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Analgesia combinada raquiperidural em trabalho de parto: seus efeitos sobre o desfecho do parto

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A analgesia combinada raquiperidural (RP) tornou-se uma opção cada vez mais popular para o trabalho de parto tradicional devido ao seu rápido início de ação e ao resultado confiável. Este foi um estudo prospectivo de amostragem conveniente para determinar os efeitos da RP sobre o desfecho do parto.

MÉTODOS:

Foram incluídas 110 parturientes primigestas saudáveis, com gestação única de ≥ 37 semanas e na fase ativa do trabalho de parto. As pacientes foram designadas para os grupos RP (n = 55) ou não RP (n = 55) com base em seus consentimentos para a analgesia combinada RP. As parturientes do grupo não RP receberam outros métodos de analgesia para o parto. As durações do primeiro e segundo estágio do trabalho de parto, as taxas de parto vaginal instrumental e cesariana de emergência e os escores de Apgar foram comparados.

RESULTADOS:

A média de duração do primeiro e segundo estágio do trabalho de parto não foi significativamente diferente entre os dois grupos. As taxas de parto instrumental não foram significativamente diferentes entre os grupos, RP (11%) versus não RP (16%). A incidência ligeiramente maior de cesariana no grupo RP (16% versus 15% no não RP) não foi estatisticamente significativa. O desfecho neonatal em termos de índice de Apgar foi inferior a 7.

CONCLUSÃO:

Não houve diferenças significativas em relação à duração do trabalho, às taxas de parto vaginal instrumental e cesariana de emergência e ao desfecho neonatal em parturientes que receberam RP para analgesia de parto em comparação com aquelas que não receberam.

Palavras-chave:
Combinação raqui-peridural; Analgesia de parto; Resultado fetal; Duração do parto

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Combined spinal-epidural (CSE) has become an increasingly popular alternative to traditional labour epidural due to its rapid onset and reliable analgesia provided. This was a prospective, convenient sampling study to determine the effects of CSE analgesia on labour outcome.

METHODS:

One hundred and ten healthy primigravida parturients with a singleton pregnancy of ≥37 weeks gestation and in the active phase of labour were studied. They were enrolled to the CSE (n = 55) or Non-CSE (n = 55) group based on whether they consented to CSE analgesia. Non-CSE parturients were offered other methods of labour analgesia. The duration of the first and second stage of labour, rate of instrumental vaginal delivery and emergency cesarean section, and Apgar scores were compared.

RESULTS:

The mean duration of the first and second stage of labour was not significantly different between both groups. Instrumental delivery rates between the groups were not significantly different (CSE group, 11% versus Non-CSE group, 16%). The slightly higher incidence of cesarean section in the CSE group (16% versus 15% in the Non-CSE group) was not statistically significant. Neonatal outcome in terms of Apgar score of less than 7 at 1 and 5 min was similar in both groups.

CONCLUSION:

There were no significant differences in the duration of labour, rate of instrumental vaginal delivery and emergency cesarean section, and neonatal outcome in parturients who received compared to those who did not receive CSE for labour analgesia.

Keywords:
Combined spinal-epidural; Labour analgesia; Foetal outcome; Duration of labour

Introdução

A dor durante o trabalho de parto é um dos tipos mais angustiantes que uma pessoa precisa suportar. O Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas declarou: "O trabalho de parto resulta em dor grave para muitas mulheres. Não há outra circunstância na qual seja considerado aceitável que uma pessoa sinta uma forte dor, passível de intervenção segura, enquanto está sob os cuidados de um médico".11. Pain relief during labour. ACOG Committee Opinion No. 295. American College of Obstetricians and Gynaecologists. Obstet Gynecol. 2004;104:213. Atualmente, mais mulheres optam por métodos de alívio da dor durante o trabalho de parto. A analgesia peridural adquiriu cada vez mais popularidade no mundo inteiro devido a sua capacidade de fornecer analgesia superior a outros métodos de alívio da dor.

