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Uma reformulação da sistemática do ICM, particularmente com respeito às operações interestaduais

ARTIGOS

Uma reformulação da sistemática do ICM, particularmente com respeito às operações interestaduais

Henrique Goldkorn

Economista e contador. Consultor de empresas

1. INTRODUÇÃO

Parece-nos que agora já ninguém tem dúvidas de que o produto da arrecadação do ICM deveria beneficiar, primordialmente, as regiões consumidoras das mercadorias e não (como acontece atualmente) as regiões produtoras. O sistema adotado até agora (de alíquotas diferenciais de imposto para as operações intra e interestaduais) tem justamente essa finalidade - de permitir aos estados de consumo a obtenção de uma maior fatia do bolo do ICM. Foi decidido recentemente aumentar gradativamente esse diferencial das alíquotas de imposto, no sentido de intensificar a referida transferência de receita tributária.

Essa medida evidentemente deverá atingir (pelo menos em parte) sua finalidade de transferência de receita. Entretanto, ela tem grandes desvantagens no que tange às relações entre o fisco e o contribuinte e entre os sucessivos contribuintes, no caso de compras para revenda ou industrialização. Contudo, seria perfeitamente possível evitar tais desvantagens, além de se conseguir uma distribuição ainda mais justa da receita tributária. Para esse fim sugerimos duas medidas de adoção extremamente fácil.

Em primeiro lugar, propomos o estabelecimento de uma câmara de compensação do imposto cobrado nas operações interestaduais. Isto seria muito fácil, uma vez que todos os contribuintes já declaram os montantes envolvidos ao efetuarem o recolhimento do imposto. Tais impostos interestaduais poderiam ser depositados em um Fundo de Compensação do ICM, à ordem do Tribunal de Contas da União (possivelmente no Banco do Brasil), que seria redistribuído aos estados à semelhança dos Fundos de Participação, já existentes.

Para suavizar possíveis distorções de receita que essa nova sistemática poderia provocar, seria estabelecido um plano de transição gradual, em 11 anos.

O Fundo de Compensação do ICM seria distribuído em duas parcelas. A primeira parcela seria proporcional às reduções da receita de cada um dos estados e a segunda aos créditos fiscais relativos aos consumos interestaduais de mercadorias.

No primeiro exercício de aplicação do plano, a primeira parcela seria de 100% e a segunda de zero; no segundo exercício, as parcelas seriam de 90 e 10%, respectivamente; no terceiro, 80 e 20%, e assim por diante. Do 11º exercício em diante, evidentemente, o Fundo de Compensação do ICM seria atribuído integralmente à segunda parcela. É óbvio que, no primeiro exercício, seria obtido o mesmo efeito de distribuição da receita tributária da sistemática atual.

Em segundo lugar, uma vez que a finalidade de transferência de receita tributária teria sido atendida pelo novo sistema, poderia ser estabelecida a unificação das alíquotas intra e interestaduais. Em outras palavras, em cada estado passaria a haver uma única alíquota de ICM. Cremos não ser necessário demonstrar, neste ponto, as vantagens que daí adviriam para as relações entre o fisco e os contribuintes e destes entre si.

No item 2 deste estudo analisaremos o funcionamento da atual sistemática do ICM, tanto no que diz respeito às operações intra-estaduais como no que se relaciona às operações interestaduais, seja das mesmas zonas de tributação, de zona de tributação mais baixa e de zona de alíquota mais alta. No item 3 delinearemos nossas sugestões para a reformulação da sistemática do ICM das operações interestaduais. Como corolário, mostraremos, no item 4, as razões da desnecessidade das atuais alíquotas diferenciais de ICM. No item 5, indicaremos nossas sugestões referentes aos prazos de pagamento do ICM em geral.

