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A relação entre os níveis de ansiedade no período pré-operatório e os incidentes vasovagais durante a administração de raquianestesia

Resumo

Justificativa:

O objetivo deste estudo foi investigar a relação entre a ansiedade no período pré-operatório e os sintomas vasovagais observados durante a administração de raquianestesia a pacientes submetidos à cirurgia nas regiões perianal e inguinal.

Métodos:

O estudo incluiu pacientes com cirurgias agendadas para correção de hérnia inguinal, fissura anal, hemorroidas e excisão de fístula pilonidal. Foram incluídos 210 pacientes entre 18-65 anos e estado físico ASA I-II. A avaliação dos pacientes compreendeu história de tabagismo e consumo de álcool, classificação ASA e nível de escolaridade. As correlações foram avaliadas entre o número de tentativas de aplicação da raquianestesia e história de anestesia com sintoma vasovagal, nível de escolaridade, sexo, tabagismo e consumo de álcool, história anestésica e escores de ansiedade. O inventário do estado (transitório) de ansiedade, parte do Inventário de Ansiedade Traço-Estado (State Trait Anxiety Inventory - IDATE), foi usado para determinar os níveis de ansiedade dos participantes. Achados clínicos de vasodilatação periférica, hipotensão, bradicardia e assistolia observados durante a administração da raquianestesia foram registrados.

Resultados:

Observamos aumento dos incidentes vasovagais durante a administração da raquianestesia em casos com escores elevados de ansiedade, pacientes do sexo masculino e pacientes sem história anestésica. O nível de escolaridade e o número de punções com agulha espinhal não mostraram ter qualquer efeito sobre os incidentes vasovagais.

Conclusão:

Determinar as causas que desencadearam os incidentes vasovagais observados durante a aplicação da raquianestesia, fornecer boa informação ao paciente sobre a anestesia regional e promover alívio da ansiedade com tratamento ansiolítico no pré-operatório contribuirão para eliminar possíveis incidentes vasovagais.

PALAVRAS-CHAVE
Ansiedade; Raquianestesia; Síncope; Vasovagal

Abstract

Background:

It was aimed to investigate the relationship between preoperative anxiety and vasovagal symptoms observed during the administration of spinal anesthesia in patients undergoing surgery in the perianal and inguinal regions.

Methods:

The study included patients with planned surgery for inguinal hernia repair, anal fissure, hemorrhoid and pilonidal sinus excision. The study included a total of 210 patients of ASA I-II, aged 18-65 years. Patients were evaluated in respect of demographic characteristics, smoking and alcohol consumption, ASA grade and educational level. Correlations were evaluated between the number of attempts at spinal anesthesia and anesthesia history with vasovagal symptoms and educational level, gender, smoking and alcohol consumption and anesthesia history with anxiety scores. The instant (transient) state anxiety inventory part of the Transient State/Trait Anxiety Inventory (State Trait Anxiety Inventory - STAI) was used to determine the anxiety levels of the participants. Clinical findings of peripheral vasodilation, hypotension, bradycardia and asystole observed during the administration of spinal anesthesia were recorded.

Results:

Vasovagal incidences during the administration of spinal anesthesia were seen to increase in cases of high anxiety score, male gender, and an absence of anesthesia history. Educational level and the number of spinal needle punctures were not found to have any effect on vasovagal incidents.

Conclusion:

The determination of causes triggering vasovagal incidents seen during the application of spinal anesthesia, better patient information of regional anesthesia implementations and anxiety relief with preoperative anxiolytic treatment will help to eliminate potential vasovagal incidents.

KEYWORDS
Anxiety; Spinal anesthesia; Syncope; Vasovagal

Introdução

Considera-se que a síncope vasovagal, também conhecida como síncope vasopressora de origem neurocardiogênica, seja o resultado de interações anormais do complexo do mecanismo neurocardiovascular, necessário para a manutenção da perfusão sistêmica e cerebral e que é um dos tipos de síncope mais frequentemente observados.11 Brignole M, Alboni P, Benditt D, et al. Guidelines on management (diagnosis and treatment) of syncope-update 2004. Executive summary. Eur Heart J. 2004;25:2054-72.

