Acessibilidade / Reportar erro

Relações industriais: visão panorâmica

ARTIGOS

Relações industriais: visão panorâmica

Laerte Leite Cordeiro

Professor-Adjunto do Departamento de Administração Geral e Relações Industriais da Escola de Administração de Emprêsas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas

O objetivo dêste artigo é o de oferecer uma visão panorâmica da realidade atual do desempenho da função de relações industriais nas emprêsas brasileiras. Para esta comunicação, o lastro acadêmico são duas pesquisas realizadas com o inestimável apoio do Centro de Pesquisas e Publicações da Escola de Administração de Emprêsas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas; a primeira, referente à pequena emprêsa e a segunda, objetivando o reconhecimento da realidade da grande emprêsa. Alguns comentários feitos sobre a emprêsa média são produto de especulação, a partir dos dados das duas pesquisas citadas.

O artigo examina o desempenho funcional em relações industriais ao longo de suas atividades mais típicas, a fim de que a comparação - em têrmos do porte das emprêsas - seja facilitada.

1. RELAÇÕES INDUSTRIAIS NA PEQUENA EMPRESA

Em pesquisa realizada pela Escola de Administração de Emprêsas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas,(1 1 ) CORDEIRO, L. L., DE CARVALHO, A. R., e PEREIRA, L. C. B. Administração Geral e Relações Industriais na Pequena Emprêsa Brasileira, Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1968. ) sôbre os problemas administrativos da pequena emprêsa brasileira, examinaram-se as principais áreas de preocupação, incluindo-se nelas a administração da produção, a administração mercadológica, a administração contábilfinanceira, a jurídico-econômica e a administração geral e relações industriais. Nossas observações em tôrno da realidade atual da atividade de relações industriais estão baseadas nos resultados dessa pesquisa, cujas monografias estão em fase de publicação.

A primeira preocupação dos pesquisadores foi definir a pequena emprêsa no Brasil. Pareceu-lhes que seriam quatro os itens importantes na verificação das condições da pequena emprêsa: a) controle de capital e administração, executado pessoalmente pelos proprietários; b) independência - não deveria estar ligada a qualquer holding; c) inexistência de controle monopolista no mercado em que vendia; e d) não ter mais de 100 empregados e não haver faturado, em 1963, mais de 50 milhões de cruzeiros antigos.

A segunda preocupação foi determinar a amostra de maneira a que fôsse possível tornar válida a pesquisa, em têrmos das pequenas emprêsas brasileiras, como um todo. Pareceu aos pesquisadores que, para o tipo de indagações, uma amostra de conveniência seria suficientemente representativa e, assim, foram selecionadas 155 firmas representando três regiões do País: Nordeste, Centro-Sul e Sul. Foram entrevistados seus proprietários, mediante questionário preparado para tal fim.

Recolhidas as respostas necessárias, foram realizadas várias mesas-redondas, para esclarecer, num contato amplo com empresários de pequena emprêsa, pontos nebulosos dos resultados obtidos na tabulação dos questionários. Completada a pesquisa, seus autores passaram a analisar os resultados e, finalmente, a escrever as monografias que já estão sendo publicadas.

Do esfôrço pioneiro realizado pelos pesquisadores da referida Escola, tomamos algumas informações que nos permitirão oferecer, neste trabalho, um quadro da realidade viva, objetiva e verdadeira das relações industriais na pequena emprêsa brasileira, observada no desempenho de suas atividades típicas.

1.1. Recrutamento ( 2 (2 ) Idem, ibidem, p. 69 a 73. )

Êste é feito, em grande parte, através de contatos pessoais do encarregado ou do próprio patrão, sem nenhuma preocupação por análises de mercado, por tipo de material humano necessário, ou por investigação de melhor método ou fonte de recrutamento. As tabuletas rudimentares colocadas à porta da fábrica foram mencionadas várias vêzes, sendo muito citada a utilização de anúncios em jornais para a maioria dos casos.