Contudo, há controvérsia quanto ao seu efeito tanto no curso quanto no desfecho do trabalho de parto. Como resultado, pesquisas consideráveis foram feitas e as descobertas levaram a mudanças na prática. A analgesia peridural foi previamente implicada no prolongamento do trabalho de parto, aumentou a necessidade de ocitocina e as taxas de partos instrumentais e operatórios. Porém, há evidências crescentes que refutam algumas dessas alegações.22. McGrady E. Epidural analgesia in labour. Cont Educ Anaesth Crit Care Pain. 2004;4:114-7.

A anestesia combinada raquiperidural (RP) tornou-se uma opção cada vez mais popular para a peridural tradicional. A combinação de anestésico local/opiáceo administrada por via intratecal fornece analgesia de início rápido, potente e confiável, com bloqueio motor mínimo durante a primeira fase do trabalho de parto, permite a mobilidade materna e resulta em maior satisfação materna.33. Kuczkowski KM. Ambulation with combined spinal-epidural labor analgesia; the technique. Acta Anaesthesiol Belg. 2004;55:29-34.and44. Frikha N, Ellachtar M, Mebazaa M, et al. Combined spinal-epidural in labor-comparison of sulfentanil vs tramadol. Middle East J Anesth. 2007;19:87-96. Um estudo recente que comparou a combinação de RP com a analgesia peridural tradicional mostrou que, embora ambas as técnicas fossem excelentes opções analgésicas, a RP proporcionou alívio da dor significativamente mais rápido e melhor durante a primeira fase do trabalho de parto.55. Gambling D, Berkowitz J, Farrell TR, et al. A randomized controlled comparison of epidural analgesia and combined spinal-epidural analgesia in a private setting. Anesth Analg. 2013;116:636-43.

Vários estudos que compararam analgesia peridural e RP ou analgesia peridural e não epidural relataram resultados variáveis, mas nenhum deles comparou a RP com outros métodos de analgesia em trabalho de parto.6, 7-8 Nas revisões sistemáticas de 2011 do banco de dados Cochrane que compararam analgesia peridural versus não epidural ou nenhuma analgesia em trabalho de parto, a RP foi incluída junto com a analgesia peridural, e não como uma entidade separada. Devido ao exposto, decidimos observar o efeito que a RP teve sobre o desfecho do trabalho de parto em comparação com métodos opcionais de analgesia de parto. Nossos desfechos foram a duração da fase ativa da primeira e da segunda fase do trabalho de parto, as taxas de parto instrumental vaginal e de cesariana de emergência e os resultados neonatais.

Métodos

Este estudo prospectivo de amostragem por conveniência foi conduzido após obter a aprovação do Comitê de Ética institucional. Após assinarem o consentimento informado, foram incluídas no estudo 110 parturientes classificadas como ASA I, de acordo com a Sociedade Americana de Anestesiologistas (ASA). As parturientes eram primigestas, entre 20 e 40 anos, com uma gestação única de ≥ 37 semanas e na fase ativa do trabalho de parto, com dilatação cervical de 3-4 cm. Qualquer gestante com doença relacionada à gravidez ou contraindicação para a analgesia combinada RP foi excluída.

As parturientes foram examinadas pela equipe obstétrica na enfermaria. Uma anamnese obstétrica detalhada foi feita e a apresentação fetal cefálica confirmada por uma varredura. Quando a equipe obstétrica confirmou que as parturientes estavam na fase ativa do trabalho de parto (dilatação cervical de 3-4 cm com contrações regulares), as pacientes foram transferidas para a sala de parto. Aquelas que consentiram com a analgesia combinada RP foram incluídas no grupo RP e para aquelas que declinaram dessa analgesia outras formas de analgesia foram oferecidas e as parturientes foram designadas para o grupo não RP. As parturientes do grupo não RP receberam entonox (N2O/O2, 50%/50%) ou 50 mg de petidina por via intramuscular (IM) com 12,5 mg de prometazina IM (Fenergan). A pressão arterial e a pulsação das parturientes foram monitoradas em intervalos de uma hora. A frequência cardíaca fetal e a duração e a frequência das contrações uterinas foram monitoradas com cardiotocografia contínua.