Clinicamente, a síncope tem quatro parâmetros principais que podem ser indicadores: perda de consciência, perda de tônus postural, recuperação espontânea e achados cardiovasculares adicionais a múltiplas etiologias. Na forma clássica de síncope neurocardiogênica, achados cardiovasculares como hipotensão, bradicardia, palidez e sudorese são observados juntamente com os achados clássicos de síncope. Cada parâmetro da síncope neurocardiogênica está relacionado com um aumento da atividade vasovagal e é avaliado como um sintoma vasovagal.22 Abboud F. Neurocardiogenic syncope. N Engl J Med. 1993;328:1117-20.

Embora a etiologia não seja totalmente conhecida, um aumento dos sinais aferentes para o sistema nervoso central, quando o núcleo motor dorsal do vago e o núcleo ambíguo responsável são estimulados pela atividade parassimpática na medula, a inibição da atividade simpática após a supressão dos núcleos rostrais ventromedial e ventrolateral responsáveis pela atividade simpática e a ativação da atividade parassimpática causam a síncope e criam bradicardia e/ou hipotensão.33 Badner NH, Nielson WR, Munk S, et al. Preoperative anxiety detection and contributing factors. Can J Anaesth. 1990;37:444-7.

4 Kinsella SM, Tuckey JP. Perioperative bradycardia and asystole: relationship to vasovagal syncope and the Bezold-Jarisch reflex. Br J Anaesth. 2001;86:859-68.

5 Doyle DJ, Mark PW. Reflex bradycardia during surgery. Can J Anaesth. 1990;37:219-22.

6 Prakash ES. When the heart is stopped for good: hypotensionbradycardia paradox revisited. Adv Physiol Educ. 2005;29:15-20.
-77 Apt L, Isenberg SJ. The oculo-cardiac reflex as a surgical aid in identifying a slipped or ‘lost’ extraocular muscle. Br J Ophthalmol. 1980;64:362-5. Na síncope de origem neurocardiogênica a ansiedade grave pode ser a origem da síncope.

A ansiedade é um sentimento espontâneo e ambíguo de oscilação do humor, cuja razão é desconhecida e pode ser experimentada com sensação de medo, angústia e eventos ruins iminentes. É uma reação natural que as pessoas desenvolvem contra situações nas quais não se sentem seguras e um tipo de estado de alerta quando uma situação é percebida como potencialmente ameaçadora. A incidência de ansiedade entre os pacientes hospitalizados é de 10% a 30%, em geral.88 Bekaroğlu M, Uluutku N, Alp K, et al. Ameliyat öncesi kaygı ve depresyon durumunun ameliyat komplikasyonlarına ve yatış süresine etkisi üzerine bir çalışma. Türk Psikiyatri Dergisi. 1991;2:285-288 [in Turkish]. A incidência de ansiedade no período pré-operatório em pacientes adultos é de 11% a 80%.33 Badner NH, Nielson WR, Munk S, et al. Preoperative anxiety detection and contributing factors. Can J Anaesth. 1990;37:444-7.

Até certo nível, a ansiedade é saudável e funcional. Portanto, o nível alvo de ansiedade em pacientes na preparação pré-operatória é um nível "médio" ou "saudável".99 Kindler CH, Harms C, Amsler F, et al. The visual analog scale allows effective measurement of pre-operative anxiety and detection of patient's anesthetic concerns. Anesth Analg. 2000;90:706-12.

A ansiedade no período pré-operatório é uma situação caracterizada por inquietação e preocupação decorrentes de qualquer doença, internação, anestesia e cirurgia ou não por não saber o que irá acontecer.1010 Ramsay MAE. A survey of pre-operative fear. Anaesthesia. 1972;27:396-402. A ansiedade aumenta a resposta ao estresse e ativa a liberação de mediadores neuroendócrinos nos pacientes. Isso tem um efeito negativo na cirurgia, anestesia e recuperação pós-operatória.1111 Kain ZN, Sevarino F, Pincus S, et al. Attenuation of the preoperative stress response with midazolam: effects on postoperative outcomes. Anesthesiology. 2000;93:141-7.

