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Uma breve trajetória dos elementos constitutivos do Advocacy Coalition Framework (ACF)

Una breve trayectoria de los elementos constitutivos del Advocacy Coalition Framework (ACF)

Resumo

O trabalho reconstrói a trajetória do Advocacy Coalition Framework (ACF), especialmente seu processo de aprendizado orientado à políticas públicas. Inicialmente, o texto contrasta os elementos contidos em Sabatier e Mazmanian (1980), nos quais são encontrados os primeiros esforços para desenvolver um modelo de análise com os argumentos encontrados em Sabatier (1987, 1988 e 1993). Posteriormente, a trajetória histórica de atualizações e versões do modelo é discutida com base nas análises de Sabatier e Jenkins-Smith (1999), Sabatier e Weible (2007) e Jenkins-Smith et al. (2018). Ao longo de mais de 30 anos de pesquisa, foi possível acompanhar as modificações presentes nas quatro versões do modelo, as principais hipóteses construídas, as críticas e seus desdobramentos Uma lacuna identificada nessa trajetória e consequente proposta para uma futura agenda de pesquisa apontam a influência dos atores internacionais e suas implicações nas modificações de políticas públicas, condição não explicitamente abordada pela ACF em suas diversas versões, conforme destacado por Jenkins-Smith et al. (2018).

Palavras-chave:
modelo de coalizão de defesa; processo de aprendizagem orientada a políticas; subsistema da política pública; sistema de crenças; mudança de políticas públicas

Resumen

El artículo pretende trazar la trayectoria del Advocacy Coalition Framework (ACF), especialmente su proceso de aprendizaje orientado a políticas públicas. Inicialmente, el texto contrasta los elementos contenidos en Sabatier y Mazmanian (1980), donde se encuentran los primeros esfuerzos por desarrollar un modelo de análisis, con los argumentos encontrados en Sabatier (1987, 1988 y 1993). Posteriormente, se discute la trayectoria histórica de actualizaciones y versiones del modelo a partir de los análisis de Sabatier y Jenkins-Smith (1999), Sabatier y Weible (2007), y Jenkins-Smith et al. (2018). A lo largo de la trayectoria de construcción del ACF, fue posible seguir las modificaciones en las cuatro versiones del modelo, las principales hipótesis construidas, las críticas y sus desdoblamientos. Una laguna identificada en esta trayectoria, y consecuente propuesta de agenda de investigación futura, destaca la influencia de los actores internacionales y sus implicaciones en las modificaciones de las políticas públicas, condición no abordada explícitamente por el ACF en sus variadas versiones, como destacan Jenkins-Smith et al. (2018).

Palabras clave:
marco de coalición de causas; proceso de aprendizaje orientado a políticas; subsistema de políticas públicas; sistema de creencias; cambio en las políticas públicas

Abstract

This paper aims to retrace the trajectory of the Advocacy Coalition Framework (ACF), especially its policy-oriented learning process. Initially, we contrast the elements in Sabatier and Mazmanian (1980), where the first efforts to develop an analysis model are found, with the arguments found in Sabatier (1987, 1988, and 1993). Subsequently, the historical trajectory of updates and versions of the model is discussed based on the analyses in Sabatier and Jenkins-Smith (1999), Sabatier and Weible (2007), and Jenkins-Smith et al. (2018). It was possible to follow the modifications in the model, the main hypotheses built, the criticisms, and their unfoldings. As main findings, it was evident throughout the ACF construction trajectory: four versions of the model over almost 30 years and with the decisive participation of six prominent authors who contributed to its main developments since the first version, present in Sabatier and Jenkins-Smith (1993); and Sabatier and Jenkins-Smith (1999), the model gains greater analytical capacity with the intermediate variables between the external factors and the policy subsystem and analytically refines the categories internal to the subsystem. One gap identified in this trajectory, and consequent proposal for a future research agenda, is the influence of international actors and their implications on policy modifications, a condition not explicitly addressed by the ACF in its varied versions, as highlighted by Jenkins-Smith et al. (2018).

Keywords:
policy-oriented learning; advocacy coalitions; policy subsystems; belief systems; policy change

1. INTRODUÇÃO

O Advocacy Coalition Framework (doravante ACF) é um dos modelos mais utilizados na literatura internacional para analisar disputas que permeiam o processo decisório de políticas públicas. De acordo com Weible, Sabatier, Jenkins-Smith, Nohrstedt, e Henry (2011Weible, C. M; Sabatier, P. A; Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; & Henry, A. D. (2011). A quarter century of the advocacy coalition framework: an introduction to the special issue. The Policy Studies Journal, 39(3), 349-360. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.2011.00412.x
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), o ACF, desde sua concepção, partiu das seguintes premissas: a) a principal unidade de análise é o subsistema da política pública; b) para entender os acordos no subsistema é imprescindível uma trajetória histórica de política pública não inferior a 15 anos; c) os atores envolvidos no sistema da política pública podem estar agregados em coalizões; e d) os desenhos das políticas públicas são interpretados como traduções das crenças das coalizões. Essas premissas são consideradas nos seguintes eixos analíticos: a formação e a manutenção de coalizões; o processo do aprendizado da coalizão orientado à política pública e as mudanças na política pública.1 1 Não há consenso na literatura sobre o termo modelo, frequentemente utilizado para traduzir o Advocacy Coalition Framework. Resolvemos mantê-lo no texto por dois motivos principais: pela ampla utilização na língua portuguesa da tradução do ACF como “Modelo de Coalizão de Defesa”; pelo conteúdo substantivo dado à sua concepção por vários autores para quem a utilização de modelos para analisar políticas públicas visa ordenar e simplificar a vida política no sentido de tornar mais inteligíveis as relações que encontramos na realidade, além de serem ferramentas conceituais construídas para coletar, organizar, interpretar, entender e explicar dados sobre políticas públicas (cf. Deubel, 2002; Dye, 2009). Nesse sentido, Jenkins-Smith, Nohrstedt, Weible, e Ingold (2018, pp. 138-139, p. 161) resgatam a importância da distinção entre framework (estrutura conceitual) e teoria. Isso porque ocorreram modificações no ACF ao longo do tempo, o que dificulta acompanhar o que mudou e o que se manteve igual. Portanto, ao largo dessas modificações, distinguir entre teoria e framework tem como intuito vincular os componentes mais estáveis do ACF ao nível de framework, mais suscetíveis de serem desenvolvidos por testes empíricos sistemáticos e pensamento criativo, sem se restringir a uma teoria como referência.

Dentre esses três eixos, o processo de conhecimento orientado à política pública (policy-oriented learning) é o que mais apresenta desafios e limites para a operacionalização de estudos empíricos2 2 Para aprofundar o entendimento sobre o conceito de conhecimento orientado a política e sua recente aplicação em estudos empíricos, ver Ma e Vieira (2020). (Jenkins-Smith et al., 2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge.). Entretanto, é a categoria que dá originalidade ao ACF ao partir do entendimento de que o conhecimento não é estanque, e sim contingencial, e que as transformações guiadas por esse processo são resultantes do embate entre coalizões e suas crenças diante do subsistema da política pública. O próprio modelo, desde os primeiros esforços do professor Sabatier nos anos 1980Sabatier, P. A; & Mazmanian, D. (1980). The implementation of public policy: a framework of analysis. Policy Studies Journal, 8(4), 538-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.1980.tb01266.x
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, também incorporou contribuições decorrentes de sua aplicação mundo afora e mostrou-se, assim como no processo do aprendizado, orientado à política pública, suscetível a mudanças e adaptações.

