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O executivo, esse eunuco

RESENHA BIBLIOGRÁFICA

Kurt E. Weil

O executivo, esse eunuco

Por O. William Battalia e John J. Tarrant. Rio de Janeiro, trad, do original inglês The corporate eunuch, de Vera Nunes Pedroso. Editora Expressão e Cultura, 1956. 156 p.

Estamos diante de um livro de moda, com um título que pode ser chamado de sexy (embora isso possa parecer paradoxal), de fácil leitura, com um fundo cultural do autor ou autores suficiente para também "servir de entretenimento aos mais exigentes devoradores de pratos de cultura administrativa. Um dos grandes editores de livros no Brasil disse uma vez que o título vende metade da edição. Assim, um livro inglês que trata de doenças profissionais chama-se Health in industry (saúde na indústria), para acentuar a conotação positiva. Pode ser afirmado sem hesitação que o título desse pequeno livro nada tem a ver com o conteúdo. Poderia ser sugerido, então, Da impotência do executivo, ou Da importância de não fazer nada com convicção. Talvez o capítulo que mais se aproxima do tema seria o de n. 7, "Os executivos devem ser casados?" O anti-herói desse capítulo está sexualmente impotente, na página 69. Mas algo a mais sobre o tema do título pode ser procurado em vão. De lá para cá surge um "emasculado" e só. Aliás este resenhista, por motivos óbvios, duvida que um executivo possa ser eunuco. E deixando o título, o que o livro tem de novo? Resposta: nada. Mas vale a pena ler? Sim.

O executivo - ou, usando um termo mais adequado - esse desgraçado, é apresentado como um homem infeliz porque não sabe o que faz. A esposa, colocada como símbolo-mártir do executivo de sucesso, é dona de um lar infeliz. O executivo, de acordo com os autores, nada faz - ele delega, julga, comanda, assiste a reuniões, convoca reuniões, e assim vai até um dia perceber que nada fez de realmente útil. O autor prossegue citando, na maioria das páginas dedicadas a soluções, os remédios de Frederick Herzberg, do Job-Enrichment. Diz Herzberg que só o dinheiro não é suficiente para motivar. Indubitavelmente essa descoberta é antiga - e válida, quando a escolha de empregos permite prestar atenção nos demais fatores associados ao emprego: ambiente, colegas, benefícios extras, possibilidades de promoção. Mas também, muitas vezes - e no Brasil, quase sempre - a simples necessidade de ganho - pagar as contas - sobrepõe-se a tudo. Então Herzberg afirma que existem dois conjuntos de condições que afetam a maneira pela qual executamos as nossas tarefas. A um deles chama fatores de higiene; desses fatores, os mais importantes são: a política e a administração da companhia, a supervisão, o ordenado, as relações interpessoais e as condições de trabalho. Nenhum deles pode satisfazer, e sim apenas evitar que uma pessoa se sinta insatisfeita. Os motivadores, ao contrário, têm a capacidade de satisfazer. São as coisas que fazem com que as pessoas se sintam bem trabalhando... e são: o próprio trabalho, as realizações, o reconhecimento, a responsabilidade e o progresso (p. 51-2). A essas receitas de Herzberg, os autores juntam as deles. Por exemplo, perguntam se o executivo continua subindo de cargo em cargo, em ritmo satisfatório. Se não, ele deve conformar-se com a manutenção num platô de segurança - anterior ao da incompetência de Peter (Peter's principle). Para isso, os autores recorrem repentinamente à luta pela sobrevivência evolutiva de Darwin e à nova biologia usada por Anthony Jay, no Corporation man. A luta pela sobrevivência dentro de uma organização é isenta de sangue, mas pode ser igualmente feroz, (p. 136). Assim, os escritos de Lorenz, Desmond Morris (o que tem o macaco nu com o executivo), Morris e Tiger, observando pássaros e mamíferos, transferem para o homem fenômenos tais como agressão, combate fictício, o imperativo territorial, sujeição masculina, etc. O resenhista concorda em parte com o atavismo darwiniano, apesar de discordar da transferência - assim, é ir longe demais considerar o cheirinho deixado pelo gatão em tudo que é a "zona de influência dele" comparável à assinatura do chefão em toda papelada autorizando qualquer coisa (exemplo do resenhista - não do livro). Poder-se-ia falar do poste e do cachorro como imperativo territorial. Mas este resenhista prefere usar o livro de Buchsbaum - Animais without backbones (Animais sem espinha dorsal), e ver a organização das formigas e abelhas (Maeterlinck) ou ler sobre a sobrevivência das baratas, que superaram incólumes e com poucas modificações mais de 300 milhões de anos, apenas encolhendo-se um pouco (no carbonífero, chegavam a 60 ou 70cm de comprimento). De fato, a barata seria, na escola de absurdo de Lodi, um bom exemplo para o executivo - decapitada, continua a funcionar normalmente, pois a cabeça só serve para colocar alimentos dentro do canal de digestão.