No grupo RP, a infusão de solução de Ringer com lactato foi iniciada e as parturientes foram colocadas na posição sentada. O procedimento foi feito sob cuidados de assepsia em L3-L4 ou L4-L5, com um kit pré-embalado que continha uma agulha peridural de calibre 18G, um cateter peridural de calibre 20G e uma agulha espinhal de calibre 27G (BD Durasafe(tm) Plus). O espaço peridural foi identificado com a técnica da perda da resistência à injeção de solução salina e, em seguida, a agulha espinhal foi inserida através da agulha peridural. Após a visualização do refluxo do líquido cefalorraquidiano, uma dose intratecal de 0,5 mL de ropivacaína a 0,2% com 0,5 mL de fentanil (25 µg) foi administrada. O cateter peridural foi então inserido 3-5 cm no espaço peridural e fixado. A parturiente foi então posicionada em decúbito dorsal com deslocamento uterino para a esquerda e a cabeceira da cama elevada a 20-30°. O nível de bloqueio sensorial foi verificado para garantir que o nível sensorial fosse ≥T10 e, em seguida, uma infusão peridural de ropivacaína a 0,0625% com 2 µg.mL-1 de fentanil foi iniciada a 8 mL.h-1. Os parâmetros hemodinâmicos das parturientes foram monitorados a intervalos de 5 minutos durante e após o procedimento nos primeiros 15 minutos e depois a cada 15 minutos na primeira hora e, depois disso, a cada meia hora. Hipotensão arterial, definida como uma redução de 20% dos valores basais na pressão arterial sistólica, foi tratada com giro da parturiente para a posição lateral esquerda e administração de oxigênio materno e infusão de líquidos por via intravenosa ou vasopressora (6 mg de efedrina ou 50 µg de fenilefrina por bolus), conforme indicado.

Durante o trabalho de parto, os níveis de bloqueio sensorial e motor e o escore de dor foram avaliados em intervalos de uma hora. O grau de bloqueio motor foi avaliado com o escore de Bromage modificado (EBM), no qual 1 = bloqueio completo, incapaz de mover os pés ou joelhos; 2 = bloqueio quase completo, capaz de mover apenas os pés; 3 = bloqueio parcial, capaz de mover apenas os joelhos; 4 = fraqueza detectável de flexão do quadril em supinação; 5 = nenhuma fraqueza detectável de flexão do quadril em supinação. As parturientes com EBM ≤2 e/ou nível sensorial ≥T6 foram consideradas como portadoras de bloqueio peridural excessivamente denso ou alto, respectivamente, e adequadamente tratadas.

A dor foi avaliada com a Escala de Avaliação Numérica (EAN), em que 0 indica ausência de dor e 10 a pior dor imaginável. A dor incidental foi tratada com a administração peridural de doses adicionais em bolus e/ou com o aumento da taxa de infusão peridural, a depender do escore da EAN. Para as parturientes com escores de dor =3-5, a taxa de infusão peridural foi gradualmente aumentada até o máximo de 12 mL.h-1. Para aquelas com escore de dor ≥ 6, doses em bolus de lidocaína a 2% (2-3 mL) foram administradas via peridural até o máximo de 8 mL. A peridural foi considerada ineficaz se uma dor significativa (escore EAN > 5) persistisse apesar da administração da dose máxima. A essas parturientes oferecia-se o reposicionamento peridural. Caso elas não concordassem, meios opcionais de analgesia eram usados. As parturientes que precisaram de reposicionamento peridural ou de meios opcionais de analgesia foram excluídas do estudo. A infusão peridural foi mantida até o nascimento do bebê e interrompida somente após a sutura da episiotomia.

O manejo obstétrico foi semelhante em ambos os grupos. Amniotomia era feita se as membranas fetais estivessem intactas. O exame pélvico para avaliar o progresso do trabalho de parto foi feito em intervalos regulares, de acordo com o protocolo. O aumento de ocitocina foi prescrito como necessário para obter uma taxa de dilatação cervical ≥1 cm/h. A decisão de proceder ao parto vaginal instrumental ou operatório foi tomada de acordo com as indicações maternas ou fetais.