O objetivo principal deste trabalho é recuperar a trajetória de construção do ACF destacando a importância de seu arcabouço teórico e de suas categorias analíticas para a compreensão dos processos e das dinâmicas que envolvem a formulação e implementação de políticas públicas. Tal resgate se dará da seguinte forma: inicialmente, contrastamos os elementos constantes em Sabatier e Mazmanian (1980Sabatier, P. A; & Mazmanian, D. (1980). The implementation of public policy: a framework of analysis. Policy Studies Journal, 8(4), 538-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.1980.tb01266.x
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), em que estão presentes os primeiros esforços para desenvolver um modelo de análise, com os argumentos encontrados em Sabatier (1987 e 1988). Os resultados desses trabalhos seminais foram reafirmados em Sabatier e Jenkins-Smith (1993Sabatier, P. A. (1993). Policy change over a decade or more. In P. A. Sabatier & H. C. Jenkins-Smith (Eds.), Policy change and learning: an advocacy coalition approach(pp. 13-39). Boulder, CO: Westview Press.). Em seguida, para discutir o conceito de conhecimento orientado para a política pública (policy-oriented learning), tomamos por referência os estudos de Jenkins-Smith e Sabatier (1993Jenkins-Smith, H. C; & Sabatier, P. A. (1993b). The dynamics of policy-oriented learning. In P. A. Sabatier, & H. C. Jenkins-Smith (Eds.), Policy change and learning: an advocacy coalition approach. (pp. 41-56). Boulder, CO: Westview Press.). Posteriormente, discutimos a trajetória histórica de atualização e versões do modelo com base nas análises constantes em Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge.), Sabatier e Jenkins-Smith (1999Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1999). The advocacy coalition framework: an assessment. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (pp. 117-166). Boulder, CO: Westview Press .) e Sabatier e Weible (2007Sabatier, P. A; & Weible, C. M. (2007). The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (2a ed., pp. 189-220). Boulder, CO: Westview Press .). Dessa forma, foi possível acompanhar as modificações no modelo, as principais hipóteses construídas, as críticas e seus desdobramentos.3 3 Foge às preocupações deste artigo fazer uma revisão dos principais trabalhos empíricos que utilizam o ACF. Entrementes, como a discussão proposta aqui não pretende ser de natureza abstrata, cumpre destacar parte de uma literatura já consolidada que dialoga com o modelo. Kukkonen et al. (2018) estudaram a influência do Regime Internacional nas políticas ambientais; Moyson (2018) buscou entender os efeitos dos interesses no aprendizado orientado à política; Brown e Stuart (1993) analisam a política da aviação civil nos EUA utilizando o ACF; Araújo (2013) estudou as coalizões da política ambiental no Legislativo brasileiro; Capelari, Araújo, e Calmon (2015) e Ma, Lemos, e Vieira (2020) realizam um balanço das pesquisas nacionais que utilizam o ACF; Capella (2006) e Capella e Brasil (2015) sistematizaram as principais variáveis do modelo; Heikkila e Carney (2017) no comparativo do ACF e mais seis outras concepções teórico-conceituais usadas na análise de políticas públicas, entre muitos outros.

Para chegar à configuração atual, o ACF vem passando por alterações desde suas primeiras versões. Importa salientar que Sabatier, antes de estabelecer a coautoria com Jenkins-Smith, em conjunto com Mazmanian ao longo dos anos 1970, já propunha um protótipo de análise para preencher uma lacuna nos estudos de políticas públicas, qual seja, a influência do sistema político na implementação de políticas públicas. A proposta, à época, abordava os seguintes tipos de política pública: i) transformações desde a burocracia de linha à alta burocracia; ii) mudança no comportamento de burocratas municipais ou estaduais na distribuição de recursos; iii) comportamentos de atores privados na disputa por orçamentos (Sabatier & Mazmanian, 1980Sabatier, P. A; & Mazmanian, D. (1980). The implementation of public policy: a framework of analysis. Policy Studies Journal, 8(4), 538-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.1980.tb01266.x
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). Naquele momento, era possível visualizar três elementos presentes na essência do que o ACF tenta explicar: a relação entre os burocratas de diferentes níveis, as mudanças de comportamento daqueles que decidem a política pública e a participação dos atores formalmente fora do governo que tentavam permear o processo decisório.

Também é possível identificar em Sabatier e Mazmanian (1980Sabatier, P. A; & Mazmanian, D. (1980). The implementation of public policy: a framework of analysis. Policy Studies Journal, 8(4), 538-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.1980.tb01266.x
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, p. 540) a preocupação com o comportamento do ator político quando se refere ao legado teórico construído por outros autores (Bardach, 1977Bardach, E. (1977). The implementation game: what happens after a bill becomes a law. Cambridge, MA: MIT Press. Recuperado de http://hdl.handle.net/10822/775241
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; Rein & Rabinovitz, 1977Rein, M; & Rabinovitz, F. F. (1977). Implementation: a theoretical perspective. Cambridge, MA: Joint Center for Urban Studies of MIT.; Van Meter & Van Horn, 1975Van Meter, D. S; & Van Horn, C. E. (1975). The policy implementation process: a conceptual framework. Administration & Society, 6(4), 445-488. Recuperado de https://doi.org/10.1177/009539977500600404
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) para compreender o processo decisório de implementação para além da perspectiva administrativa e jurídica:

Collectively, these efforts provide a reasonable overview of policymaking in terms of its complexity and the variety of factors that can either assure or impede successful implementation. But we fell that more is needed. In the first place, more of an effort is needed in conceptualizing and empirically exploring the linkage between individual behavior and the political, economic, and legal context in which it occurs […]4 4 Coletivamente, esses esforços fornecem uma visão geral razoável da formulação de políticas públicas em termos de complexidade e variedade de fatores que podem garantir ou impedir a implementação bem-sucedida. Mas sentimos que mais é necessário. Em primeiro lugar, é necessário um esforço maior para conceitualizar e explorar empiricamente a ligação entre o comportamento individual e o contexto político, econômico e jurídico em que ocorre. .

2. DISTINTAS VERSÕES DOS DIAGRAMAS DO ACF

A versão mais atual do diagrama do ACF se assemelha a um sistema que se retroalimenta, como se pode verificar na Figura 1. O esquema analítico representativo do modelo conta com duas categorias externas, sendo uma mais estável, sem alterações abruptas no curto prazo, chamada de parâmetros relativamente estáveis. Nesse conjunto, estão: os atributos básicos do problema da área da política pública e a distribuição dos recursos naturais, os valores fundamentais socioculturais e a estrutura social, além da estrutura constitucional básica do Estado. O conjunto eventos externos ao subsistema agrega as variáveis mais dinâmicas. Primeiro, as alterações nas condições socioeconômicas, como a urbanização acelerada, as recorrentes crises econômicas, a abertura comercial e as mudanças na opinião pública. Essas variáveis indicam a mudança do sistema da coalizão de governabilidade, ou seja, qual partido ou grupo político apresenta maior força diante do governo. Por fim, há as alterações no subsistema de outras políticas. Antes de afetar o subsistema interno de uma política pública específica, as variáveis externas passam pelo filtro de dois conjuntos: estruturas de oportunidade para coalizões de longo prazo e constrangimentos e recursos de curto prazo disponíveis.

Figura 1
Digrama do fluxo do modelo de coalizão de defesa

Dentro do primeiro conjunto, destaca-se o grau de consenso necessário para mudanças mais profundas na política pública. Por exemplo, se a política pública não afetar significativamente as crenças dos atores, tende a ter alto grau de consenso. A abertura do sistema político, uma categoria de longo prazo para as coalizões, busca compreender o contexto em países nos quais o corporativismo é um elemento significante de permeabilidade. Países com fortes tradições corporativistas nas relações entre Estado e sociedade tendem a restringir a participação de atores no processo. Conforme Milward e Francisco (1983Milward, H. B; & Francisco, R. A. (1983). Subsystem politics and corporatism in the United States. Policy and Politics, 11(3), 273-293. https://doi.org/10.1332/030557383782628607
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), a intermediação de interesses corporativos ocorre em torno de áreas de políticas públicas baseadas em programas governamentais. Nessas áreas, agências estatais, ao mesmo tempo, apoiam grupos de pressão no processo de formulação da política pública e contam com o apoio destes. Por fim, a sobreposição de clivagem social encerra a relação das categorias intervenientes intermediárias de maior duração com repercussões sobre o grau de consenso quando há muita polarização.

No segundo conjunto, constrangimentos e recursos de curto prazo disponíveis, observamos o contingenciamento das ações dos atores no subsistema da política pública. Dentro desse subsistema, a principal unidade de análise é a coalizão de defesa, tensionada por uma competição interna coerente com os seus princípios, valores e interesses, um sistema de crenças. As coalizões geralmente abdicam de suas estratégias e recursos específicos para permear a decisão de uma autoridade governamental a seu favor. O resultado é a criação de regras que trarão consequências aos eventos do subsistema externo dinâmico, forjando um ciclo de retroalimentação. Não obstante o comportamento dos atores, o conteúdo das políticas públicas importa, como também o sistema político do país e sua trajetória histórica de experiência democrática, além do contexto internacional, condições que possibilitam maior participação ou contestação.