2. A ATUAL SISTEMÁTICA DO ICM

Nesta parte do estudo, propomo-nos a analisar o funcionamento das várias modalidades da atual sistemática do ICM, como segue:

1. generalidades;

2. operações inteiramente intra-estaduais;

3. compras dentro do mesmo estado, com vendas em outros estados;

4. compras em outro estado, com vendas no mesmo ou em outros estados;

5. confronto dos vários efeitos tributários atuais.

2.1 Generalidades

Para que possam ser facilmente reconhecidos os efeitos das várias modalidades de operações, dentro da atual sistemática do ICM, analisaremos, em cada uma das molidades, o mesmo exemplo de operação, a saber:

fase a) o fabricante vende o produto ao atacadista, por Cr$ 700;1 1 Para fins de simplificação, vamos presumir em nosso exemplo que o fabricante em questão não tem direito a qualquer crédito fiscal (relativo ao ICM contido nas compras de matérias-primas, etc).

fase b) o atacadista revende o produto ao varejista, por Cr$ 1 000;

fase c) o varejista vende o produto ao consumidor final, por Cr$ 1 500.

Como a legislação vigente estabelece, no caso de operações internas, alíquotas mais altas para os estados do Norte-Nordeste, estamos considerando esses estados como a zona de tributação mais alta; por extensão, os demais estados constituem a zona de tributação mais baixa. As alíquotas mencionadas neste estudo são as que estão estipuladas para vigorarem a partir do exercício de 1976.

Outrossim estabelece a legislação que, da arrecadação do ICM, 80% pertencem aos estados e 20% aos correspondentes municípios. Não obstante, para maior facilidade de compreensão dos dados que vamos apresentar, deixamos de tomar em consideração, neste estudo, a parcela devida aos municípios. Em outras palavras, partimos do pressuposto de que o imposto pertencesse, integralmente, aos estados em questão. A separação da parcela devida aos municípios tornaria a análise mais complexa e não alteraria as proporcionalidades envolvidas.

Além disso, na presente análise, quando falarmos de "compras" quereremos referir-nos à primeira fase de operação, ou seja, à compra do atacadista ao fabricante. Para efeito de simplificação vamos presumir, outrossim, em todos os exemplos analisados, que, na última fase, o varejista e o consumidor final estejam localizados no mesmo estado. Conseqüentemente, quando falarmos de "vendas" estaremos nos referido à segunda fase, isto é, à venda do atacadista ao varejista.

2.2 Operações inteiramente intra-estaduais

As operações inteiramente intra-estaduais (ou "internas") na realidade não afetariam a nossa análise das operações interestaduais; não obstante, estamos incluindo-as aqui para "arredondar" os respectivos conceitos. Uma operação inteiramente intra-estadual, nos moldes antes referidos, tem atualmente os efeitos tributários constantes no quadro 1.


Como se pode ver claramente, os impostos totais (a soma dos impostos recolhidos pelo fabricante, atacadista e varejista) são iguais aos impostos brutos devidos na última operação (c = venda do varejista ao consumidor final).

2.3 Compras dentro do mesmo estado, com vendas em outros estados

Nesta análise, apreciaremos três submodalidades distintas de compras dentro do mesmo estado, com vendas em outros estados, a saber:

a) vendas a outros estados, da mesma zona de tributação;

b) vendas a estados de zona de tributação mais baixa;

c) vendas a estados de zona de tributação mais alta.

Para os efeitos desta análise, presumiremos que o fabricante e o atacadista estejam localizados em um estado e o varejista e o consumidor final em outro. Evidentemente, poderíamos ter usado um exemplo em que o fabricante estivesse localizado em um estado, ao passo que o atacadista, o varejista e o consumidor final estivessem em outro. A apresentação dos exemplos seria algo diferente, mas os relacionamentos ilustrados seriam os mesmos.

2.3.1 Vendas a outros estados, da mesma zona de tributação

Este caso assemelha-se às operações inteiramente intra-estaduais (ver 2.2), mas a alíquota do imposto devido na segunda fase (venda do atacadista ao varejista) é a alíquota interestadual, como demonstrado no quadro 2.


