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Análise do processo de implantação das normas de sustentabilidade empresarial: um estudo de caso em uma agroindústria frigorífica de bovinos

Analysis of implantation process of enterprise sustainability rules: study of case in the beef agro industry

Resumos

O trabalho tem como objetivo analisar como é o processo de adequação da agroindústria às normas internacionalmente reconhecidas de sustentabilidade (ISO 9001, ISO 14001, OHSAS 18001 e SA 8000). Para tanto, foi estudado um frigorífico exportador de carne bovina no Estado de Mato Grosso do Sul. Observou-se que o processo de implantação das normas de sustentabilidade foi realizado por meio do cumprimento dos requisitos normativos exigidos para a certificação, a partir do desenvolvimento de programas socioambientais, mudando culturalmente as ações da organização e dos colaboradores em termos mais sustentáveis.

Sustentabilidade; Qualidade; Certificação; Agroindústria; Carne bovina


This work intends to analyze the implantation process of internationally recognized rules of sustainability (ISO 9001, ISO 14001, OHSAS 18001 e SA 8000). An exporting slaughter house in the state of Mato Grosso do Sul was studied for the case. As a result it was noticed that the rules for implantation process of sustainability fulfilled the rule requirements demanded for certification, culturally modifying organization and collaborators actions towards the sustainable awareness.

Sustainability; Quality; Certification; Agribusiness; Beef agro industry


Geraldino Carneiro de AraújoI; Paulo Sergio Miranda MendonçaII

IMestre em Agronegócios pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Professor da Faculdade de Administração da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Rua Paraná, 191, Stella Maris - Andradina - SP - CEP 16901-155. E-mail: geraldino.araujo@gmail.com IIDoutor em Administração pela Universidade de São Paulo (USP). Professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Avenida Bandeirantes, 3.900, Monte Alegre - Ribeirão Preto - SP - CEP 14030-000. E-mail: paulomiranda@usp.br

RESUMO

O trabalho tem como objetivo analisar como é o processo de adequação da agroindústria às normas internacionalmente reconhecidas de sustentabilidade (ISO 9001, ISO 14001, OHSAS 18001 e SA 8000). Para tanto, foi estudado um frigorífico exportador de carne bovina no Estado de Mato Grosso do Sul. Observou-se que o processo de implantação das normas de sustentabilidade foi realizado por meio do cumprimento dos requisitos normativos exigidos para a certificação, a partir do desenvolvimento de programas socioambientais, mudando culturalmente as ações da organização e dos colaboradores em termos mais sustentáveis.

Palavras-chave: Sustentabilidade; Qualidade; Certificação; Agroindústria; Carne bovina.

ABSTRACT

This work intends to analyze the implantation process of internationally recognized rules of sustainability (ISO 9001, ISO 14001, OHSAS 18001 e SA 8000). An exporting slaughter house in the state of Mato Grosso do Sul was studied for the case. As a result it was noticed that the rules for implantation process of sustainability fulfilled the rule requirements demanded for certification, culturally modifying organization and collaborators actions towards the sustainable awareness.

Keywords: Sustainability; Quality; Certification; Agribusiness; Beef agro industry.

1 INTRODUÇÃO

O ciclo produtivo da sociedade capitalista extrai do meio ambiente os insumos necessários para a produção de alimentos e bens de consumo, entretanto o processo produtivo retorna resíduos e emite poluentes em grandes quantidades, acarretando poluição e esgotamento dos recursos naturais. Outra preocupação que surge é que há uma volumosa camada da população mundial que sofre com pobreza, fome e exclusão social. A finitude dos recursos naturais e os impactos negativos dos resíduos das fábricas, apontados por Severo, Delgado e Pedrozo (2006), resultaram em um processo de desenvolvimento econômico sem preocupação com a natureza e, assim sendo, com a qualidade de vida.

O desenvolvimento sustentável parece ser uma obrigação do governo, no entanto os recursos destinados a tal promoção são limitados. Segundo Safatle (2006a), o setor privado assume um papel relevante nesse âmbito: sem a participação dos recursos privados, passa a não existir o uso sustentável da biodiversidade, e, sem o uso sustentável que gera renda e emprego, não haverá mais biodiversidade para abastecer o processo produtivo. A sustentabilidade ainda é um processo complexo. Diante desse panorama, as empresas passam a se reestruturar para adequar-se a essa percepção, ainda mais no que tange às relações com o comércio exterior. As pressões sociais e restrições impostas às exportações de produtos fazem que as empresas sejam forçadas a buscar formas de reduzir seu impacto ambiental e a melhorar sua imagem ante sua responsabilidade social. Nesse sentido, muito se tem procurado fazer para a sustentabilidade do setor produtivo (CORAL, 2002).

A sequência de operações e transações organizacionais faz que os agentes econômicos interajam dentro do processo produtivo. Um dos fluxos produtivos que têm destaque no Brasil é o da carne bovina, por causa de sua capacidade produtiva. As relações comerciais se dão em diferentes níveis (o produtor e o frigorífico, o frigorífico e o varejo, o varejo e o consumidor final, e as relações internacionais entre o frigorífico e o mercado externo). Safatle (2006a) afirma que as empresas conquistaram status pós-geográficos, ou seja, além dos limites de seus países, em termos de filiais produtivas ou de relacionamento com fornecedores e clientes, são quase um novo Estado. O aumento das exportações comprova o mérito das relações entre os frigoríficos brasileiros e os clientes externos. Perante essa contextualização, torna-se relevante destacar que o processo de adequação às normas (ISO 9001, ISO 14001, OHSAS 18001 e SA 8000) aparenta contribuir para a sustentabilidade empresarial, uma vez que envolve mudanças na estrutura organizacional em relação ao meio ambiente e à sociedade, procurando sempre retornos econômicos. Os países que demandam carne bovina brasileira exigem adequações nas estruturas e nos processos dos frigoríficos visando adquirir produtos padronizados, seguros e de qualidade, e mesmo elementar (observando que os frigoríficos a partir do ano 2000 começaram a se mover nesse sentido), a certificação é um item importante. Tais exigências precisam ser cumpridas para que haja negociação entre o frigorífico e o mercado organizacional (externo). Insurge o pressuposto de que o frigorífico, o qual atende ao mercado externo, ao cumprir os requisitos internacionais, concomitantemente promove a sustentabilidade, e torna-se, então, importante verificar esse processo de adequação.