Embora bradicardia e parada cardíaca dependentes dos reflexos vagais sejam raramente confrontadas em anestesia geral e regional, a gravidade dessas raras complicações exige precauções máximas.

Em estudos anteriores, relatou-se que a síncope ocorre pelo menos uma vez em 3% da população geral e essa taxa aumenta para 6% nos idosos.1212 Savage DD, Corwin L, McGee DL, et al. Epidemiologic features of isolated syncope: the Framingham Study. Stroke. 1985;16:626-9.,1313 Lipsitz LA, Wei JY, Rowe JW. Syncope in an elderly, institutionalised population: prevalence, incidence, and associated risk. Q J Med. 1985;55:45-54. A síncope foi determinada em 3% de todas as apresentações em prontos-socorros e em 1% dos pacientes hospitalizados.1414 Kapoor W. Evaluation and management of syncope. JAMA. 1992;268:2553-60. Contudo, com exceção dos relatos de casos, de acordo com nossa pesquisa, não há estudos na literatura de síncope nos períodos pré- ou perioperatório e sua etiologia não foi pesquisada de forma abrangente.

Neste estudo, nosso objetivo foi investigar os fatores causadores de bradicardia reflexa, observados durante a administração de anestesia regional em pacientes submetidos à cirurgia eletiva de regiões perianal e inguinal e avaliar a relação com a ansiedade no pré-operatório.

Material e métodos

O estudo incluiu 210 pacientes, ASA I-II, entre 18-65 anos, agendados para correção de hérnia inguinal, fissura anal, hemorroidas e excisão de cisto pilonidal. A aprovação para o estudo foi concedida pelo Comitê de Ética do hospital e assinatura em termo de consentimento informado foi obtida de todos os pacientes. Foram excluídos todos os pacientes que eram analfabetos ou não podiam entender o idioma turco ou que apresentavam problemas de visão e audição ou distúrbios psiquiátricos. O inventário de ansiedade como estado emocional transitório, parte do State-Trait Anxiety Inventory (STAI), validado para a população turca por Ömer e Le Compte em 1976, foi usado para determinar os níveis de ansiedade dos participantes.1515 Le Compte WA, Ömer N. Development of the Turkish edition of state-trait anxiety inventory. In: Spielberg CD, Diaz Guerro R, editors. Cross-cultural anxiety. Washington, DC: Hemisphere Publishing Co.; 1976. p. 51-68. Esse teste compreende duas subunidades diferentes, cada uma envolve 20 itens que medem o traço e o estado de ansiedade separadamente. A subunidade que avalia o traço de ansiedade foi desenhada para medir os sentimentos nos últimos sete dias e a outra subunidade para medir os sentimentos atuais. Os participantes foram solicitados a marcar uma das opções de "nunca", "às vezes", "frequentemente" ou "quase sempre", para cada item da pesquisa. Os escores positivos foram designados para os itens 3, 4, 6, 7, 9, 12, 13, 14, 17 e 18 e os escores negativos para os itens 1, 2, 5, 8, 10, 11, 15, 16, 19 e 20 da pesquisa. As marcações foram feitas manualmente. Os escores entre 1 (ou -1) e 4 (ou -4) foram designados para cada item, de acordo com as características positivas e negativas, e 50 pontos foram adicionados aos escores totais obtidos. Os escores maiores e menores foram aceitos como 80 e 20, respectivamente (fig. 1). A presença de ansiedade nos pacientes foi avaliada como baixa, moderada e alta, quando os valores obtidos no STAI foram 20-37, 38-44 e 45-80, respectivamente.

Figura 1
Inventário do traço e estado de ansiedade de Spielberger.