A solicitação às agências profissionais de emprego é muito pouco freqüente na pequena emprêsa em reduzido número de casos foi tentada quando se buscava pessoal de supervisão média, técnicos ou funcionário de escritório.

1.2. Seleção ( 3 (3 ) Idem, ibidem, p. 73 a 74. )

Em 50% dos casos, a seleção tem constado exclusivamente de uma entrevista realizada com o patrão ou com o encarregado. Alguns dos proprietários informaram sôbre a realização de provas práticas tipo "vá ali e faça um para que eu veja", sem qualquer outra preocupação, a não ser a de verificar a habilidade profissional do candidato. A Psicotécnica positivamente não encontrou ainda possibilidade de maior aplicação na pequena emprêsa. O exame do conteúdo da carteira profissional foi um método prático bastante mencionado e também o período de experiência: "Desde que não podemos selecionar imediatamente, aceitamos o homem e, no dia a dia, verificamos se serve ou não". As agências de emprêgo, pouco procuradas para recrutamento, também não são muito consideradas na seleção dos candidatos.

1.3. Treinamento4 (4 ) Idem, p. 74 a 76.

A grande maioria dos proprietários ou responsáveis informou que não havia treinamento sistemático e orientado em suas emprêsas. O treinamento ocorre, informalmente, no serviço e o nôvo empregado aprende o que tem que aprender em seu contato diário com o encarregado.

O treinamento é, em alguns casos, deixado a cargo de um dos empregados mais antigos que apadrinha a preparação do nôvo, ensinando-lhe o que sabe sôbre os serviços a serem executados. Em uns poucos casos, o próprio patrão participa do processo. E é necessário recordar que isso é feito sem qualquer planejamento ou controle formal, com todos os prejuízos ou vantagens que tal processo possa oferecer.

1.4. Remuneração5 (5 ) Idem, p. 86 a 93.

Na pequena emprêsa brasileira não se faz avaliação ou classificação dos cargos. A diretriz básica é a de que sempre é melhor não diferenciar salários para não haver problemas. Assim, o salário-mínimo foi lembrado como regra geral. Talvez por fôrça do pequeno número de empregados,o cargo e o ocupante do cargo são muitas vêzes confundidos na determinação do salário. Muitas emprêsas entrevistadas mencionaram utilizar incentivos salariais, a despeito de recearem as complicações oriundas do processo. Argumentaram que, às vêzes, se deve produzir ou vender mais, mesmo até para salvar a emprêsa da quebra. Sucede então que, passada a fase que justificava o incentivo, não há como convencer os empregados da nova situação. O vale foi, também, confirmado como tradição da pequena emprêsa, ainda que os empresários "se arranquem os cabelos" para lidar com êsse problema. Sua justificativa para a concessão é a de que, sem o vale, o empregado não consegue subsistir.

1.5. Avaliação do Desempenho e Promoções ( 6 (6 ) Idem, p. 93 a 95. )

Não ocorre, na pequena emprêsa, a aplicação de técnicas sistemáticas e objetivas de avaliação do desempenho individual dos empregados. Como já foi visto acima, não há muito interêsse dos empresários em diferenciar os indivíduos, seja qual fôr o critério. É evidente que uma avaliação acontece em todos os casos, mas ela é subjetiva, assistemática e principalmente política. As promoções, nos poucos casos em que ocorrem, sejam verticais ou horizontais (aumentos), são sempre feitas a partir da avaliação não estruturada e subjetiva. Não há rotinas, formulários, sistemas.

1.6. Benefícios ( 7 (7 ) Idem, p. 96 a 98. )

A grande maioria das emprêsas pesquisadas informou que o benefício mais freqüente é o empréstimo pessoal, em dinheiro, feito aos empregados. Segundo informaram, parece que dificilmente são lesadas, com respeito ao reembolso do que lhes é devido. Já há pequenas emprêsas que dão ou subsidiam uniformes, oferecem assistência médica e remédios, pagam o prêmio total do seguro de vida em grupo para seus empregados, fazem pequenas doações para o clube (em geral de futebol) dos empregados, têm seu refeitório, outorgam assistência jurídica gratuita e, quando é o caso, vendem produtos de sua fabricação com um desconto especial. Ainda assim, é importante notar que - embora as emprêsas já façam mais do que seria de se esperar - as concessões são estabelecidas de acordo com as necessidades do momento, sem uma diretriz a orientá-las, sem controle de sua eficiência e sem planejamento administrativo. São concedidas ao sabor do vento paternal que sopra aqui e acolá.