A exportação de carne bovina para o mercado externo é crescente, e a concorrência entre os frigoríficos brasileiros, acirrada. Diante do exposto, emerge o problema de pesquisa: Como é o processo de adequação às normas de sustentabilidade no contexto de um frigorífico de abate e processamento de bovinos? Assim, o objetivo deste trabalho é apresentar, analisar e discutir o processo de adequação da indústria frigorífica às normas de sustentabilidade por meio das dimensões ambiental, social e econômica; dessa forma, consideram-se a implantação e a manutenção das normas e de suas consequências sustentáveis.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

Em se tratando de um artigo que procura a validação empírica em um frigorífico bovino sobre a abordagem em torno da sustentabilidade empresarial com base nas normas reconhecidas internacionalmente, fez-se necessária uma discussão teórica.

2.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Diante da afirmativa que o crescimento é inevitável, é preciso criar uma estrutura para suportá-lo e supri-lo, para produzir mais, reciclar mais, conscientizar mais e consumir menos. A população deve agir menos agressivamente em relação ao meio ambiente, pois os recursos naturais são limitados. Assim, alguns fatores devem ser mais disseminados e realizados, como produzir degradando menos de forma mais limpa e reduzindo o consumo. No entanto, há as desigualdades sociais. Mesmo sob essas condições, o país cresce sem controle, a população aumenta e consequentemente se avolumam os problemas sociais, políticos, econômicos e, em especial, os relacionados ao meio ambiente, fazendo que os recursos naturais fiquem escassos mais rapidamente. O que afeta uma sociedade afeta todo o mundo (ABRAMOVITZ, 1993; ARROW et al., 1995; FOLLADORI, 1999).

O modelo atual de desenvolvimento econômico vem gerando enormes desequilíbrios sociais. Em outras palavras, nunca houve tanto crescimento, riqueza e fartura ao lado de tanta miséria, degradação ambiental e poluição, e é nesse cenário que se encaixa o desenvolvimento sustentável, como uma maneira de equilibrar as atividades essenciais à qualidade de vida e dar continuidade a elas. Conforme o documento "Nosso futuro comum" (Relatório de Brundtland), desenvolvido pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento em 1991, o desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades presentes sem comprometer a capacidade das gerações.

Para o desenvolvimento sustentável, Philippi (2001) aponta dois pontos-chave: o conceito das necessidades faz que as necessidades dos pobres recebam prioridade, e a noção dos limites oriundos da tecnologia e da organização social imposta ao meio ambiente impedem que este atenda às necessidades presentes e futuras. Ou seja, se, por um lado, os mais pobres são prioridade, por outro, há limites ao que diz respeito ao meio ambiente, o que faz que as necessidades não sejam supridas. Segundo Rattner (1999), esse processo expõe o caráter frágil desse conceito de desenvolvimento sustentável, no qual parecem caber diversos significados, pois é tratado como sinônimo de sociedade racional, de indústrias limpas, de crescimento econômico, de utopias românticas; tudo nele parece pertencer. E isso abrange ainda a satisfação das necessidades do presente, o atendimento das necessidades dos pobres e a manutenção da capacidade das gerações futuras em satisfazer suas necessidades. O conceito mais amplo de desenvolvimento sustentável apoia-se na integração de questões sociais, ambientais e econômicas, constituindo o tripé conhecido como Triple-Bottom Line (CARVALHO; VIANA, 1998; CORAL, 2002; OLIVEIRA FILHO, 2004).

2.2 SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL

É preciso expor que há uma discussão sobre o conceito de desenvolvimento sustentável e sustentabilidade, apresentam-se a seguir as duas visões. A primeira refere-se ao fato de que o desenvolvimento sustentável é comumente associado à expectativa de um país que entra numa fase de crescimento que se mantém ao longo do tempo (FERREIRA, 1998; 1999; RATTNER, 1999; ALTENFELDER, 2004). A segunda trata a sustentabilidade como a capacidade de autossustentar-se, de automanter-se. Uma atividade sustentável qualquer é aquela que pode ser mantida por um longo período, para não se esgotar nunca, apesar dos imprevistos que podem vir a ocorrer (PHILIPPI, 2001; ALMEIDA, 2002; SAFATLE, 2006a).

Torna-se comum relacionar desenvolvimento sustentável a políticas públicas e sustentabilidade às demais ações promovidas pelo setor privado. No entanto, Young e Steffen (2006) salientam que a maior participação das organizações na sustentabilidade não pode substituir a ação pública e que as medidas voluntárias tornam-se mais comuns no setor privado. O setor empresarial, então, assume um papel fundamental na promoção de mudanças, movida por valores morais, para que se supere a crise da insustentabilidade (SAFATLE, 2006b). O objetivo de qualquer organização é obter o maior retorno possível sobre o capital investido, ou seja, gerar lucro e remunerar seus acionistas. Para tanto, utiliza-se de ferramentas disponíveis para estar à frente dos concorrentes, obtendo maiores margens e fatias de mercado. Layrargues (1998, p. 60) afirma que "[...] as empresas que procuraram se alinhar [à sustentabilidade], ao invés de reagir negativamente, acabaram descobrindo ganhos importantes de produtividade e competitividade".