Com o intuito de aprofundar o estudo das políticas públicas sem desconsiderar o sistema político e a dimensão institucional, Sabatier e Mazmanian (1980Sabatier, P. A; & Mazmanian, D. (1980). The implementation of public policy: a framework of analysis. Policy Studies Journal, 8(4), 538-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.1980.tb01266.x
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) montaram o seguinte quadro analítico (Figura 2):

Figura 2
Fluxograma das variáveis no processo de implementação de políticas públicas

No estudo do final da década de 1970, não estavam ainda delineados os conceitos importantes para o modelo ACF, como coalizão de defesa, sistemas de crenças, aprendizado orientado à política pública e o subsistema político, mas podemos destacar alguns elementos de similitude.

O conjunto de variáveis tratabilidade do problema, destacadas na Figura 1, é equivalente à categoria atributos básicos no conjunto parâmetros relativamente estáveis do ACF, ou seja, qual problema ou bem público a política pública se propõe a resolver/enfrentar. Também não precisamos de muito esforço para identificar as variáveis não estatutárias que afetam a implementação, assim como os eventos externos ao subsistema no ACF, como categorias externas ao Estado que afetam a implementação, como, por exemplo, mudanças socioeconômicas e tecnológicas.

Já a categoria capacidade estatutária para estruturar a implementação é passível de comparação com constrangimentos de curto prazo e recursos dos atores do subsistema. O arranjo institucional (forma de seleção da burocracia) representa a membrana de separação entre os que estão dentro e fora da comunidade que decide a política pública. Por fim, a variável estágios do processo de implementação guarda semelhanças com o subsistema da política pública do ACF. Ambas sofrem influências das variáveis externas, ou seja, são variáveis dependentes. Todavia, no caso do ACF, o subsistema é anteparado pelos constrangimentos e recursos de curto prazo dos atores do subsistema, assim como exerce influência por meio dos outputs e impactos da política pública.

Em Sabatier e Mazmanian (1980Sabatier, P. A; & Mazmanian, D. (1980). The implementation of public policy: a framework of analysis. Policy Studies Journal, 8(4), 538-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.1980.tb01266.x
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), embora seja perceptível certa inquietação em torno de como o comportamento, as teorias e as tecnologias influenciam os atores, não se encontram ainda presentes conceitos como o de coalizão de defesa e o de aprendizado orientado à política pública. Esses conceitos, que proporcionarão maior consistência analítica ao modelo, só serão absorvidos pela categoria subsistema da política pública no ACF, pois, porquanto a categoria estágios do processo de implementação guarde uma forma processual assim como o subsistema da política pública, ainda não aborda o embate das coalizões decorrente de seus sistemas de crenças. É importante frisar que o protótipo de Sabatier e Mazmanian (1980) contava com uma forte influência da administração pública e com a preocupação com a eficiência da política pública em si, não necessariamente com a perspectiva analítica formulada cerca de dez anos depois, como também é possível visualizar a tentativa de alinhar o desenho institucional com a ação dos atores políticos sem recorrer a uma perspectiva generalista e reducionista, ao tempo em que apresentava um ferramental analítico para prover previsibilidade mínima com base em evidências empíricas. Nesses termos, não seria nenhuma digressão apontar o modelo disposto em Sabatier e Mazmanian (1980) como um marco paradigmático para entender os primeiros passos em direção ao ACF.

A versão do ACF apresentada em Jenkins-Smith e Sabatier (1993aSabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) é resultado do contato entre ambos, ainda em 1985, quando o professor Jenkins-Smith visitou a Universidade de Califórnia, em Davis, na qual o professor Sabatier lecionava. Na ocasião, identificaram concepções similares acerca do papel da informação científica e da análise de políticas públicas no processo político (Jenkins-Smith & Sabatier, 1993Jenkins-Smith, H. C; & Sabatier, P. A. (1993b). The dynamics of policy-oriented learning. In P. A. Sabatier, & H. C. Jenkins-Smith (Eds.), Policy change and learning: an advocacy coalition approach. (pp. 41-56). Boulder, CO: Westview Press., p. 12). Formularam, então, a primeira versão do digrama representativo do modelo, conforme pode ser visualizado na Figura 3.

Figura 3
Primeira versão do ACF

Sabatier e Jenkins-Smith (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) chegaram a esse desenho após duas décadas de estudos sobre a política pública ambiental na Califórnia. Como resultado desses anos de pesquisa, verificaram os seguintes aspectos relevantes no que tange às modificações na política pública: a importância do debate científico e técnico sobre o entendimento do papel da política pública; a descentralização no processo decisório da política pública que passou do âmbito do Congresso dos EUA para autoridades locais; a formação dos triângulos de ferro em torno de crenças e valores5 5 Triângulo de ferro é o conceito utilizado por Kingdon (1995) para descrever a coalizão formada por um grupo de interesse em associação com integrantes da burocracia executiva e representantes do Legislativo. O conceito, provavelmente, foi utilizado pela primeira vez pelo jornalista Ralph Pulitzer, em 1919, momento de ascensão do pensamento elitista, corrente teórica dominante na Ciência Política até meados do século XX, cujo conteúdo afirmava a concentração de poder político nas mãos de uma minoria, de uma elite política, aspecto inevitável em todas as sociedades. A crítica à teoria das elites foi formulada e aprofundada pelo pluralismo, sobretudo com base no trabalho seminal de Dahl (1961), para quem o poder nas sociedades industrializadas ocidentais está amplamente distribuído entre diferentes grupos. Nenhum grupo encontra-se destituído de poder para influenciar o processo de tomada de decisão e, igualmente, nenhum grupo é dominante (cf. Grynspan, 1994). Uma genealogia do ACF teria essa discussão como marco inicial. ; a influência de eventos externos físico-ambientais, como a mudança climática e a poluição do ar. Essa multiplicidade de fatores, segundo Sabatier (1993, p. 20), valida a perspectiva trabalhada por Heclo (1974Heclo, H. (1974). Social policy in Britain and Sweden. New Haven, CT: Yale University Press.), que focaliza o aprendizado desenvolvido pelas elites políticas dentro da comunidade profissional de determinada política pública para entender as mudanças em curso nas políticas públicas de longo prazo.

Respaldados por esse trabalho e em contraste com o modelo discutido inicialmente em Sabatier e Mazmanian (1980Sabatier, P. A; & Mazmanian, D. (1980). The implementation of public policy: a framework of analysis. Policy Studies Journal, 8(4), 538-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.1980.tb01266.x
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), os autores apresentam quatro premissas básicas: é necessário uma perspectiva de análise igual ou superior a dez anos para compreender o processo de mudança da política pública e o conhecimento adquirido pela comunidade da política pública ao longo desse tempo; o foco no subsistema político é a forma mais factível para compreender mudanças nas políticas; deve-se levar em consideração as dimensões intergovernamentais e todos os níveis de governo para compreender o subsistema político; as políticas públicas podem ser consideradas como sistemas de crenças que consistem em um conjunto de valores e suposições sobre como concretizá-las. No trabalho de 1999, Sabatier e Jenkins-Smith acrescentam mais uma suposição: a importância do papel dos argumentos e das informações técnicas sobre a magnitude e causa dos problemas, bem como dos prováveis impactos das várias soluções apresentadas.

Note-se que, no debate acerca da motivação dos atores, Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) apresenta diferenças em relação à unidade de análise quando comparado com Heclo (1974Heclo, H. (1974). Social policy in Britain and Sweden. New Haven, CT: Yale University Press.), embora ambos deem ênfase às coalizões baseadas na dinâmica do aprendizado orientado à política pública. Heclo (1974, pp. 308-309) focalizou os grupos formalmente organizados e a busca individual por autointeresse.

Recentemente, Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge.) complementaram essa premissa ao apontar a interferência de informações técnicas e científicas no subsistema por estarem atreladas ao sistema de crenças dos atores. Nesse trabalho, os autores apresentam mais uma suposição: os indivíduos são limitadamente racionais, motivados por crenças e valores, como também são relativamente motivadas por objetivos, mas não têm muita clareza de como alcançá-los. Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) parte da ideia de que os atores no subsistema não se restringem a grupos formais, como organizações e partidos, e possuem racionalidade limitada. Tomando ainda o diagrama disposto na Figura 3, Sabatier (1993, p. 20) busca diferenciar os fatores externos mais estáveis que afetam a política pública daqueles mais dinâmicos, conforme trabalhado na comparação com Sabatier e Mazmanian (1980Sabatier, P. A; & Mazmanian, D. (1980). The implementation of public policy: a framework of analysis. Policy Studies Journal, 8(4), 538-560. Recuperado de https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.1980.tb01266.x
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). Assim, justifica-se a distinção entre os dois conjuntos de variáveis externas quanto à sua estabilidade e capacidade de influenciar ao longo do tempo: parâmetros relativamente estáveis e os eventos externos dinâmicos.