Mais uma vez, vemos que os impostos totais correspondem ao imposto bruto devido na última fase (venda do varejista ao consumidor final), nos montantes de Cr$ 225,00 ou Cr$ 210,00, conforme se trate de operações realizadas na zona de tributação mais alta ou mais baixa.

Por outro lado, enquanto que nas operações inteiramente intra-estaduais a totalidade do ICM é recolhida a um só estado, no caso anterior somente uma parte é recolhida ao estado de destino, ao passo que o restante é recolhido ao estado de origem (ver a linha Subtotal).

2.3.2 Vendas a estados de zona de tributação mais baixa

Este caso é ligeiramente mais complexo do que o anteriormente mencionado. Vamos supor que o fabricante e o atacadista estejam localizados no Estado de Pernambuco e o varejista e o consumidor final no Estado de São Paulo. A situação é a apresentada no quadro 3.


Como neste exemplo, o estado de destino (São Paulo) está localizado na zona de tributação mais baixa do que o estado de origem (Pernambuco), os impostos totais são mais baixos do que no exemplo anterior. Entretanto, se os compararmos com o exemplo 2, veremos que os impostos totais do caso presente são iguais àqueles de uma operação intra-estadual da zona de tributação mais baixa, se bem que seja distinto o seu desdobramento.

2.3.3 Vendas a estados de zonas de tributação mais alta

Este caso é o inverso do anterior. Vamos supor que o fabricante e o atacadista estejam localizados no Estado de São Paulo e o varejista e o consumidor final no Estado de Pernambuco. A situação é atualmente a apresentada no quadro 4.


Como no exemplo do quadro 4 o estado de destino (Pernambuco) está localizado na zona de tributação mais alta do que o estado de origem (São Paulo), os impostos totais são mais altos do que no exemplo anterior; se os compararmos com o exemplo 2, veremos que eles são iguais aos de uma operação intra-estadual da zona de tributação mais alta. Evidentemente, contudo, o seu desdobramento é diferente.

2.4 Compras em outro estado, com vendas no mesmo ou em outros estados

No caso presente, vamos apreciar quatro submodalidades distintas de compras em outro estado, com vendas no mesmo ou em outros estados, a saber:

a) vendas intra-estaduais;

b) vendas a outros estados, da mesma zona de tributação;

c) vendas a estados de zona de tributação mais baixa;

d) vendas a estados de zona de tributação mais alta.

Vamos presumir, para os efeitos desta análise, que o fabricante esteja localizado em um estado e o atacadista, o varejista e o consumidor final em um outro ou outros.

2.4.1 Vendas intra-estaduais

Este exemplo assemelha-se àquele das operações inteiramente intra-estaduais, ilustradas em 2.2; no caso presente, contudo, o fabricante está localizado em um outro estado (por exemplo, Pernambuco e Guanabara). A operação, portanto, tem atualmente os efeitos tributários mostrados no quadro 5.


Como vemos, no caso de ambas as zonas de tributação, os impostos totais são ainda os mesmos dos correspondentes exemplos do subitem 2.2 (operações inteiramente intra-estaduais), mas no entanto as respectivas distribuições são diversas.

2.4.2 Vendas a outros estados, da mesma zona de tributação

Neste exemplo, o fabricante, o atacadista e o varejista estão localizados em três estados distintos da mesma zona de tributação (o consumidor final está localizado no mesmo estado que o varejista); os respectivos efeitos tributários estão no quadro 6.


Mais uma vez, notamos que os impostos totais, em ambas as zonas de tributação são os mesmos que os do exemplo precedente, referente às operações inteiramente intra-estaduais; entretanto, as respectivas distribuições são diferentes nos três casos mencionados.

2.4.3 Vendas a estados de zonas de tributação mais baixa

Desta vez, o fabricante e o atacadista estão localizados em dois estados diferentes da zona de tributação mais alta (por exemplo, Alagoas e Pernambuco), ao passo que o varejista e o consumidor final estão localizados em algum estado da zona de tributação mais baixa (por exemplo, Guanabara). Nesse caso, os respectivos efeitos tributários são atualmente os mostrados no quadro 7.