1.7. Relações Trabalhistas ( 8 (8 ) Idem, p. 99 a 100. )

Ainda que a pesquisa tenha sido realizada em uma fase político-econômico-social do Brasil em que a agitação sindical podia fàcilmente sentir-se, somente 15% dos entrevistados declararam haver tido alguma dificuldade com o sindicato operário. E ainda mais, nos poucos casos mencionados, os problemas sempre foram resolvidos de maneira fácil e rápida. No que se refere à participação dos empregados na atividade sindical, a resposta da grande maioria foi a de que essa participação não existe, sendo totalmente verdadeiro que nenhum empregado de pequena emprêsa é líder de movimento sindical no Brasil. As razões invocadas para essa pequena participação dos empregados no sindicato foram tôdas relacionadas com o fato de êste órgão da classe nunca fazer nada por êles: sentindo-se, assim, abandonados, não o buscam.

Em 95% das firmas pesquisadas, jamais houve uma greve, ainda que para muitas o trabalho tivesse que ser interrompido, às vêzes, em virtude do receio de represália do sindicato, ou por causa de piquêtes à porta da emprêsa, principalmente nas greves gerais ou de solidariedade, tão comuns à época em que a pesquisa foi realizada.

1.8. Relações com Empregados ( 9 (9 ) Idem, p. 59 a 63. )

Um dos dados curiosos da pesquisa foi aquêle sôbre as relações entre os empregados e o dono. Foram descritas como sendo muito informais, permitindo-se, geralmente, uma comunicação direta entre êles, por meio de sugestões ou reclamações dos primeiros, passando por cima de eventuais chefes ou encarregados intermediários. A justificativa dos patrões foi a de que êsse procedimento, condenável em teoria, cria um ambiente democrático e permissível. "Na prática", dizem, "leva a uma administração mais dinâmica". Por outro lado, muitos contatos entre o dono e os empregados sucedem em razão de problemas pessoais ou domésticos porque: a) o patrão está sempre perto e disposto a escutar suas dúvidas; b) o patrão tem alguma intimidade com seus empregados, conhecendo-os pelo nome e sabendo da situação pessoal de cada um; c) é êle quem tem poder de decisão; não há motivo, portanto, para buscar auxílio de outros; d) representa proteção para os empregados que, em geral, não conhecem bem seus direitos; e) como o sindicato não os ajuda a resolver seus problemas, o patrão é a única saída.

É essa a realidade apurada em relação à pequena emprêsa brasileira.

2. RELAÇÕES INDUSTRIAIS NA EMPRESA MÉDIA

No que diz respeito à emprêsa de porte médio, não há, que saibamos, informações mais reais. Não conhecemos, na literatura, qualquer trabalho no Brasil que possa servir de base a um relatório sôbre o atual desempenho funcional nas relações industriais na emprêsa média. Assim, nossos comentários serão baseados exclusivamente em especulações sôbre as pesquisas citadas ao longo do texto. Perdoemnos sucumbir a essa tentação.

Devemos, talvez, em primeiro lugar, imaginar e determinar aquilo que poderíamos denominar de emprêsa média, estabelecendo suas diferenças para com a pequena e grande emprêsa, em têrmos do que nos interessa nesta análise. Parece-nos, por exemplo, que o número de empregados se elevaria a mais de 59, não ultrapassando, geralmente, o número de 200 ou 300, dependendo do tipo de emprêsa.