Na sala de pré-medicação, antes da administração da pré-medicação, a escala de ansiedade STAI foi aplicada a todos os pacientes por um anestesiologista e os resultados foram registrados. Idade, sexo, estatura, peso, história de tabagismo e consumo de álcool, estado físico ASA e nível educacional dos pacientes também foram registrados. O acesso intravascular foi estabelecido e o paciente foi transferido para o centro cirúrgico. Na mesa de operação, a frequência e o ritmo cardíaco foram monitorados com eletrocardiografia e a pressão arterial não invasiva (PANI) e a saturação de oxigênio periférico (SpO2) também foram monitoradas. Após a monitoração, o paciente foi posicionado em posição sentada e a assepsia da área lombar foi feita três vezes com iodopovidona e, em seguida, campos estéreis foram aplicados. Uma agulha espinal com o bisel em ponta de lápis (26G) foi inserida entre L4-L5 ou L3-L4, ponto localizado com palpação, e o número de tentativas de aplicação da raquianestesia foi registrado. Raquianestesia foi aplicada a todos os pacientes em posição sentada e nenhum paciente recebeu ansiolítico. Durante o procedimento, uma pressão sistólica < 90 mmHg e diastólica < 60 mmHg foi avaliada como hipotensão; batimentos cardíacos < 60 por minuto (bpm) como bradicardia e zero bpm como assistolia e esses valores foram registrados. Nos casos de bpm < 40, atropina (1 mg) foi administrada.

Análise estatística

O poder do estudo foi determinado em 0,99 a um intervalo de confiança de 95% e nível de significância de 0,05. Esse achado indicou que a amostra era suficiente (tamanho do efeito = 0,27).

O programa SPSS 15.0 foi usado para a análise de dados. Os testes de Shapiro-Wilk e Levene foram usados para a conformidade dos dados com distribuição normal e a homogeneidade das variâncias, respectivamente. Métodos paramétricos e não paramétricos foram usados para a análise das variáveis com e sem variação homogênea e distribuição normal, respectivamente. O teste t de amostras independentes foi usado para comparar dois grupos independentes. O teste do qui-quadrado de Pearson foi usado para comparar os dados categóricos. Os dados quantitativos foram expressos em média ± desvio padrão (DP) nas tabelas. Os dados categóricos foram expressos em número (n) e porcentagem (%). Os dados foram analisados com intervalo de confiança de 95% e um valor-p < 0,05 foi aceito como estatisticamente significativo.

Resultados

Foram incluídos 210 pacientes entre 18-65 anos e estado físico ASA I-II. Não houve diferença estatisticamente significativa entre aqueles que apresentaram e os que não apresentaram sintomas vasovagais em relação a idade, estatura, peso, tabagismo, consumo de álcool ou classificação ASA (p < 0,05) (tabela 1).

Tabela 1
Características demográficas dos pacientes

Sintomas vasovagais foram observados em 40 pacientes. Em média, sintomas vasovagais foram observados em 19% dos pacientes no pré-operatório (tabela 1).

Em nenhum dos grupos havia pacientes analfabetos ou sem grau de instrução. Não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos em relação a sintomas vasovagais e nível de escolaridade (p < 0,05) (tabela 1).

Os sintomas vasovagais mais frequentes foram sudorese e tontura. Achados de origem cardiogênica foram observados em 27 pacientes e, em um deles, uma planície asistólica foi formada. Em alguns pacientes, vários sintomas foram observados ao mesmo tempo (tabela 2).

Tabela 2
Incidentes vasovagais observados nos pacientes

Dos 40 pacientes que apresentaram sintomas de síncope vasovagal, um tinha história de raquianestesia e seis de anestesia geral. Uma diferença estatisticamente significativa foi determinada entre os grupos em relação à história de anestesia geral e raquianestesia (p < 0,05) (tabela 3).

Tabela 3
Comparação de história pregressa de anestesia, tipo de cirurgia, número de tentativas de punção subaracnóidea

O tipo de cirurgia e o número de tentativas de punção subaracnóidea não tiveram efeito estatisticamente significativo sobre a ocorrência de sintomas vasovagais (p > 0,05) (tabela 3).