Constatamos outra vez que são os mesmos os impostos totais, nas operações cuja fase final seja realizada na zona de tributação mais baixa, qualquer que seja a modalidade de realização das duas fases anteriores (ver os exemplos 2., 2.3.2 e 2.4.1).

Como é idêntica atualmente a tributação das operações interestaduais em ambas as zonas de tributação, são também idênticos os efeitos tributários deste exemplo e aqueles das operações do exemplo 2.4.2, finalizadas na zona de tributação mais baixa.

2.4.4 Vendas a estados de zona de tributação mais alta

De certo modo, este exemplo é o inverso do exemplo precedente. Vamos presumir que o fabricante e o atacadista estão localizados em dois estados diferentes da zona de tributação mais baixa (por exemplo, São Paulo e Guanabara), ao passo que o varejista e o consumidor final estão localizados em um estado da zona de tributação mais alta (por exemplo, Pernambuco). Os respectivos efeitos tributários serão atualmente os seguintes:

Tal como no caso anterior, constatamos que são os mesmos os impostos totais, nas operações cuja fase final seja realizada na zona de tributação mais alta, qualquer que seja a modalidade de realização das duas fases anteriores (ver os exemplos 2., 2.3.3 e 2.4.1). Também como no caso anterior, entretanto, é diversa a distribuição dos recolhimentos de impostos aos estados beneficiários.

Como é idêntica atualmente a tributação das operações interestaduais em ambas as zonas de tributação, são também idênticos os efeitos tributários deste exemplo e aqueles das operações do exemplo 2.4.2, finalizadas na zona de tributação mais alta.

2.5 Confronto dos vários efeitos tributários atuais

Para que se possa avaliar melhor a variabilidade dos efeitos tributários atuais de uma mesma operação, segundo a localização do fabricante, do atacadista e do varejista,2 2 Estamos sempre presumindo que o consumidor final esteja localizado no mesmo estado que o varejista, embora isto nem sempre ocorra. 3 Como a operação se desenvolve inteiramente dentro de um mesmo estado, os percentuais, neste caso, são idênticos aos dos valores acrescentados (ver a seção A.) veja-se a tabela 1.

Como podemos perceber imediatamente pela tabela 1, as participações dos estados do fabricante, atacadista e varejista quanto aos valores acrescentados (ver A - tabela 1), no caso presentemente ilustrado, são de 46,67%, 20,00% a 33,33%, respectivamente. Não obstante, as faixas de participações dos respectivos estados, nas correspondentes arrecadações tributárias, são as mostradas na tabela 2.

Em conclusão, dentro da atual sistemática do ICM, o estado do fabricante poderá arrecadar (no caso do exemplo aqui analisado) desde um mínimo de 34,23% até um máximo de 50,00% do total dos tributos correspondentes, dependendo do estado de localização do atacadista e do varejista (é preciso lembrar que estamos presumindo, em todos os casos ilustrados, que o consumidor final esteja localizado no mesmo estado do varejista). O máximo, conseqüentemente, representa um acréscimo de 46% sobre o mínimo.

Os estados do atacadista e do varejista, por sua vez, poderão arrecadar desde os mínimos de 2,22% e 33,33%, respectivamente, até os máximos de, também respectivamente, 32,44% e 51,11%. O máximo, portanto, representa um acréscimo de 1 401% sobre o mínimo, no caso do estado do atacadista, e de 58%, no caso do estado do varejista.

Como já dissemos, sob a sistemática vigente, a diferença entre as alíquotas de ICM que incidem sobre as operações intra e interestaduais tem a finalidade ostensiva de transferir, para os estados consumidores das mercadorias, uma parcela maior do imposto devido pela comercialização final das mercadorias. Não obstante, em muitos casos, essa transferência ou não se materializa, ou então sofre defasamentos variáveis.