Os dados coletados incluíram a duração da primeira e da segunda fase do trabalho de parto, aumento de ocitocina, resultado do trabalho (parto vaginal espontâneo, parto vaginal instrumental ou cesariana), bem como os escores de Apgar no 1° e 5° minutos. A indicação para cesariana de emergência por incisão no segmento inferior (CEISI) também foi registrada. O resultado fetal foi avaliado com base em estudos anteriores, nos quais escores de Apgar <7 foram considerados baixos.44. Frikha N, Ellachtar M, Mebazaa M, et al. Combined spinal-epidural in labor-comparison of sulfentanil vs tramadol. Middle East J Anesth. 2007;19:87-96.and99. Liu EHC, Sia ATH. Rates of caesarian section and instrumental vaginal delivery in nulliparous women after low concen- tration epidural infusions or opioid analgesia. Br Med J. 2004;328:1410-5. Além disso, qualquer incidência de hemorragia no pós-parto foi registrada e, para as pacientes do grupo RP, qualquer efeito colateral observado (náusea, vômito, prurido, cefaleia pós-punção) foi documentado e adequadamente tratado. Para as pacientes do grupo não RP, as razões para o declínio da analgesia combinada RP também foram documentadas.

Análise estatística

O tamanho da amostra foi calculado com a fórmula de Snedecor e Cochran (1989) para variáveis contínuas. O valor constante de 10,51 baseou-se no valor-a de 0,05 e poder de 90%. Com essa fórmula, um tamanho de amostra de 45 pacientes para cada grupo foi obtido. Considerando uma taxa de desistência de 20%, 55 pacientes eram necessários em cada braço. O programa SPSS (versão 20; IBM SPSS Inc.) foi usado para a análise estatística. A análise dos dados foi feita com o teste t independente para os dados paramétricos e o teste do qui-quadrado para os dados não paramétricos. Um valor-p < 0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

Resultados

Foram incluídas no estudo 110 parturientes, 55 em cada grupo. A tabela 1 apresenta as características das parturientes de ambos os grupos. Não houve diferença significativa em termos de idade, peso, altura, índice de massa corporal (IMC) e idade gestacional entre as parturientes de ambos os grupos.

Tabela 1
Características das parturientes (valores expressos em média ± desvio padrão)

Não houve diferença significativa na duração da primeira e da segunda fase do trabalho de parto entre ambos os grupos, como mostra a tabela 2. A porcentagem de pacientes que recebeu ocitocina foi de 71% e 65% nos grupos RP e não RP, respectivamente, e não houve diferença significativa. No total, 46 pacientes do grupo RP e 47 do grupo não RP tiveram parto vaginal normal. As taxas de parto vaginal espontâneo e instrumental não foram estatisticamente diferentes entre os grupos. O parto por vácuo extrator foi o modo mais comum de parto instrumental assistido. A taxa de CEISI não diferiu significativamente entre os grupos. A principal indicação para CEISI foi sofrimento fetal, responsável por 14,5% e 10,9% dos casos nos grupos RP não RP, respectivamente. CEISI foi indicada em caso de mau progresso nos demais casos de ambos os grupos.

Tabela 2
Características do trabalho de parto (valores expressos em média ± DP ou em números com percentual entre parênteses quando apropriado)

No 1° minutos, três e dois recém-nascidos dos grupos RP e não RP, respectivamente, apresentaram escores de Apgar < 7, mas a diferença não foi estatisticamente significativa. Nenhum dos recém-nascidos apresentou escore de Apgar <7 no 5° minuto.

Prurido foi a complicação mais comum no grupo RP - presente em 24 parturientes (44%) - mas a duração foi curta e não houve necessidade de intervenção. Duas gestantes (3,6%) do grupo RP queixaram-se de náusea sem vômito. Não houve outras complicações relacionadas à RP, como dor de cabeça pós-punção dural e hipotensão, ou outras complicações, como hemorragia pós-parto. As parturientes que declinaram a analgesia combinada RP relataram como motivos o medo de sentir dores nas costas, dormência ou incapacidade de suportar a segunda fase do trabalho de parto.