Os pacientes com sintomas vasovagais apresentaram ansiedade em grau significativamente maior (STAI > 45) do que os pacientes sem sintomas (p < 0,001) (tabela 4).

Tabela 4
Nível de ansiedade no sintoma vasovagal presente ou ausente nos pacientes

Uma relação estatisticamente significativa foi estabelecida entre escores elevados de ansiedade e sexo e ausência de história de anestesia geral ou raquianestesia (p < 0,05). Não houve relação estatisticamente significativa entre escores elevados de ansiedade e nível de escolaridade, tabagismo e consumo de álcool (p < 0,05) (tabela 5).

Tabela 5
Relação do nível de escolaridade, gênero, tabagismo, uso de álcool e história de anestesia com os escores de ansiedade

Discussão

No presente estudo, investigamos os fatores causadores de incidentes vasovagais que são frequentemente observados durante a raquianestesia e avaliamos a relação com a ansiedade. Na literatura, embora existam muitos relatos de casos de incidentes vasovagais observados no pré-operatório e durante intervenções sob anestesia regional, o presente estudo apresenta uma série de casos mais ampla.1616 Jang YE, Do SH, Song I. Vasovagal cardiac arrest during spinal anesthesia for Cesarean section - a case report. Korean J Anesthesiol. 2013;64:77-81.,1717 Kim KO, Oh JS. Vagally mediated atrioventricular block with ventricular asystole immediately after assuming prone position under spinal anesthesia: a case report. Korean J Anesthesiol. 2016;69:63-5.

A ansiedade é a primeira resposta quando as pessoas enfrentam um problema e a reação mais frequente em casos de doença. Os pacientes hospitalizados desenvolvem ansiedade, especialmente aqueles que devem ser submetidos a qualquer intervenção cirúrgica.99 Kindler CH, Harms C, Amsler F, et al. The visual analog scale allows effective measurement of pre-operative anxiety and detection of patient's anesthetic concerns. Anesth Analg. 2000;90:706-12. Além das intervenções cirúrgicas, a aplicação de qualquer anestesia é percebida como perigosa pelos pacientes e o estresse e a tensão são desenvolvidos com essa percepção tanto no período pré-operatório quanto no pós-operatório.1818 Kehlet H, Wilmore DW. Evidence-based surgical care and the evolution of fast-track surgery. Ann Surg. 2008;248:189-98.

Embora diferentes testes tenham sido usados para avaliar a ansiedade no período pré-operatório, o uso do STAI, que inclui uma escala de avaliação tanto do traço quanto do estado de ansiedade, é amplamente aceito.1919 Aykent R, Kocamanoğlu S, Üstün E, et al. Preoperatif anksiyete nedenleri ve değerlendirilmesi: APAIS ve STAI skorlarının karşılaştırılması. Turkiye Klinikleri J Anest Reanim. 2007;5:7-13 [in Turkish].

A incidência de ansiedade no pré-operatório foi relatada entre 11% e 92% em vários grupos de pacientes cirúrgicos.2020 Wetsch WA, Pircher I, Lederer W, et al. Preoperative stress and anxiety in day-care patients and inpatients undergoing fast-track surgery. Br J Anaesth. 2009;103:199-205. Enquanto o limiar do STAI-S, usado para o estado de ansiedade com sintomas clinicamente distintos e aceito como 39-40, foi determinado como 44-45 para pacientes no período pré-operatório. A razão para isso é que o STAI-S indica como as pessoas se sentem, independentemente das situações e circunstâncias presentes.2020 Wetsch WA, Pircher I, Lederer W, et al. Preoperative stress and anxiety in day-care patients and inpatients undergoing fast-track surgery. Br J Anaesth. 2009;103:199-205.

No presente estudo, os pacientes com escore STAI-S > 45 foram classificados como em alto nível de ansiedade e constituíram 23% (50) do grupo total de pacientes.

