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Correspondências

CORRESPONDÊNCIAS

A importância da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual do Ceará

Paulo César Alves Carneiro

Rio de Janeiro - RJ

Tenho a honra e a satisfação de apresentar, voluntariamente, as minhas sinceras congratulações ao atual reitor da Universidade Estadual do Ceará (UECE) (Prof. Dr. Manassés Claudino Fonteles) e ao competente e interessado corpo docente desta alentada universidade, pela criação da Faculdade de Medicina da UECE. Julgo ser um prêmio de incentivo e esperança ao sofrido e explorado povo do Ceará.

Uma escola médica inserida no contexto de uma prestigiada universidade (que respeita o pluralismo de idéias e a liberdade de pensamento) constitui um lugar apropriado para a criação e divulgação do saber, bem como presta uma valorosa contribuição ao desenvolvimento regional.

É de relevante valia e de máximo prestígio, a instituição deste curso para a comunidade cearense e nordestina, pois se trata de uma Universidade PÚBLICA e GRATUITA. A universidade pública não objetiva o lucro, tem papel preponderante na formação de médicos dotados de qualidade e competência. Nela a pesquisa se destaca, contribuindo para a qualidade do produto final.

Inquestionavelmente, o ensino superior privado cresceu, demasiadamente, no famigerado governo FHC. Atualmente, o ensino superior brasileiro é liderado por duas instituições particulares (a Universidade Paulista – UNIP, com 81.459 alunos - dados do ano 2001 e pela Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro, com 60.067 alunos). Esta última, faz vestibular: tradicional, por computador, portador de diploma (isenção do vestibular), transferência externa, Exame Nacional de Ensino Médio (Enem), quase semanalmente. Realiza múltiplos convênios com taxas de descontos diferenciadas e muita propaganda, enchendo, diariamente, as páginas dos grandes jornais. Possui notáveis "lobistas", enquanto nas universidades públicas não há dinheiro sequer para coisas elementares, quem dirá para propaganda. Possui um curso médico, que não formou, até o presente, nenhuma turma. Não possui hospital universitário próprio, conseqüentemente usa o hospital público (Hospital Geral de Bonsucesso – HGB) do Ministério da Saúde para o ensino (internato), num convênio lesivo para o patrimônio e interesse público, segundo o Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro (Sinmed).

Tenho esperança que, na minha querida terra natal, o novo governador recém-eleito (Lúcio Gonçalo Alcântara), tenha uma visão mais clara e progressista do que seja universidade e de seu papel para com a sociedade. Este mandatário é médico e professor universitário, portanto espero uma maior sensibilidade para a questão, não devendo se omitir e nem ceder às pressões de distintas origens. O Hospital Universitário da UECE, já foi batizado, recentemente, com o nome do seu ilustre pai, Waldemar de Alcântara, também médico e professor de medicina, a quem tive o privilégio de conhecer. Foi uma justa homenagem prestada.

Li e aprovei, recentemente, os argumentos irrefutáveis a propósito da viabilidade financeira do curso de Medicina da UECE, escrita pelo competente e dedicado Professor Titular de Saúde Pública da UECE Marcelo Gurgel Carlos da Silva, destacado escritor e meu contemporâneo na Faculdade de Medicina (UFC). Portanto, repito, considero por demais viável a Faculdade de Medicina na UECE, pois acredito que aumentará a competitividade entre os cursos médicos no Ceará. Torna-se imprescindível a retirada urgente da cobiça, da inveja e da vaidade de ilustres personalidades locais. A grande psicanalista Melanie Klein (Viena, 1882 – Londres, 1960) relatou em "Inveja e Gratidão", que "o invejoso adoece diante do regozijo do outro". Só se sente bem com a miséria alheia. "Todo esforço para satisfazer um invejoso é infrutífero". Não considero exaltação recomendar a releitura do consagrado livro: Reflexões sobre a Vaidade dos Homens, escrito por Matias Aires da Silva de Eça (1705-1763) (Editora Martins Fontes, 1993). É preciso colocar o ensino médico público, que não é mercadoria, acima dos interesses individuais e privados. Finalizando, não há porque recuar na instituição desta nova escola médica. A qualquer preço, deve-se manter o concurso vestibular/2003, com as 40 (quarenta) vagas para o curso de Medicina. E, subseqüentemente, ministrar um excelente curso, com qualidade e competência, pois possui infra-estrutura adequada e um corpo docente de elevado padrão técnico-científico.

Importância do PCR para hepatite C na triagem de doadores de sangue

Mônica Caamaño Cristovão Poli; Rafael Colella; Denise Albuquerque Dourado; Yoná Murad; Catarina Simpson; Nanci Alves Salles

São Paulo - SP

Desde 1999, o Hospital do Câncer está trabalhando com um teste de biologia molecular para detectar diretamente o RNA do vírus da hepatite C baseado em reação em cadeia da polimerase (PCR) e oferecendo este serviço aos doadores de sangue da Instituição, além do exame de triagem obrigatório de detecção de anticorpos contra o vírus da hepatite C. Neste período, observamos que muitos doadores apresentavam teste positivo na técnica de PCR sem a presença de anticorpos (Método imunoenzimático de 3ª geração Abbott Murex, versão 4.0:negativo). Optamos por reconvocar estes doadores e repetir os exames em nosso laboratório e em outra instituição, através de metodologia Amplicor- versão 2.0 Roche e nested PCR, respectivamente, a partir de janeiro de 2001 a maio de 2002. Na maioria das repetições não foi confirmado o teste positivo quando as amostras foram testadas individualmente em ambas as instituições e atribuímos este fato à padronização inicial desta rotina. Além disso, confirmamos, com concordância de resultados, o caso de um doador de repetição que detalharemos a seguir:

I.E.S., 52 anos, sexo feminino, natural de Bauru. Os antecedentes epidemiológicos são negativos para transfusão prévia e uso de drogas, apenas relatava que nos últimos sete anos trabalhava com crianças carentes de 0 a 4 anos. Os resultados dos testes realizados nas doações de sangue e na repetição encontram-se na tabela na página ao lado.