Para que as organizações possam contribuir para a sustentabilidade, devem modificar seus processos produtivos, quando for necessário, para se tornarem sustentáveis. Isso implica construir sistemas de produção que não causem impactos negativos e que estejam contribuindo para a recuperação de áreas degradadas ou oferecendo produtos e serviços que contribuam para a melhoria da performance ambiental dos consumidores (CORAL, 2002). Coral (2002, p. 129) apresenta um modelo de sustentabilidade a ser aplicado pelas empresas:

Quadro 1


O conceito do tripé da sustentabilidade (Triple-Bottom Line) tornou-se amplamente conhecido entre as empresas e os pesquisadores (CARVALHO; VIANA, 1998; CORAL, 2002; AMARAL, 2003; OLIVEIRA FILHO, 2004), o que faz dele uma ferramenta conceitual. As organizações, para serem consideradas sustentáveis, precisam ter ações e programas que permeiem as três dimensões. A sustentabilidade empresarial cabe às organizações, para Safatle (2006b, p. 20) "o setor privado é a única instituição forte, flexível e internacional que sobrou no mundo". São as organizações privadas as grandes operadoras desse modelo econômico. Para o setor empresarial, o conceito de sustentabilidade representa uma nova abordagem de fazer negócios que promove inclusão social, reduz e/ou otimiza o uso de recursos naturais e o impacto sobre o meio ambiente, sem desprezar a rentabilidade econômico-financeira da empresa. Tal abordagem cria valor para o acionista, promove maior probabilidade de continuidade do negócio (perenidade) e proporciona significativa contribuição a toda a sociedade (ATKINSON, 2000; HOFFMAN, 2000; BOVESPA, 2005).

A sustentabilidade passa a ser uma realidade nas organizações brasileiras. Na década de 1980, em decorrência do aumento da consciência ecológica, o setor apresentou-se disposto a pagar o preço da consideração dessa nova variável no processo produtivo. A preocupação ambiental passou, gradativamente, a ser encarada como uma necessidade de sobrevivência, diferenciando as organizações em termos de política de marketing e de competitividade no mercado (LAYRARGUES, 1998; AMARAL, 2003). A partir de então, surgiram também ações voltadas para o desenvolvimento social - interno e externo. O novo contexto foi se afirmando com os anos.

A evolução do pensamento sustentável, que parte da esfera pública, cabendo a cada nação promover o desenvolvimento sustentável em seu território, chega às organizações privadas, e os clientes mais exigentes demandam uma posição mais responsável das empresas. Nesse enredo, emerge o conceito de sustentabilidade empresarial, composta de ações que procuram visar à redução de impactos ambientais e à promoção de programas sociais, mantendo-se economicamente viável no mercado.

Quadro 2


É importante ressaltar que, para ser considerada a sustentabilidade empresarial, é necessário que haja ações voltadas para as três dimensões básicas.

2.3 AGROINDÚSTRIA FRIGORÍFICA

O Brasil, atualmente, possui o maior rebanho comercial do mundo e assumiu a liderança mundial na quantidade exportada. A pecuária de corte é uma das explorações agropecuárias mais significativas, tanto na geração de receitas internas como na pauta de exportação, e ainda incorpora tecnologias que aumentam a produtividade (ARAÚJO, 2006). O rebanho comercial brasileiro possui cerca de 204,7 milhões de cabeças. O país tem a segunda maior produção mundial com aproximadamente 8,9 milhões de toneladas em equivalente carcaça. O abate e a produção referem-se especificamente à carne bovina e também demonstram índices elevados, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2006) e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) (2006). A cadeia produtiva da carne bovina brasileira é uma das mais complexas em relação à estruturação e aos agentes envolvidos, exercendo um papel fundamental ao longo da história e do desenvolvimento brasileiros. Os agentes econômicos do fluxo produtivo, no caso da carne bovina, são: produção de insumos, produtores de bovinos, abatedouros/frigoríficos (agroindústria) e rede de distribuição (atacado e varejo) (MICHELS; SPROESSER; MENDONÇA, 2001).

Há destaque para a agroindústria, neste caso específico, o frigorífico de abate e processamento de bovinos, pois este é considerado o agente coordenador que, apesar da pouca estruturação, tem a finalidade de aprimorar a gestão na cadeia e garantir a qualidade do produto por meio do processo de transação de informações, o que contribui para a satisfação dos clientes e para a redução dos custos e das perdas em todas as etapas da cadeia. Tal coordenação em cadeias agroindustriais pode ser obtida pelo desenvolvimento e pela aplicação prática a montante (no sentido cliente-fornecedor) e a jusante (no sentido fornecedor-cliente) (NEVES et al., 2003; BORRÁS; TOLEDO, 2006; MARTINS, 2007).

2.4 NORMAS DE SUSTENTABILIDADE

A seguir, apresentam-se as características das normas internacionalmente reconhecidas e certificáveis (ARAÚJO; MORAIS; MENDONÇA, 2006; MARTINHÃO FILHO; SOUZA, 2006). É importante salientar que não é objeto deste estudo os sistemas de gestão não certificáveis e demais normas. A ISO 9001 (International Organization for Standardization) apresenta os requisitos da gestão da qualidade, a ISO 14001 da gestão ambiental, a OHSAS 18001 (Occupational Health and Safety Assessement Series) da gestão da saúde e segurança ocupacional e a SA 8000 (Social Accountability) da gestão da responsabilidade social. As normas podem ser implantadas de forma associada e simultânea em um único sistema, conhecido como sistema integrado de gestão (SIG).