Os parâmetros relativamente estáveis (relativelly stable parameters) são mais difíceis de alterar em curto prazo e estão menos suscetíveis à ação das coalizões e dos atores. A política ambiental, por exemplo, é significativamente afetada pela qualidade do ar, pelas correntes de ar e pelo limite territorial político, que é relativamente estável ao longo do tempo (Sabatier, 1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 17). Dentro dessa dimensão de influência externa estão os atributos do problema ou, basicamente, como o bem em disputa regulado pela política pública é caracterizado. Sabatier (1993) exemplifica a preocupação com o ar como um bem exaurível, que necessita de regulação para que se mantenha tal acesso. Valores culturais fundamentais e estrutura social podem ser evidenciados com as diferentes visões sobre a participação do Estado na economia se a estrutura social é sectária racial ou religiosa, entre outras possibilidades. Portanto, a relevância da estrutura social e do contexto na formação de coalizões afasta-se de qualquer compreensão baseada em um nível analítico exclusivamente fundamentado no indivíduo.

No modelo de 1993, a estrutura constitucional básica se refere à dimensão normativo-legal do Estado. Já os eventos do sistema dinâmico externo (external system events) são um desafio constante para os atores do subsistema da política pública. Os atores devem aprender a se antecipar e responder a essas mudanças repentinas de maneira consistente às suas crenças e interesses (Sabatier, 1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 22). Coalizões sistêmicas de governabilidade correspondem a mudanças na composição do Congresso e da orientação do executivo. Como exemplo empírico dessa categoria, os autores apontam a mudança na composição do Congresso estadunidense, de democratas liberais para republicanos conservadores, e de como tal condição afetou o redirecionamento das prioridades do governo na política ambiental. As decisões políticas e os impactos decorrentes de outros subsistemas estariam atrelados ao fato de que os subsistemas são parcialmente autônomos e sofrem a influência das decisões de outras áreas. Sabatier (1993) evidencia essa interseção entre subsistemas destacando as implicações da política externa britânica na observação de certos níveis de poluição como situação decorrente de sua inserção na Comunidade Econômica Europeia.

As categorias constrangimentos e recursos dos atores no subsistema funcionam como um anteparo, um filtro, a essas pressões externas (parâmetros de estabilidade relativa e sistema dinâmico de eventos). Assim, as condições externas, como a estrutura socioeconômica e o desenho constitucional do país, geram o conjunto recursos, oportunidades e dificuldades dentro do contexto de uma política pública específica. Mas cabe aos atores, dentro do subsistema da política pública, aproveitar o momento para direcionar a política pública de forma coerente com suas crenças. O interessante dessa categoria é considerar um contexto intermediário entre o ambiente externo e o subsistema da política pública em si (Sabatier, 1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .; Sabatier & Jenkins-Smith, 1999). Cumpre notar que, nas versões subsequentes do modelo, esse é o ponto que mais sofre alterações, conforme pode ser visualizado no Quadro 1.

Quadro 1
Comparação entre a primeira e a segunda versão do ACF

Sabatier e Jenkins-Smith (1999Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1999). The advocacy coalition framework: an assessment. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (pp. 117-166). Boulder, CO: Westview Press .), em comparação com Sabatier e Jenkins-Smith (1993Jenkins-Smith, H. C; & Sabatier, P. A. (1993b). The dynamics of policy-oriented learning. In P. A. Sabatier, & H. C. Jenkins-Smith (Eds.), Policy change and learning: an advocacy coalition approach. (pp. 41-56). Boulder, CO: Westview Press.), acrescentam o grau necessário de consenso para mudanças substanciais na política pública como variável intermediária entre os parâmetros de estabilidade relativa e o subsistema da política pública, além de adicionarem a variável opinião pública nos eventos do subsistema externo dinâmico. As etapas que compõem o subsistema da política pública também apresentam alterações. As decisões pelas regras institucionais soberanas, aquelas acerca da regulação, da alocação de recursos e dos compromissos presentes na primeira versão, sofrem duas modificações: são simplificadas para decisões da autoridade governamental e tornam regras institucionais, alocação de recursos e compromissos uma nova etapa do subsistema. Assim como ocorreu em Sabatier e Jenkins-Smith (1999Jenkins-Smith, H. C; & Sabatier, P. A. (1993a). The study of policy processes. In P. A. Sabatier; & H. C. Jenkins-Smith (Eds.), Policy change and learning: an advocacy coalition approach. (pp. 1-9) Boulder, CO: Westview Press.), a mesma variável intermediária entre os fatores externos e o subsistema da política pública sofre mais alterações, como se pode observar na síntese da terceira versão do modelo (Quadro 2) presente em Sabatier e Weible (2007, p. 202). Adicionou-se a categoria estruturas de oportunidades para coalizão de longo prazo, que absorveu a variável, antes separada, níveis de consenso para mudanças na política pública e acrescentou-se a categoria abertura do sistema político.

Como destacaram Sabatier e Weible (2007Sabatier, P. A; & Weible, C. M. (2007). The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (2a ed., pp. 189-220). Boulder, CO: Westview Press ., p. 200), essas duas categorias foram incorporadas com base no trabalho de Lijphart (1999Lijphart, A. (1999). Patterns of democracy: government forms and performance in thirty-six countries. New Haven, CT: Yale University Press.) e inseridas após a observação do contexto corporativista europeu, presente nos estudos de Larsen, Vrangbaek e Traulsen (2006Larsen, J. B; Vrangbæk, K; & Traulsen, J. M. (2006). Advocacy coalitions and pharmacy policy in Denmark - solid cores with fuzzy edges.Social Science & Medicine,63(1), 212-224. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2005.11.045
https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2005...
).6 6 Em regimes corporativistas há incentivos para as coalizões terem acesso aos canais de permeabilidade por meio de “centros sólidos com a borda porosa e muitos atores procurando agir como mediadores” (Larsen, Vrangbaek, & Traulsen, 2006, p. 200). Na perspectiva corporativista, o Partido Social-Democrata e a Associação Farmacêutica Dinamarquesa anteciparam o canal de decisão ao aglutinar as duas coalizões antagônicas (Larsen et al., 2006, p. 218).

Quadro 2
Comparação entre as variáveis e categorias presentes na terceira e na quarta versão do diagrama do ACF

Conforme exibido no Quadro 2, anteriormente, ao compararmos os diagramas dispostos em Sabatier e Weible (2007Sabatier, P. A; & Weible, C. M. (2007). The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (2a ed., pp. 189-220). Boulder, CO: Westview Press .) com os de Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge.), presentes na Figura 1, podem-se verificar três alterações: a incorporação da categoria sobreposição de clivagens ideológicas no conjunto de variáveis estruturas para coalizões de longo prazo; da mesma forma, a relação de impacto direta do longo prazo nos eventos do sistema externo; a retirada da figura do policy broker do diagrama.

Ainda sobre a influência dos fatores externos ao subsistema da política pública, Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge.) e Sabatier e Weible (2007Sabatier, P. A; & Weible, C. M. (2007). The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (2a ed., pp. 189-220). Boulder, CO: Westview Press .) assinalam a importância das pressões internacionais para impor direcionamentos à política pública, embora presuma-se que o nível internacional tenha autoridade limitada. Entretanto, cumpre destacar que essa pressão não é explorada na literatura da área nem no modelo. Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge.) discutem o volume de estudos comparativos entre países, mas não incorporam a interação das coalizões no plano internacional e suas influências nos subsistemas domésticos.