Em todo caso, o padrão medidor para os autores é a pergunta: "Fiz isto, estou satisfeito?" e, então, para ficar satisfeito, recomendam:

1.º Concentre-se na área pessoal de competência.

2.º Torne-se indispensável para um futuro vencedor (isso é duro - nas repartições públicas brasileiras deve-se "badalar" todo mundo, nunca se sabe quem vai subir em seguida).

3.º Transforme-se em conselheiro de confiança.

Townsend, que escreveu o prefácio do livro, não concorda com o platô de segurança e com os conselhos dos autores sobre como alcançar a satisfação. Então, dá no prefácio (que deve ser lido após o livro - portanto deveria ser um posfácio, ou melhor, poscrito) a receita dele, Townsend:

a) Desista de tudo (parece que é avestruz com a cabeça na areia - modernamente é o hippy ou pseudohippy, na opinião do resenhista).

b) Desista e construa a sua própria pirâmide.

c) Continue, mas mantenha-se independente.

d) Torne-se um líder.

Ao menos as propostas de Townsend são tão impraticáveis como as dos autores.

Mas vale a pena ler o livro, sim, e muito. Townsend, por exemplo discorda do capítulo 13, que advoga que o executivo deve ser visível. Mas é exatamente a visibilidade do executivo que lhe permite a mudança de emprego para melhor - e os autores mostram como essa visibilidade deve ser alcançada:

a) escreva artigos para jornais profissionais;

b) tenha notícias na imprensa;

c) participe em associações profissionais;

d) mantenha ligação com antigos colegas;

e) assista a reuniões científicas e outras;

f) tome parte em mesas-redondas;

g) vá ao clube praticar esportes;

h) tome parte em atividades cívicas;

i) fique em contato com agências especializadas em empregos.

O exemplo do pai de filho escoteiro é meio fraco - mas as idéias todas valem. Valem também os capítulos sobre o casamento do executivo (7) e mais os seguintes:

O buraco no dia cheio (5)

A interminável conferência de negócios (6)

Vou ser meu próprio patrão (8)

O empório executivo (9)

Como administrar o sucesso (10)

Rompendo as barreiras do organograma (11)

Delegue a sua vontade (12).

Nesses, e em outros capítulos, os autores tratam de problemas reais como, por exemplo, o de que a maior parte do tempo é perdido em reuniões, que o executivo moderno é considerado executivo, mas não executivo de um ramo industrial, como por exemplo, vendas de tecidos. Então, o executivo pode ser jogado de vendas de tecidos para distribuição de detergentes. A falta de ligação, assim, torna obrigatório o consultor, como instrutor externo, outra das teses dos autores.

Os autores não são identificados mais detalhadamente - fala-se somente em Battalia como sócio de uma empresa consultora - Battalia, Lotz & associates. Mas ao menos são muito bem lidos - e mesmo não concordando com a tese, difusa e confusa do livro, de que o executivo é infeliz, porque não faz, mas só resolve, decide, supervisiona, preside, etc... deve-se ler livro, pois e pequeno, não cansa, informa e diverte. Alguns dos casos são longos demais, mas isso não subtrai. A tradução é boa, dentro das limitações da linguagem inglesa, que deve ter sido bastante concisa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Ago 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 1975
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