Essa adequação pode ser percebida pelo número de certificações concedidas às organizações, como as associadas ao Conselho Empresarial Brasileiro de Desenvolvimento Sustentável (Cebds). Muitas dessas empresas possuem mais de um tipo de sistema de gestão certificado. Segundo Griffith (2000), um SIG é a estrutura organizacional, recursos e procedimentos utilizados para planejar, monitorar e controlar projetos nas áreas de qualidade, meio ambiente, saúde e segurança no trabalho e também responsabilidade social, uma vez que existe similaridade entre os elementos de gestão associados. Muitas empresas estão se adequando às normas voluntárias internacionais de sistemas de gestão, como meio de administrar suas atividades em relação a essas demandas. Essas normas servem de base para as organizações atingirem desempenhos mais sustentáveis.

Quadro 3


Segundo Martinhão Filho e Souza (2006) e Davenport (1998), os benefícios mais importantes do processo de implantação do SIG são: melhoria da eficiência e eficácia dos processos, redução da burocracia sistêmica, eliminação de duplicidade e redundância de procedimentos e instruções, e redução de custos. Além disso, o SIG é mecanismo que vende a si mesmo.

3 PROCEDIMENTO METODOLÓGICO

Neste estudo, utilizou-se a pesquisa exploratória de abordagem qualitativa, e o método de procedimento foi o estudo de caso. A exploração se baseia mais nas técnicas qualitativas. Segundo Godoy (1995), uma pesquisa qualitativa deve ter como preocupação maior a interpretação de fenômenos e a atribuição de resultados.

Campomar (2005) ressalta que o estudo de caso é o tipo de pesquisa em que o pesquisador explora apenas um simples fenômeno delimitado pelo tempo e pela atividade, utilizando-se de uma diversa variedade de técnicas de coleta de dados. Os instrumentos de pesquisa foram entrevistas em profundidade e coleta de dados secundárias, assim para o levantamento de dados e de informações relevantes à investigação utilizaram-se técnicas de documentação direta e indireta, e observação direta intensiva (COOPER; SCHINDLER, 2003). As técnicas de documentação direta e indireta abrangem o levantamento de dados de fontes diversas.

A coleta de dados foi realizada por meio de observação, análise de documentos e entrevistas semiestruturadas com agentes previamente contatados (a coordenadora do SIG, o responsável pela qualidade, o responsável pela produção e a responsável pelos recursos humanos). Para a escolha do caso estudado, selecionaram-se inicialmente os dez principais frigoríficos exportadores de carne bovina no Brasil, com base na sua participação nas exportações (LATTA, 2005), dentre estes aqueles que possuem as certificações em relação às normas internacionalmente reconhecidas apresentadas por Araújo, Morais e Mendonça (2006) e Martinhão Filho e Souza (2006). Neste caso, destacou-se um frigorífico de Mato Grosso do Sul. A pesquisa envolveu a unidade industrial do frigorífico, pois centraliza todas as informações relativas ao processo de adequação às normas.

O diálogo interdisciplinar entre a teoria das organizações e a nova sociologia econômica, propostas por Serva e Andion (2004, p. 5), assume um importante papel: "[...] nos debates sobre o espaço da economia na atualidade, parece necessário que ela [sociologia econômica] avance para além dos seus pressupostos básicos, buscando respostas às questões levantadas", visando, assim, estabelecer uma ponte entre a economia e as relações sociais. Nesse processo, torna-se essencial que as abordagens prescritivas e normativas sejam confrontadas por análises empíricas vivenciadas no espaço organizacional (CARVALHO; VIEIRA; LOPES, 1999). Coletaram-se os dados junto à organização estudada, e foram definidas as categorias de análise de cada uma das normas do SIG. Em seguida, identificaram-se, na teoria existente sobre sustentabilidade, as categorias e subcategorias de análise. A etapa seguinte foi relacionar as categorias e subcategorias de análise de ambos os recortes.

4 RESULTADOS E ANÁLISES

4.1 PERFIL ORGANIZACIONAL

O frigorífico em estudo é um complexo alimentício estruturado para produção de carne bovina e seus derivados, desde o abate de animais até a comercialização de carnes resfriadas e congeladas e seus subprodutos. A empresa comercializa seus produtos principalmente para o mercado externo. A organização deixa claro, às partes interessadas, que se preocupa com o meio ambiente, responsabilidade social e com os colaboradores para a sustentação do seu crescimento e sobrevivência no mercado. Além das unidades dedicadas ao foco principal do negócio, possui unidades fabris, curtume e fábrica de adubos, que complementam a utilização da matéria-prima, aproveitando ao máximo todos os seus produtos e subprodutos (inclui uma fábrica de fertilizantes que utiliza os efluentes sólidos das fábricas). A organização possui uma unidade certificada com a ISO 9001 (sistema de gestão da qualidade), a ISO 14001 (sistema de gestão do meio ambiente), a OHSAS 18001 (sistema de gestão de saúde e segurança ocupacional) e a SA 8000 (sistema de gestão de responsabilidade social), que foi o foco da pesquisa (fontes de coleta 1 e 3 do Quadro 4).


4.2 IMPLANTAÇÃO DO SISTEMA INTEGRADO DE GESTÃO (SIG)

Em 2003, o frigorífico contratou uma empresa de consultoria para o processo de adequação às normas internacionalmente reconhecidas. Nesse período, realizou-se um diagnóstico organizacional. Após essa fase, propuseram-se duas opções:

• Inicialmente, adequar a empresa às normas da ISO 9001 e depois às demais, em um período estimado de quinze meses.

• Adequar todas as normas concomitantemente em um período estimado de doze meses, visto que as normas entre si se complementam.

