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Agilizando o processo regulatório de estudos clínicos no Brasil

PANORAMA INTERNACIONAL

MEDICINA FARMACÊUTICA

Agilizando o processo regulatório de estudos clínicos no Brasil

Sonia Mansoldo Dainesi

O Brasil vem continuamente ganhando espaço no cenário internacional da pesquisa clínica. As vantagens desta participação são evidentes para vários setores da sociedade, tais como as instituições de saúde, os investigadores locais, a indústria farmacêutica e, inquestionavelmente, os pacientes.

A escolha de um país, dentre tantos outros, para participar de um ensaio multicêntrico passa por alguns critérios, como: adequado nível de conhecimento científico e administrativo, incluindo boas práticas clínicas (GCP - Good Clinical Practice), volume de pacientes, tempo para o assim chamado FPI (First Patient In), isto é, o tempo gasto entre o recebimento do protocolo e a inclusão do primeiro paciente no estudo, custos locais competitivos, dados de morbi-mortalidade (para alguns protocolos) e potencial comercial para o produto no país1,2.

Artigo recentemente publicado3 sugere algumas recomendações práticas que podem acelerar o início dos estudos: a) Realização de "testes de inclusão" antes do início do estudo, na medida em que alguns investigadores são excessivamente otimistas no tocante ao número potencial de pacientes; b) "Benchmarking": interação com os membros do centro de pesquisa, no sentido de se indicar a existência de outros protocolos competitivos na instituição. Se houver semelhança dos critérios de inclusão, o número de pacientes certamente será dividido entre eles; c) Simulações operacionais, ou seja, deve-se testar o protocolo e a ficha clínica mesmo antes da inclusão do primeiro paciente; d) Encontro dos investigadores: deve ser transparente e esclarecedor, em que todas as dúvidas devem ser desfeitas.

Entre os critérios mencionados, aquele que vem sendo visto como principal gargalo em nosso país é o FPI. As etapas a serem percorridas são, de maneira sumária, as seguintes: tradução e revisão do protocolo e brochura do investigador, aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) e, posteriormente, pela CONEP (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa) e ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e, finalmente, a obtenção da licença de importação. Supondo-se que cada um desses passos gaste um mês, cinco meses são necessários para termos o FPI. Este prazo é superior ao apresentado pela maior parte dos países europeus e de nossos colegas latino-americanos. Sabe-se, entretanto, que um mês para cada um desses passos está próximo da utopia, principalmente para alguns deles, como é o caso da aprovação da CONEP, que tem 60 dias para emitir seu parecer sobre o estudo e, algumas vezes, emite respostas não consistentes para vários centros participantes da mesma pesquisa, causando atraso e confusão na interpretação do que deve ser feito. Inquestionável é a missão da CONEP4 – garantir e resguardar a integridade, direitos e liberdade dos participantes das pesquisas – o que se solicita é, apenas, maior agilidade e coerência. Reconhecidos esforços têm sido feitos, mas ainda com resultados dúbios.

Para reduzir este tempo, que hoje está ao redor de seis meses (quando tudo corre bem), devemos agilizar cada uma das etapas. Eis alguns exemplos: verificação cautelosa de possíveis inconsistências entre o protocolo e a ficha clínica, e entre o protocolo e o TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido) que deve, adicionalmente, respeitar as leis locais; treinamento; interação contínua entre o staff da empresa e o do centro de pesquisa; ajuda na solução a eventuais problemas que os investigadores possam ter nos centros; adequado planejamento da logística do estudo; conhecimento prévio das datas de reunião de cada CEP, evitando que se perca um mês ou mais neste processo; apoio a eventos como os "Encontros de CEPs", realizados em São Paulo, nos últimos dois anos.

Comentário

Estudos clínicos internacionais conduzidos recentemente em nosso país mostram que o FPI é, de fato, maior no Brasil que em outros países, fazendo com que percamos competitividade com outros países da América Latina e leste europeu. Alguns casos têm levado mais de 12 meses para o início. Em estudos mais precoces, como os de fase I e II, este atraso pode simplesmente determinar a não participação de nosso país no estudo, uma vez que o número de pacientes nesses estudos é menor e, conseqüentemente, rapidamente atingido. Vale ressaltar que, uma vez iniciado o estudo, os centros brasileiros apresentam elevada velocidade de inclusão, que compensa a defasagem inicial e rapidamente se atinge o número planejado de pacientes. É com satisfação, portanto, que temos visto investigadores nacionais como primeiros autores em estudos internacionais, por terem recrutado o maior número de pacientes nesses estudos.

Referências

1. Lamberti, MJ et al. Going global. Appl Clin Trials 2004;13:84-92.

2. Glanszpigel D. Clinical trials in LA. Appl Clin Trials 2003;12:38-41.

3. Zuckerman DS. Taking the delays out of trial protocol changes. Scrip Magazine 2004; 19-20.

4. Siqueira JE. Ética na pesquisa com seres humanos. Rev Assoc Med Bras 2004;50:243.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Jul 2005
  • Data do Fascículo
    Jun 2005
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