Existem dois casos de frustração da referida transferência de receita tributária: o primeiro caso é o daqueles compradores interestaduais que adquirem mercadorias para seu próprio consumo (ou utilização) e não para revenda ou industrialização. Nesses casos (no sistema atual), o estado de destino da operação não obtém qualquer receita, quer imediatamente, quer a longo prazo.

O segundo caso é o daqueles contribuintes que adquirem as mercadorias para revenda ou industrialização. Dependendo do ciclo de comercialização ou industrialização, a obtenção de receita pelo estado de destino sofre um defasamento, pois somente depois de efetuada a comercialização efetiva (isto é, a venda do produto revendido ou industrializado) é que o estado de destino pode (no sistema atual) esperar receber a sua parte da receita tributária de tais operações interestaduais.

No sistema ora proposto, os estados de destino passariam a receber sempre e prontamente aquela parte do ICM das operações interestaduais que fosse correspondente à venda feita pelo fornecedor sediado em outro estado.

3. REFORMULAÇÃO DA SISTEMÁTICA DO ICM DAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS

Nesta parte de nosso estudo, examinaremos a nossa proposta para a reformulação do ICM das operações interestaduais, especialmente os aspectos referentes:

a) ao Fundo de Compensação do ICM e o seu rateio;

b) aos fluxos financeiros do Fundo de Compensação.

3.1 O Fundo de Compensação do ICM e o seu rateio

Uma vez que o ICM, em última análise, é pago pelos consumidores dos produtos, seria mais justo que a sua receita revertesse em benefício dos estados que os consomem e, não, como ocorre atualmente (em grande parte), em benefício dos estados produtores.

Esse objetivo poderá ser conseguido mediante o estabelecimento de um Fundo de Compensação do ICM, a ser gerido pelo Tribunal de Contas da União, à semelhança do que é feito com o Fundo Federal de Participação do Imposto de Renda e do IPI.

Os impostos correspondentes às operações interestaduais seriam depositados nesse Fundo que poderia ser redistribuído aos estados consumidores com base nos dados sobre o consumo que viessem a ser apurados por aquele Tribunal.

O recolhimento do imposto devido nas operações interestaduais continuaria a ser feito pelos fabricantes, atacadistas, varejistas, etc; a fiscalização, conseqüentemente, também continuaria a ser feita pelos respectivos estados de origem.

Para a execução dos rateios, bastaria que cada estado comunicasse ao órgão controlador (por hipótese, o TCU) os dados que já possui referentes às operações interestaduais, tanto ativas como passivas, isto é, às operações de vendas de um estado aos outros estados, por um lado, e aos créditos de compras de um estado nos outros estados, por outro lado (as Secretarias estaduais de Finanças ou Fazenda já possuem estes dados).

No primeiro exercício de aplicação do novo sistema, em que o rateio seria feito integralmente com base nas reduções de receita, não seriam ainda necessárias as informações referentes aos créditos das operações passivas, ou seja, aquelas relativas aos créditos de ICM, referentes às compras efetuadas em outros estados; bastariam as informações referentes às operações ativas, de vendas interestaduais.

O sistema, nesse primeiro exercício, funcionaria da maneira (dados hipotéticos, em milhões de cruzeiros) como se vê na tabela 3.

Em outras palavras, no primeiro exercício, cada estado receberia de volta (rateio do Fundo) o mesmo montante que tivesse arrecadado em relação às operações interestaduais; somente o mecanismo é que seria modificado - as receitas interestaduais passariam a ser depositadas à ardem do Fundo de Compensação e voltariam de novo aos estados de origem.

A partir do segundo exercício, seria introduzida a unificação das alíquotas de imposto de cada estado (e não a unificação das alíquotas de todos os estados, como se poderia supor) e, como já foi dito, 90% do Fundo de Compensação do ICM seriam rateados em proporção às reduções de receitas e 10% em proporção às operações passivas interestaduais. Para exemplificar, tomemos os mesmos dados de operações ativas referidos em relação ao primeiro exercício (tabela 4).