Relatou-se que os níveis mais altos de ansiedade são observados em mulheres.2020 Wetsch WA, Pircher I, Lederer W, et al. Preoperative stress and anxiety in day-care patients and inpatients undergoing fast-track surgery. Br J Anaesth. 2009;103:199-205.

21 Mitchell M. Conscious surgery: influence of the environment on patient anxiety. J Adv Nurs. 2008;64:261-71.
-2222 Caumo W, Schmidt AP, Schneider CN, et al. Risk factors for postoperative anxiety in adults. Anaesthesia. 2001;56:720-8. Como o hospital onde conduzimos o estudo atende a uma base militar, o número de homens foi bem maior na população do estudo. Ao contrário da literatura geral, a ansiedade em mulheres foi menor do que em homens neste estudo. O número significativamente maior de homens na população do estudo pode ser a razão para essa diferença. Embora a ansiedade relacionada à separação da família tenha sido relatada com mais frequência por mulheres, alguns pesquisadores também afirmaram que as mulheres expressam suas ansiedades mais facilmente do que os homens.2323 Domar AD, Everett LL, Keller MG. Preoperative anxiety: is it a predictable entity?. Anesth Analg. 1989;69:763-7.

Consideramos que essa diferença poderia estar relacionada ao fato de os níveis de emoção expressa serem mais restritos nos homens em nossa sociedade. No presente estudo, determinamos que os níveis de ansiedade nos homens foram estatisticamente mais elevados no período pré-operatório em comparação com os das mulheres.

Alguns estudos relataram que a experiência cirúrgica anterior reduziu a ansiedade no pré-operatório e isso é explicado com o modelo de aprendizagem condicional, no qual um estímulo incondicional de medo é encontrado a intervalos curtos.2222 Caumo W, Schmidt AP, Schneider CN, et al. Risk factors for postoperative anxiety in adults. Anaesthesia. 2001;56:720-8.

Embora estudos relatem que a experiência pregressa de anestesia não alterou o nível de ansiedade no pré-operatório, sugerem que a experiência pregressa de anestesia reduziu a ansiedade nos homens, enquanto não afetou a ansiedade nas mulheres.2323 Domar AD, Everett LL, Keller MG. Preoperative anxiety: is it a predictable entity?. Anesth Analg. 1989;69:763-7.,2424 Moerman N, van Dam FS, Muller MJ, et al. The Amsterdam Preoperative Anxiety and Information Scale (APAIS). Anesth Analg. 1996;82:445-51. Estudos relatam que os pacientes com história de anestesia há mais de 10 anos apresentaram menos ansiedade em relação à anestesia, em comparação com aqueles que foram submetidos à cirurgia nos últimos 10 anos.1010 Ramsay MAE. A survey of pre-operative fear. Anaesthesia. 1972;27:396-402. No presente estudo, as histórias de anestesia regional e geral foram avaliadas separadamente e uma diferença estatisticamente significativa nos incidentes vasovagais foi determinada entre os pacientes com e sem história de anestesia.

Na literatura, relatou-se que um estado físico ASA ≥ II e o tamanho da operação afetaram o nível de ansiedade. Em alguns estudos, o estado físico ASA foi relatado como um determinante do nível de ansiedade no pré-operatório.2222 Caumo W, Schmidt AP, Schneider CN, et al. Risk factors for postoperative anxiety in adults. Anaesthesia. 2001;56:720-8. O presente estudo foi conduzido com pacientes com estado ASA I-II submetidos a cirurgias com alta no primeiro dia de pós-operatório - no mais tardar, consideraram-se a quantidade esperada de perda sanguínea, o tempo cirúrgico e a permanência hospitalar pós-cirurgia. Nenhuma diferença significativa foi determinada em relação ao estado físico ASA entre os grupos que participaram deste estudo.