Em julho de 2003, o frigorífico escolheu a segunda opção: imprimir simultaneamente a concepção, estruturação e implementação das quatro referências normativas, com data para certificação em doze meses. É importante observar que ocorreu a adequação das normas às atividades da empresa, e não o contrário. O diagnóstico realizado pela consultoria identificou as principais adequações.

Quadro 5


Para obter a certificação, foi preciso estabelecer e manter procedimentos para identificar e avaliar os impactos. De maneira geral, existia uma série de necessidades pontuais que justificaram o fato de os processos serem, conforme a necessidade, adequados, excluídos, criados ou melhorados. A organização já tinha estruturado e operacionalizado uma significativa parte dos requisitos normativos requeridos, o que contribuiu, após ajustes necessários, para uma rápida e precisa configuração do SIG. O período de adequação do frigorífico às normas foi de 14 meses (dois a mais que o previsto). O SIG é uma estrutura disponível para implementação de ações relacionadas à gestão da qualidade, do meio ambiente, da segurança e saúde e da responsabilidade social, que inclui procedimentos, responsabilidades, processos e recursos necessários. Esse sistema tem por objetivo retratar os princípios e valores, todos os seus pontos estão bastante claros e suportam todos os objetivos e metas da organização.

4.3 SUSTENTABILIDADE EMPRESARIAL NO FRIGORÍFICO

A seguir, são apresentadas as principais ações, na visão do frigorífico, considerando cada uma das dimensões da sustentabilidade empresarial.

4.3.1 Análise da dimensão ambiental

O frigorífico relaciona diretamente a norma ISO 14001 à dimensão da sustentabilidade ambiental. A ISO 14001, segundo o frigorífico, foca a gestão ambiental sob as seguintes categorias: prevenção e controle da poluição, racionalidade dos recursos naturais, atendimento aos requisitos legislativos ambientais, promoção da sustentabilidade (comprometimento), gerenciamento ambiental e melhoria contínua. No Quadro 6, apresentam-se os códigos teóricos, as categorias e subcategorias da dimensão ambiental.


Uma vez que a norma é genérica e permite melhorias contínuas, especificamente são tratadas as ações da empresa (substância empírica da pesquisa - fontes de coleta 1, 2, 3 e 6 do Quadro 4), a partir das subcategorias traçadas no Quadro 6.

• Controle das emissões de gases: as caldeiras (do frigorífico e do curtume) têm as suas emissões monitoradas anualmente por empresa especializada externa (parâmetro número 8 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama)). Há um controle das fumaças emitidas pelos veículos a diesel, não ocorre queima de resíduos a céu aberto, e controla-se o risco de vazamentos tóxicos de refrigeração (amônia).

• Controle/tratamento de efluentes líquidos: monitoramento nas estações de tratamento (Conama nº 357/05), a fim de evitar a contaminação do solo com ácido sulfúrico e do lençol freático. Os produtos químicos são armazenados de forma adequada, há aterro sanitário, e controla-se o risco de poluição. Há também o projeto efluente zero que visa à utilização dos efluentes tratados na unidade industrial para a atividade de fertirrigação, aproveitando os nutrientes remanescentes para a adubação de pastos.

• Controle/reciclagem dos resíduos sólidos: mensalmente o responsável pelo pátio contabiliza o volume e o peso dos resíduos coletados por meio da coleta seletiva. A venda desse material é realizada para empresa especializada e são mantidos registros do total de resíduos encaminhados; os principais resíduos sólidos são plástico, papelão e papel; e há o reaproveitamento de grande quantidade dos resíduos da fabricação de adubo.

• Adoção de tecnologias limpas: há tratamento dos efluentes, programa de florestamento e, em especial, o desenvolvimento de adubo de resíduos sólidos industriais. O Programa de Adubos Orgânicos foi realizado em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Esse programa foi registrado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Em 2004, o fertilizante foi certificado como "orgânico" pelo Instituto Biodinâmico (IBD).

• Uso sustentável dos recursos não renováveis: monitoramento diário pelos técnicos da manutenção do consumo de energia elétrica e monitoramento mensal do consumo de água pelos técnicos da manutenção. A água é utilizada nos processos da empresa e considerada o principal recurso natural de consumo, pelas quantidades necessárias aos processos de produção, higienização e limpeza; para tanto, não existem metas.

• Atendimento à legislação ambiental: a organização segue alguns parâmetros do Conama e possui todas as licenças ambientais e de funcionamento atualizadas.

• Conservação/preservação da biodiversidade ambiental: florestamento para o consumo sustentável de lenha para as caldeiras. Florestamento é uma ação para a autossuficiência na demanda de lenha, com o propósito de preservar a vegetação natural e minimizar os impactos.

• Exigências de conformidades ambientais para os fornecedores: avaliação e seleção de fornecedores segundo impactos no SIG. Exige-se da maioria dos fornecedores licença ambiental ou licença municipal de funcionamento.

No frigorífico, a norma ISO 14001 pressupõe o gerenciamento ambiental: atendimento aos requisitos legislativos, controle da poluição e racionalização dos recursos naturais para a promoção da sustentabilidade. Assim, as subcategorias listadas no Quadro 6 são atendidas, uma vez que estão presentes na organização o controle das emissões de gases, o controle/tratamento de efluentes líquidos, o controle/reciclagem dos resíduos sólidos, a adoção de tecnologias limpas, o uso sustentável dos recursos não renováveis, o atendimento à legislação ambiental, a conservação/preservação da biodiversidade ambiental, além de exigências de conformidades ambientais para os fornecedores. Apesar do empenho da organização, cabe enfatizar que "A indústria ainda não é capaz de eliminar todo resíduo produzido, controlar todas as emissões produzidas e muito menos reciclar todo produto após o término de sua vida útil" (LAYRARGUES, 1998, p. 62).