Para a distribuição da parte correspondente aos créditos concedidos (10%) seria armado o quadro 9, adiante.


A partir do décimo primeiro exercício, repetimos, a distribuição seria feita integralmente com base nos créditos das operações passivas.

A situação seria então a seguinte (usando mais uma vez, a título de exemplo, as mesmas operações passivas do segundo exercício):

Quadro 10


3.2 Os fluxos de recursos do Fundo

O sistema proposto, evidentemente, afetaria apenas a receita tributária correspondente às operações interestaduais, isto é, àquelas operações nas quais a firma vendedora e a firma compradora se encontram em estados distintos. Portanto, não seriam afetadas as receitas decorrentes das operações intra-estaduais, isto é, daquelas nas quais tanto a firma compradora como a vendedora se encontram dentro da mesma unidade federada.

Para que o Fundo de Compensação do ICM possa alcançar adequadamente as suas finalidades seria necessário disciplinar rigorosamente seu funcionamento, de modo que todos os estados cumprissem fielmente os seus dispositivos. Não poderíamos esperar que os diversos estados entreguem correntemente os recursos ao Fundo se eles não tiverem uma razoável certeza de que estes recursos também voltarão, prontamente, nos termos estabelecidos.

O disciplinamento do novo sistema teria muito a ganhar se a sua administração fosse confiada ao TCU, o qual já exerce a administração do Fundo de Participação dos estados e municípios no rateio do imposto de renda e poderia (se assim o determinasse a lei) punir o estado acaso recalcitrante, com a retenção da quota daquele último imposto. Isto, evidentemente, seria um recurso extremo e heróico, a ser utilizado somente em último caso. Além disso, há a necessidade de um mecanismo que permita o acompanhamento cotidiano do cumprimento do novo sistema pelos vários estados.

Parece-nos que o ideal seria que toda a arrecadação do ICM passasse a ser feita pela rede bancária autorizada, a qual teria incumbência de canalizar os recursos, diariamente, em conformidade com as destinações legais que tiverem sido estabelecidas. Não obstante, este ponto não é imprescindível. O que de fato seria imprescindível é que os órgãos centrais de Fazenda ou Finanças dos vários estados depositassem, diariamente, a favor do Fundo, as parcelas que devam ser submetidas ao rateio. Possivelmente, tal depósito deveria ser feito no Banco do Brasil, na principal agência de cada estado.

Como, no primeiro exercício, cada estado receberia de volta o mesmo montante depositado, poderia ser dada autorização ao Banco do Brasil para que, no dia útil seguinte ao do depósito, devolvesse o numerário recebido. No entanto, a partir do segundo exercício de vigência do novo sistema, o rateio (como já explicamos) passaria a modificar-se e, por isso, haveria necessidade de adoção de uma metodologia diferente para a devolução do numerário.

A partir do segundo exercício, portanto, haveria uma distribuição diária de devoluções, que seria baseada na média observada nos n meses anteriores. Essa média seria dividida pelo número de dias úteis de cada mês, o que determinaria o montante diário a ser devolvido (inicialmente) a cada um dos estados. Os ajustes para mais ou para menos, decorrentes do rateio efetivo, seriam feitos no mês subseqüente à apuração do rateio, também divididos igualmente entre os dias úteis do mês em questão. Por exemplo, se os rateios efetivos correspondentes ao mês de janeiro fossem publicados em março, seriam os ajustes para mais ou para menos efetuados no decorrer do mês de abril, e assim por diante.

4. DESNECESSIDADE DE ALÍQUOTAS DIFERENCIAIS DE ICM

A instituição do Fundo de Compensação do ICM poderia tornar desnecessárias as atuais diferenças entre as alíquotas vigentes para as operações intra e interestaduais quanto ao seu efeito sobre as receitas tributárias dos vários estados.