3. O SUBSISTEMA POLÍTICO NO ACF: HIPÓTESES DO MODELO E CONCEITOS ADJACENTES

O subsistema da política pública é a dimensão básica para empregar o ACF, a fim de abranger a formação e a interação entre os atores dentro do processo decisório, bem como as respostas destes às variáveis externas e intermediárias. Dessa forma, contribui decisivamente para a compreensão acerca das mudanças da política pública e a caracterização das coalizões de defesa. Em relação à categoria coalizões de defesa, Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) propõe uma abordagem bem diferente dos passos de implementação presentes em Sabatier e Mazmanian (1980). Em contextos marcados pela tendência a uma especialização do conhecimento técnico e científico, torna-se necessário incorporar outros atores à comunidade da política pública, como cientistas, além da profissionalização e disseminação da mídia na sociedade de massa, personificada pelos jornalistas. Portanto, Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 24) define o subsistema como um conjunto de atores lidando com determinados problemas referentes a uma política pública, sem desconsiderar outros potenciais participantes das coalizões para além do nível de análise individual. Nesses termos, considera atores coletivos - organizações privadas ou públicas, partidos e agremiações - também como unidade de análise no subsistema.7 7 A ampliação do escopo de unidade de análise presente em Sabatier (1993) e posteriormente reafirmada em Jenkins-Smith et al. (2018, p. 139), para atores não formalmente integrantes do poder público, tem início no debate iniciado por Heclo (1978) acerca da abrangência da participação de atores no processo decisório de política pública.

O subsistema é circunscrito a uma política pública tematicamente específica com alcance territorial definido. A origem do subsistema se dá com o descontentamento ou a questão que um grupo, ou uma coalizão, concomitante às subespecializações que vão sendo desenvolvidas ao longo da profissionalização, apresenta em relação ao andamento das ações públicas voltadas para um tópico que aflige uma comunidade localizada no espaço e no tempo. Independentemente da origem, subsistemas contêm um enorme e diverso conjunto de atores, os quais deverão ser agregados em grupos que reduzam a sua quantidade para tornar a análise factível. A categoria coalizão de defesa pode ser definida, então, como um conjunto de pessoas oriundas de diversas posições que compartilham um sistema de crenças e aparentam um grau não trivial de coordenação das atividades ao longo do tempo. Essa concepção pode ser uma alternativa à dificuldade em verificar a variação do comportamento dos atores em uma mesma instituição, como o Congresso, cortes de justiça e até mesmo agências (Sabatier, 1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 25). Nesses estudos, as análises se concentram em um conjunto de tópicos, desde a estrutura e estabilidade do sistema de crenças dos atores até sua formação e manutenção ao longo do tempo (Jenkins-Smith et al., 2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 154).

O agrupamento dos atores em torno de uma coalizão é realizado por meio da convergência de crenças. Todavia, pode haver atores que não se amoldem a uma ou outra coalizão, como consultores, pesquisadores e burocratas, que participam somente para oferecer suas habilidades técnicas.8 8 Jenkins-Smith et al. (2018), posteriormente, para delinear esses atores que não se amoldam a uma ou outra coalizão, trabalham com a categoria de subsistemas maduros, caracterizados como um conjunto de participantes que se consideram uma comunidade semiautônoma e que compartilham um conhecimento específico no domínio da política, buscando influenciar a política pública por um longo período. Entretanto, há uma categoria chamada policy broker, função geralmente ocupada por políticos eleitos para o Executivo cuja preocupação consiste em garantir limites mínimos à competição travada entre as coalizões no sentido de lograr soluções para os problemas que a política pública enfrenta. A distinção entre participar da coalizão de defesa ou ser um police broker reside no desfecho da política pública em si (Sabatier, 1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .). O modelo indica que afiliações institucionais tendem ao policy broker, enquanto atores formalmente fora do poder público tendem a participar de uma coalizão (Sabatier, 1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .). Por fim, o conceito de coalizão de defesa admite que o compartilhamento de crenças é a liga entre os atores e que as crenças centrais são significativamente resistentes às mudanças.

O alinhamento desses elementos confirma a primeira hipótese do ACF: quando a crença central da política pública está em disputa dentro de um subsistema, a formação de aliados e oponentes tende a ser bastante estável durante períodos de uma década ou mais (HP1). Com isso, o ACF rejeita o argumento de que atores são orientados, primordialmente, por interesses de curto prazo e coalizões de conveniência. Em Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 27), pode-se visualizar uma série de trabalhos empíricos que reafirma tal hipótese. Interesses e ações são determinados por uma relação causal. Certo ator pretendia alcançar deliberado fim ou interesse e agiu de certa forma, usou certo meio para conseguir tal fim. Para chegar a essa relação causal, entre meio e fim, é necessário um parâmetro de crenças sobre a causalidade das ações. Logo, crenças absorvem o autointeresse e o objetivo. O inverso fica mais limitado. Ademais, é muito difícil atestar, com significativa confiabilidade, o interesse que não seja restrito à atividade econômica ou quantificável em uma lógica utilitarista, que não resulte de um conjunto de valores e crenças (cf. Sabatier, 1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 27). Portanto, não se deve entender crenças e interesses como conceitos ortogonais, pois são complementares, embora as crenças sejam mais factíveis de serem identificadas do que os interesses.

Para tentar compreender o conjunto de crenças sem necessariamente cair no relativismo ou no reducionismo, Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 29) entende que o sistema de crenças possui três pontos de partida básicos: a teoria da ação racional de Ajzen e Fischbein (1980Ajzen, I; & Fischbein, M. (1980). Understanding attitudes and predicting social behavior. Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall.), na qual, para os autores, as ações derivam de um leque de possibilidades para atingir uma combinação de metas em que as preferências dos atores estão além de uma visão utilitarista simplista; a racionalidade é limitada em vez de perfeita; como o subsistema é composto por um grupo seleto dentro da política pública, há fundamentos substanciais que confirmam que muitos atores terão um sistema de crenças internamente consistente e relativamente complexo nas áreas de interesse deles.

Destituída a racionalidade como principal indicador para a ação dos atores, fica a questão sobre a forma como o sistema de crenças pode ser explicado. Nesse sentido, Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) dialoga com os seguintes autores: Putnam (1976Putnam, R. (1976).The comparative study of political elites. Hoboken, NJ: Prentice-Hall.), em que há uma revisão da orientação normativa e cognitiva das elites políticas; Axelrod (1976Axelrod, R. (1976).Structure of decision: the cognitive maps of political elites. Princeton, NJ: Princeton University Press., como citado em Lakatos, 1971), na distinção do núcleo duro dos elementos do sistema de crenças científicas; e Converse (1964), que entende as crenças abstratas como mais resistentes às mudanças do que as específicas. Dessa forma, o sistema de crenças adotado no ACF perpassa por três categorias estruturais: o núcleo duro dos fundamentos normativos e axiomas ontológicos que definem o ator; a periferia do núcleo duro de crenças, depois chamado crença da política pública (Sabatier & Weible, 2007), em que as estratégias e as posições na política pública convergem para as crenças do núcleo duro; e os aspectos secundários, as decisões instrumentais e a busca pelas informações necessárias específicas da política pública para implementar as crenças presentes na periferia do núcleo duro.

É possível reconhecer que o sistema de crenças atende a uma hierarquia quanto à propensão à mudança na medida em que se aproxima dos aspectos secundários. As crenças oriundas do núcleo duro tendem a ser mais difíceis de mudar e mais genéricas. Muitos membros da coalizão demonstrarão concordância com várias crenças presentes no núcleo duro. Entretanto, as crenças secundárias dependem da área da política pública. As posições em um ponto específico de uma política pública que interfiram no núcleo duro serão mais difíceis de alterar do que uma posição ligada às crenças secundárias.

Por isso, Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) apresenta mais duas hipóteses: atores de uma coalizão de defesa demonstram mais consenso em questões do núcleo duro de crenças, embora menos nos aspectos secundários (HP2), e atores (ou coalizões) desistirão dos aspectos secundários de seus sistemas de crenças antes de reconhecer a fraqueza nas crenças da periferia do núcleo duro (HP3). Essas duas hipóteses são importantes porque posicionam os termos de negociação nos aspectos decisórios. Mais recentemente, Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 154) acrescentaram as seguintes sub-hipóteses à hipótese 3: em uma coalizão, as agências administrativas geralmente defendem posições mais moderadas do que seus aliados de grupos de interesse (HPA); atores em grupos propositivos são mais limitados em sua expressão de crenças e posições políticas do que atores de grupos materiais (HPB).