Discussão

O efeito da analgesia neuraxial nos resultados obstétricos e de trabalhos de parto tem sido estudado extensivamente ao longo dos anos. Entre os desfechos estudados encontram-se a duração da primeira e da segunda fase do trabalho de parto, o aumento da ocitocina, a taxa de partos instrumentais e cesáreos, a satisfação materna e o resultado neonatal.10, 11, 12-13

O presente estudo mostrou que a duração da primeira fase do parto não foi prolongada em gestantes que receberam a combinação de analgesia RP. O ligeiro aumento na média da duração da fase ativa do parto no grupo RP (352,3 minutos em comparação com 347,2 minutos no grupo não RP) não atingiu significância estatística. Estudos anteriores que compararam analgesia peridural com opiáceos sistêmicos relataram resultados inconsistentes. A analgesia peridural foi implicada no prolongamento ou não apresentou efeito na primeira fase do trabalho de parto.13, 14, 15, 16-17 Curiosamente, Tsen et al. relataram que a RP foi associada ao aumento da taxa de dilatação cervical em pacientes nulíparas.1818. Tsen LC, Thue B, Datta S, et al. Is combined spinal-epidural analgesia associated with more rapid cervical dilatation in nul- liparous patients when compared with conventional epidural analgesia. Anesthesiology. 1999;91:920-5. Os autores postularam que a analgesia espinal com a técnica RP permitiu, pelo menos inicial e e potencialmente durante o curso do trabalho de parto, reduzir a dose do anestésico local, em comparação com a analgesia peridural convencional. Outro postulado foi que o trabalho de parto doloroso resultou em um aumento do nível de adrenalina materna que, em si, pode ser tocolítico. Evidências demonstram que a analgesia peridural pode acelerar o parto porque o fornecimento de analgesia eficaz reduz as catecolaminas maternas e, portanto, minimiza seu efeito inibitório na contratilidade uterina.1919. Schnider SM, Abboud TK, Artal R, et al. Maternal catecholamines decrease during labor after lumbar epidural anesthesia. Am J Obstet Gynecol. 1983;147:13-5. Portanto, era de se esperar que o uso combinado de RP com seu rápido início e eficácia analgésica semelhante teria um efeito similar na duração do trabalho de parto.

Acredita-se que a analgesia peridural prolonga a segunda fase do trabalho de parto ao remover o reflexo involuntário da parturiente de suportar ou ao interferir na função motora.1515. Rojansky N, Tanos V, Shapira S, et al. Effect of epidural analge- sia on duration and outcome of induced labour. Int J Gynaecol Obstet. 1997;56:237-44. O esforço materno insuficiente durante a expulsão pode causar má posição fetal durante a descida, o que pode levar a uma intervenção sob a forma de parto instrumental ou cesariana. Contudo, na prática moderna atual, quando soluções anestésicas locais diluídas são usadas para fornecer analgesia peridural, o bloqueio motor e, portanto, a fraqueza dos músculos do assoalho pélvico são mínimos ou inexistentes. Isso foi confirmado por uma metanálise recentemente publicada sobre o efeito de baixas concentrações versus altas concentrações de anestésicos locais para analgesia de parto nos desfechos obstétricos e anestésicos. 2020. Sultan P, Murphy C, Halpern S, et al. The effect of low con- centrations versus high concentrations of local anesthetics for labour analgesia on obstetric and anesthetic outcomes: a meta- analysis. Can J Anesth. 2013;60:840-54. Os autores descobriram que as baixas concentrações estavam associadas a uma redução na incidência de parto vaginal assistido e a uma segunda fase mais curta de trabalho de parto. Usamos uma infusão peridural com uma concentração baixa de ropivacaína a 0,0625% e 2 µg.mL-1 de fentanil em nosso estudo, de acordo com o protocolo institucional. Não é surpresa que o nosso estudo não tenha encontrado diferença significativa entre os grupos RP e não RP em relação à duração da segunda fase do trabalho de parto. Esse resultado é semelhante aos de outros estudos randomizados e controlados que compararam a combinação de RP com a analgesia peridural convencional. 2121. Norris MC, Fogel ST, Conway C. Combined spinal-epidural versus epidural labor analgesia. Anesthesiology. 2001;95:913-20.and2222. Stacey RG, Poon A. Comparison of low dose epidural with combined spinal-epidural analgesia for labour. Br J Anaesth. 2000;84:695-8.