O organograma mostraria uma estrutura que, sem ser tão achatada como a da pequena emprêsa, não teria a mesma superposição de níveis das grandes. Os proprietários talvez já não sejam os únicos administradores, mas, também, não terão delegado a outros administradores - profissionais - grande parte da administração de suas emprêsas, como no caso das grandes. Há um desempenho mais técnico em relação à emprêsa pequena, mas sem as proporções viáveis para a grande. Dispõe de maiores recursos financeiros e humanos, sem que possa chegar às ótimas condições da grande. É, indubitàvelmente, mais burocrática que a pequena, embora não possa competir ainda com a burocracia necessária e estruturada da emprêsa grande. E assim por diante.

Construída, portanto, nossa imagem de emprêsa de porte médio no Brasil, que substitui dados de pesquisa que não se têm, resta-nos agora desenvolver os estudos sobre seus problemas específicos de relações industriais, seguindo o modêlo que estabelecemos para a análise da situação da pequena emprêsa.

Em nossa opinião, as emprêsas, nesse estágio de desenvolvimento, já se encontram em condições e com necessidade de ampliar e aperfeiçoar seus esforços para melhor administrarem seus recursos humanos. O recrutamento e a seleção de pessoal já merecem mais atenção, em face do número maior de admissões e do movimento geral de pessoal; o número de cargos e de pessoal aumenta, fazendo com que os problemas de administração salarial mereçam maiores cuidados. Os empregados talvez já não sejam João, Antônio ou Alberto, que o dono conhecia pelo nome, já que, ao perderem sua identidade humana, são hoje o 221, o 300 e o 97. Os problemas relacionados com a obediência aos preceitos da legislação trabalhista ampliam-se em função do maior número de empregados.

Há que se estabelecer diferenças entre os empregados, avaliá-los, e promovê-los. A delegação da autoridade, para ser exercida, demanda um condicionamento dos indivíduos, a necessidade de planejar e executar um treinamento, tornado indispensável, ainda que em bases modestas.

Por tudo isso, cremos que neste tipo de emprêsa já exista desenvolvimento na direção de uma administração de pessoal exercida de maneira mais técnica, ainda que não se possa imaginar profundidade maior em seu desempenho. Êsses são nossos breves comentários especulativos sobre a emprêsa média e seu desempenho em relações industriais.

3. RELAÇÕES INDUSTRIAIS NA GRANDE EMPRÊSA

No que se refere à grande emprêsa, felizmente, podemos contar com resultados de pesquisa que informam as condições reais em que ocorre o desempenho da função de relações industriais. Com efeito, em trabalho realizado há já algum tempo, pesquisadores investigaram emprêsas industriais de São Paulo, com mais de 1.000 empregados, e consideradas grandes para as condições brasileiras.(10 (10 ) VALLE DA SILVA, L. F. e CORDEIRO, L. L. A Função de Relações Industriais em Emprêsas Industriais do Grande São Paulo, 1965/66, cujos resultados vão aqui relatados. ) A amostra foi de, aproximadamente, 25% do universo e incluíram-se emprêsas dos ramos industriais mais representativos, entre os quais: eletromecânico, químico-farmacêutico, de borracha, alimentos, têxteis e brinquedos. Entre os resultados gerais colhidos na pesquisa, verificou-se que 100% das emprêsas da amostra têm um departamento de relações industriais que participa da formulação das diretrizes gerais que se referem aos recursos humanos ligados à emprêsa e que, ao mesmo tempo, as implementa, executivamente, tornando realidade efetiva o planejamento de pessoal. Na seqüência histórica do desenvolver das emprêsas pesquisadas ocorreu a absorção, pelo departamento de relações industriais atual, da antiga e menos ambiciosa seção de pessoal que se mantém como uma unidade subalterna, executando tarefas ligadas à rotina burocrática de registro e controle legal dos recursos humanos e empregados. Quanto à localização do departamento de relações industriais na estrutura formal das organizações, somente duas alternativas puderam ser anotadas na pesquisa: 1) localizado como área funcional básica, ao lado das vendas, produção e finanças; e 2) localizado debaixo de uma gerência ou uma diretoria administrativa, ao lado de finanças, mas ainda sem alcançar a importância de vendas e produção consideradas por muitos como as funções fundamentais na indústria. (Vide organograma na página seguinte.)