Uma questão central para o modelo que ainda requer mais estudos diz respeito ao problema do free-rider da ação coletiva. Sabatier e Weible (2007Sabatier, P. A; & Weible, C. M. (2007). The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (2a ed., pp. 189-220). Boulder, CO: Westview Press .) discutem essa questão por meio de três perspectivas: os custos de participação na coalizão são relativamente baixos se comparados com outras formas de comportamento coletivo porque o compartilhamento do sistema de crenças gera alta confiança e boa vontade para distribuir custos justamente; os referidos benefícios de participação numa coalizão são exagerados, especialmente quando os participantes da política pública experimentam o devil shift9 9 Trata-se de uma percepção que coloca a coalizão antagônica em uma posição maniqueísta entre “Deus e o diabo” (Jenkins-Smith et al., 2018). Devil shift foi cunhado inicialmente em Sabatier, Hunter, e McLaughlin (1987). O estudo parte da premissa de que a racionalidade apresentada pela perspectiva comportamental torna-se ainda mais contestável ao considerar que atores em disputa por determinado desfecho de um processo decisório comprometem a eficiência no uso de recursos. Em um contexto de assimetria de informação, a dificuldade em conseguir identificar com precisão valores, objetivos e recursos do concorrente compromete as estratégias, a alocação de recursos e a percepção sobre o outro. Assim, há o risco de subestimar ou superestimar o “inimigo”, tal como exposto na literatura das relações internacionais. Diante dessa problematização, o achado central da pesquisa corrobora a tese de que os atores percebem os oponentes como mais fortes e mais maldosos do que realmente são. em situações de alto conflito; o nível de coordenação na coalizão varia entre forte e fraca, nos extremos. A fraca coordenação tem custos mais baixos, reduzindo os riscos para o free-rider.

Na disputa no subsistema da política pública, uma coalizão exerce o papel mais proeminente do que outra. Cada uma tenta seguir as suas crenças e, para isso, usam estratégias e recursos proporcionados pelos parâmetros de estabilidade relativa e eventos do sistema dinâmico externo (Jenkins-Smith et al., 2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 154; Sabatier, 1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .). Sabatier (1993Sabatier, P. A. (1993). Policy change over a decade or more. In P. A. Sabatier & H. C. Jenkins-Smith (Eds.), Policy change and learning: an advocacy coalition approach(pp. 13-39). Boulder, CO: Westview Press.) apresenta, então, mais duas hipóteses referentes ao movimento de aprendizado das coalizões e as influências externas: o núcleo (atributos básicos) do programa de governo dificilmente será revisado enquanto a coalizão principal se mantiver no poder (HP4); o núcleo (atributos básicos) do programa de governo dificilmente será modificado sem uma significante perturbação externa ao subsistema (HP5). Com essas hipóteses, é possível afirmar que coalizões menos expressivas podem exercer mais permeabilidade na política pública, porém terão que contar com eventos externos significativos para potencializar suas estratégias. Da mesma forma, o conhecimento orientado para a política pública é mais suscetível de alterar os aspectos secundários do que o núcleo duro dos atributos da política pública.

Estudos recentes vêm tentando aperfeiçoar o conceito de coalizão de defesa, por meio da operacionalização de estudos empíricos em torno de algumas lacunas, como o melhor entendimento do conceito de conhecimento orientado para a política pública, a inclusão de níveis de conflito, os atributos dos atores, o papel do policy broker e a natureza dos estímulos e das características dos fóruns de decisão. Tais preocupações encontram-se em Weible et al. (2020Weible, C. M., Ingold, K., Nohrstedt, D., Henry, A. D., & Jenkins‐Smith, H. C. (2020). Sharpening advocacy coalitions.Policy Studies Journal,48(4), 1054-1081. Recuperado de https://doi.org/10.1111/psj.12360
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), cujo foco está numa melhor definição de coalizão de defesa e na preocupação em entender a dinâmica dos atores não somente em torno do sistema de crenças, mas da importância da ação coordenada nos subsistemas das políticas públicas. Esses estudos definiram cinco atributos para uma coalizão de defesa: os atores e suas tipologias; o sistema de crenças; a coordenação das atividades políticas; os recursos e, por fim, a estabilidade. O tipo ideal de coalizão de defesa é justamente aquele que atende aos cinco atributos. Já a condição mínima para a existência de uma coalizão é o compartilhamento de crenças.

4. O CONHECIMENTO ORIENTADO PARA A POLÍTICA PÚBLICA E HIPÓTESES CORRESPONDENTES

Depois de discutir as hipóteses e os conceitos que tratam da influência dos fatores externos sobre os atores na formação das coalizões de defesa, abordaremos outro conceito fundamental do modelo ACF: o aprendizado orientado para a política pública (policy-oriented learning). Jenkins-Smith e Sabatier (1993bSabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 42) o definem como alternâncias duradouras de pensamento ou intenções comportamentais que resultam da experiência e que estão relacionadas com a obtenção ou revisão de preceitos do sistema de crenças de indivíduos ou de coletivos. É o conceito-chave para compreender o núcleo das crenças da política que guia os atores submetidos a constrangimentos e oportunidades decorrentes de eventos externos e da ação dos oponentes. O conhecimento resultante da exposição aos eventos externos e a ação dos oponentes podem provocar uma revisão do núcleo do sistema de crenças, mas repercutem mais substancialmente na modificação dos aspectos secundários.

O processo de formação do subsistema, conforme visto, se inicia com a tentativa de resolver um problema. Se a coalizão formada identificar as causas e conseguir apoio político, propõe uma política pública como solução. Se esta não obtiver contestação de outra coalizão, é implementada. Do contrário, a coalizão que contestou a política pública deve buscar recursos e apoio para sua proposta alternativa. Ambas as coalizões partem para o que os autores chamam de debate analítico, travado em várias arenas/fóruns e que também afeta o processo. Após o debate, se o resultado não alcançar consenso, busca-se um acordo. Havendo concordância, ambos procuram expandir suas coalizões. Caso não, o governo desenvolve um programa intensivo em pesquisa de baixa coerção. Assim, a tensão entre as coalizões é atenuada e estudos são realizados para retomar a avaliação das propostas (Jenkins-Smith & Sabatier, 1993bSabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 46).

Outro ponto relevante diz respeito ao fato de como os atores identificam e respondem às mudanças no sistema de crenças do grupo antagônico, no sentido, até mesmo, de incorporar as crenças contra quem disputa. O exemplo apresentado por Jenkins-Smith e Sabatier (1993aSabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) refere-se à mudança de posição dos economistas, críticos dos gastos do governo, em sua tentativa de controlar a emissão de poluentes. Foram instituídos programas de incentivo e linhas de crédito para as firmas reduzirem a emissão de poluentes na atmosfera. Tal decisão não afetou as crenças dos economistas na eficiência econômica e atendeu às crenças da coalizão preocupada com a emissão de poluentes. A transformação ocorreu pela incorporação de novos aspectos secundários ao sistema de crenças da política pública dentro do debate analítico.

Comprometidos com a inteligibilidade e o estudo do aprendizado orientado para a política pública (policy-oriented learning) do ACF, Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 151) traduziram o que Jenkins-Smith e Sabatier (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 42) chamaram de processos nas seguintes questões básicas: quais componentes dos sistemas de crenças mudaram ou se mantiveram ao longo do processo de aprendizado? Quais contextos promovem o aprendizado por membros da coalizão? Como o conhecimento é difundido entre aliados e possíveis oponentes?

Com o intuito de dar conta dessas questões, tidas como processuais, Sabatier e Jenkins-Smith (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) listaram as seguintes dimensões explicativas: nível de conflito entre as coalizões - reflete o grau de incompatibilidade das crenças básicas entre as coalizões. Se o nível for muito baixo ou muito alto, tende a gerar pouco aprendizado. Se for muito baixo, as coalizões esvaziam as arenas e dedicam energia a outros temas. Já se for muito alto, as diferenças entre as crenças centrais da política pública de cada coalizão se acentuam, dificultando a mudança de posição. Quanto aos níveis intermediários, tendem a intensificar o processo de aprendizado direcionado para a política pública, pois há motivação suficiente para considerar ou contestar a outra parte. Desse conceito, Sabatier e Jenkins-Smith (1993, p. 56) apresentam a sexta hipótese do ACF:

  • Um cenário de policy-oriented learning, por meio de sistemas de crenças é mais factível quando há um nível intermediário de conflito de informações entre duas coalizões (HP6).

A outra categoria explicativa consiste em tratamento analítico possível (analytical tractability). Essa categoria se apresenta um pouco confusa em Jenkins-Smith e Sabatier (1993bSabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 56), mas refere-se à capacidade do trato analítico de determinado tema de uma política pública. Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 151) atualizaram o conceito para atributos do estímulo. De uma forma ou de outra, trata-se de políticas nas quais o tema é ambíguo, sem muito embasamento técnico-científico. Por isso, espera-se um nível baixo no aprendizado orientado para a política pública.