O sangue total coletado na doação de 01/04/2002 foi desprezado, a doadora foi orientada e está em acompanhamento com infectologistas, iniciando tratamento antiviral.

Durante o período de 17 meses detectamos uma soroconversão em 20.000 doações de sangue.

Nos EUA, Europa e Japão a prevalência de portadores da hepatite C atinge, nos dias atuais, médias percentuais entre 1% e 2% da população geral. No Brasil, os dados são ainda muito precários, com as estimativas atuais atingindo 1,5%, em média¹.

O risco de contágio de hepatite C por transfusão de sangue e hemoderivados reduziu-se drasticamente nos anos 90 com a introdução de testes de alta sensibilidade e técnicas de inativação viral, passando de 0,5% por unidade de sangue transfundida nos anos 70 para cerca de 0,01% a 0,001% após 1994. Com os testes de terceira geração e em alguns centros de hemoterapia em que se faz a seleção de doadores de sangue por PCR individualmente ou em "pool", o risco tem reduzido ainda mais acentuadamente¹. O período de janela imunológica pode ser reduzido para 60 dias com a introdução de PCR para triagem rotineira de doadores de sangue para hepatite C².

Segundo a Portaria n° 79 do DOU 03/02/2003³, a partir de fevereiro de 2004 todo o sangue coletado no país deverá ser testado através de técnicas de biologia molecular para diminuir a transmissão transfusional de hepatite C (HCV) e do vírus da imunodeficiência adquirida humana (HIV), denominadas de teste de ácidos nucléicos (NAT).

As principais dificuldades para a implantação do NAT em doadores de sangue têm sido a logística, alto custo e problemas de contaminação das amostras4.

A maioria dos países desenvolvidos já adotou esta metodologia desde 1999, isoladamente ou de forma combinada ("primers" diferentes para cada agente infeccioso) utilizando a modalidade Multiplex da técnica de PCR.

Experiência semelhante foi descrita na Alemanha, em que o teste de HCV-RNA é obrigatório desde abril de 1999. Hitzler e Runkel5 identificaram uma doação HCV-RNA positiva com anticorpo negativo. Estes autores também não conseguiram informações sobre os fatores de risco dos doadores infectados².

A Cruz Vermelha japonesa avaliou desde outubro de 1999 um teste Multiplex para detecção simultânea de hepatite B-DNA, hepatite C-RNA e HIV 1-RNA e encontrou para HCV-RNA uma média de detecção de 31 dias antes do anticorpo HCV. A média de detecção para HIV1-RNA foi de 14 dias antes do anticorpo HIV1 e uma média de nove dias antes do antígeno p246.

O risco de transmissão transfusional de hepatite C ainda existe devido a falha dos testes de triagem sorológica atuais em identificar os doadores recentemente infectados durante o período de janela imunológica ou em detectar variantes antigênicas destes vírus, além das diferenças individuais na resposta imune dos doadores que limitam a eficácia dos testes de anticorpos para hepatite C².

Segundo modelo matemático utilizado nos Estados Unidos desde 1990 para estimar a probabilidade da existência de uma doação potencialmente infectante no estoque de sangue, houve redução no risco de transmitir hepatite C de 1: 120.000 antes da implantação do NAT para 1: 1.000.000 na Austrália e de 1:800.000 para 1:10.000.000 na França7.

Referências

1. Focaccia R, Conceição O, Oliveira UB em I Consenso da Sociedade Paulista de Infectologia para Manuseio e Terapia da Hepatite C 2002; 7-8.

2. Hitzler WE e Runkel S. Routine HCV-PCR screening of blood donations to identify early HCV infection in blood donors lacking antibodies to HCV. Transfusion 2001; 41: 333-7.

3. Portaria 79 DOU 03/02/2003.

4. Widell A, Molnegren V, Pieksma F, Calmann M, Peterson J e Lee SR. Detection of hepatitis C core antigen in serum or plasma asa marker of hepatitis C viraemia in the serological window-phase. Transfusion Medicine 2002; 12: 107-13.

5. Hitzler WE e Runkel S. Screening of blood donations by hepatitis C virus polymerase chain reaction (HCV-PCR) improves safety of blood products by window period reduction. Clin Lab 2001; 47: 219-22.

6. Meng Q, Wong C, Rangachari A, Tamatsukuri S, Sasaki M, Fiss E et al. Automated Multiplesx Assay System for simultaneous detection of hepatitis B virus DNA, hepatitis C virus RNA and Human Immunodeficiency virus type 1 RNA. Journal of Clinical Microbiology 2001; 39: 2937-45.

7. Glynn SA, Kleinman SH, Wright DJ, Busch MP. International application of the Incidence Rate/Window Period model. Transfusion 2002; 42: 966-71.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Nov 2003
  • Data do Fascículo
    Set 2003
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