O organograma de relações industriais, considerado próximo da média, nas grandes emprêsas inclui os setores de recrutamento e seleção, registro e controle, administração salarial, treinamento, benefícios, relações trabalhistas, prevenção de acidentes e segurança.

No que se refere ao maior responsável pelo departamento de relações industriais, o título de seu cargo mais freqüentemente encontrado é o de Gerente de Relações Industriais. Quanto à instrução, verificou a pesquisa que 60% dos titulares ao departamento de relações industriais dispõem de diploma de curso superior, aparecendo com bastante freqüência os advogados, os economistas e os cientistas sociais. O Gerente de Relações Industriais, em geral, tem assento nas reuniões da cúpula, incorporando-se, desta forma, ao grupo profissional componente da administração superior. Entre os dados gerais, verificaram ainda os pesquisadores que a relação entre o número total de empregados na emprêsa e o número de empregados do departamento de relações industriais oferecia um resultado médio de 5% e um resultado mediano de 4,4% que demonstram o grau de especialização já alcançado por tais organizações e a relevância com que esta área já é distinguida no concêrto das atividades administrativas das emprêsas.

3.1. Recrutamento e Seleção

A tarefa de procurar e escolher os recursos humanos necessários para as atividades das emprêsas é realizada de forma ampla e atualizada. A existência de agências de emprêgo permite o recrutamento por essa via ainda que, na maior parte das vêzes, sua utilização se restrinja à procura de administradores e chefes burocráticos de nível intermediário. As escolas são outra via de recrutamento não só para colocações permanentes dos já graduados como, também, para prática dos alunos durante seus cursos. Os métodos tradicionais de procura no arquivo de antigos pretendentes, de recomendações de funcionários da emprêsa, tabuletas à porta da fábrica e anúncios em jornais são amplamente utilizados. O processo de seleção também é o recomendado, clàssicamente, na literatura especializada e inclui entrevistas, preenchimento de formulários, provas de capacidade, testes psicológicos, verificação de referências e exame médico. Dado curioso é ser a Psicotécnica ainda utilizada, embora presente teoricamente, na descrição dos passos mais comuns do processo de seleção. Só 27,7 % das emprêsas utilizam testes de inteligência, sendo que sua aplicação fica restrita a cargos burocráticos ou de supervisão; os testes de personalidade são empregados em apenas 11,1% das indústrias e, em geral, só para cargos superiores de nível executivo.

O teste de RAVEN foi mencionado como o mais utilizado para inteligência e o psicodiagnóstico miocinético de MYRA Y LÓPEZ, O mais comum para as característicos de personalidade.

3.2. Turnover

A taxa de turnover - considerada por muitos como o termómetro que mede a condição e o estado geral da administração e, em especial, da política de pessoal das emprêsas - é, efetivamente, computada e considerada por, aproximadamente, 60% das organizações pesquisadas. A grande maioria dessas emprêsas (63,2% ) efetua o cálculo da taxa em bases mensais e as demais, em cômputo anual, semestral ou sem periodicidade estabelecida.

3.3. Treinamento

A pesquisa demonstrou que 95% das emprêsas inquiridas oferecem algum treinamento sistemático a seus empregados. Aos aprendizes (menores) ministram, através do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial e Comercial (SENAI-SENAC), o ensinamento de formação profissional. Aos empregados recém-admitidos dá treinamento de orientação inicial destinado a promover sua integração no quadro de pessoal. Muito freqüente também é o treinamento de supervisores de primeira linha, tanto no setor operário quanto no setor burocrático. A maior colaboração que a administração pública oferece à empresa privada, através do departamento de relações industriais, é o treinamento de supervisores pelo método TWI (Training Witbin Industry) que, trazido ao Brasil por uma equipe norte-americana, em meados de 1950, logo ganhou prestígio oficial por adequar-se eficientemente às nossas necessidades de rápida formação de mão-de-obra de supervisão, em virtude do início do processo de expansão industrial, já então, em ritmo acelerado. O Govêno assumiu a responsabilidade por sua divulgação, ofereceu cursos gratuitos, graduou instrutores para as necessidades dos departamentos de relações industriais das emprêsas. Transcorridos já quase 20 anos de seu lançamento no Brasil, o TWI é ainda o curso para supervisores de primeira linha mais realizado nas emprêsas industriais. Embora os programas: atuais de treinamento para supervisão sejam mais completos do que o TWI, nem por isso se abandona êste eficiente método.