A taxa de parto instrumental é mais um desfecho importante avaliado, pois o procedimento aumenta o risco de trauma perineal materno e de resultados neonatais adversos em caso de parto difícil.1313. Cambic CR, Wong CA. Labour analgesia and obstetric outcomes. Br J Anaesth. 2010;105:50-60. A revisão de 2011 do banco de dados Cochrane da analgesia peridural versus não peridural ou nenhuma analgesia durante o trabalho de parto mostrou que a analgesia peridural foi associada ao aumento do risco de parto vaginal assistido. 88. Anim-Somuah M, Smyth RMD, Jones L. Epidural versus non- epidural or no analgesia in labour. Cochrane Database Syst Rev. 2011;12:CD000331. Contudo, verificou-se que a incidência de parto instrumental não foi significativamente diferente (RP, 9% versus não RP, 12,7%). Isso contrasta com estudos anteriores que relataram taxas mais altas de parto instrumental em peridural, em comparação com opiáceos parenterais ou uso de óxido nitroso. 99. Liu EHC, Sia ATH. Rates of caesarian section and instrumental vaginal delivery in nulliparous women after low concen- tration epidural infusions or opioid analgesia. Br Med J. 2004;328:1410-5.and1212. Leong EW, Sivanesaratnam V, Oh LL, et al. Epidural analgesia in primigravidae in spontaneous labour at term: a prospective study. J Obstet Gynaecol Res. 2000;26:271-5. Estudos que compararam RP com peridural não relataram diferenças nos tipos de parto. 2121. Norris MC, Fogel ST, Conway C. Combined spinal-epidural versus epidural labor analgesia. Anesthesiology. 2001;95:913-20.and2222. Stacey RG, Poon A. Comparison of low dose epidural with combined spinal-epidural analgesia for labour. Br J Anaesth. 2000;84:695-8. Devemos notar que os resultados são frequentemente afetados por múltiplos fatores de confusão, como a técnica analgésica neuraxial, o método de manutenção da analgesia peridural, a concentração de anestésico local, o grau de analgesia durante a segunda fase do trabalho de parto e os fatores obstétricos.1313. Cambic CR, Wong CA. Labour analgesia and obstetric outcomes. Br J Anaesth. 2010;105:50-60.

Dados consideráveis apoiam a noção de que a analgesia neuraxial em trabalho de parto não aumenta o risco de cesariana em comparação com a analgesia sistêmica.1313. Cambic CR, Wong CA. Labour analgesia and obstetric outcomes. Br J Anaesth. 2010;105:50-60. Neste estudo, não observamos aumento significativo das taxas de cesariana em gestantes que receberam analgesia combinada RP. A revisão do banco de dados Cochrane da analgesia peridural versus não epidural ou nenhuma analgesia em trabalho de parto mostrou que não há evidência de diferença significativa no risco em geral de cesariana, embora haja um aumento do risco de cesariana por sofrimento fetal. 88. Anim-Somuah M, Smyth RMD, Jones L. Epidural versus non- epidural or no analgesia in labour. Cochrane Database Syst Rev. 2011;12:CD000331. De forma semelhante, Halpern et al. relataram que o risco de cesariana não foi diferente entre mulheres que receberam opioides sistêmicos versus analgesia neuraxial. 1717. Halpern SH, Leighton BL. Epidural analgesia and the progress of Labor. Evidence-based obstetric anaesthesia. Oxford, UK: Blackwell; 2005. p. 10-22. Também devemos enfatizar que muitos fatores, além do progresso do trabalho de parto, podem contribuir para o parto cesáreo, tais como desproporção céfalo-pélvica, bebê macrossômico, infecção e paridade materna.1313. Cambic CR, Wong CA. Labour analgesia and obstetric outcomes. Br J Anaesth. 2010;105:50-60. Os resultados desses estudos, incluindo o nosso, implicam que é improvável que a analgesia neuroaxial, em si, afete as chances de um parto normal.