4.3.2 Análise da dimensão social

Na dimensão social, para o frigorífico, há o relacionamento com o processo de adequação das normas OHSAS 18001 e a SA 8000. A OHSAS 18001, sistema de gestão de saúde e segurança ocupacional, está ligada às seguintes categorias: controle de acidentes de trabalho, ambiente de trabalho, ações de saúde ocupacional, ações de segurança no trabalho e melhoria contínua. Por sua vez, a SA 8000, de responsabilidade social, está ligada às seguintes categorias: comprometimento com o desenvolvimento, comunicação às partes interessadas, atendimento à legislação trabalhista e melhoria contínua. Em seguida, no Quadro 7, apresentam-se os códigos teóricos, as categorias e subcategorias da dimensão social.


Na dimensão social, o frigorífico possui programas internos (voltados para os colaboradores) e externos (voltados para o desenvolvimento da comunidade). A seguir, apresentam-se as principais ações sociais (a substância empírica - fontes de coleta 1, 2, 3 e 6 do Quadro 4).

• Promoção da responsabilidade social: a empresa demonstra estar comprometida com o exercício da responsabilidade social e com o respeito ao ser humano. Assim, ela procura manter relações sólidas de parceria e confiança com seus colaboradores, clientes e fornecedores na prática da justiça social. Além disso, incentiva o desenvolvimento pessoal e profissional de seus colaboradores, sendo a educação a base de todas as iniciativas, levando em consideração a melhoria contínua das condições de trabalho e o bem-estar de todos.

• Desenvolvimento dos recursos humanos: a capacitação dos funcionários é promovida toda vez que uma necessidade é identificada ou quando há aquisição de novos equipamentos; introdução ou incorporação de novas tecnologias ou processos de trabalho; aperfeiçoamento das relações de trabalho; e necessidade de perenizar os conceitos relativos ao SIG.

• Saúde ocupacional e segurança no trabalho: a empresa mantém um programa de qualidade de vida que oferece assistência gratuita médico-hospitalar, odontológica, fisioterápica e ergonômica. Além disso, tem firmado parcerias que proporcionam descontos em procedimentos que também podem ser estendidos aos familiares. Como trabalho preventivo e de conscientização, a empresa mantém um calendário anual da saúde, com a abordagem de temas como prevenção ao câncer, doenças sexualmente transmissíveis, campanhas de orientação alimentar, cuidados com o coração, incluindo o fornecimento de dietas alimentares elaboradas por nutricionistas, e programas de apoio às gestantes.

• Atendimento dos direitos humanos e das práticas trabalhistas: a organização respeita as 44 horas de trabalho por semana e um dia de folga a cada período de sete dias; as horas extras não excedem a 12 horas de trabalho por semana; há uma política de combate e reparação do trabalho infantil e política de proteção ao menor aprendiz. Continuamente são realizadas atividades para monitoramento da adequação aos requisitos da norma SA 8000.

• Ações sociais para o desenvolvimento da comunidade: quatro iniciativas principais, de ordem social e educacional, dão suporte à política social e educacional:

1) Auxílio-educação: por meio desse recurso, a empresa investe na carreira profissional dos colaboradores e incentiva os estudos e a capacitação profissional.

2) Combate ao analfabetismo: o Programa de Alfabetização e Ensino para Jovens e Adultos nas instalações da empresa.

3) Educação pré-escolar: os filhos das colaboradoras em idades de 4 meses a 6 anos são recebidos gratuitamente pelo Crescer Recanto de Educação Infantil.

4) Atividades físicas e artísticas: visando à maior integração e à prática saudável de atividades físicas e de recreação, são mantidas áreas para a prática de esportes dos funcionários, como campo de futebol e quadras poliesportiva e de areia.

A organização proporciona ações internas que visam ao bem-estar dos colaboradores, com o propósito de reduzir os riscos de acidentes e promover a saúde ocupacional, tal como a OHSAS 18001 propõe. Cumpre os requisitos da norma SA 8000 em termos de práticas trabalhistas e direitos humanos, e ainda favorece ações externas para o desenvolvimento da comunidade - social e educacional. A OHSAS 18001 no frigorífico possui ações de saúde ocupacional e segurança no trabalho, visando melhorar o ambiente de trabalho para reduzir os acidentes de trabalho, o que atende à categoria da dimensão social sustentável (Quadro 7) que envolve a saúde e segurança. A SA 8000 pressupõe o compromisso com o desenvolvimento, o atendimento à legislação trabalhista e a comunicação às partes interessadas, que atendam principalmente à categoria da dimensão social sustentável: o atendimento dos direitos humanos e das práticas trabalhistas. Indiretamente, ambas as normas promovem a responsabilidade social interna e o desenvolvimento dos recursos humanos, além de fomentar projetos de cunho social para o desenvolvimento da sociedade. Nessa dimensão, a subcategoria responsabilidade social merece destaque, uma vez que o conceito agrega as demais subcategorias tratadas.

4.3.3 Análise da dimensão econômica

A dimensão econômica é apresentada a seguir. No contexto do frigorífico em relação à ISO 9001, a gestão da qualidade apresenta as seguintes categorias de análise: garantia da qualidade, ferramentas da qualidade, atendimento das exigências dos clientes, atendimento dos requisitos regulamentares, gerenciamento de processos e melhoria contínua. No Quadro 8, expõem-se os códigos teóricos, as categorias e as subcategorias que compõem a dimensão econômica.