Alguns pesquisadores relataram que a idade não foi um fator determinante para o nível de ansiedade,1212 Savage DD, Corwin L, McGee DL, et al. Epidemiologic features of isolated syncope: the Framingham Study. Stroke. 1985;16:626-9.,2323 Domar AD, Everett LL, Keller MG. Preoperative anxiety: is it a predictable entity?. Anesth Analg. 1989;69:763-7.,2424 Moerman N, van Dam FS, Muller MJ, et al. The Amsterdam Preoperative Anxiety and Information Scale (APAIS). Anesth Analg. 1996;82:445-51. embora Ramsay tenha determinado que a taxa de ansiedade foi maior no grupo de pacientes de meia-idade e relacionou essa taxa às responsabilidades familiares desses pacientes. A sensação de predestinação é maior nos pacientes mais velhos e os pacientes mais jovens podem estar mais bem informados sobre os incidentes negativos relacionados à saúde através da tecnologia de mídia.1010 Ramsay MAE. A survey of pre-operative fear. Anaesthesia. 1972;27:396-402. No presente estudo, a população de pacientes que apresentou incidentes vasovagais foi majoritariamente composta por pacientes mais jovens, em conformidade com a literatura, embora uma diferença estatisticamente significativa entre dois grupos não tenha sido estabelecida.

Embora alguns estudos tenham relatado que a ansiedade aumentou com um nível de escolaridade mais alto, outros estudos mostraram que o nível de escolaridade não afetou o nível de ansiedade.2525 Deyirmenjian M, Karam N, Salameh P. Preoperative patient education for open-heart patients: a source of anxiety?. Patient Educ Couns. 2006;62:111-7.,2626 Bayar A, Tuncay İ, Atasoy N, et al. The effect of watching live arthroscopic views on postoperative anxiety of patients. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2008;16:982-7. Relatou-se que os níveis de ansiedade no pré-operatório foram maiores nos pacientes com mais de 12 anos de escolaridade.2222 Caumo W, Schmidt AP, Schneider CN, et al. Risk factors for postoperative anxiety in adults. Anaesthesia. 2001;56:720-8. No presente estudo, não estabelecemos uma relação entre os níveis de escolaridade e de ansiedade. O nível de ansiedade foi maior nos pacientes com escolaridade primária e menor nos que haviam cursado o ensino médio, mas a diferença não foi estatisticamente significativa.

O tratamento pré-operatório de reposição de nicotina mostrou não ter qualquer efeito sobre os níveis de ansiedade no pré-operatório de fumantes e os sintomas desenvolvidos relacionados à privação em fumantes não criaram problemas clinicamente graves no período perioperatório.2727 Warner DO, Patten CA, Ames SC, et al. Smoking behavior and perceived stress in cigarette smokers undergoing elective surgery. Anesthesiology. 2004;100:1125-37.,2828 Malhotra SK, Singh S, Bajaj A, et al. Induction-intubation response, smokers vs non-smokers. Middle East J Anesthesiol. 2005;18:529-40. No presente estudo não observamos diferença nos níveis de ansiedade entre fumantes e não fumantes.

Este estudo teve algumas limitações, que incluíram o uso isolado de raquianestesia, a maioria da população do estudo ser do sexo masculino e o número limitado de tipos de cirurgias. Estudos futuros poderiam investigar os sintomas vasovagais observados durante a aplicação de anestesia regional e bloqueios de nervos periféricos.

Conclusão

A determinação dos fatores que causam incidentes vasovagais durante a aplicação da raquianestesia é importante tanto no diagnóstico quanto no tratamento e devem ser conhecidos tanto pelos pacientes quanto pelos anestesiologistas. A prevalência de incidentes vasovagais aumenta com escores elevados de ansiedade e ausência de história anestésica. Avaliar os níveis de ansiedade dos pacientes, reduzir os problemas vasovagais indesejáveis com medicação ansiolítica no pré-operatório e informar os pacientes sobre a aplicação da anestesia regional são úteis para erradicar os incidentes vasovagais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2017

Histórico

  • Recebido
    15 Jan 2016
  • Aceito
    29 Jul 2016
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