A atual dualidade de alíquotas, além de tornar mais complexos os trabalhos burocráticos dos contribuintes tem, entre outras, as seguintes conseqüências: os contribuintes mais criteriosos adotam duas tabelas para os seus preços de venda, respectivamente para as operações intra e interestaduais, de modo que o produto líquido seja idêntico em ambos os casos. Os menos criteriosos simplesmente embolsam a diferença de alíquotas de imposto. Vejamos um exemplo relativo ao primeiro caso (preços diferenciais:

Entretanto, se o contribuinte não adotar preços diferentes para as operações interestaduais, a situação será a seguinte:

Caso venha a ser adotada a simplificação sugerida, não mais haveria diferença entre operações intra e interestaduais, no que diz respeito aos contribuintes; todas as operações tributáveis passariam a ser tratadas da mesma maneira, tanto pelos contribuintes vendedores como pelos contribuintes que adquirem as mercadorias para revenda ou industrialização.

5. OS PRAZOS DE RECOLHIMENTOS DO ICM EM GERAL

Certos aspectos da questão foram recentemente abordados pelos mestres Eugênio Gudin e Octávio Gouvêa de Bulhões (dos quais nos orgulhamos de ter sido aluno, na antiga Faculdade Nacional de Ciências Econômicas).

Aconselham os referidos mestres que, em substituição ao atual ICM, fosse adotada uma cobrança de imposto somente nas operações de venda aos consumidores finais. Alegam eles que, entre outras coisas, isso viria corrigir uma das injustiças fiscais, isto é, aquela que exige que cada empresário recolha correntemente o imposto devido em sua fase do processo de comercialização, ao passo que o produto de tais vendas somente é por ele cobrado mais tarde, ocorrendo, pois, um fluxo negativo de caixa para o empresário.

Não pretendemos alongar-nos, neste momento, quanto aos aspectos (a nosso ver) negativos de um tal sistema, do ponto de vista da arrecadação e fiscalização do imposto. Ao contrário, tencionamos apresentar agora uma sugestão que, sem modificar a atual sistemática do controle do ICM, poderia eliminar os inconvenientes mui justamente apontados pelos nossos queridos mestres. A sugestão consiste, pura e simplesmente, no seguinte: o fisco concederia ao contribuinte ostensivo (o empresário) um prazo de pagamento do imposto correspondente ao prazo médio das compras e vendas do contribuinte; possivelmente, "de lambuja", seria dado um prazo adicional de, digamos, mais 15 dias.

Esse sistema funcionaria da seguinte maneira: ao declarar o seu volume de vendas e compras (o que já é feito atualmente), cada contribuinte indicaria os montantes correspondentes a cada um dos prazos de compra e de venda (digamos, 30, 60, 90 dias,... etc.) e os respectivos prazos médios. Os montantes de cada tipo de operação seriam multiplicados pelos dias de prazo, produzindo os "pontos" ou valores ponderados. O valor líquido dos "pontos", dividido pelo líquido das operações absolutas, daria o prazo médio. Por exemplo:

O prazo médio, no exemplo acima, é de 2 780 000/120 000, ou seja, 23 ou 24 dias. No caso de ser concedido ao contribuinte um prazo incremental de, digamos, 15 dias, o prazo total para o pagamento do imposto seria de 38 ou 39 dias, no exemplo em lide.

  • 1
    Para fins de simplificação, vamos presumir em nosso exemplo que o fabricante em questão
    não tem direito a qualquer crédito fiscal (relativo ao ICM contido nas compras de matérias-primas, etc).
  • 2
    Estamos sempre presumindo que o consumidor final esteja localizado no mesmo estado que o varejista, embora isto nem sempre ocorra.
    3 Como a operação se desenvolve inteiramente dentro de um mesmo estado, os percentuais, neste caso, são idênticos aos dos valores acrescentados (ver a seção
    A.)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 1974
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