A análise da sustentabilidade econômica baseia-se nas subcategorias expostas no Quadro 8 e nas fontes de coleta 1, 2, 3 e 6 do Quadro 4.

• Aumento das exportações: o frigorífico definiu a exportação como foco principal de suas atividades, tendo destinado, nos últimos anos, o mínimo de 70% da produção ao mercado externo. As unidades estão habilitadas à exportação de carne in natura a todos os países abertos para o Brasil (não somente para a chamada Lista Geral, como também para a União Europeia, Rússia, Israel, entre outros). É, também, habilitada para exportar carne in natura para os Estados Unidos (mercado fechado para o produto in natura brasileiro). Em razão dos focos de febre aftosa no Estado de Mato Grosso do Sul, não foi possível avaliar essa categoria.

• Crescimento dos resultados econômicos financeiros (receita, lucro, faturamento, investimentos etc.): novamente, em razão dos focos de febre aftosa ocorridos no Estado de Mato Grosso do Sul, não foi possível demonstrar o crescimento dos resultados econômicos e financeiros. Entretanto, o frigorífico demonstra dados do setor de carne bovina para seus investidores e possui um relacionamento estreito com estes, para demonstrar os resultados.

• Pagamento de salários justos: a política salarial estabelece o piso da categoria e obedece ao conveniado entre o sindicato e os empregados, proporcionando uma margem de rendimento extra; o salário é baseado no tamanho médio de uma família da região Centro-Oeste (3,5) e é considerado o critério do IBGE. Na definição dos salários, também são consideradas as características da cidade. A organização procura assegurar que o salário pago mensalmente satisfaça, pelo menos, os padrões mínimos; há o incentivo à assiduidade, auxílio à educação, cesta natalina, seguro de vida, transporte e alimentação.

• Estratégias organizacionais para o mercado: o frigorífico produz cortes especiais com valor agregado e possui mais de dois mil tipos diferentes de produtos. Desenvolve produtos com a marca do cliente e embalagens especiais (visando ao consumidor final). O planejamento e controle da produção tem uma atuação fundamental para que os cortes sejam produzidos, embalados e separados de acordo com as especificações de cada cliente. O SIG facilita o relacionamento com o cliente externo porque utiliza a padronização internacional.

• Oferta de produtos de qualidade a baixo custo (eficiência produtiva): para atender às exigências do consumidor e aos anseios do pecuarista que produz a matéria-prima ideal para a indústria frigorífica, o frigorífico possui um programa de qualidade de bovinos que objetiva comercializar a matéria-prima (bovinos/carcaças) de acordo com um sistema de classificação de carcaças; remunerar o produtor fiel, que fornece o produto desejado pela indústria; e avaliar os resultados dos abates, orientando o produtor quanto ao melhor tipo de bovinos/carcaça.

• Pagamento de tributos e impostos ao governo: o frigorífico mantém pontualmente o pagamento de tributos e impostos aos governos, pois objetiva solidificar o seu relacionamento com os seus investidores, clientes, colaboradores, fornecedores e a comunidade. Assim, oferece a todos os interessados maior transparência e confiabilidade nos atos praticados.

No frigorífico, a norma ISO 9001 propõe a garantia da qualidade utilizando uma série de ferramentas para atender às exigências dos clientes e aos requisitos regulamentares. Essa norma gerencia os processos produtivos, o que atende à maioria das categorias da dimensão econômica sustentável (Quadro 8), como a oferta de produtos de qualidade, o atendimento aos requisitos entendido como uma estratégia organizacional para melhor atender os clientes - mercado externo. Dessa forma, espera-se que haja o aumento das exportações, o que certamente gerará melhores resultados econômico-financeiros para a organização. Segundo Stares (1997), a agregação de valor ao produto por meio do aprimoramento de um SIG, incorporado com os fatores econômicos acarretados pelo aumento da eficácia e pela redução dos desperdícios, pode ser uma grande vantagem competitiva para a empresa.

A organização, paralelamente, para ser considerada socialmente responsável, precisa oferecer salários justos e manter um bom relacionamento com o governo no pagamento de impostos e tributos que estão relacionados na dimensão econômica. As melhorias contínuas citadas nas normas ISO 9001, ISO 14001 e OHSAS 18001 têm como objetivo aprimorar a eficácia da empresa por meio de políticas, objetivos, resultados de auditorias, análise de dados, ações corretivas e preventivas e análise crítica da direção. Assim, a organização não fica estagnada e está sempre buscando meios para melhorar as gestões ambiental, ocupacional e da qualidade.

4.4 DISCUSSÃO SOBRE AS NORMAS DE SUSTENTABILIDADE

No atual mercado, novos conceitos e atitudes são incrementados às ações e políticas adotadas pelas empresas. Conceitos como responsabilidade social, reciclagem, redução do consumo de recursos e emissões de efluentes, reaproveitamento, reutilização etc. contribuem para uma nova postura da empresa perante a sociedade. Assim, a questão da avaliação ambiental, da qualidade, da responsabilidade social e da saúde e segurança, na busca por uma melhoria contínua, passa a ser um assunto de interesse atual (TAVARES JÚNIOR, 2001). Mais do que buscar a certificação em normas de qualidade, que proporcionam uma oportunidade de melhoria de desempenho do produto/serviço para melhor atender os clientes, as organizações estão ampliando tal abordagem e buscando também oportunidades de melhorias nos aspectos ambientais e sociais, para o atendimento de exigências da sociedade. Já é perceptível o interesse das organizações pelo SIG e pela busca do desenvolvimento com responsabilidade por meio dos conceitos de sustentabilidade (MEDEIROS, 2003).

