodos assim que são adquiridos, pois nem sempre os defeitos estão associados ao uso, podendo ser uma limitação intrínseca à própria fabricação. Os ensaios descritos são aplicáveis apenas aos eletrodos de referência mais comumente usados em meio aquoso. Porém, mantendo a sua estrutura básica e fazendo algumas adaptações, é possível aplicá-los a outros casos. Os limites de tolerância descritos nesse trabalho foram baseados em normas técnicas estrangeiras, deixando evidente a necessidade de elaboração das, ainda inexistentes, normas técnicas nacionais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Dez 2006
  • Data do Fascículo
    Ago 2000

Histórico

  • Aceito
    14 Jan 2000
  • Recebido
    02 Set 1998
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