Um grande número de emprêsas oferece treinamento também aos níveis mais altos da administração em suas organizações. Há no Brasil um número bastante grande de universidades e instituições que oferecem cursos de desenvolvimento de executivos, deixando de ser necessário para as emprêsas o envio de administradores para cursos no exterior, acontecimento bastante comum alguns anos atrás. Apenas para oferecer uma imagem mais nítida de como as emprêsas encontram facilidade no treinamento (formação ou desenvolvimento) de pessoal para os níveis de administração, basta dizer que só na cidade de São Paulo existem seis Faculdades de Administração de Emprêsas e, pelo menos, 30 instituições destinadas a aperfeiçoar supervisores e executivos. O treinamento é, sem dúvida, uma das mais bem cuidadas áreas de atividade de relações industriais no Brasil.

3.4. Avaliação do Desempenho

Os resultados da pesquisa informaram que, aproximadamente, 68,5% das grandes emprêsas industriais brasileiras se utilizam de um sistema de avaliação do desempenho individual dos empregados.

A justificativa para o uso dêsse instrumento de relações industriais é a de que as promoções horizontais e verticais são produzidas com resultados mais objetivos e menos discutíveis; que o moral da organização se eleva a partir da eqüidade que se estabelece entre todos os empregados; e que se podem perceber falhas de treinamento a serem corrigidas.

A avaliação do desempenho é realizada em vários momentos específicos da vida do empregado na emprêsa, como, por exemplo, ao final do período de experiência e ao término do primeiro ano de trabalho. Basicamente, todavia, essa atividade de relações industriais está relacionada com a política de salários da emprêsa e é fator de sua determinação. A maioria das emprêsas se vale dêsse instrumento para todos os cargos operários, burocráticos ou de supervisão média, mas não o utiliza para os cargos de gerência ou executivos de nível superior. Em geral, os resultados da avaliação não são mostrados ao avaliado pelo superior imediato nem pelo departamento de relações industriais, e são considerados confidenciais.

3.5. Benefícios

100% das emprêsas oferecem algum tipo de benefício extra-salarial aos empregados. Trata-se, efetivamente, de prática comum no Brasil. A pesquisa anotou os mais comuns: o restaurante da emprêsa, com alimentação oferecida dentro de bons padrões médios de qualidade, a preço de custo ou subsidiada pela emprêsa; assistência médicohospitalar-dentária, completa e com extensão, em muitos casos, aos dependentes do empregado; transporte dos empregados em ônibus especiais da emprêsa ou alugados, especialmente quando a fábrica se localiza na periferia das cidades; clube dos empregados, mantido ou subsidiado em seu orçamento por doações da emprêsa; colônias de férias; cooperativas de consumo; bolsas de estudos; empréstimos; e outros mais. As explicações para essa concessão ampla das emprêsas são controvertidas e discutíveis: para alguns, as emprêsas têm que fazer o que o Instituto deveria fazer e não faz; para outros, é uma corrida louca no sentido de conquistar e, principalmente, manter a mão-de-obra difícil de obter-se no mercado; para muitos, é uma forma de pagar salários baixos e dar a aparência de que estão altamente preocupados com o bem-estar de "seus" empregados; e seguem-se outras explicações mais ou menos cínicas. Seja, porém, qual fôr a explicação, o fato é que hoje em dia, no Brasil, a grande emprêsa que não oferecer um bom plano de benefícios terá, realmente, muitas dificuldades em conseguir atrair os recursos humanos de que necessita.