A relevância de um SIG é destacada pela necessidade de responder aos atuais paradigmas da globalização e da crescente conscientização por produtos e processos que contribuam para uma melhoria na qualidade de vida da sociedade, respeito aos direitos humanos de uma maneira geral e critérios ambientais direcionados à sustentabilidade (TAVARES JÚNIOR, 2001). Muitas organizações estão implantando normas voluntárias internacionais de sistemas de gestão, como meio de gerenciamento de suas atividades:

Estas normas servem de apoio para as organizações atingirem desempenhos mais sustentáveis de seus negócios, que de certa forma abrangem as dimensões econômicas, ambientais e sociais do tripé da sustentabilidade empresarial (JAPPUR, 2004, p. 73).

As organizações perceberam a oportunidade de incorporar o desenvolvimento e a melhoria da performance econômica à ecoeficiência e à responsabilidade social. Dessa forma, cada uma das empresas desenvolve seu programa de gestão (total ou parcialmente integrada) de acordo com suas próprias características, conforme as características da indústria na qual elas estão inseridas e de acordo com a visão das partes interessadas, levando em conta novas oportunidades não consideradas no passado, e, por isso, encontram novas vantagens competitivas (MEDEIROS, 2003). No entanto, é preciso observar que a certificação de sistemas de gestão não significa, necessariamente, que a organização seja sustentável, pois depende do nível e da abrangência dos indicadores produzidos (JAPPUR, 2004). O relacionamento dos dados referentes às normas internacionalmente reconhecidas, no caso do frigorífico, com as categorias das dimensões sustentáveis indica que o processo de adequação às normas promove uma sustentabilidade empresarial "básica". É extremamente relevante destacar que para o frigorífico o processo de adequação às normas gera sustentabilidade empresarial.

5 CONCLUSÕES

O foco do trabalho, então, foi um frigorífico de abate e processamento de carne bovina de Mato Grosso do Sul, certificado com as principais normas internacionalmente reconhecidas, para verificar o processo de adequação de tais normas na promoção da sustentabilidade empresarial. O processo de adequação às normas internacionalmente reconhecidas ocorreu visando à certificação (leia-se reconhecimento) da gestão da empresa, sendo vista como uma vantagem competitiva ante os concorrentes. O frigorífico decidiu por implantar o SIG, ou seja, a implantação simultânea das normas: ISO 9001, ISO 14001, OHSAS 18001 e SA 8000. O processo de adequação durou 14 meses, e o frigorífico se mostrou preparado para a implantação das normas com poucas mudanças na estrutura e nos processos administrativos e produtivos.

Das principais adequações do frigorífico, destacam-se a formalização dos processos, adequações para uma melhor gestão ambiental e reestruturações físicas para uma melhor gestão ambiental e ocupacional. A implantação do SIG, então, ocorreu com as devidas adequações do frigorífico, ressalta-se que foi preciso conscientizar todos os colaboradores envolvidos para que houvesse sucesso na implantação. Atualmente, o desenvolvimento do SIG se dá pelo controle dos indicadores levantados no manual desse sistema, no qual há a definição de responsabilidades e autoridades para verificar, informar e corrigir, quando necessário, as ações, com o propósito de obter, além da adequação aos requisitos normativos, a melhoria contínua de seus processos. O frigorífico - certificado com as normas reconhecidas internacionalmente e com o SIG estruturado - demonstra ser uma empresa que oferece produtos de qualidade e que se preocupa com o meio ambiente, a saúde e segurança de seus colaboradores. Além disso, é socialmente responsável, pois cumpre os requisitos normativos.

O fato de as normas serem genéricas e, portanto, aplicáveis a todos os tipos de organizações, além das melhorias contínuas, faz que surjam ações únicas que procuram melhor gerir os aspectos de qualidade, meio ambiente, saúde e segurança ocupacional (e também sobre responsabilidade social). Nesse sentido, o frigorífico apresenta alguns programas que são considerados sustentáveis, pois envolvem as dimensões ambiental, econômica e social. Assim, a descrição do processo de adequação das normas reconhecidas internacionalmente faz um paralelo com a sustentabilidade. O frigorífico acredita que o processo de adequação às normas (implantação do SIG) promove a sustentabilidade empresarial, no entanto é preciso salientar que a empresa possui muitas ações de melhorias contínuas e investe em programas que vão além dos requisitos normativos, proporcionando assim sustentabilidade. As normas são associadas a três grandes conjuntos: qualidade (ISO 9001), meio ambiente (ISO 14001) e funcionários e sociedade (OHSAS 18001 e SA 8000), que se relacionam diretamente com as dimensões da sustentabilidade empresarial, respectivamente: econômico, ambiental e social. O processo de implantação das normas de sustentabilidade foi realizado, além das ações normativas estabelecidas, com a conscientização dos colaboradores. Assim, culturalmente a sustentabilidade empresarial foi sendo implantada no frigorífico concomitantemente com os requisitos normativos exigidos e com o desenvolvimento de programas socioambientais.

Ressalta-se que o presente trabalho tem algumas limitações. O caso da febre aftosa no Estado de Mato Grosso do Sul, em 2005/2006, é considerado um limitador da pesquisa, uma vez que impossibilitou uma melhor análise das categorias da dimensão econômica (aumento das exportações e resultados econômico-financeiros). O presente trabalho oferece uma ampla variedade de temas a serem aprofundados, no entanto sugere-se a realização de estudos de casos em que se apliquem as categorias de análise deste estudo qualitativo em estudos quantitativos, por meio de variáveis para a definição de indicadores de sustentabilidade empresarial.

Submissão: 17 jul. 2007.

Aceitação: 25 nov. 2008.

Sistema de avaliação: às cegas dupla (double blind review).

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2009

    Histórico

    • Recebido
      17 Jul 2007
    • Aceito
      25 Nov 2008
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