A partir desse ponto, Jenkins-Smith e Sabatier (1993bSabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 52) levantaram mais duas hipóteses:

  • Problemas que aceitam dados quantitativos e teorias como base para sua solução são mais propensos ao aprendizado orientado para a política pública por meio dos sistemas de crenças do que aqueles em que dados e teoria são geralmente qualitativos, bastante subjetivos ou completamente ausentes (HP7);

  • Os problemas relativos a sistemas naturais são mais propícios ao aprendizado do que aqueles que envolvem sistemas puramente sociais ou políticos, porque, em alguns casos, estão mais suscetíveis a argumentos calcados no método científico clássico das ciências da natureza e biológica (HP8).

Ainda em relação às categorias de análise presentes no modelo, importa ressaltar a quantidade de pessoas, quem participa e os fóruns, arenas ou ambientes nos quais as interações entre as coalizões ocorrem. Em relação a esse ponto, Jenkins-Smith e Sabatier (1993bSabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press ., p. 54) apresentam mais uma hipótese.

  • A policy-oriented learning por meio de sistemas de crenças é mais provável quando há um fórum dominado por normas processuais e que tenha prestígio suficiente para forçar profissionais de diferentes coalizões a participar (HP9).

No intuito de seguir atualizando o modelo, Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 151) complementaram com a seguinte questão: qual o papel, se há algum, de policy broker na facilitação do aprendizado diante dos oponentes? Tal questão resultou em mais uma categoria explicativa: os atributos dos atores, que são sistemas de crenças, recursos, estratégias e network, ou seja, como um ator, preferencialmente o policy broker, interfere no processo de aprendizado orientado para política pública? De acordo com Ingold e Varone (2012Ingold, K; & Varone, F. (2012). Treating policy brokers seriously: evidence from the climate policy.Journal of Public Administration Research and Theory,22(2), 319-346. Recuperado de https://doi.org/10.1093/jopart/mur035
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), os brokers têm a capacidade de facilitar o aprendizado entre os oponentes, embora não haja critério pré-definido acerca da afiliação ou posição ocupada por estes. Os autores, assim, acrescentam uma última, até o presente momento, hipótese ao modelo:

  • Mesmo quando a acumulação de informações técnicas não altera a perspectiva da coalizão opositora, isso pode ter impactos importantes para a política pública - pelo menos no curto prazo - por alterar a perspectivas dos policy brokers (HP10).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na retomada e análise da trajetória de construção do ACF, foi possível identificar quatro versões do modelo ao longo de quase 30 anos, as quais contaram com a participação de seis autores. Na comparação entre a primeira versão presente em Sabatier e Jenkins-Smith (1993Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1993). Policy change and learning: an advocacy coalition approach. Boulder, CO: Westview Press .) com aquela desenvolvida em Sabatier e Jenkins-Smith (1999)Jenkins-Smith, H. C; & Sabatier, P. A. (1993a). The study of policy processes. In P. A. Sabatier; & H. C. Jenkins-Smith (Eds.), Policy change and learning: an advocacy coalition approach. (pp. 1-9) Boulder, CO: Westview Press., o modelo ganhou maior capacidade analítica com as variáveis intermediárias entre os fatores externos e o subsistema da política, como também aperfeiçoou analiticamente as categorias internas ao subsistema ao modificar o conceito de regras soberanas para regras definidas por autoridades governamentais e separá-la das demais categorias decorrentes da caracterização do subsistema, como regras institucionais e alocação de recursos.

Essa modificação foi importante para a incorporação do conceito de policy broker. No segundo momento, ao comparar a terceira versão constante em Sabatier e Weible (2007Sabatier, P. A; & Weible, C. M. (2007). The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (2a ed., pp. 189-220). Boulder, CO: Westview Press .) com a segunda versão em Sabatier e Jenkins-Smith (1999Sabatier, P. A; & Jenkins-Smith, H. C. (1999). The advocacy coalition framework: an assessment. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (pp. 117-166). Boulder, CO: Westview Press .), identificamos que a principal modificação ocorreu com a contribuição de Larsen, Vrangbaek e Traulsen (2006Larsen, J. B; Vrangbæk, K; & Traulsen, J. M. (2006). Advocacy coalitions and pharmacy policy in Denmark - solid cores with fuzzy edges.Social Science & Medicine,63(1), 212-224. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2005.11.045
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) na incorporação da categoria abertura do sistema político dos países em que há a predominância do corporativismo. Com isso, o modelo aumentou a sua capacidade de aplicação em contextos cuja estrutura política é dessemelhante ao padrão encontrado nas democracias ocidentais. A quarta versão, presente em Jenkins-Smith et al. (2018)Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., distingue-se de terceira de Sabatier e Weible (2007Sabatier, P. A; & Weible, C. M. (2007). The advocacy coalition framework: innovations and clarifications. In P. A. Sabatier (Ed.), Theories of the policy process (2a ed., pp. 189-220). Boulder, CO: Westview Press .) ao acrescentar a categoria sobreposição de clivagem social na variável intermediária estruturas de oportunidades para coalizões de longo prazo. Também retira o policy broker do subsistema e deixa somente as regras institucionais como resultado direto da decisão da autoridade governamental.

Ao longo dessas transformações no diagrama do ACF, cabe destacar as principais tentativas de resposta às suas limitações, de acordo com seus três enfoques teóricos: discussão acerca das mudanças da política pública, conceituação e identificação das coalizões de defesa e o desenvolvimento do aprendizado orientado para a política pública. Conforme Jenkins-Smith (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 144), o estudo de mudanças da política pública, com base no ACF, tem sido objeto de muitos estudos empíricos. O que mais chama a atenção nesses trabalhos é a preocupação em explicar como e por que algumas políticas públicas mudam mais que outras. Para o autor, se a versão original do modelo utilizava duas hipóteses para responder a essas questões - perturbações externas aos subsistemas das políticas públicas e mudanças na estrutura de poder -, os estudos empíricos evidenciaram a combinação entre perturbações externas e internas ao subsistema, aprendizado orientado para a política pública e acordos negociados como tentativas para explicar as mudanças, ou não, das políticas públicas (Jenkins-Smith et al., 2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 147). Ademais, os estudos sobre tais mudanças utilizam diferentes métodos de coleta e análise de dados e adotam definições levemente distintas de política pública (Jenkins-Smith et al., 2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge., p. 147),

O aprendizado orientado para a política pública é definido como alteração de percepção e comportamento ante a solução de um problema público decorrente da revisão do sistema de crenças de indivíduos ou grupos. Está relacionado com a mudança na política pública e também afeta o processo de filiação dos atores às coalizões de defesa. Todavia, ao mesmo tempo que dá originalidade ao ACF, o aprendizado orientado para a política pública é o enfoque teórico menos consistente por causa de seu caráter subjetivo e de difícil mensuração. Políticas públicas com nível intermediário de conflito e com informações técnicas e científicas disponíveis tendem a prover estudos com maior potencial de aplicabilidade do ACF.

Já os estudos focalizados na identificação e tipificação das coalizões de defesa tendem a ser mais difundidos. As publicações dos precursores do modelo estão indo nessa direção, como é possível verificar em Weible e Ingold (2018Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). Why advocacy coalitions matter and practical insights about them.Policy & Politics,46(2), 325-343. Recuperado de https://doi.org/10.1332/030557318X15230061739399
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) e Weible et al. (2020)Weible, C. M., Ingold, K., Nohrstedt, D., Henry, A. D., & Jenkins‐Smith, H. C. (2020). Sharpening advocacy coalitions.Policy Studies Journal,48(4), 1054-1081. Recuperado de https://doi.org/10.1111/psj.12360
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. Isso não significa que tal enfoque seja o mais simples. Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge.) expõem o quanto ainda é imprecisa e limitada a definição do conceito de coalizão de defesa. Nesse sentido, Weible et al. (2020Weible, C. M., Ingold, K., Nohrstedt, D., Henry, A. D., & Jenkins‐Smith, H. C. (2020). Sharpening advocacy coalitions.Policy Studies Journal,48(4), 1054-1081. Recuperado de https://doi.org/10.1111/psj.12360
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, p. 8) propõem adicionar atributos à conceitualização original da coalizão de defesa. Afinal, esse enfoque, em suas limitações e imprecisões, é o que traz maior potencial de operacionalização para pesquisas empíricas por ser substancialmente descritivo quando comparado com o caráter mais explicativo atribuído às categorias mudanças na política pública e conhecimento orientado para a política pública.