3.6. Administração de Salários

Como em qualquer país, também no Brasil, o problema da remuneração é o centro das preocupações do departamento de relações industriais. Isso se comprova com êsse fato que a pesquisa revelou: 95% das emprêsas estudadas tinham um setor para cuidar especificamente dos problemas ligados à política de salários. A avaliação de cargos, a pesquisa de salários, a avaliação do desempenho individual e o controle das intervenções do Govêrno são as atividades mais comumente atribuídas ao setor de administração de salários, que as executa em detalhe. Nos países em processo de desenvolvimento e de elevado índice inflacionário, a satisfação das necessidades primárias ou econômicas dos empregados é prioritária.(11 (11 ) MCGREGOR, Douglas. Os Aspectos Humanos da Emprêsa, Lisboa, Livraria Clássica Editora, 1960. ) Daí a grande preocupação dos departamentos de relações industriais nas emprêsas pelo conjunto de atividades que lidam com a remuneração dos empregados, em todos os níveis da hierarquia. O salário é a grande consideração. Se o trabalhador tiver que trocar relações humanas por cruzeiros, aceitará fácilmente a proposição. Assim sendo, para a emprêsa brasileira, a administração de salários é a atividade mais importante. A grande emprêsa no Brasil analisa, descreve e avalia os cargos de suas estruturas organizacionais; realiza pesquisa de salário com seus próprios recursos, associando-se a outras, ou comprando o trabalho feito por agências externas. Determina, gráficamente, sua curva de salários e considerão desempenho individual do empregado como fator diferencial da remuneração. Leva em consideração as reivindicações sindicais e ajusta sua política às decisões indiscutíveis do Govêrno.

3.7. Prevenção de Acidentes

A pesquisa demonstrou que em 95% das emprêsas o departamento de relações industriais é o órgão encarregado da tarefa de prevenir acidentes industriais. Na maioria dos departamentos há um setor exclusivamente para cuidar dessa tarefa e em 95% dos casos há controle sobre os acidentes ocorridos. O controle é exercido através de índices de freqüências e gravidade dos acidentes, estatisticamente computados. É bom recordar que a legislação trabalhista, no Brasil, obriga as emprêsas com mais de 100 empregados a manterem uma comissão interna de prevenção de acidentes (C.I.P.A.), composta de representantes da administração e dos empregados, em igual número, com o objetivo geral de prevenir acidentes através de inspeções, propaganda e controle nessa área. Deve-se dizer, ainda, que, na maioria das emprêsas, essas comissões, criadas por fôrça de lei, não encontram condições de melhor desempenho, sendo, portanto, o resultado de sua ação bastante relativo.

3.8. Segurança

As atividades ligadas à segurança das pessoas e das instalações tam bém se encontram, na maioria das emprêsas (85% ), subordinadas ao departamento de relações industriais. Como no caso dá prevenção de acidentes também aqui há, em geral, um setor da estrutura de relações industriais a cuidar, especificamente, dos problemas que ocorrem.

As atividades mais comumente atribuídas à segurança são: a supervisão do corpo de guardas, compreendendo a identificação e a revista eventual de pessoas à porta; o controle do trânsito interno; a guarda noturna; a prevenção e combate a incêndios junto aos empregados; o treinamento de brigadas voluntárias e a supervisão eventual do Corpo de Bombeiros e do equipamento especializado. Em 100% das emprêsas há um Corpo de Guardas, havendo Corpo de Bombeiros em apenas 50% dos casos. Quando se imaginam emprêsas com 5.000 empregados, ocupando áreas quadradas imensas (como no caso das emprêsas automobilísticas), com grande circulação de fornecedores, clientes e interessados diversos, operando com materiais e processos por vêzes altamente perigosos, tem-se que admitir que essas atividades devem realmente merecer a intenção exclusiva nos departamentos de relações industriais para que sejam desempenhadas de forma adequada e tranqüila. De seu bom exercício depende não só a integridade da emprêsa, como entidade responsável por suas instalações, mas, também, a dos sêres humanos que nela trabalham e que merecem todo o cuidado possível.