Resultado neonatal avaliado pelo índice de Apgar foi similar em ambos os grupos. Todos os cinco recém-nascidos nos dois grupos, com escores de Apgar menor do que 7 no 1° minuto recuperaram no 5° min. Isso está de acordo com outros estudos que mostraram não haver diferença nos escores de Apgar ou no pH do cordão em pacientes que recebem peridural ou analgesia RP.6, 9, 12-23

O efeito colateral mais comum nas parturientes que receberam a analgesia combinada RP foi prurido, o que ocorreu em 44% das pacientes. Esse efeito foi transitório e tolerável, sem necessidade de tratamento. As queixas das pacientes revelaram prurido como o efeito colateral mais comum dos opiáceos intratecais.2424. Van der Velde M. Combined spinal epidural analgesia for labor and delivery: a review. Acta Anaesthesiol Belg. 2004;55:17-27. Miro et al. concluíram em seu estudo que embora a analgesia combinada RP tenha sido mais comumente associado a prurido e dor nas costas, essa combinação proporcionou analgesia de qualidade superior.2323. Miro M, Guasch E, Gilsanz F. Comparison of epidural analgesia with combined spinal-epidural for labor. Int J Obstet Anesth. 2008;17:15-9.

Este estudo tem algumas limitações. Primeiro, o caráter de cegamento dos médicos foi difícil, porque as parturientes eram facilmente diferenciadas entre os grupos RP e não RP. Mesmo que isso possa reduzir o limiar de parto instrumental no grupo RP, esse foi reduzido por adesão rigorosa aos protocolos para o manejo obstétrico da instituição. Segundo, como este estudo incluiu apenas parturientes classificadas como ASA I, seus resultados não podem ser extrapolados para pacientes com outras afecções médicas ou relacionadas à gravidez. Essas comorbidades poderiam influenciar o manejo obstétrico e afetar a taxa de parto instrumental ou cesariana e possivelmente o resultado neonatal. Terceiro, a avaliação subjetiva da dilatação cervical pode variar entre médicos com diferentes experiências e afetar, assim, a avaliação real da duração do trabalho de parto. O aumento de ocitocina é outro fator de confusão em relação à duração do trabalho de parto. Como era parte do protocolo obstétrico de nossa instituição, a maioria de nossas parturientes recebeu ocitocina, mas não registramos se a administração ocorreu antes ou após o início da analgesia de parto. A ocitocina, em si, pode acelerar a progressão do trabalho de parto. Por outro lado, o fornecimento de analgesia de parto eficaz poderia ser parcialmente responsável por acelerar os processos de trabalho de parto. No entanto, pode ter havido algumas parturientes que, apesar de receber analgesia de parto, não apresentaram alívio da dor. O alívio subótimo da dor pode retardar a progressão do trabalho de parto e levar, assim, à administração de ocitocina. Finalmente, quando ao resultado neonatal, comparamos apenas os escores de Apgar entre os dois grupos. Outros índices de bem-estar neonatal, como o pH do cordão umbilical, a necessidade de naloxona, ventilação mecânica ou admissão em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal, não foram investigados em nosso estudo.

Em geral, este estudo apoia outros estudos que descobriram que a analgesia combinada RP não afetou negativamente o resultado do trabalho de parto.1717. Halpern SH, Leighton BL. Epidural analgesia and the progress of Labor. Evidence-based obstetric anaesthesia. Oxford, UK: Blackwell; 2005. p. 10-22.and1818. Tsen LC, Thue B, Datta S, et al. Is combined spinal-epidural analgesia associated with more rapid cervical dilatation in nul- liparous patients when compared with conventional epidural analgesia. Anesthesiology. 1999;91:920-5. As mulheres em trabalho de parto podem estar certas de que, além de obter analgesia superior com a combinação de RP, podem ter um parto vaginal seguro e normal. Em conclusão, o presente estudo mostrou que não houve diferença significativa na duração do trabalho de parto, na taxa de parto instrumental vaginal e de cesariana de emergência e no resultado neonatal em parturientes que receberam RP em comparação com aquelas que não receberam RP para analgesia de parto.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    05 Jul 2014
  • Aceito
    03 Set 2014
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