Por fim, como lacuna e consequente proposta para uma futura agenda de pesquisas, a influência dos atores internacionais e suas implicações nas modificações da política pública não são explicitamente abordadas pelo ACF, conforme destacado por Jenkins-Smith et al. (2018Jenkins-Smith, H. C; Nohrstedt, D; Weible, C. M; & Ingold, K. (2018). The advocacy coalition framework: An overview of the research program. In C. M. Weible, P. A. Sabatier, C. M. Weible; &P. A. Sabatier (Eds.), Theories of the policy process (pp. 135-171). London, UK: Routledge.). No entanto, em um ambiente internacional marcado por interdependência complexa, considerar o contexto externo certamente trará contribuições para a análise de políticas públicas. Afinal, faz-se necessário questionar como organizações internacionais e redes globais de atores interferem no subsistema de uma política pública e quais variáveis de contextualização apresentam maior sensibilidade diante do ambiente externo. Talvez essas não sejam questões caras para discussão em estudos e experiências estadunidenses, uma vez que os EUA influenciam mais as políticas públicas dos demais países do que sofrem influência delas, porém, para países em posições secundárias no sistema internacional, a discussão se mostra pertinente e promissora.

AGRADECIMENTOS

Este artigo é um dos produtos da tese de doutorado intitulada “No centro das coalizões de defesa da política de transporte marítimo de carga: participação, intermediação e incrementalismo” de autoria de Henrique Campos de Oliveira, sob a orientação de Alvino Sanches Filho defendida junto ao Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal da Bahia (UFBA), realizada com recursos oriundos de bolsa financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

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    » https://doi.org/10.1111/j.1541-0072.2011.00412.x
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    Não há consenso na literatura sobre o termo modelo, frequentemente utilizado para traduzir o Advocacy Coalition Framework. Resolvemos mantê-lo no texto por dois motivos principais: pela ampla utilização na língua portuguesa da tradução do ACF como “Modelo de Coalizão de Defesa”; pelo conteúdo substantivo dado à sua concepção por vários autores para quem a utilização de modelos para analisar políticas públicas visa ordenar e simplificar a vida política no sentido de tornar mais inteligíveis as relações que encontramos na realidade, além de serem ferramentas conceituais construídas para coletar, organizar, interpretar, entender e explicar dados sobre políticas públicas (cf. Deubel, 2002; Dye, 2009). Nesse sentido, Jenkins-Smith, Nohrstedt, Weible, e Ingold (2018, pp. 138-139, p. 161) resgatam a importância da distinção entre framework (estrutura conceitual) e teoria. Isso porque ocorreram modificações no ACF ao longo do tempo, o que dificulta acompanhar o que mudou e o que se manteve igual. Portanto, ao largo dessas modificações, distinguir entre teoria e framework tem como intuito vincular os componentes mais estáveis do ACF ao nível de framework, mais suscetíveis de serem desenvolvidos por testes empíricos sistemáticos e pensamento criativo, sem se restringir a uma teoria como referência.
  • 2
    Para aprofundar o entendimento sobre o conceito de conhecimento orientado a política e sua recente aplicação em estudos empíricos, ver Ma e Vieira (2020).
  • 3
    Foge às preocupações deste artigo fazer uma revisão dos principais trabalhos empíricos que utilizam o ACF. Entrementes, como a discussão proposta aqui não pretende ser de natureza abstrata, cumpre destacar parte de uma literatura já consolidada que dialoga com o modelo. Kukkonen et al. (2018) estudaram a influência do Regime Internacional nas políticas ambientais; Moyson (2018) buscou entender os efeitos dos interesses no aprendizado orientado à política; Brown e Stuart (1993) analisam a política da aviação civil nos EUA utilizando o ACF; Araújo (2013) estudou as coalizões da política ambiental no Legislativo brasileiro; Capelari, Araújo, e Calmon (2015) e Ma, Lemos, e Vieira (2020) realizam um balanço das pesquisas nacionais que utilizam o ACF; Capella (2006) e Capella e Brasil (2015) sistematizaram as principais variáveis do modelo; Heikkila e Carney (2017) no comparativo do ACF e mais seis outras concepções teórico-conceituais usadas na análise de políticas públicas, entre muitos outros.
  • 4
    Coletivamente, esses esforços fornecem uma visão geral razoável da formulação de políticas públicas em termos de complexidade e variedade de fatores que podem garantir ou impedir a implementação bem-sucedida. Mas sentimos que mais é necessário. Em primeiro lugar, é necessário um esforço maior para conceitualizar e explorar empiricamente a ligação entre o comportamento individual e o contexto político, econômico e jurídico em que ocorre.
  • 5
    Triângulo de ferro é o conceito utilizado por Kingdon (1995) para descrever a coalizão formada por um grupo de interesse em associação com integrantes da burocracia executiva e representantes do Legislativo. O conceito, provavelmente, foi utilizado pela primeira vez pelo jornalista Ralph Pulitzer, em 1919, momento de ascensão do pensamento elitista, corrente teórica dominante na Ciência Política até meados do século XX, cujo conteúdo afirmava a concentração de poder político nas mãos de uma minoria, de uma elite política, aspecto inevitável em todas as sociedades. A crítica à teoria das elites foi formulada e aprofundada pelo pluralismo, sobretudo com base no trabalho seminal de Dahl (1961), para quem o poder nas sociedades industrializadas ocidentais está amplamente distribuído entre diferentes grupos. Nenhum grupo encontra-se destituído de poder para influenciar o processo de tomada de decisão e, igualmente, nenhum grupo é dominante (cf. Grynspan, 1994). Uma genealogia do ACF teria essa discussão como marco inicial.
  • 6
    Em regimes corporativistas há incentivos para as coalizões terem acesso aos canais de permeabilidade por meio de “centros sólidos com a borda porosa e muitos atores procurando agir como mediadores” (Larsen, Vrangbaek, & Traulsen, 2006, p. 200). Na perspectiva corporativista, o Partido Social-Democrata e a Associação Farmacêutica Dinamarquesa anteciparam o canal de decisão ao aglutinar as duas coalizões antagônicas (Larsen et al., 2006, p. 218).
  • 7
    A ampliação do escopo de unidade de análise presente em Sabatier (1993) e posteriormente reafirmada em Jenkins-Smith et al. (2018, p. 139), para atores não formalmente integrantes do poder público, tem início no debate iniciado por Heclo (1978) acerca da abrangência da participação de atores no processo decisório de política pública.
  • 8
    Jenkins-Smith et al. (2018), posteriormente, para delinear esses atores que não se amoldam a uma ou outra coalizão, trabalham com a categoria de subsistemas maduros, caracterizados como um conjunto de participantes que se consideram uma comunidade semiautônoma e que compartilham um conhecimento específico no domínio da política, buscando influenciar a política pública por um longo período.
  • 9
    Trata-se de uma percepção que coloca a coalizão antagônica em uma posição maniqueísta entre “Deus e o diabo” (Jenkins-Smith et al., 2018). Devil shift foi cunhado inicialmente em Sabatier, Hunter, e McLaughlin (1987). O estudo parte da premissa de que a racionalidade apresentada pela perspectiva comportamental torna-se ainda mais contestável ao considerar que atores em disputa por determinado desfecho de um processo decisório comprometem a eficiência no uso de recursos. Em um contexto de assimetria de informação, a dificuldade em conseguir identificar com precisão valores, objetivos e recursos do concorrente compromete as estratégias, a alocação de recursos e a percepção sobre o outro. Assim, há o risco de subestimar ou superestimar o “inimigo”, tal como exposto na literatura das relações internacionais. Diante dessa problematização, o achado central da pesquisa corrobora a tese de que os atores percebem os oponentes como mais fortes e mais maldosos do que realmente são.
  • 33
    Relatório de revisão por pares: o relatório de revisão por pares está disponível neste link.

Editado por

Editora-chefe: Alketa Peci (Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro / RJ - Brasil) https://orcid.org/0000-0002-0488-1744
Editor adjunto: Fernando de Souza Coelho (Universidade de São Paulo, São Paulo / SP - Brasil) https://orcid.org/0000-0003-2803-0722
Márcio Barcelos (Universidade Federal de Pelotas, Pelotas / RS - Brasil) https://orcid.org/0000-0003-3205-1673
Paulo Carlos Du Pin Calmon (Universidade de Brasília, Brasília / DF - Brasil) https://orcid.org/0000-0001-6314-9564

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Oct 2022

Histórico

  • Recebido
    16 Fev 2022
  • Aceito
    15 Ago 2022
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