3.9. Relações Trabalhistas

É área de atividade das mais controvertidas no Brasil. Antes da Revolução de 1964, sendo os sindicatos altamente ativos, os departamentos de relações industriais eram os órgãos que suportavam a carga do relacionamento com as entidades dos trabalhadores, servindo de aríete assim como de amortecedor.

O setor de relações trabalhistas era, na maior parte das vêzes, dirigido por um hábil advogado militante nas cortes da Justiça Trabalhista, com grande prática de tôdas as coisas que se referissem a sindicatos, a líderes sindicais, à legislação específica e assim por diante. Entre as muitas tarefas, nem sempre muito elegantes, estavam as de comprar informações ou pessoas, espionar as assembléias sindicais, chamar a polícia política quando os piquêtes nas portas das fábricas impediam a entrada de empregados nas greves gerais, particulares ou de solidariedade, representar <os interêsses das emprêsas nos problemas da Justiça do Trabalho e o aconselhamento na aplicação de medidas disciplinares.

Com a Revolução, o rumo da problemática mudou: não há a agressividade sindical de luta, não há greves e as reivindicações de salários não são atendidas quando conflitam com a política antiinflacionária do Govêrno Federal. O resultado da mudança, para o departamento de relações industriais, foi um alívio de pressão ocorrendo, porém, o esvaziamento das funções do setor de relações trabalhistas que, de unidade eminentemente política e de certa maneira policial, se transformou em simples órgão assessor, de conteúdo jurídico. A maioria das emprêsas, a partir da comprovação do fato, simplesmente eliminou êsse órgão da estrutura de relações industriais.

Êste é o panorama de relações industriais na grande emprêsa brasileira, que se ofereceu ao pesquisador interessado.

  • 1) CORDEIRO, L. L., DE CARVALHO, A. R., e PEREIRA, L. C. B. Administração Geral e Relações Industriais na Pequena Emprêsa Brasileira, Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1968.
  • (10) VALLE DA SILVA, L. F. e CORDEIRO, L. L. A Função de Relações Industriais em Emprêsas Industriais do Grande São Paulo, 1965/66, cujos resultados vão aqui relatados.
  • (11) MCGREGOR, Douglas. Os Aspectos Humanos da Emprêsa, Lisboa, Livraria Clássica Editora, 1960.
  • 1
    ) CORDEIRO, L. L., DE CARVALHO, A. R., e PEREIRA, L. C. B.
    Administração Geral e Relações Industriais na Pequena Emprêsa Brasileira, Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1968.
  • (2
    )
    Idem, ibidem, p. 69 a 73.
  • (3
    )
    Idem, ibidem, p. 73 a 74.
  • (4
    )
    Idem, p. 74 a 76.
  • (5
    )
    Idem, p. 86 a 93.
  • (6
    )
    Idem, p. 93 a 95.
  • (7
    )
    Idem, p. 96 a 98.
  • (8
    )
    Idem, p. 99 a 100.
  • (9
    )
    Idem, p. 59 a 63.
  • (10
    ) VALLE DA SILVA, L. F. e CORDEIRO, L. L.
    A Função de Relações Industriais em Emprêsas Industriais do Grande São Paulo, 1965/66, cujos resultados vão aqui relatados.
  • (11
    ) MCGREGOR,
    Douglas. Os Aspectos Humanos da Emprêsa, Lisboa, Livraria Clássica Editora, 1960.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jul 2015
    • Data do Fascículo
      Mar 1969
    Fundação Getulio Vargas, Escola de Administração de Empresas de S.Paulo Av 9 de Julho, 2029, 01313-902 S. Paulo - SP Brasil, Tel.: (55 11) 3799-7999, Fax: (55 11) 3799-7871 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: rae@fgv.br